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𝐄𝐏𝐈𝐏𝐇𝐀𝐍𝐘

[ CAPÍTULO DOIS ]

‖ TERRA À VISTA

APÓS A EUFORIA QUE as crianças – menos Eustáquio, é claro – sentiam passar, devido ao fato de estarem nas terras mágicas de Nárnia, os quatro indagaram ao Príncipe Caspian – opa, ele agora era rei! – a razão do mesmo ter utilizado mais uma vez de sua trompa para os convocar ao país, curiosos para saberem com o que iriam lidar a seguir, afinal, Nárnia era sempre repleta de aventuras.

━ Imagino qual é o problema que iremos nos meter dessa vez ━ disse Sebastian, ansioso, e os outros concordaram com ele. ━ O que tem para nos dizer, Caspian?!

━ Bem, dessa vez, eu não os chamei ━ contou o rei, e os quatro se entreolharam em confusão, enquanto Eustáquio ainda resmungava em um canto.

━ E por que é que não?! ━ questionou Betty, quase ofendida. ━ Pois saibam que eu não gosto de aparecer de intrometida nos lugares! Bem, é como eu normalmente apareço na maioria das ocasiões, mas às vezes sinto vontade de ter um convite!

━ Sinto muito, Betty, mas dessa vez, não fui eu mesmo… ━ repetiu Caspian, tão confuso quanto os mais novos.

━ Seja qual for o caso, é sempre um prazer estar aqui ━ lembrou Edmundo, com um grande sorriso. ━ Seria um prazer ainda maior se…

O Pevensie mais velho não foi capaz de completar a frase, porque os gritos de Eustáquio, que era atacado por Ripchip – o rato guerreiro e muito querido – do outro lado do convés o interromperam. 

━ Se ele não tivesse vindo conosco ━ completou Bash, com um olhar de julgamento, que se suavizou assim que Ripchip se aproximou da turma.

━ Ripchip! Como vai? ━ perguntou Lúcia, alegre.

O rato fez uma reverência elegante, como sempre.

━ Majestades, Sebastian ━ ele cumprimentou, e assim que se endireitou da reverência, olhou para Eustáquio por cima dos ombros. ━ É um prazer vê-los, mas o que faz esse intruso estar aqui?

Finalmente levantando-se do chão, encharcado e amedrontado, Eustáquio Mísero apontou um dos dedos ossudos em direção a Ripchip, antes de proferir:

━ Esse rato gigantesco arranhou minha cara toda! E, para piorar, ele fala!

Com um revirar de olhos, Betty se aproximou do garoto e o ofereceu uma toalha, de forma paciente.

━ Não tem um único arranhão no seu rosto! E, para deixar claro, Ripchip só estava tentando tirar a água dos seus pulmões ━ ela defendeu. ━ E ora essa, é claro que ele fala!

━ Fazê-lo se calar é que é difícil ━ Caspian completou.

━ Quando não houver nada a ser dito, prometo que não direi nada ━ Ripchip garantiu.

A cada segundo, Eustáquio parecia se aproximar mais de um colapso nervoso. Com o rosto vermelho e as veias saltadas, ele se agarrou fortemente a toalha, tentando se aquecer, e gritou:

━ EU QUERO ACORDAR AGORA!

Numa tentativa de ajudar, Betty o deu um beliscão, e ele gritou mais uma vez.

━ Por que não o jogamos de volta no mar?

Lúcia deu uma forte cotovelada em Edmundo, que claramente estava considerando uma boa ideia a sugestão do rato, e se aproximou de Betty, para tentar ajudá-la a acalmar o primo.

━ Eustáquio, deixe de chilique! É Nárnia!

━ Isso mesmo ━ confirmou um Minotauro, que fazia parte da tripulação. ━ Estamos no Peregrino da Alvorada.

Aparentemente, até aquele momento o garoto desesperado ainda não havia visto a criatura, porque foi quando se virou para ver quem o dirigia a palavra que Eustáquio foi de encontro ao chão, em um súbito desmaio. Betty e Lúcia tentaram prender a risada, mas foram as únicas; enquanto os tripulantes caíram na risada, incluindo Edmundo e Bash, Caspian pediu para que alguns de seus homens cuidassem de Eustáquio, e então subiu em uma parte mais elevada do navio para apresentar os velhos amigos.

━ Homens, quero que conheçam nossos náufragos! ━ ele iniciou, com a voz alta, evidenciando as quatro crianças com as mãos. ━ Rei Edmundo, o Justo! Rainha Lúcia, a Destemida! Rainha Elizabeth, a Genuína! Sebastian, o coração nobre! Grandes amigos e defensores de Nárnia!

Conforme a tripulação se ajoelhava perante eles, os quatro abriram sorrisos gentis, aceitando as reverências. Quando começaram a se levantar, Betty se prontificou a esclarecer um assunto que temia que fosse surgir mais cedo ou mais tarde.

━ Antes que cheguemos ao assunto, eu sei que parecemos jovens demais, mas tecnicamente já fomos mais velhos que a maioria de vocês.

🌊

Betty Birdwhistle nunca havia se imaginado como uma pirata; em suas brincadeiras de faz de conta, ela já havia sido princesa, fada, e até mesmo uma bruxa, mas nunca uma pirata. Ela costumava pensar que piratas deveriam ser bons nadadores, coisa que ela com certeza não era – Betty era boa em muitas coisas, mas nunca foi uma esportista –, e agora se divertia ao perceber que fazia parte da tripulação de um navio.

Quando todos se secaram e vestiram roupas secas – Betty se surpreendeu ao ver como a moda em Nárnia estava mudando, pois ela nunca antes tinha vestido calças ali –, o rei Caspian os levou para conhecer o interior do navio, onde todos iriam se acomodar quando chegasse a hora do merecido descanso.

━ Nunca pensei que viveríamos uma aventura em alto-mar ━ contou Betty, com um enorme sorriso enquanto corria os olhos pelo local em que se encontravam. ━ É tudo tão bonito! E tão diferente…

━ Aslam! ━ exclamou Lúcia, de repente, e todos se viraram de imediato, apenas para encontrarem a face do Leão esculpida na madeira dourada da porta. ━ E vejam, são nossas coisas!

O pequeno quarto que lhes era apresentado por Caspian mais parecia uma espécie de memorial. Havia tapeçarias com imagens dos reis da Era de Ouro, pinturas que representavam a coroação de Elizabeth, a Genuína, após o sumiço dos Pevensie, a chegada de Lúcia em Nárnia, quando encontrou o senhor Tumnus pela primeira vez… Conforme as crianças corriam os olhos pelo local, seus corações se enchiam de saudade e orgulho.

Em um dos cantos, estava o arco e flecha que foi presenteado a Susana pelo Papai Noel. Também viram a trompa mágica que os havia levado para Nárnia da última vez e muitas outras coisas, que Caspian os mostrava com alegria.

━ A espada de Pedro! ━ disse Edmundo, vendo a arma próxima a uma parede.

━ Cuidei dela como prometi ━ assegurou Caspian, estendendo a espada em direção à Edmundo. ━ Tome! É sua se quiser.

Edmundo balançou a cabeça para os lados, rejeitando.

━ É sua. Pedro deu a você.

Caspian agradeceu com um abano de cabeça, antes de se virar e abrir a porta de um armário.

━ Bem, eu ainda salvei isso para você.

━ A sua lanterna, Ed! ━ exclamou Betty, caindo na risada. ━ Não há arma mais eficiente do que ela, é verdade.

━ Tem certeza? ━ perguntou Caspian, elevando uma sobrancelha antes de tirar duas lanças do mesmo armário, entregando-as à garota, que escancarou um dos maiores sorrisos já vistos pelos outros. ━ Viridi Hastam, a lança dos bosques, e…

━ Pignus, eu sei! A lança que Ed me deu quando perdi Viridi Hastam… São os meus bebês! ━ ela completou, emocionada, ao ver que Viridi Hastam ainda se iluminava em suas mãos. Dando uma risadinha, ela se virou para o irmão, entregando-o a lança dos bosques e permanecendo com Pignus. ━ Ainda é sua, Bash, ou já se esqueceu?

Com um sorriso animado, ele aceitou a lança, tentando a equilibrar.

━ Ótimo! Eu mal podia me equilibrar com essa lança em terra firme, e agora estamos em alto-mar! ━ ele reclamou, fazendo com que todos dessem risada de sua indignação. ━ Sabem de uma coisa? Não tem graça nenhuma!

━ Não reclame demais ou vai ficar igual a Eustáquio ━ Edmundo falou, cruzando os braços. ━ Você não quer isso, quer?

━ Edmundo tem razão, você só sabe reclamar! ━ exclamou a irmã, girando a lança nas mãos com uma técnica impecável. ━ Nós estamos em Nárnia, é motivo de alegria. Bem, ao menos, eu acho… Nós só aparecemos quando há um problema a se resolver. Qual é o da vez, Caspian?

Começando a narrar histórias dos últimos anos de Nárnia, Caspian puxou um mapa velho, para os mostrar por onde haviam passado e o que haviam feito em cada local, resolvendo questões para garantir a resolução de impasses narnianos. 

━ Desde que se foram pela última vez, os Gigantes do Norte se renderam, e nós derrotamos os exércitos da Calormânia no Grande Deserto ━ contou o rei navegador, orgulhoso. ━ Nárnia está em paz!

Era uma ótima notícia, é claro, e todos ficaram felizes ao saber daquilo. Mas Betty se atentou a uma coisa em particular: em todos os minutos de história de Caspian, ele não havia uma única vez mencionado um romance! Aquilo devia de estar errado, porque além de ser rei, Caspian havia também se tornado um homem bastante bonito. Sem conseguir se segurar, ela indagou:

━ Isso é ótimo, mas me diga uma coisa… ━ ela iniciou, cautelosa, e todos a encararam com curiosidade. ━ Nárnia ainda não tem uma rainha?!

━ Ora, sua linguaruda, que falta de educação! ━ Bash a repreendeu.

━ Bem, a essa altura do campeonato, eu já estava esperando que Caspian tivesse encontrado uma bela sereia pelo caminho do Peregrino da Alvorada ou coisa parecida! ━ ela se justificou, cruzando os braços. ━ Não quis ser intrometida, mas estava curiosa, é só isso!

━ Tudo bem, não tem problema ━ garantiu Caspian, com um sorriso envergonhado. ━ Eu sigo sozinho, Betty ━ ele esclareceu, e ela assentiu com a cabeça, ainda surpresa pela informação. ━ Acredito que entre todos nós, rapazes, Edmundo foi o único a encontrar sua rainha.

Sebastian revirou os olhos, com o rosto se contorcendo em uma carranca mal-humorada.

━ Ele não encontrou nada ━ resmungou, passando um dos braços pelos ombros da irmã mais velha e a puxando para longe de Edmundo. ━ Somos todos solteirões! Principalmente Edmundo!

Como de costume, as bochechas de Betty ficaram vermelhas e ela revirou os olhos, enquanto Edmundo ria sozinho, encarando o chão. Então, quando o navio balançou relativamente mais forte do que no minuto anterior e todos tiveram que se segurar para não cair, um tilintar se fez ouvir no local, e o Pevensie se abaixou para identificar o que havia caído.

Um sorriso pequeno dominou seus lábios ao reconhecer a pequenina jóia, que havia sido forjada tantos anos antes, quando Edmundo era mais velho. O brilho não havia desaparecido, e ainda que precisasse de polimento, a aliança de noivado de Betty estava em perfeito estado.

━ Está chegando a hora de você se conformar de que Betty e eu estivemos noivos, Bash ━ Edmundo falou, se levantando e guardando o anel no bolso antes que os outros vissem. ━ E eu sempre fui um noivo perfeitamente decente para ela, se quer saber…

Algum tempo antes, pouco após a vitória dos narnianos contra os telmarinos, Elizabeth e Edmundo haviam tido uma conversa secreta, longe dos outros, sobre seus sentimentos. Era claro que deveriam conversar de novo, porque agora já haviam amadurecido um pouco mais, mas o Pevensie permanecia firme ao que havia dito à Birdwhistle da última vez: ele se casaria com ela a qualquer momento, com anéis de papel, se fosse necessário.

━ É verdade, Bash ━ confirmou Caspian.

━ Você nem estava lá na época!

━ É o que dizem os livros sobre a Era de Ouro! Todos falam sobre como a guardiã dos bosques e o rei justo eram apaixonados, e sobre como se tratavam de igual para igual, e que Edmundo nunca foi nada além de gentil e honesto com Betty ━ justificou Caspian, contando sobre o que havia lido em suas aulas de história de Nárnia. ━ Até hoje, é um dos romances preferidos do povo narniano! Ainda escrevem canções sobre os dois.

━ E bem, eu estava lá ━ completou Lúcia, abrindo um sorriso travesso, aproximando-se do irmão. ━ Se me lembro bem, o pior dia da vida de Edmundo foi quando um lorde da Arquelândia visitou Cair Paravel para pedir a mão de Betty em casamento. Acho que nunca vi meu irmão tão desesperado quanto naquele dia!

Sebastian estava cansado de todos estarem sempre contra ele quando o assunto era o noivado de sua irmã e Edmundo. A vida era tão injusta! Mas não podiam julgá-lo; Betty era a melhor pessoa do mundo aos seus olhos, e sempre seria boa demais para qualquer um. Não era nada pessoal contra Edmundo; era contra todos os homens!

━ Certo, não vamos começar com esse papo de novo ━ pediu Betty, prendendo a risada, e se virou para Caspian. ━ Se não tem ninguém em perigo e tudo está bem, por que é que estamos aqui, afinal de contas?

Caspian deu de ombros.

━ É uma boa pergunta.

━ E aonde estamos indo?

━ Antes de eu tomar o trono do tio Miraz, ele tentou matar os amigos mais leais do meu pai. Os sete fidalgos de Telmar, que fugiram para as Ilhas Solitárias e, desde então, ninguém nunca mais ouviu sobre eles. É para onde vamos.

━ Você acha que aconteceu algo com eles?

━ É o que quero descobrir.

━ E o que fica a leste das Ilhas Solitárias? ━ perguntou Lúcia, vendo que nada constava no mapa.

━ Águas não mapeadas. Eu me lembro de contos sobre serpentes marinhas e monstros assustadores ━ disse Betty, lembrando-se de relatos que havia tido conhecimento durante seu tempo como rainha. ━ Oh, será que conseguiremos mesmo chegar até lá?

━ Você está tentando nos assustar com essas histórias? ━ Bash acusou, cerrando os olhos.

━ Não estou tentando, você é que é medroso.

━ Certo, não vamos brigar… ━ pediu Caspian, acalmando os ânimos dos irmãos Birdwhistle. ━ Vamos salvar nossas energias! Não sabemos o que há para se encontrar na nossa jornada.

Devagar, Betty se aproximou do ouvido esquerdo do irmão, que tinha os olhos arregalados, e sussurrou:

━ Serpentes marinhas!

Sebastian sentiu um frio na espinha, e Betty riu de seus olhos arregalados. Ela admirava Sebastian; ele costumava ser um rapaz cético e facilmente assustado, mas não importava a situação, ela sabia que enfrentaria todos os medos para o bem de Nárnia. Ainda que não tivesse recebido um título formal, ela sabia que ele também era um guardião dos bosques narnianos. 

Após alguns minutos, todos subiram para o convés novamente, agora aproveitando o sol brilhante que os iluminava e aquecia, e enquanto Lúcia e Bash foram atrás de Ripchip, que cantava a música que lhe havia sido apresentada por uma dríade quando ainda era apenas um filhote, Betty permaneceu junto ao resto da tripulação, assistindo a um duelo amistoso entre Edmundo e Caspian.

━ Era só o que faltava… Eles estão tentando se matar! ━ disse Eustáquio, ao lado da loira. ━ Isso não é divertido! Vocês aqui só fazem besteiras…

━ Só não vá desmaiar novamente! ━ pediu a Birdwhistle, se divertindo com o duelo. ━ Você está melhor?

━ Não. Acho que pioro a cada momento.

Com mais alguns movimentos, Edmundo e Caspian finalizaram o duelo de espadas, com sorrisos nos rostos e nem um pouco cansados; ora essa, eram reis e estavam acostumados a duelar! Betty aplaudiu, junto dos tripulantes, e Caspian acenou para que ela se aproximasse.

━ Não quer se unir a nós?

━ Ah, vocês não me dariam trabalho ━ ela retrucou, sorrindo de lado. ━ E assim eu não me divirto!

Os homens do navio estavam curiosos para ver o desempenho da garota, mas jamais ousariam insultar a rainha. No entanto, todos os livros diziam que Elizabeth, a Genuína, havia sido uma guerreira excepcional, defendendo Nárnia com apenas uma lança, a qual empunhava de forma habilidosa.

━ Vamos lá, Betty. Nos dê a honra de te enfrentar ━ Caspian continuou, com um sorriso, e Betty assentiu, girando a lança nas mãos ao se aproximar dos dois reis.

━ Bom, já que Vossa Majestade insiste…

É claro que, em uma batalha amistosa e brincalhona, ninguém estava realmente se esforçando para provar um ponto; tudo não passava de entretenimento, afinal, passar os dias encarcerados em um navio podia ficar entediante, e os monarcas queriam garantir alguma diversão para os tripulantes do Peregrino da Alvorada. Mas era inegável que, ainda que sem muito esforço, Edmundo parecia se sobressair – ele definitivamente não era tido como o melhor espadachim de Nárnia sem motivo! – sobre Caspian, que também era muito habilidoso.

Betty não lutava com uma espada. Ela empunhava Pignus, uma grande lança prateada e que havia sido forjada especialmente para ela, e provava seu valor. Com certeza, a destreza de seus movimentos e a força de seus golpes surpreendia a todos enquanto o rei justo, o rei navegador e a rainha genuína batalharam no convés. O som de metal se chocando contra metal se unia ao som de risadas, e era como música para os ouvidos da garota.

Após mais alguns minutos, já levemente ofegante, Betty girou a lança nas mãos, interceptando golpes tanto de Caspian quanto de Edmundo, e os desarmou, fazendo com que as espadas caíssem ao chão. Abrindo um sorriso vitorioso, Betty agradeceu pelos aplausos, parabenizando os adversários e aceitando um copo d'água que lhe era oferecido.

━ Hora de voltar ao trabalho! ━ o capitão do navio gritou, do andar de cima, e Caspian foi ao seu encontro, enquanto todos se dispersavam.

Juntamente à Edmundo, Betty se apoiou contra o casco do navio, descansando, e encarou o horizonte.

━ Você sabe o que dizem sobre o leste das Ilhas Solitárias, não sabe? ━ perguntou Edmundo, e ela assentiu. ━ Além das serpentes marinhas e tudo isso.

━ É onde a água e o céu se encontram. O começo do País de Aslam ━ ela falou, e Edmundo concordou, observando o mar a sua frente. ━ Acha que é real? Que podemos alcançar?

Edmundo a encarou, assentindo de forma confiante.

━ Sim. É preciso acreditar.

━ Deve ser onde Ele passa todo o tempo quando some, não é? ━ indagou a loira, referindo-se ao amigo Leão. ━ Espero que consigamos encontrar Aslam uma última vez…

Uma última vez. Edmundo e Betty trocaram um olhar um pouco triste, porque ambos sabiam que aquela era, provavelmente, a última vez dos dois em Nárnia, afinal, já haviam aprendido muitas coisas nas duas primeiras viagens; agora, já deveriam ser maduros o suficiente para compreender o que restava a ser ensinado, como ocorreu com Pedro e Susana.

━ Não vamos pensar em coisas tristes ━ pediu Edmundo. ━ Temos muita coisa para fazer aqui, e vamos aproveitar enquanto podemos.

━ Você tem razão. Temos outras preocupações até chegarmos lá ━ concordou Betty, olhando para Sebastian, que agora apontava uma lança para Eustáquio, tentando o convencer a duelar contra ele. ━ SEBASTIAN, PARE IMEDIATAMENTE! NÃO É SÓ PORQUE EUSTÁQUIO É A ÚNICA PESSOA A BORDO QUE VOCÊ É CAPAZ DE DERROTAR QUE DEVE AGIR COM ARROGÂNCIA!

Edmundo soltou uma risada, vendo quando o mais novo abaixou a cabeça e obedeceu a irmã, voltando a se aproximar de Lúcia e Ripchip.

━ O poder está subindo à cabeça dele. Não posso deixar!

━ Ah, não se estresse com isso, ele só quer lutar um pouco.

━ Não vão faltar oportunidades.

━ Tem razão. Nunca faltam ━ o rapaz disse, em concordância, e ela riu. ━ Sabe o que eu estava pensando que era engraçado?

━ Seria muito estranho se eu soubesse… Infelizmente, ainda não leio mentes!

━ Ora, você é sempre tão engraçada! ━ exclamou ele, com tom de sarcasmo. ━ Eu dei a você um anel de papel, e me lembro de ter escrito que ele deveria ser mantido longe de água… E agora veja onde nós estamos!

A risada de Betty não demorou a ser ouvida, e ela assentiu, encarando as leves ondas que empurravam o navio em alto-mar.

━ É verdade. Ainda bem que nossos sentimentos não são frágeis como os anéis de papel ━ ela falou, sem o encarar, sentindo um leve calor nas bochechas, e Edmundo sorriu. ━ Bem, os meus não são.

Finalmente, Edmundo decidiu tirar a velha aliança de Betty de um dos bolsos, atraindo os olhos da garota, que se iluminaram ao ver a jóia. Sem dizer nada, ele pegou sua mão e passou a aliança por seu dedo anelar, antes de levar as costas da mão da garota até os lábios e depositar um pequeno beijo.

━ Eu mantenho minha palavra ━ prometeu Edmundo, a olhando no fundo dos olhos, e ela sorriu. ━ Eu me casaria com você.

Antes que Betty pudesse responder, Eustáquio interferiu:

━ Ah, que nojo! Agora eu quero vomitar, e nem é pelo balanço das ondas!

Trocando um olhar divertido, Betty e Edmundo cruzaram os braços.

━ Talvez seja melhor ir se deitar, então.

━ Não, não vai ser necessário. Minha mãe diz que tenho boa disposição, dada minha inteligência ━ o loiro respondeu.

Edmundo, que estava tomando um gole da água, se engasgou ao ouvir a frase, cuspindo de volta no copo ao não conseguir prender a risada. Lúcia, Ripchip e Sebastian se aproximaram dos três, e o rato logo se pronunciou:

━ Não vejo nada de bom nele!

━ Pois fiquem vocês sabendo que, assim que acharmos uma civilização, eu vou contatar o consulado e mandar prender todos vocês por rapto!

━ Pois fique sabendo que nós jamais iríamos raptar um garoto tão chato!

━ Rapto?! ━ indagou Caspian, se aproximando do grupo, com um sorriso divertido. ━ Que engraçado, pensei que tivéssemos te salvado!

━ Bem, contra minha vontade! E agora estou preso num lugar sem higiene! É como um zoológico!

━ Ah, mas todos nós somos limpinhos ━ protestou Betty, em defesa dos amigos. 

━ Como ele reclama! ━ exclamou Ripchip, admirado, e Edmundo riu pelo nariz.

━ Isso é só um aquecimento. Ele mal começou!

E então, enquanto todos se divertiam e se admiravam com as reclamações absurdas do garoto indignado, um dos tripulantes do Peregrino da Alvorada, que estava responsável por ficar no cesto da gávea do navio – um lugar alto, onde se dava para observar tudo –, gritou, alertando todos os presentes:

━ TERRA À VISTA!

Caspian correu, buscando uma luneta, e voltou para o convés, observando a direção apontada pelo homem.

━ As Ilhas Solitárias! ━ ele exclamou. ━ Que estranho, não há nenhuma bandeira narniana..

━ Mas as Ilhas Solitárias sempre pertenceram à Nárnia! Isso está muito suspeito…

━ Eu sugiro o desembarque ━ falou Edmundo. ━ O que me dizem? Caspian, você é quem manda no navio, o que faremos?

━ Vamos ancorar, e ir até a praia nos botes ━ ele anunciou, e se virou para o amigo centauro. ━ Tavos, avise aos outros.

Conforme a ordem foi dada, não demorou para que todos os selecionados estivessem em pequenos botes, remando em direção à terra firme ao mesmo tempo que o fim da tarde se aproximava.

Betty nunca havia gostado muito de botes, porque eles sempre pareciam que estavam prestes a tombar; como não nadava bem, ela não gostava das pequenas embarcações. Ainda assim, ninguém a ouviu reclamar uma única vez, ao contrário de Eustáquio, que não parecia nunca se calar.

Ajudando Lúcia a descer com segurança, quando os botes já estavam acostados, Betty ouviu Eustáquio reclamar novamente:

━ Podíamos ao menos esperar até o amanhecer.

━ Não há hora certa para uma aventura, perna bamba! ━ repreendeu Ripchip, zombando do garoto que tinha dificuldades para sair do bote.

Quando Eustaquio finalmente tomou coragem para descer, se espatifou sobre as escadas de pedra, recebendo olhares de julgamento de todos.

━ Ele é mesmo parente de vocês? ━ perguntou Caspian.

━ Felizmente, não é meu ━ retrucou Sebastian.

O porto das Ilhas Solitárias estava estranho; vazio e silencioso, como nunca havia estado antes, ao menos, que Betty soubesse. Isso despertou a desconfiança de todos os presentes, que se moviam com cautela, sem tirar as mãos de suas armas.

De repente, ouviram o barulho de um sino, que os fez pular no lugar, e todos empenharam suas espadas, lanças e bestas, preparados para a luta. Curiosamente, ainda estavam sozinhos.

━ Isso está tudo muito esquisito ━ resmungou Betty.

━ Vamos entrar ━ decidiu Caspian, apontando para a fortaleza de pedra que os levaria até o centro da cidade, onde esperava encontrar alguma movimentação. ━ Se não voltarmos até o amanhecer, mande nos procurar.

De imediato, Ripchip assentiu.

━ Certo, vossa majestade.

demorou MUITO mas finalmente veio aí!! A saudade que eu tava da minha betinha... espero que tenham gostado do capítulo, prometo que vou tentar atualizar mais rápido de agora em diante!