Capítulo 10: Perseguição incomum

FEDERICO NARRANDO

Outro dia na padaria que acabou. Estou bem cansado hoje. Fora que aquela menina me incomodou muito com aquela atitude. Eu não gosto de muito contato físico. É desconfortável. Eu diria que quando transo, não me incomodo tanto com isso. Mas o que me pertubou mesmo foi ela ter feito aquilo do nada.

Mas depois Marcelle alegrou muito meu dia. Ela deixou uma bolinha de gude cair no pátio. Ficamos procurando durante um intervalo. Ela deixa bolinhas de gude presas na mochila dela. Segundo Marcelle, ela cria a sua própria moda.

Achamos a bolinha assim que um estudante da contabilidade passou apressado e caiu com tudo no chão. Fazia tempo que eu não dava uma gargalhada tão gostosa como aquela. Foi muito engraçado o tombo dele. Ri até não poder mais.

Marcelle pisou no meu pé pra ver se eu parava. Parece que o cara bateu a boca no chão. Fomos lá, e como sou da odontologia, resolvi pedir pra ele abrir a boca, pra ver se o sangramento era na gengiva, se havia dentes quebrados ou coisa do tipo. Mas ele só tinha cortado os lábios mesmo. Então é menos mal. Ele tinha os dentes muito tortos. E o siso dele tá nascendo. Aproveitei e avisei isso pra ele.

Bem... mais um dia que se passa, né?

Ao chegarmos em casa, Pierre foi tomar um banho e Nico foi no quintal aparar a grama. Eu subi para o meu quarto para descansar um pouco. Chegando lá, dou de cara com meu irmão mexendo nas minhas coisas.

- Aconteceu alguma coisa, Hank? - Falo me aproximando dele, e sentando ao seu lado. Ele parou de mexer no meu criado mudo, e tirou da gaveta o meu álbum de fotos.

- Só queria ver as fotos suas. Tem tanto tempo que não as vejo. - Ele tinha um tom de muita calma e doçura. Dificilmente vejo ele assim. Parece um pouco atordoado.

- Não devia estar no trabalho? - Não era a hora costumeira de Hank estar aqui.

- Me deram o resto da semana de folga... aconteceu uma perseguição policial de madrugada. E dessa vez eu quase morri. - Não dou tempo de Hank continuar e torno a bombardeá-lo com perguntas sobre o que aconteceu, se ele está bem, mas ele se manteve calmo e pediu para eu parar um pouco. - Eu estou bem. Quase levei um tiro.

- Eu nunca gostei de você ser policial. É muito perigoso. Enormes riscos a serem corridos.

- Mas se alguém não correr, quem é que vai cuidar da segurança? - Ele podia passar uma imagem muito rabugenta, mas sei que ele é um irmão incrível. Sempre gostou de cuidar dos outros. Não foi nenhuma novidade ele virar policial. - Eu descobri minha vocação para proteção com você se lembra?

FLASHBACK
WOLVERHAMPTON, 2008
NARRAÇÃO DO HANK

- Seu Idiota! - Theodore barrava enquanto empurrava Fede no chão.

- Me desculpa. Eu não fiz por mal. Foi um acidente. Eu não ouvi a professora. - Fede tentava se justificar, mas o menino o empurrou de novo no chão.

Não ia ter jeito. Vou ter que ir lá me meter. Vou caminhando até a pequena confusão no parquinho da escola. Eu sou o dobro do tamanho dos meninos, então eu ia ser xingado por armaçar uma criancinha. Mas eu não ligo. Se tratando do meu irmão, eu faço tudo.

- Moleque! Vaza daqui e deixa o menino em paz.

- Mas é culpa dele que a professora proibiu a gente de trazer carrinho pra escola pelo resto da semana! - O pirralho veio falar comigo com o tom arrogante de quem é o dono da razão.

- Isso não é motivo pra você bater nele. Então deixa ele em paz. Ou vai se ver comigo. - Eu deixo bem claro, mas sem elevar o tom de voz. Não vou me alterar por um toquinho de gente desse.

- Sai daqui! Para de defender a bixinha. - Ele se vira e dá um chute em meu irmão na minha frente. Aí já é demais.

Pego o menino pela blusa e o levanto no ar.

- Vamos dar um passeio nós dois. - Eu saio dali segurando ele, e ele gritando "me larga, seu troglodita".

Chego até a caixa da areia da escolinha. Viro o menino cabeça pra baixo e o seguro pela borda da cueca. Ele começa a gritar. Deve estar com medo agora. Eu o largo no chão e ele cai de cara na areia.

Um cuecão seguido de areia na boca. Esse aí não vai mexer com o Fede tão cedo.

FIM DO FLASHBACK
NARRAÇÃO DE VOLTA AO FEDERICO

- Eu me lembro desse dia. Você levou um baita xingo. Papai foi na escola. Ele começou a berrar com você em italiano para a diretora não poder entender o que você dizia. - Rio ao me lembrar daquele dia.

- Ele falou muito palavrão. Mas chegando em casa, o cinto falou por ele. Lembro até da dor. Aquele dia foi o limite pra ele. - Hank passava pelas fotos do álbum. Na maioria das minhas fotos até os 9 anos, eu não sorria nem olhava para a câmera. Elas foram importantes quando comecei a fazer acompanhamento com Harry. Pois indicaram que eu tinha a face monótona e sem muita expressão desde novo.

No dia em que apanhei, eu tinha pegado o carrinho na minha mochila e estava brincando com as rodinhas dele durante a aula. A professora me chamou uma vez e me pediu para parar, porém não ouvi. Na segunda vez, ela já veio berrando e proibindo a gente de trazer carrinho para a aula durante o resto da semana. Theodore Macarthur não gostou nadinha. Ele era apaixonado com carrinhos.

- Hank, o que rolou nessa perseguição policial? - A curiosidade passou a me dominar.

- Olha, Fede. Eu nem sei como explicar. Nós recebemos uma denúncia de um caminhão seguindo um longo caminho com 4 motos sempre acompanhando atrás. Então fomos ver o que era...

- Foi tráfico de drogas? - Minha aposta se tratando que um dia Hank murmurrava enquanto dormia "Eu vou pegar os maloqueiros traficantes".

- É bem provável. Acontece que começamos uma perseguição de carros. Um dos motoqueiros começou a atirar. E quando fomos revidar. As armas de nenhum de nós tinha mais do que uma bala. Só uma. A gente geralmente deixa sempre carregada. Mas a denúncia pegou todo mundo de surpresa, porque disseram que o motorista do caminhão era Argentino. Na hora pensamos que era um hermano. Fomos tão rápido que ninguém conferiu a munição. - Acho que estou começando a entender as coisas.

- E os motoqueiros estavam fazendo escolta e também estavam armados. Acertei? - Um dos filhos da mãe quase deve ter acertado Hank.

- Sim. E um deles começou a atirar que nem louco pra trás. Mas na hora que ele ia acertar em cheio no carro que eu estava, com a mira bem na minha cabeça, o outro motoqueiro jogou a moto pra cima dele. O tiro foi no retrovisor. Era pra ter acertado em mim. E isso foi estranho. Bill e Henry levaram dois tiros cada. Henry está na UTI. Não sei porque o cara fez isso. Talvez quisesse evitar mais uma possível morte de policial. - Hank realmente deu sorte pelo o que ele está me falando. - E o pior de tudo, é que depois achamos o caminhão largado em um beco. Estava recheado com algodão. Foi uma pista falsa. Os motoqueiros estavam vestidos com roupas pretas dos pés às cabeças. Depois procuramos nas câmeras e não achamos nada.

- Então, os caras fugiram de vocês e não deram conta de pegar ninguém.

- Sim foi isso mesmo. Mas sabe de uma coisa? No momento, eu estou feliz porque estou aqui com você Fede. Você não tem ideia do tanto que eu amo você. - O sorriso no rosto do Hank não nega que mesmo com tudo isso, ele está feliz.

- Ah, para com isso. Eu sempre te dei muito trabalho. - Eu falo meio sem graça. Não sei reagir a elogios bem.

- Não é culpa sua o trabalho que você deu, e eu não me importo de ter defendido você naquelas brigas. Foi assim que eu descobri a minha vocação para carreira policial.

- Mas naquele dia o sinto do papai até deixou até cicatriz.

- Muitas vezes elas servem não só para lembrar que já nos machucamos, mas também que já superamos aquela dor. - É raro ver Hank agindo assim. Nem parece aquele meninão metido a macho. 

- Hank, por favor seja sincero comigo. Você me acha estranho? - Aproveitoa deixa e tiro uma dúvida.

- Por que você diz isso?

-  Só me responde. - Acho que falei de forma um pouco agressiva.

- Sim, eu te acho estranho. Mas eu também sou estranho. Todo mundo é um pouco estranho. Cada um com as suas peculiaridades. Nós já conversamos sobre isso. eu sei que o Harry também já conversou com você.

- Mas eu não consigo evitar. Sempre tem alguém me incomodando por causa de alguma atitude que eu não entendo. Eu também não consigo saber porque todo mundo cobra de mim alguma coisa, porque eles esperam que eu reproduza um comportamento igual a todo mundo. - Meu tom de voz saiu bem irritado com certeza. 

- O que você acha que pode fazer para mudar isso? Trocar o seu cérebro? Ir no neurocirurgião e pedir para que ele refaça todos os seus neurônios?

- Você e o Harry por a caso ensaiaram esse discurso? - Agora Hank começa a me estressar.

- Não. Mas se ele falou a mesma coisa, está sendo muito sensato. Olha para mim e me escuta. Você é uma excelente dançarino, vai ser um dentista maravilhoso, é um irmão fofo e gentil, é educado. Você é o viado mais elegante que eu já vi na minha vida. É melhor de cama do que eu. Tem o pau maior do que o meu. - Ele riu disso. Ele realmente tá diferente hoje. - Você não tem que se envergonhar de ser você mesmo. Um dia quando você não estiver mais morando comigo, você vai estar com marido incrível que vai te fazer muito feliz.

- E por falar em falar nisso. O Nico me convidou para sair e eu aceitei. Vamos amanhã à noite.

- E quando você vai falar para ele? Acho bom ser sincero. Se ele reagir mal, já sai fora na hora.

- Eu acredito que ele já saiba.

- Mas me diz uma coisa. Você gosta do Nico? - A pergunta dele é difícil de responder. Levo uns 8 segundos e digo:

- Eu e ele conversamos muito na padaria; ele me faz rir com suas piadas, ele é gentil comigo, mesmo todas as vezes que eu altero a minha voz sem querer, mesmo quando eu fico perdido mexendo na massa do pão ou quando eu não respondo ele de imediato... Ele não se importa que eu fico indeciso quando me perguntam o que eu vou fazer para jantar e eu fico quase um minuto parando para pensar. Eu acho que eu gosto disso nele.

- Se você gosta disso nele, então também gosto. Vai em frente. Mas se vocês forem com a roupa mais social, não fica amarrando dessa amarrando a gravata que nem você fazia quando você era criança. Não tenta espantar sua próxima foda. - Ele fala em tom de brincadeira.

- Ah, vai se foder, Hank.

- Não, não. Vai você foder ele. - Nós dois caímos na gargalhada. Que saudades de ter um momento assim com ele.

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