Senhora do Verão ୧ ⎯
Charon manteve uma careta durante todo o almoço, revoltado pela minha recusa em ter uma revanche. Como ambos filhos de governantes, o peso de nossas palavras era igual valor, em Solaris a minha ainda mais pesada.
— Príncipe Charon, vossa alteza Eclypse, peço perdão por não vos receber durante a chegada. — A voz da grã-duquesa ecoou calma acariciando meus ouvidos, mas firme e com clareza. Sua presença por si só era acolhedora, quente como um dia de verão.
— Áine — aceitei seus braços abertos, apesar de ser uma interação imprópria para a corte, tinha a mulher como uma segunda mãe.
— Que o sol a alumie — respondeu afagando minhas costas e se afastando em seguida para observar meu rosto —, parece radiante Ely.
— Quem não estaria após ganhar uma competição amigável?
— Empate quase-amigável — Charon interrompeu —, é um prazer duquesa. Assim como repassei meus sentimentos ao duque, agradeço por me receber em sua casa.
Áine, que é uma professora da academia de Solaris, e uma mulher muito perceptiva, passou os olhos entre nós com curiosidade.
— É uma honra príncipe Charon, estive trocando cartas com Nevis por alguns bons anos. Ela me disse boas coisas sobre você.
O aruano arregalou os olhos quando ouviu um nome conhecido, sorrindo em seguida animado pela menção.
— Nevis foi a minha professora, mas não sabia que ela trocava cartas com a grã-duquesa. Não me lembro de mencionar conhecer uma docente de Solaris.
— Deve ser porque não nos conhecemos. Não pessoalmente — explicou —, a muitos anos recebi uma solicitação de material de estudo. Nevis estava estudando os círculos de magia solares. Eu respondi, e os pedidos voltaram a aparecer, com eles, dúvidas. Quando percebi já estávamos trocando cartas por mais de um ano.
— Solaris e Aruna podem compartilhar conhecimento mágico? — questionei.
Os donos da mansão trocaram um olhar e sorriam — Que tal nos acomodarmos para conversar? O fazer no meio do hall não parece confortável.
Seguimos o caminho que Áine indicou, Summer, Polly e Rav se juntaram a nós. Aibek havia se oferecido para ajudar na breve investigação do tronco caído na floresta, o príncipe tagarela disse que antes de se juntar aos cavaleiros imperiais o guarda foi um caçador. E prontamente sua presença foi bem recebida.
Nos organizamos numa das muitas salas de estudos, poltronas confortáveis organizadas no centro e paredes repletas de livros. Duas grandes janelas deixavam que a luz natural iluminasse o local, o reflexo que beijava o chão também era projetado para o teto repleto de afrescos.
— Onde está o professor Samson? — perguntei para Polly.
— Disse ter uma pesquisa para dar sequência, sabe como ele é, sempre com o rosto nos livros do reino.
A última parte de sua fala, foi um código, para dizer que a nossa questão política envolvendo Marysol e Kivar já estava sendo pesquisado. Sorri e enlacei meu braço com o dela, agradecendo em voz baixa.
Depois que nos acomodamos, a grã-duquesa retomou o assunto.
— Devem se lembrar que Solaris e Aruna um dia foram um mesmo reino, os irmãos que o governavam, muito diferentes em seus ideais separaram essa grande terra em dois reinos. Irmãos entre si, mas ainda independentes. Quando essa separação aconteceu, surgiu um acordo de transação cultural entre os dois reinos.
— Mas Aruna não é um império? — Polly perguntou.
— Haviam pequenos reinos de inverno anexados a Aruna, por meio de acordos políticos passaram a integrar a mesma terra. Depois que o primeiro rei Aruano faleceu. Império se tornou o termo regente por essas aquisições. Correto, príncipe Charon?
O rapaz assentiu concordando — Os reinos que faziam fronteira eram pequenos, e com poucos recursos. A melhor chance de sobreviverem era se aliar, em troca de benefícios e casamentos.
— Pensei que disse que essas coisas eram diferentes em Aruna — olhei para as minhas mãos antes de erguer os olhos para o príncipe.
— Atualmente princesa Ely, não posso falar por uma época que não vivi.
A magia dentro de mim se revolveu, apesar de estar sorrindo seus olhos me confrontavam diretamente.
— Com os reinos afastados, as organizações de desenvolveram de maneira diferente. Casamentos arranjados são comuns aqui em Solaris, mas não tão praticado em Aruna. — interviu o grão-duque colocando a mão no ombro de sua esposa — Nem todos têm a sorte que temos.
Juno que até estão estava de braços cruzados protestou em voz alta sobre a clara demonstração de afeto dos pais. Isso rendeu algumas risadas e uma desculpa do grão-duque Veroni por suas ações de romântico incorrigível.
Charon ainda parecia curioso sobre a relação entre Nevis e a grã-duquesa Áine, portanto a maior parte da conversa que veio em seguida foi ele questionando sobre os estudos e também complementando o que sabia do seu lado da história. Mesmo sem saber do envolvimento da mulher.
Havia algo em suas perguntas que me soavam estranhas, em certo momento pareceu até mesmo que ele estava tentando tirar alguma resposta da professora.
— Não existe uma magia de constrição ou de selagem. Pelo menos não conhecida, o que existem são runas que limitam o uso da magia, ou propriedades mágicas. Como uma câmara de reuniões, já que é um local propício para discussões ávidas, nesse caso é bloqueado o uso de magia quando se entra nela.
— Parece curioso demais Charon, está tramando alguma coisa? — questionei cruzando as pernas e apoiando o cotovelo na poltrona. Durante a conversa me lembrei das linhas prateadas que vi surgindo nas costas do garoto, só que o problema é que ele estava usando magia normalmente.
Por um segundo, apenas um momento, vi sua expressão falhando. Novamente mostrando um príncipe estoico e não um herdeiro desengonçado.
— Quando estive em Balor da última vez ouvi uma conversa como essa. — Charon voltou a sorrir, sabendo que o motivo dele estar em Barlor era um segredo.
— Não é tão surpreendente — Áine interviu —, aquele país tem histórico de manipulação de magias. Grandes estudiosos tiveram suas habilidades seladas por apresentar perigo aos regentes.
Summer passou as mãos nos braços — Parece horrível, é como tirar a essência da pessoa, nascemos com ela, a magia. É como perder um braço ou perna.
— É também uma forma de moléstia, quando alguém tira algo de você sem consentimento, ou nesse caso te impede de usar para o resto da vida.
Os guardas bateram na porta, avisando que o tronco fora movido para dentro propriedade.
— Que tronco? — Áine se virou para Juno.
— Enquanto estávamos competindo, Ely encontrou um tronco caído — explicou para a mãe —, quebrado seria mais preciso. Haviam marcas de garras nele que não conseguimos identificar.
— Com magia do caos e os seguidores de Caligo se movimentando, não me surpreende ser quimeras começarem a aparecer. Recebemos relatos na academia de anomalias surgindo próximo às fronteiras — a professora disse —, pensamos ser apenas mais experimentos.
— Me perdoe pela intromissão, mas não é algo que deveria ter sido repassado para o rei?
Aibek havia retornado junto ao grupo, e assim que adentrou a sala se colocou ao lado de Charon.
— Meu pai não daria atenção — respondi em seu lugar — Valet e Cyrus seriam as pessoas ideais para cuidar do assunto.
— Foi tratado como um grupo errante, já que não encontramos mais vestígios, fazem alguns meses. O problema maior que vejo aqui é: como conseguiu entrar em nossa propriedade sendo que a proteção está ativada. — Áine questionou em voz alta.
— Os escudos estão funcionando, sem brechas ou falhas, minha senhora — um dos guardas informou.
— De qualquer forma, vamos manter a atenção, um animal grande como o que vocês dizem ser, não passaria despercebido — afirmou Theros, o grão-duque —, vamos enviar para a academia analisar e então informar vossa majestade. Se houver algo a ser informado.
Aibek se curvou levemente — Peço perdão pela minha petulância.
O almoço foi anunciado, e apesar de todos parecerem animados, havia uma verdade velada realmente assustadora. Se as defesas estavam intactas, o que quer que tenha derrubado e marcado aquela árvore, viera do céu.
N/A: Olá! Obrigada por ler até aqui!
Lembrando que estamos tentando duas atualizações por mês, então a próxima será (se tudo ocorrer como planejado) 29 de Março.
Até mais, Xx!
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