Cantos do Vento ୧ ⎯
Midwinter parecia ser uma cidade pacífica, apesar de muito movimentada por conta da fronteira com Aruna. Pela manhã, depois de um desjejum na companhia da marquesa, aceitei seu convite para conhecer a cidade. Afinal são raros os momentos de explorar novos lugares.
Porém, não imaginei que o filho, Denali estaria nessa equação.
No momento em que o herdeiro apareceu, reparei no seu esforço para se fazer apresentável. A imagem era completamente diferente daquela primeira impressão, quase podia se dizer ser alguém apresentável, isto é, se a cada momento sua boca não se abrisse para proferir falas desprezíveis.
Uma intenção é clara, ele deseja de qualquer forma entrar no meu lado bom e mais do que isso, dentro do meu vestido. Ou no caso das minhas calças.
Tanto Polly quanto Rav tinham uma expertise para galgar informações, um pouco de conversa com as pessoas da mansão e já tinha uma boa noção do que diziam sobre mim. Além da clássica, dizendo que sou amaldiçoada, também corre o rumor de que estou desesperada para casar.
Esse segundo ouvi vez ou outra enquanto ainda em Solaris, considerando que parece ser mais forte ao norte, posso eliminar a culpa de Marysol — desta vez —, e atribuir a marquesa Kirav e sua filha Shurya. A mesma dupla que apareceu na recepção de Charon desesperadas para conseguir uma aliança mais profunda com o príncipe Aruano. Imediatamente decepcionadas pelas ações inesperadas dele de me convidar para ser sua companhia.
— Disse algo engraçado princesa? — Denali perguntou.
Sua voz próxima demais me chamou a atenção, pela educação ele estava me acompanhando doando um braço como apoio.
— Desculpe, parece que me permiti divagar — tratei de corrigir, para não gerar mal entendidos. Olhei envolta e sua mãe já não estava por perto. — A marquesa Aspen, onde está?
— Subitamente minha mãe se lembrou ter um compromisso, sua memória já não é como antigamente. Perdoe pela indelicadeza, devo continuar sendo sua única companhia pelo resto do passeio.
Olhei para trás e sorri — Natural de Midwinter, certamente, espero que possa continuar guiando Polly e Rav também com a mesma gentileza da marquesa.
Denali olhou para os dois que andavam pouco atrás de nós, se esforçando para não deixar uma careta nascer. Certamente ele não os via além de meros serventes.
— Ei Den! — um grupo se aproximou vindo de uma viela — Que roupa é essa? Todo fantasiado para ir no bord-
— Não sei do que está falando — o filho da casa Aspen disse alto, nervosamente cortando a fala do outro rapaz imediatamente. Lançando para mim um olhar preocupado, ao contrário das besteiras que deviam estar passando por sua cabeça. Eu ficaria grata por ele dedicar sua atenção para esse outro tipo de atividade, ao invés de ficar no meu pé.
— Parece que seus colegas desejam conversar com você, Lorde Denali — fingi um sorriso —, vou com Polly e Rav naquela loja enquanto... Se acertam.
— Claro alteza — ele disse e saiu, arrastando as pessoas juntas.
— Finalmente esse mala saiu de perto — Polly disse para mim imediatamente me puxando na direção contrária da que disse que iria.
Rav tirou a capa extra das costas e me estendeu, assim poderia andar com um pouco menos de preocupação. Embolei os cabelos na nuca e vesti o capuz, meus dois acompanhantes também fazendo o mesmo.
— E então o que vamos fazer agora que nos livramos dele? — Polly segurou a minha mão em seguida se agarrando ao meu braço. Provavelmente aproveitando da temperatura do meu corpo para esquentar as palmas frias.
— Nos mantermos longe — afirmei com um riso e olhei para o céu. — A marquesa mostrou o bairro nobre, mas imagino ter um distrito comum certo Rav?
— Sim, passamos por ele rapidamente quando viemos — explicou —, não parece muito diferente dos subúrbios de Solaris.
É exatamente o que eu queria, em cidades de viagem é mais fácil de conseguir informações, uma vez que pessoas circulam o dia inteiro. Hospedes que se gabam para seus estaleiros, comerciantes que cantam sobre o sucesso de seus negócios, informação sobre tudo e todos. Desde que se procure no lugar certo.
No caminho até aqui, em todas as cidades e vilas que passamos fizemos esse serviço de reconhecimento. Todas as palavras de Voil se provando verdade, a quantidade de estrangeiros na terra do sol havia aumentado consideravelmente. A ponto dos moradores solares reclamarem e começarem a ver com maus olhos.
Aqueles nascidos no pequeno e infértil país de Barlor, um pouco mais. Visto que a maioria deles estava se aliando a guildas de mercenários e escoltas individuais.
Geralmente nobres e comerciantes que não possuem guarda própria contratam mercenários e ex-guardas oficiais para fazerem escolta. Balorianos são mais truculentos e colocam um pouco mais de medo em possíveis assaltantes, sento a atual preferência de quem opta pelo serviço. Essa situação parece estar começando a levantar uma revolta social.
Contudo, por tudo que o professor Samson me ensinou ao longo dos anos. Caos social não parece ser o que eles estão procurando, caso contrário não estariam levantando acampamento e se instalando próximos de cidades de fronteira.
Algumas quadras separaram o bairro de comércio comum daquele dito ser de nobres, vivo, cheio de cores e cheiros me passava uma sensação bem mais agradável e humanizada do que as calçadas vazias com pessoas fingindo falar sobre coisas que não compreendiam.
— Venha moça bonita, se me der um sorriso, faço um desconto!
— Não existem verduras com melhor qualidade em Midwinter do que as minhas!
— Venham, venham todos! O teatro está preste a começar — ouvi uma voz se sobressair na multidão.
Por algum motivo me chamou a atenção, nunca vi um desse em Solaris. Parecia ser uma praça, havia um pequeno palco com uma única tela iluminada e a voz parecia sair da sombra do contador de histórias projetado.
— As lendas, aquelas lendas. Eu, você e todos ouvimos enquanto ainda estamos no braços de nossas — conforme ele falava, imagens escuras iam se moldado.
— Contam que no início dos tempos, haviam dois irmãos cujos destinos estavam. Um deles foi abençoado pelo sol, o brilhante e ardente deus Solaris, cuja luz irradiava esperança e calor sobre a terra. O outro foi protegido pela lua, a pálida e misteriosa deusa Aruna, cujo domínio é a noite tranquila, a lua dos amantes e os sonhos profundos.
— Porém, muito antes do dia ser dia, e noite ser noite, algo muito mais sombrio e profano reinava absoluto.
As crianças gritaram quando a imagem repentinamente mudou.
— Calligo, mãe do caos, aquela que chamam de escuridão, aprisionada na noite e suas sombras por toda uma eternidade.
As pessoas que assistiam à peça, vaiaram a imagem se uma suposta mulher presa na escuridão — Pobrezinha, coitadinha! Tão mesquinha, mas não sozinha.
O narrador mudava a entonação da voz, fazendo uma virar dez diferentes. Jovem, adulta ou de um ancião.
— Seus filhos, seus seguidores, sua criação! Destinados a quebrar com glória essa terrível maldição. Eu ouvi, ouvi das montanhas, todas as sombras cantam essa canção!
Quando a lua for aprisionada e o sol completamente devorado, Calligo ó minha mãe, me mantenha ao teu lado.
Sem sol, nem dia, nem noite ou lua, o fim do mundo se aproxima, agonia pura.
Nas sombras profundas, segure a minha mão, vamos juntos, juntos vamos, findar a divisão.
No céu da eterna noite, nada se vê, nada se ouvia.
Saúdam, glória a Calligo a eterna rainha.
Um calafrio percorreu minha espinha e até mesmo Polly apertou a mão em meu braço, nervosamente olhei para os lados. Ninguém parecia muito incomodado com as palavras da cantiga, pelo contrário alguns deles pareciam complacentes a ideia de Calligo livre.
— São cantos sombrios, mas são palavras do vento! Solaris e Aruna podem impedir o final julgamento, com seus guardiões e herdeiros protegem e garantem o selamento. Digo para vós bem alto sim! Quem disse que seria fácil trazer o fim? Com sol e lua juntos, lado a lado, não existe equilíbrio para ser quebrado. Assim foi dito, assim ouvi. Um sonho distante de quem já esteve aqui.
Novamente a sombra mudou para a forma do contador de história, um fantoche — Mas não se preocupe conto uma história, verdade ou não, se gostou, me agradeça com uma moeda antes de ir embora.
As pessoas que estavam envolta aplaudiram, no fim é foi uma história curta para entreter as crianças e com um final feliz. As lendas de criação do continente são diferentes em casa região, foi a primeira vez que ouvi essa versão. Poucos dos versos da canção ainda na minha mente, não parecendo ser tão fantasiosa assim.
Tirei uma moeda e pedi para Rav colocar no pequeno cesto na frente do palco.
— O que devemos fazer agora? — Polly questionou. — Se ficarmos paradas, é capaz do chato nos encontrar.
— Sobre isso tem razão.
Assim que a fala deixou minha boca, uma explosão aconteceu no canto da praça, jogando aos céus entulhos de todos os tipos. Sem ter tempo para reagir, uma segunda explosão ocorreu bem mais perto de Polly e eu.
Ergui o braço para nos proteger, mas a quantidade de pessoas que correram foi o maior problema. Num instante fui jogada para o lado e minha dama de companhia também se perdeu na multidão, ouvi sua voz me chamar na distância. Porém, mesmo com a estatura elevada, não consegui achar nenhum dos dois.
Inevitavelmente me vi acompanhando o fluxo de pessoas, e quando consegui me separar do aglomerado estava numa área de vielas.
Meu senso de direção não era tão ruim, poderia achar facilmente meu caminho de volta, isto é, se os estrangeiros que notaram minha presença me deixassem passar.
— Que tal se divertir um pouco gracinha? — o sotaque ainda era forte, tinha a rispidez na fala já conhecida da região de Barlor.
— Temos dinheiro — um segundo disse —, mas garanto que vamos fazer você se sentir tão bem que no fim vai agradecer e pedir mais uma vez.
Não costumava sair sem pelo menos uma lâmina escondida, nunca se sabe quando alguém pode tentar roubar minha magia do sol, ou apenas tentar um assassinato. Lidar com uma dupla de idiotas não devia ser problema.
Puxei a capa para o lado e sorri — Já que vocês insistem, não vou negar uma diversão.
Eles sorriram um pro, outro e se aproximaram, nisso peguei a lâmina escondida e assim que o primeiro entrou no meu campo de ataque, avancei. Um corte no peito e em seguida um chute na junta do joelho, fazendo soar os ossos quebrado e o grito de agonia.
— Oh desculpe, acho que nossas definições de diversão são um pouco diferentes.
Vendo o colega caído, o segundo se posicionou para me dar um soco, desviei abaixando e cravando a lâmina em sua perna. O homem também urrou de dor dando alguns passos para trás, nenhum deles era um mercenário, apenas grandes babacas. Tive espaço o suficiente para levantar e deferir um chute em sua lateral. Forte o suficiente para o fazer bater contra a parede e cair desacordado no chão.
Foi então que um vento frio soprou nas minhas costas, havia alguém ali. Apertei os dedos na lâmina, a presença era diferente. Ter se aproximado sem eu perceber já era um indicativo de suas habilidades.
Quando me virei, no capuz escuro havia um par de olhos azuis e alguns fios de cabelos prateados escorriam para fora dele. Ambas suas mãos se ergueram a fim de revelar sua identidade.
Aquele que se esgueirou atrás de mim, era um aruano conhecido.
— Que o sol vos alumie, Princesa Eclypse.
Obrigada por ler até aqui!
Próxima atualização 30 de Agosto!
Amo vocês mais que ontem, menos que amanhã.
Até mais, Xx!
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