II | O jantar


O FANTASMA ME ACOMODOU em um quarto com as paredes quase desmoronando. Há uma pequena cama, toda vez que sento escuto as molas rangendo em protesto.

Para minha surpresa, os lençóis brancos não pareciam encardidos e possuem um aroma floral.

Felizmente, tem um banheiro dentro do quarto, possui uma banheira de madeira e um balde do mesmo material que pesa uma tonelada. A água está límpida e fresca.

Com muito esforço consigo erguê-lo e derramar na banheira. Encheu apenas a altura de cinco dedos, mas isso teria que ser o suficiente para me limpar, ou pelo menos tirar a camada de suor da pele.

Quando estou me ensaboando com uma bucha de palha vejo uma aranha enorme há alguns metros a frente. Solto um grito.

Segundos depois a porta é aberta em um estrondo. Solto mais um gripo e tento esconder meus seios com o antebraço.

O fantasma havia invadido o banheiro, ele olha ao redor alarmado, como se estivesse prestes a atacar alguém.

— Ai meu Deus! — Exclamo.

Enfio meu rosto em chamas entre as pernas. Minha voz só havia atraído a atenção do fantasma para minha figura encolhida.

Ele engole em seco.

— Ah... O que aconteceu?

— Uma aranha. — Indico com a cabeça para parede atrás da porta. — Vire-se, preciso me vestir.

Pego uma enorme toalha pendurava em um gancho e me enrolo nela.

A aranha não havia se movido do lugar, apesar de todo barulho. O fantasma aproxima a mão na parede e lentamente pega o bicho sobe pela sua mão.

— Essa é a Anne. Ela gosta de ficar nesse banheiro, eu havia me esquecido disso. — Ele explica com um sorriso travesso.

Bastardo.

— Por que não atravessou a parede para entrar? — Pergunto.

Ele encolhe os ombros.

— Sou o único que não pode atravessar a matéria. Como líder há uma grande quantidade de energia concentrada no meu corpo, então sou basicamente um vivo com algumas habilidades peculiares.

— Habilidades?

— Sim... Pode te mostrar uma se quiser.

Noto que sua atenção havia voltado para o meu corpo, ele olha apenas por alguns segundos e balança a cabeça.

— Você é uma tentação. — Ele diz, a aranha sobe até seu ombro. — Te vejo no jantar.

Então, ele simplesmente desaparece em uma nuvem esbranquiçada.

Encontro um vestido na cama, ele possui as mesmas cores listradas da roupa do fantasma.

A roupa possui vários tecidos, felizmente eles estavam inumerados de acordo com a ordem de vestimenta. Primeiro vesti a camisa branca com o braço longo e largo, depois, o vestido listrado que cobria meus pés e por fim um espartilho escuro.

Desço cuidadosamente as escadas frágeis. Para minha surpresa, ao adentrar a sala encontro a mesa com uma refeição suculenta e escaldante. Minha barriga ronca com a visão.

O lugar está iluminado por velas espalhadas pelas paredes e no meio da mesa.

O fantasma aparece em um estralar de dedos, afastando uma cadeira simples.

— Lady, sente-se. O banquete está pronto.

Hesito.

— Permita me disser que está deslumbrante essa noite. — Ele continua, se sentando próximo de mim.

Sinto o calor subir pelo meu pescoço e se esparramar pelas bochechas.

O meu cativeiro está usando um longo terno, as listras azuis aparecem por abaixo do tecido.

O cabelo está um amaranhado de cachos bagunçados, uma mecha roça em sua sobrancelha escura.

— Obrigada, você também está agradável.

Ele sorri abertamente.

— Não vai me perguntar de onde eu arranjei essas comidas? — Ele me instiga.

Enfio rapidamente um pedaço grande de carne no prato, além de uma coxa de frango.

— Não sei se quero saber.

Não me importo com a etiqueta quando devoro a comida, mal havia comida café da manhã devido a minha ansiedade intensa para ir nas ruínas.

Meus lábios se curvam para baixo quando me recordo do erro que cometi ao não avisar a minha monitora que havia adicionado mais um lugar a minha lista de exploração.

A essa hora ela já teria acionado a polícia, mas quem me encontraria em um lugar completamente afastado da cidade e desconhecido até mesmo pelos moradores?

Se não fosse um desejo súbito que me atingiu quando estava em outro castelo, quando senti que precisava percorrer a estrada de cascalho que cortava a floresta eu nunca teria descoberto o lugar.

— Um euro por seus pensamentos, gatinho.

Pisco.

Espeto o brócolis com força e o enfio na boca. Procurava desviar minha mente das lembranças que enredava minha mente, então digo a primeira coisa que consigo pensar:

— Não sabia que fantasmas podiam comer.

Ele ri, dando outro bole no vinho.

— Archie, meu nome é Archie, não fantasma. E sim, posso comer, mas é a mesma coisa de provar água. Não sinto nenhum sabor.

— Eu sou Amélia.

Encaro meu prato, sentindo um subido constrangimento. Aquele nome havia feito meu coração bater mais rápido, por isso não gostei dele.

Seus lábios que estão dar cor de sangue por conta do vinho se erguem.

Não consigo tirar os olhos do seu rosto iluminado pelas chamas douradas da vela. Se eu pudesse, ficaria olhando para aquela face até o fim dos meus dias.

— Amélia. — Ele me chama. — Eu sinto... que já nos encontramos antes. Quando eu ainda estava vivo, talvez.

Minha boca fica seca.

Impossível. Penso.

— Quando você morreu?

Ele fica em silêncio, imersos em pensamentos.

— Há dois mil anos.

O talher escorrega da minha mão.

— Eu... É impossível. Você sabe.

— Há outras vidas, as pessoas renascem. — Ele responde.

Centenas de pensamentos perfuram minha mente. Todas as possibilidades circulam meus pensamentos.

— Como?

Ele traça a borda dourada da taça de vinho com o dedo.

— Eu não sei... Há muitos mistérios nesse mundo. Estou preso nessa casa há muito tempo. Meu espírito está ligado a esse lugar, pois foi onde eu morri... Onde eu fui assassinado.

Um suspiro escapa dos meus lábios.

— Quem?

— Eu nunca vi seu rosto, mas me lembro de suas mãos me empurrando escada a baixo. Me lembro do gosto do meu sangue e da dor. Depois veio o nada.

Meu coração se encolhe.

Resisto a vontade de o consolar.

Ele me aprisionou nessa casa. Me lembro.

O restante da refeição foi silenciosa, com exceção do som de risadas que a criança fantasma soltou, tive vislumbres do seu vestido enquanto ela corria pela casa, atravessando as paredes.

Depois de um tempo as risadas cessam e a sala volta a ficar silenciosa, sinto os olhos de Archie em mim o tempo todo.

Depois de um tempo as risadas cessam a e a sala volta a ficar silenciosa, sinto os olhos do fantasma em mim o tempo todo.

Quando ergo a cabeça do prato encontro a profundidade do seu olhar. Lentamente, sem eu ao menos notar, ele se aproxima de mim.

Sinto sua respiração no meu rosto. Sinto seus lábios nos meus lábios.

— Archie. — Chamo o seu nome pela primeira vez.

Seus olhos cintilam de desejo.

Antes que nossos lábios possam se encontrar novamente o fantasma tímido aparece ao nosso lado. Sinto o ar frio roçando minha pele.

Meu rosto fica em chamas.

— Sinto muito... Eu... — Ele gagueja e depois desaparece.

Ficamos alguns segundos nos encarando, eu vermelha, ele frustrado.

— Ah... Eu vou dormir. — Falo, saindo apressadamente. 


Contagem: 1245 palavras

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