63- pov: Liz Carter.
As gotas de chuva lá fora me mantinham acordada a noite toda. Talvez tenha sido a chuva, talvez todo drama vivido nos últimos dias. O som dos pingos na enorme janela do quarto começaram a me irritar quando o sincronizou com tic-tac do maldito relógio do lado da minha cama. O objeto marcava 03:45 da manhã e eu me encontrava olhando pro teto escuro, com a mente agitada.
O suspiro pesado de Oliver, que dormia profundamente ao meu lado, de certo modo me trazia um pouco de paz.
Será que eu merecia isso?
Merecia um pai que mentiu pra mim?
Merecia ver a minha mãe ir embora pela segunda vez?
O que eu fiz de errado na minha vida pra merecer tudo aquilo?
Já não bastam os traumas do último ano que ainda acercam meus pensamentos.
Está pesando nas minhas costas todas essas dores que eu carrego silenciosamente dentro do meu peito.
Quando foi que a minha vida se tornou uma grande bola de neve entrelaçada com puro drama?
Mil coisas passavam pela minha mente, enquanto a chuva engrossava lá fora e aqui dentro ficava mais frio, e mais doloroso.
Três dias sem dormir, talvez em algum momento eu começasse a delirar, ou quem sabe, surtar de vez.
Levantei enrolada no meu cobertor, ouvindo meu estômago roncar, quase implorando por um mínimo de alimento.
Entrei na cozinha, caminhei em direção ao sanduíche que o loiro havia feito mais cedo e acabei o devorando em menos de cinco minutos. Coloquei um pouco de água quente na xícara e por azar, só encontrei um pacotinho de chá. Minha barriga não merece receber uma bebida tão ruim depois de passar dias sem comer.
Deixei a xícara na pia e caminhei até a minha varanda, que por um milagre não estava inundada.
Me deitei no sofá, onde mais cedo desabafei os meus sentimentos com o meu melhor amigo.
Mas eu precisava sentir os meus sentimentos, sozinha.
Observei o céu cheio de nuvens escuras onde a chuva ficava ainda mais forte.
Encolhi minhas pernas, ainda sentada no sofázinho, sem me importar com o vento gelado que soprava meu cabelo e quase congelava minha boca.
Minha vontade ainda era de gritar. Gritar bem alto.
Eu não era mais a Liz Carter, de 27 anos, uma Sargento da Polícia de Nova York, que se machucou em um relacionamento abusivo, que cresceu e amadureceu como mulher, como filha, como amiga e como namorada.
Nesse momento, eu era a frágil Liz, que não entendia de muita coisa, mas entendia que sua mãe não iria mais voltar. Eu era a pequena Li, que passou noites em claro perguntando quando a mamãe Kate iria voltar pra me fazer dormir. Eu era a doce Lili, que sofreu sozinha por anos, que mesmo rodeada de amigos incríveis e uma família perfeita, tinha que lidar com as próprias dores. Porque não queria incomodar, porque não queria atrapalhar a vida de ninguém.
As minhas lágrimas já desciam pela minha bochecha igual escorriam no vidro do para-peito da minha sacada.
Eu apanhei, eu fui machucada na vida, e no trabalho, mas aquela dor era sem explicação. Uma dor que nunca foi sentida por mim, e acredito que por mais ninguém.
Deixei as lágrimas correrem em seu tempo. Solucei, com o peito ardendo, querendo um pouco de paz.
Pode ser injusto eu reclamar tendo uma casa enorme, um namorado dos sonhos e amigos incríveis, mas do que tudo isso adianta se as feridas do meu coração ainda não estavam curadas? Se esse sentimento de vazio ainda persiste em me incomodar. Se essa insegurança não me faz ver a porra da vida maravilhosa que eu tenho ao meu redor.
Assim que o sol nasceu, mesmo com o céu nublado, entrei devagar no quarto, caminhando com pisadas leves até o closet e peguei meu conjunto de corrida, calçando o tênis logo em seguida. Sai de fininho mais uma vez, só colocando o meu relógio.
Sorri fraco pra um vizinho — que nunca tinha visto antes — que entrou no elevador quando a caixa metálica parou no terceiro andar.
Sai do prédio, dando início a minha corrida.
As ruas ficavam cada hora mais movimentadas e cheias de pessoas indo pro trabalho, ou voltando dele, voltando de festas, indo pra escola.
Continuei a correr, tentando limpar a minha mente, os passos ficavam cada vez mais pesados, e eu já sentia o suor na testa.
Em alguns momentos percebi os olhares de uma ou duas pessoas, talvez pelo fato deles todos estarem bem agasalhados e eu fosse uma maluca que estava de legging e cropped de treino.
Corri até não saber mais onde estava. Meu relógio marcava 25 km de corrida sem pausa.
Parei no meio da passarela de algum parque, me abaixei colocando as mãos no joelho e respirei fundo, o que não deu muito certo para me calamar não que meu coração estava batendo tão forte que quase saiu pela minha boca.
Não tinha a mínima chance de voltar correndo de novo, principalmente por não fazer ideia onde eu estava.
Agradeci mentalmente quando avistei um posto policial e me apresentei, por sorte, um dos policiais era um colega antigo, que me deixou em casa.
— Obrigada, eu fico te devendo essa. — Suspirei, vendo assim que ele parou na frente do meu prédio.
— Se cuide, Carter! — Ele sorriu e eu subi, sentindo meu corpo queimar.
Abri a porta, tendo um grande susto quando dei de cara com Oliver também prestes a abrir.
— Onde você estava? — O loiro me fitou.
— Eu fui correr. — Cocei a testa, entrando em casa.
— Está fazendo uns 10 graus lá fora. — Ele arqueou as sobrancelhas.
— Eu não senti frio nenhum. — Dei de ombros.
— Pelo amor de Deus, Liz. — Bufou, me abraçando de lado. — Você dormiu?
— Não.
— Você comeu?
— Sim, o sanduíche que você deixou
— Então você saiu pra correr sem dormir e com apenas um sanduíche no estômago?
— Odeio quando me trata com uma criança e você sabe disso. — Vi o loiro me guiar pro quarto.
— Você precisa parar de ser tão durona e negar que precisa de ajuda, Li. — Ele falou me colocando sentada no sofázinho ao pé da cama. — Você não fala com ninguém, e simplesmente engole suas dores sozinha.
— Eu sempre fui assim. Por que iria mudar agora?
— Por que você é uma mulher adulta que pode, uma vez na vida, mostrar sua vulnerabilidade.
— Eu sou uma mulher adulta e consigo lidar com minhas dores sozinhas. E por que estamos tendo essa conversa?
— Por que você saiu pra correr, em pelo inverno ao invés de descansar. Você não dorme a quantos dias? Três?
— Me desculpa, tá? A última coisa que eu quero no mundo é ficar brigada com você também.
— Então me deixa cuidar de você.
— Tudo bem. — Assenti e o loiro se abaixou ficando na altura do meu joelho.
Assim que ele tirou meus tênis, senti uma ardência chata e suspirei ao ver meus calcares com sangue. Claro que eu não coloquei meias antes de sair.
— Meu Deus, Lili. Isso deve tá doendo muito.
— Pra falar a verdade, eu não tô sentindo nada. Nada, nem frio, nem dor, mais nada. Estou imune.
— Não precisa ser tão durona na minha frente, eu te conheço faz vinte anos.
— É sério.
— Aí meu Deus, eu não conhecia esse lado seu. — Ele disse sentando do meu lado e mais uma vez me abraçando.
— Eu não estou doente, tá bom? Eu vou me cuidar, eu prometo.
— Vou te dar um banho e você vai comer um café tão reforçado que nunca vai esquecer.
— Vai me dar banho é? — Sorri de lado, mordendo meu lábio.
— Engraçadinha. Vem.
Dei um gritinho de supresa quando Oli me pegou no colo e me levou pro banheiro. Realmente me dando um banho em seguida.
Assim que saímos do banheiro, me vesti e o loiro fez curativos no meus calos.
Realmente odeio que me tratem como criança, ou como se estivesse doente, mas todo aquele cuidado do Oliver me animou, me fez sorrir de verdade em dias e trouxe paz pro meu coração machucado.
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