CAPÍTULO - 16


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Flávio continuava a sua rotina diária, levantava cedo e fazia algumas flexões ao lado da cama, sempre que começava a se exercitar dessa forma ele lembrava das palavras de Sam: "Acho bonito braços grossos", sorria e voltava a se exercitar, se concentrava novamente repetindo séries e suando por Samuel. Eu acabava por sorrir ao ler seus pensamentos, ele mandava toda a intensidade e toda a sua força pra o meu neto.

Naquele dia eu o acompanhei ao café onde Héctor trabalhava, quando ele entrou sentiu imediatamente um mal estar conhecido, teria de conviver com o rapaz sem trocar uma palavra até o final do expediente e ainda aguentar aqueles olhares magoados. Héctor servia as mesas de forma mecânica e tentava com todas as suas forças não olhar para Flávio. Era possível ver o seu esforço, sua dor o acompanhava, Flávio segurou o violão e tocou os primeiros acordes de uma Bossa Nova, concentrado ele não viu quando Héctor foi para os fundos do café com os olhos marejados, perdeu-se mais uma vez na letra da música que falava de um amor doído e enorme.

"O que diabos eu estou fazendo aqui?", pensou durante a execução da segunda parte da música, a imagem de Samuel se colou aos seus olhos e uma tristeza lhe invadiu de imediato, quase chorou e eu, se ainda fosse possível, teria chorado também. "Preciso voltar ao Brasil!" não foi um pensamento qualquer, foi uma decisão tomada no calor do momento, a saudade era enorme e a vontade de rever Samuel atingiu as raias do absurdo, acredito que ele o viu em Héctor, sofrendo por sua causa e foi assim que quando terminou de tocar suas músicas, recebeu o pagamento diário e andou pela cidade prestando atenção pelos prédios, os museus, as pessoas e de repente aquela paisagem parou de fazer qualquer sentido.

- Boa tarde meu filho! – Disse Elisa assim que o viu entrar, ela usava uma máscara verde no rosto, uma touca em seu cabelo e estava esquentando água para fazer um chá. As empregadas da casa já haviam sido liberadas e por isso mesmo estava tudo muito quieto naquele horário.

- Mãe, eu preciso falar com a senhora! – Ele falou tirando o violão das costas e o colocando ao lado da mesa de jantar, ela sorriu melíflua como sempre e sentou-se a mesa com uma caneca fumegante de chá.

- Pode falar querido. – Falou e deu o primeiro gole, queimou a língua, mas por estranho que pareça ela não se queixou, deu outro gole.

- A senhora conseguiu vender o apartamento no Brasil? – Ele sentou frente a ela.

- Não, na verdade pensei em deixar que você decidisse o que fazer com aquele apartamento, afinal ele é seu! – Ela checou o esmalte das unhas enquanto falava.

- Estou pensando em voltar a morar lá! – Ele falou com vergonha e com medo de que ela tomasse aquilo como uma ofensa.

- Bom, se é o que você quer... – Outro gole.

- Sim, tenho pensado em tentar morar sozinho, mas quero que seja lá. – Ele queria ter ficado ofendido pelo seu desinteresse em sua decisão, porém desde que começou a conviver com a mãe, Flávio notou que a mulher não era mais a mesma, mas como ela parecia feliz...

- Tudo bem querido, não se preocupe que lhe ajudarei com o dinheiro. – Outro gole, mais uma olhada nas unhas.

- Vou trabalhar quando chegar por lá, mãe. – Ele se irritou um pouco por causa daquele desinteresse todo.

- Não, você vai estudar! – Foi a primeira vez que ela de fato o olhou durante aquela conversa.

- Mas mãe... – Ele só contestou para testar e ver até onde aquele ataque de mãe iria.

- Nada de "mas mãe", vai estudar sim! Deixe que com o dinheiro eu me preocupo. Filho, eu te devo muito e sei que o dinheiro não vai pagar toda a falta que eu te fiz, mas me deixa te ajudar da maneira que eu posso, tudo bem? – Ela segurou em sua mão e ele fez algo que quis por muito tempo desde que chegou naquele apartamento, mas por medo de despenteá-la jamais tentou. Um abraço de perdão, um abraço de saudade e finalmente um abraço de mãe e filho. Ela não chorou e nem ele, mas eu vi algo ao redor dela se acender, foi como se novamente Elisa ganhasse vida.

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Afonso tinha um sono pesado, dormia solto naquela manhã e eu fiquei com vergonha de acordá-lo, levantei e fui ao banheiro ainda nu como havia dormido toda a noite, examinei meu rosto, escovei os dentes e depois tomei um bom banho. A noite passada foi extremamente prazerosa, mesmo assim eu sentia uma inadequação como se o que fizemos fosse algo extremamente errado. Estava me enxugando no box, a fumaça tomava conta do lugar e ouvi a porta do banheiro se abrir.

- Bom dia Samuelzinho! – Ele falou de maneira cantada.

- Bom dia Afonso! – Falei sorrindo.

- Dormiu bem? – Falou em tom jocoso.

- Dormi! – Saí do box e ele urinava ali em minha frente, fiquei um pouco envergonhado e passei por ele sorrindo de forma contida. Afonso agia como se já fôssemos íntimos, muito íntimos, aliás.

No quarto comecei a me vestir e o ouvi embaixo do chuveiro, começou a cantar de forma desafinada: "Inda vou te levaaaaaaaar, proutro lugaaaaar... Além do sol, do maaaar..." Sorri, ele é um homem divertido, vesti uma cueca boxer e uma camiseta e deitei na cama, do lado em que ele dormiu, liguei a TV e fiquei zapeando pelos canais, não passava nada de interessante, mas deixei num canal de desenhos animados.

- Vamos tomar café da manhã? – Ele falou só de toalha, passando a mão no estômago, os pelos brilhavam por estarem molhados e colados ao seu corpo.

- Vamos, estava te esperando. – Ele pulou em cima de mim, sorrindo e me olhando no fundo dos olhos.

- Estou gostando de ti Samuelzinho... – Ele me beijou, ficamos nos amassos deitados na cama.

- Vamos, estou com fome! – Falei quando ele me soltou, a menção aos seus sentimentos me fez gelar, algo dentro de mim apitou avisando que eu não estava sendo justo com ele.

- Romântico você! – Falou com ironia, levantou-se e começou a se vestir.

- Desculpa, Afonso – Falei ainda sentado na cama, ele estava de costas para mim e assim permaneceu. Descemos para o café num clima super pesado, ele estava magoado e com razão, calados nós comíamos sem nos olhar.

- Tem outro na jogada? – Ele perguntou de supetão, eu estanquei. – Tem! – Ele não me esperou responder.

- Afonso, não é assim... – Tentei me explicar.

- Então como é? – Ele pôs os dois cotovelos em cima da mesa e assumiu uma feição questionadora, não tive outra saída senão lhe contar tudo nos mínimos detalhes. Ele me ouvia calado, seu rosto era uma máscara indefinida e eu tive medo de perdê-lo.

- Fala alguma coisa Afonso... – Pedi depois de alguns minutos de silêncio em que o ar parecia ter parado ao nosso redor.

- Falar o que? – Ele se encostou ao espaldar da cadeira.

- Afonso, não é que eu não goste de você, mas as coisas têm que ir mais devagar por enquanto, entende? – Falei como se desculpasse.

- Tudo bem! – Ele deu de ombros e eu soube que nada estava bem. Voltamos para o quarto e ele deitou na cama, naquela manhã nós tínhamos combinado de sair para conhecer melhor a cidade, mas o clima estava pesado, saímos do quarto apenas na hora do almoço, quando voltamos eu tentei falar.

- Vamos passar o fim de semana assim? – Ele já havia deitado na cama.

- Assim como? – Ele se fez de desentendido e eu peguei as minhas malas.

- Deixa de drama Samuel, tu que me deu o fora! – Ele levantou e puxou a mala da minha mão.

- Eu não te dei fora nenhum Afonso, poxa eu pensei que podia ser sincero com você, que você seria maduro frente a situação, mas pelo que vejo me enganei! – Puxei de volta a mala.

- Cara tu queria que eu reagisse como? Eu digo que estou gostando de você e tu me diz que ama outro...

- Eu não disse que o amava, só falei que...

- Que não o esqueceu e que o que sente por ele ainda é muito forte. Novidade meu amigo, isso é amor! – Ele falou quase gritando, senti-me mal por causar aquele desconforto, mas eu não poderia mentir para ele, não era justo.

- E por isso tu vai desistir? Te disse que ele tá longe, em outro país. Você está aqui comigo – Me aproximei dele e o abracei – Melhora essa cara Afonso, vamos ficar juntos... Ontem foi maravilhoso! – Falei lhe olhando e o beijei, depois beijei o seu pescoço e ele se arrepiou.

- Fico me perguntando se tu sempre vai conseguir me dobrar assim! – Ele colou os lábios aos meus e me suspendeu, ele me jogou na cama e ficou me provocando até que eu não aguentei mais e pedi, quase implorei por ele. Peça e será atendido! Passamos o fim de semana na cama, no domingo a noite estávamos de volta a nossa cidade, ele me deixou em casa e depois de dar uns amassos no carro eu entrei. Vó Leninha estava na sala de jantar conversando com uma das mulheres que trabalhava na cooperativa, sentei com elas e contei as novidades, depois deitei e dormi. Foi estranho o sonho que eu tive com Flávio naquela noite, ele estava diferente como se tivesse malhado, ele vinha envolto em uma luz azul e me dizia:

- Estou voltando pra você Sam! – Falava tocando o meu rosto.

- Quando? – Perguntei lhe encarando.

- Logo meu amor! – Ele me abraçou e por incrível que pareça o seu cheiro me tomou por completo e eu só sabia lhe beijar no sonho.

- Eu morro de saudade de você! – Falei quase chorando, abraçado a ele.

- Não mais que eu! – Ele me beijou novamente. O sonho foi tão forte que acordei imediatamente depois dessa conversa, olhei ao redor no quarto, confuso por sentir os lábios dele ainda nos meus. O quarto estava tomado pelo seu cheiro, me peguei pensando nas possibilidades que rodeavam o seu possível retorno, afinal se ele voltasse e me quisesse como eu o queria, será que ainda teríamos algum futuro juntos? Ou toda aquela história poderia ser esquecida? Será que apenas fiquei fixado a ele por ter sido o primeiro homem que me olhou com desejo e que quis estar em minha companhia de fato.

Muitas perguntas que somente se eu ficasse frente a ele é que as respostas poderiam ser dadas.

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