CAPÍTULO 25-OLIVEIRA PENSA EM PEDIR DEMISSÃO


"E estando o homem apaixonado...julga-se no direito de fazer de tudo para conquistar o seu amor!"


Oliveira achou que iria  infartar!

O estrategista já tinha mais de vinte anos naquela carreira, depois de trabalhar dez anos como detetive. 

Oliveira nunca havia trabalhado para um homem como Afonso, que exigia que se mudasse os rumos do que ele havia planejado em cima da hora.

O estrategista tinha colocado todas as peças na mesa e montado todo o tabuleiro do jogo, mas, apesar de se achar um homem inteligente,  descobrira tarde demais que tinha deduzido errado o que o seu contratante queria.

Afonso não queria apenas separar os dois gays, Oliveira finalmente havia entendido!

Ele queria separar os dois gays, pegar um dos homossexuais pra ele, sair como herói, deixar o gay que sobrava já num outro relacionamento com um prostituto e ainda exigia que iria querer uma prova de amor do homem que ele escolhera pra chamar de seu!

Para Oliveira aquilo era demais e ele confirmou  por que sempre odiara os homossexuais! Sempre odiara homens que se relacionavam com homens e depois se achavam no direito de formar uma pseudo-família! 

_Dois homens não geram filhos...dois homens não constituem família...dois homens apenas fornicam, apenas pecam contra as leis de Deus e é por isso que se eu sonhar que um dos meus filhos é esta aberração, eu mato de pancada, ouviram bem?_dissera o  pai de Oliveira quando ele e os dois irmãos ainda eram adolescentes._Aqui em casa não vai ter estas frescuras...esta sem vergonhice!

Oliveira concordava plenamente com o pai! Aquilo não era certo...não era de Deus...era pecado!

O pai de Oliveira não precisava ter sido tão agressivo, pois os filhos o seguiam e também gostavam de mulheres, também gostavam de xoxotas, seios fartos e criancinhas os chamando de papai.

Oliveira ficou imaginando o que o pai dele diria se soubesse que agora ele estava não apenas trabalhando para um veado, mas que o pacote todo envolvia quatro veados!

Ele queria poder mandar Afonso para o inferno, mas se precipitara ao investir prematuramente o dinheiro que ele ainda nem tinha ganhado ao calcular quanto tempo ele levaria pra concluir aquele serviço...Tarde demais,  ele percebeu  que era simplesmente impossível aquilo dar certo! Especialmente porque agora tinha náuseas só de pensar a que tipo de gente ele estava servindo!

Queria gritar com Afonso que não trabalhava para gays...e que odiava ter se metido naquele ninho de gatos onde ele tinha que administrar as vidas de quatro gays agora!

Odiou-se por depender do dinheiro daquele homem e odiou-se por não ter descoberto antes os reais planos de Afonso! Talvez estivesse ficando velho e estivesse perdendo o faro de investigador.

A cabeça do estrategista agora dava nós...Afonso movera céus e terras para conseguir um rim para a mãe de um gay que namorava outro gay de quem Afonso queria separar e juntar com um terceiro gay...quarto, se incluísse também o gay Afonso no pacote...sendo esse terceiro gay um prostituto! Aquilo tudo era uma zona, queria gritar o estrategista!

A cabeça de Oliveira estava zonza, pois ele olhava para Afonso com aquela postura de garanhão pegador e não o enxergava comendo o rabo de outro homem!

Onde estavam todos aqueles gays caricatos, estereotipados, aquelas drags todas que ele sempre vira e pelas quais ele sentira tanto nojo? Percebeu que o gay moderno se parecia com homem, se vestia como homem, falava como homem, agia como homem...Afonso realmente o enganara!

O tal William também  não parecia gay...nem o tal João Pedro...nem Afonso...até mesmo o tal prostituto não tinha cara de gay!

_O que faço com os planos iniciais, senhor Afonso?_perguntou o estrategista humildemente contendo o desejo de mandar o chefe para o quinto dos infernos.

_Use pra limpar o seu traseiro, porque isso tudo é um monte de papéis que não servem pra nada!_gritou Afonso jogando a papelada toda de cima da mesa no chão.

Oliveira ficou assustado com aquela atitude grosseira  imaginando se aquele homem estava louco!

Não seria mais fácil Afonso mandar  matar o rival, dopar o seu pretendente e estuprá-lo na cama e mandar o prostituto pra cadeia por estar se envolvendo no meio de algo que não lhe dizia respeito?

O estrategista, alto, gordo, cabelos grisalhos, barba e bigodes também grisalhos, quase setenta anos e se sentindo humilhado, viu todas as suas anotações (ele não conseguia visualizar tudo numa tela de celular ou de computador, daí anotar tudo ainda em papel) voarem pelos ares.

Ele perdera noites de sono...ele perdera todo o seu tempo...ele se esforçara pra fazer tudo o que o outro havia exigido e quando tudo era pra estar nos eixos...Afonso descarrilhava toda a composição do trem!

Uma empregada entrou na sala trazendo um celular  com o olhar agoniado:

_Doutor Afonso, a sua mãe novamente. Disse que se o senhor  não falar com ela agora...

Afonso já falara com a mãe mais cedo...já sabia do que se tratava...por isso arrancou o celular da mão da empregada e decidiu finalmente responder.

_Mamãe, vocês vivem dizendo que eu não me interesso por nada  e agora que estou no meio de um projeto, que deve ser o maior projeto da minha vida, vocês não me deixam em paz?_explodiu impaciente.

Ouviu a mãe anunciando que o filho tinha um projeto importante em andamento...e o pai comemorou como se Afonso  ainda fosse um adolescente!

_Filho, eu e o seu pai estamos realmente felizes por você finalmente ter se interessado por alguma coisa!_comemorou a mãe.

Ele não perdeu tempo imaginando o que o pai...a mãe...e também o avô diriam se soubessem que o seu projeto de vida agora era conquistar  um homem!

_Você está trabalhando  onde?_era a voz do pai todo animado._Liguei pra empresa e me disseram que você não apareceu lá nem um único dia, desde que viajamos.

Afonso coçou as têmporas sabendo que mesmo que ele adiasse revelar o que fazia naquele momento, teria problemas assim que os pais descobrissem tudo.

_Deve estar fabricando o meu bisneto!_riu o avô com sua voz rouca ao fundo.

Afonso lembrou-se que os pais  haviam levado o avô junto com eles.

_É isso, filho? Você está namorando...é isso?_a mãe perguntou animada._Ela é de qual família?

Afonso novamente sentiu aquela pressão toda de ser obrigado a se envolver com alguém de seu meio social...João Pedro não era do seu meio social...nem mesmo a mulher  que a sua família aprovaria e muito menos João Pedro  geraria um herdeiro para aquela família.

_Se for isso será bem-feito pra sua mãe que arranjou uma tal de Mary Anne pra namorar com você!_o pai falou ao fundo._Confesso que a garota é uma princesa e tem as ancas largas e os peitões de boa parideira.

O avô de Afonso gargalhou ao fundo, fazendo coro com o pai de Afonso e a mãe começou a protestar:

_Isso, Élio...isso mesmo! Já vai fazendo o nosso filho acreditar que eu estou contratando uma barriga de aluguel pra gerar o nosso neto!

Afonso jogou o telefone dentro do aquário que ficava numa das paredes da sala, fazendo a empregada tampar a boca para sufocar um grito.

Ele sabia que aquilo não iria adiantar, pois eles continuariam ligando, mas pelo menos se livrara daquele trio que já lhe provocava asco por imaginar que eles ainda o queriam amarrar a uma mulher para o resto da vida!

O estrategista também ficou chocado ao ver o homem alterado dando ordens para a pobre da empregada dizer aos pais e ao avô que a ligação caíra, que ele saíra e fora para debaixo da terra onde não pegava sinal de celular, ou que ela dissesse aos pais que ele morrera, mas que não viesse mais interromper aquela reunião com telefonemas dos pais!

A empregada  pediu licença e  saiu acreditando que se ficasse ali por mais um segundo seria estrangulada pelo patrão!

_Minha mãe foi  aos Estados Unidos pra  buscar uma mulher pra mim!_ele desabafou olhando para o estrategista._Dá pra acreditar nisso?

Oliveira queria dizer que estava do lado dos pais, apesar de ter certeza de que as mulheres mais lindas e sexys do mundo estavam ali mesmo, no Brasil. No minuto seguinte, percebeu a extensão daquela notícia: Afonso era gay e os pais esperavam que ele engravidasse uma mulher!

_Se me permite, senhor, talvez fosse prudente dar um neto para os seus pais, pois aí eles pelo menos se distrairiam com a criança e ficariam menos revoltados com o senhor. Sou avô e confesso que quando estou com os meus netos, o mundo pode cair na minha cabeça que eu nem vejo!

Afonso olhou para o homem como se ele tivesse o chamado de covarde, de marionete dos pais, de submisso às vontades de três idosos que ainda viviam no século passado, ou no anterior e ainda acreditavam em casamentos arranjados.

_Tenho cara de quem vai andar de acordo com as vontades dos meus pais, Oliveira? Talvez você seguiu os planos traçados pra você, mas eu não vou fazer isso!

Afonso surpreendeu-se consigo mesmo assim que percebeu o quanto estava sendo sincero.

Ele não se sentia mais pressionado a fazer o que a família esperava dele que era se casar, ter um filho, uma família...Será que descobrir-se gay mudara tanto assim a sua personalidade a ponto de libertá-lo dos pais e do avô?

Oliveira calou-se já imaginando os pais de Afonso  voltando para o Brasil, descobrindo  toda a merda que o filho estava fazendo de sua vida, cortando todo o dinheiro de Afonso e aí o estrategista ficaria no prejuízo! Talvez o mais vantajoso fosse acelerar os planos para encerrar logo aquele serviço, pegar o seu pagamento e ir embora de vez.

Como aquele homem iria assumir uma relação homossexual diante dos pais e do avô conservadores? Oliveira não queria estar na pele de Afonso.

_Meus pais voltam daqui a dois meses e eu pretendo estar fora da cidade quando eles chegarem, anote aí._disse Afonso autoritário.

_Pra qual cidade o senhor pretende ir, senhor Afonso?

_Vou sair do país. Providencie os passaportes de João Pedro e da dona Eva._falou decidido.

Oliveira ficou sem ação e sem palavras olhando aquele homem.

_Este é o prazo que você tem pra arquitetar como eu convencerei o João Pedro a largar o namorado dele e vir comigo para morarmos definitivamente nos Estados Unidos.

A cabeça de Oliveira estava pirando...Afonso desejava que ele fizesse  aquilo mesmo...em dois meses?

A ideia de que Afonso  decidira matar o tal William para facilitar o caminho voltou a povoar a mente do estrategista.

_João Pedro vai terminar com o namorado...nada de dar um tempo...eu quero um fim definitivo da relação! Pra garantir, quero o prostituto envolvido com o William. Quero a mãe do João Pedro viva, bem viva e de preferência já com o novo rim.

_O médico disse que ela já está pronta para o transplante._informou o estrategista.

_Mas eu quero que o William já esteja afastado do João Pedro quando a dona Eva estiver recebendo o rim, porque eu estarei ao lado de João Pedro neste momento tão importante nas vidas dele e da mãe dele.

"Haja estômago! Veados e romantismo pra mim não combinam", pensou o estrategista. "Tomara que ele tenha se esquecido da tal prova de amor, senão eu me demito!"

_E eu quero que o João Pedro me dê uma prova de amor, antes de nós embarcarmos para os Estados Unidos._completou Afonso.

Oliveira ficou olhando o homem, como sempre, sair deixando ele sozinho, sem ao menos se despedir e pedir licença.

O estrategista novamente queria poder se demitir...mas não podia. 

Arrancaria grana alta daquele veado rico sem um mínimo de peso na consciência e finalmente conquistaria a sua tão sonhada aposentadoria, decidiu!

Oliveira perdeu o seu final de semana, duas noites em claro, arquitetando passo a passo tudo o que faria para atender o cliente tão exigente.

Na segunda de manhã, cheio de olheiras, olhos vermelhos e com a esposa deprimida por ter ficado sem o marido por duas noites seguidas, Oliveira já tinha tudo esquematizado.

Plano perfeito...organização impecável...Afonso não tinha do que reclamar!

Não precisariam de dois meses, Oliveira comemorou. Bem antes disso, Afonso teria o seu homem e Oliveira o seu dinheiro.

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