Vaguei, vaguei e vaguei.

Não havia saída.

Cruzar as portas de vidro significava voltar para o ponto de partida. Cada vez eu aparecia em um corredor aleatório do hospital. A saída era o começo e o começo era o fim.

Não havia o que fazer além de vagar, então eu fiquei.

Observei o começo o fim e de todas as pessoas que passavam por lá, pois cada novo nascimento significava também uma nova morte.

Houve aquele casal adolescente. Eles tiveram um bebê no que eu acreditava ser o auge do inverno, pois naquela época ventava muito e todos usavam blusas de frio. A garota apareceu um tempo depois com um olho roxo e três dentes a menos, mas naquele dia seu namorado a levou de volta para casa. Um pouco depois, ela estava com o nariz quebrado, mas seu namorado a levou de volta pra casa. Então um dia ela foi transportada em uma maca, pois tinha sido espancada até quase morrer. Seu namorado nunca mais a levou de volta para casa.

A senhora idosa parecia viver no hospital, pois seu netinho estava muito doente. Haviam-no entubado e ele não tinha previsão para acordar. Ela era gentil e falava com todas as pessoas, mas sempre que o médico deixava o quarto ela chorava muito. O garotinho acordou em um dia qualquer e depois disso tudo ficou bem.

Havia um jovem rapaz que sempre trazia sua esposa para a quimioterapia. Ela não tinha mais cabelos, mas usava lenços muito bonitos. Era muito alegre e muito boa em artesanato. A equipe médica e os pacientes da oncologia gostavam muito dela, e de repente todos pareciam estar usando as pulseiras que ela fazia. Um dia seu esposo precisou trazê-la para a emergência e ela nunca mais saiu do hospital com vida. Não se tornou um fantasma, entretanto. Talvez o segredo para realmente partir em paz fosse ser muito amada em vida.

Quando finalmente revi o garoto de olhos azuis fiquei muito surpresa. Ele estava muito magro, mas continuava com vida. Empurram-no em uma cadeira de rodas em direção ao estacionamento, passando pelas duas portas de vidro da entrada.

Naquele momento eu soube que finalmente estava livre.