7. Sentimentos e Lembranças

Voltou para casa durante a tarde e se trancou na estufa de sua mãe, que havia no jardim. As paredes inteiramente de vidro davam uma bela vista para o enorme espaço gramado que havia ali, era uma propriedade que se perdia de vista. Ali entre as rosas, petúnias, orquídeas, camélias e tantos outros tipos de flores e plantas, ele se sentia bem. O perfume de algumas eram reconfortantes e o espaço era silencioso, coisa que a casa com toda certeza não era com os três Lambertini mirins perambulando por ela.

Se sentou em um banco alto para ficar da altura da mesa, também alta, e ali permaneceu, com algumas ferramentas, concentrado em arrumar a boneca de Eloisa. Ele tinha conseguido abrir a boneca e agora estudava um jeito de colocar as asas no lugar e fazê-las movimentar assim como faziam antes, colocando em prática o que tinha aprendido no curso de robótica de anos atrás. Tentaria fazer o melhor para devolver a "boneca fada" para Eloisa, tinha verdadeira paixão pela menina. Dos três era a única que não o atormentava.

Estava tão concentrado que as sobrancelhas estavam quase unidas, uma mecha negra do cabelo havia caído sobre a testa e a coluna estava um pouco curvada.

— Vocês todos têm a mesma expressão quando estão concentrados. – Soou a voz risonha de sua mãe.

Gregory se sobressaltou um pouco, mas voltando a atenção para Susana, sorriu e perguntou:

— Do que está falando, mãe?

— De você, seu irmão... Seu pai. – Ela se sentou em outro banco em frente a ele e tocou seu rosto - Está tão parecido com ele!

— Com meu irmão ou com meu pai?

— Com os dois. Você e o Nicolas são muito parecidos com Benício.

Gregory abaixou a cabeça, um pouco constrangido, não gostava muito de falar naquele assunto, se sentia culpado por não ter qualquer lembrança de seu pai. Só o conhecia por fotos ou pelas histórias contadas por sua mãe, Nicolas ou Micaela.

— Eu não consigo lembrar dele. Me desculpe.

— Não tem do que se desculpar, querido, você era muito pequeno para se lembrar de tudo.

— Como ele era?

— Ah, ele era incrível! – Respondeu ela, com um sorriso nostálgico – Era um homem muito bom, teve seus defeitos, se meteu em situações muito embaraçosas, mas ainda assim... Ele era bom. Um pai muito babão.

— Queria ter alguma lembrança.

— Você o adorava! E ele também adorava ficar com você. Benício sempre foi muito amoroso. Como você adorava sair para pescar com ele!

— Pescar? Sério? – Perguntou surpreso.

— Sim, no lago mesmo. Ele pegava uma vara e saía com você. Você nunca conseguiu pescar nada, então ele deixava você puxar a vara. – Ela riu lembrando das cenas – Depois ele devolvia os peixes para a água porque toda vez que ele trazia para casa, você chorava ao ver o peixe frito.

— Não acredito nisso.

Gregory riu junto da mãe, imaginando como teria sido. Porque a única coisa que lhe restara era aquilo... Imaginação.

— Você só comia peixe se ele fosse comprado, ninguém entendia o motivo. – Continuou Susana.

— E o Nick? Como era a relação deles?

Susana pareceu se entristecer um pouco, antes de responder:

— A maior parte da vida foi boa, ele convivia com Benício assim como você, mas em certo ponto da vida ele se tornou rebelde e quanto mais velho ficava, mais desafiava seu pai. Quando Nicolas era quase um adulto a convivência com eles era quase insuportável.

— Por quê?

— Assuntos mal resolvidos. Eles não podiam se ver e uma discussão era iniciada. O pior de tudo era que Nicolas às vezes passava dos limites e acabava descontando em você.

— Em mim?

Gregory nunca imaginou que Nicolas um dia o tratara mal, o irmão sempre teve um cuidado paternal com ele, era impossível que ele tivesse sido rude.

— Infelizmente sim. – Continuou Susana – Não era por querer, ele sempre descontava no primeiro que aparecia e na maior parte do tempo era você, que vivia grudado nele. Mas felizmente, nos últimos anos de vida de Benício eles se entenderam e passavam a maior parte do tempo juntos, creio que tentando recuperar o tempo perdido, e Nicolas começou a tomar o papel de pai de Benício porque sabia que você precisaria de um pai por perto.

— É... O Nick é a única figura paterna que conheço.

— Ele fez um bom trabalho.

— Com certeza.

Susana se levantou, enxugando algumas lágrimas e se apressou a se recompor, passou as mãos pelos cabelos grisalhos, a fim de os pôr no lugar e beijou o rosto do filho, dizendo:

— Vou deixar você trabalhar, Eloisa precisa de sua boneca rápido ou não nos deixará em paz.

Gregory sorriu de volta e a beijou na testa, demonstrando o quanto a amava, antes de Susana sair, porém, ele disse:

— Obrigado, mãe.

— Pelo que, meu filho?

— Por me contar mais uma história do meu pai. Eu o amo da mesma forma e o amo pelas histórias que me contam.

Ela abriu um largo sorriso, mas não demonstrava felicidade, demonstrava certa melancolia, e Gregory sabia o que sua mãe estava sentindo. Era saudade. E ele infelizmente não poderia fazer nada em relação àquilo.

Um pouco mais tarde ele resolveu conversar com Micaela, segundo os empregados ela voltara a se refugiar no escritório. Sendo assim, ele foi decidido naquela direção e bateu na porta a abrindo e colocando só a cabeça para dentro.

— Micaela, posso conversar com você?

— Claro, Gregory! Entra!

Ele adentrou no escritório e fechou a porta.

— Preciso da sua ajuda. – Disse ele.

— No que posso ser útil?

— Bom... É que.... Se eu te chamasse para sair. Que restaurante gostaria de ir?

Micaela deliberou por alguns segundos, com uma expressão de surpresa e estranheza no rosto. Por fim respondeu:

— Bom.... Eu não aceitaria. Eu sou casada com seu irmão e....

— NÃO! Não é isso! – Se apressou Gregory em explicar – Deus! Você entendeu errado. Como vou dizer de uma maneira melhor? Eu.... É que....

— Chamou uma garota para sair?

— Isso! É isso! Eu chamei.

— Sério? Minha nossa! Quando você cresceu?

— Micaela, estou falando sério. Não sei onde vou levá-la.

— Quantos anos ela tem?

— Não sei. Uns vinte e três ou vinte e quatro.

— Você chama uma garota para sair e não sabe nem a idade dela?

— É por isso que a chamei para sair!

— Tudo bem. Pelo que me disse ela é bem jovem. Então um ambiente como o que Nicolas e eu vamos seria sério demais para vocês. Que tal aquele com uma decoração Rock 'N Roll? Nunca lembro o nome dele!

— Está falando do Rock you?

— Isso! É bem descolado. Irado!

— Para de falar gíria, sério! Não combina com você.

— Não corta minha onda ou não te deixo sair de casa.

— Já tenho vinte e três anos, Micaela.

— Estamos fugindo do assunto. O que acha da sugestão?

— É uma ótima ideia.

— Maravilha! Então está combinado. Leve-a lá e se divirta. E por favor, troque essas roupas.

— O que tem de errado com as minhas?

— Gregory, você está um pouquinho desleixado.

— E daí?

— Isso te envelhece! Uma hora você anda desleixado na outra fica parecendo um filhinho de papai, engomadinho.

— Para com isso, Elisa já me chama assim.

— E com razão.

— Você nunca reclamou das roupas do Nicolas.

— Não, mas seu irmão é um homem de negócios e vive em reuniões, precisa parecer um engomadinho. E você não é ele. Para de se esconder atrás do seu irmão, Gregory. Assuma sua identidade. Estou falando para seu bem.

— Eu entendo. Obrigado.

E com um sorriso enorme no rosto ele saiu da sala. Só quando chegou ao seu quarto ele percebeu... Não tinha pegado o número de Elisa.

— Mas que burro! - Resmungou para si mesmo.

Sentiu um focinho gelado no tornozelo e olhou Zeus, que estava a seus pés, sorriu e pegou um biscoito, que ficava em um pote, especialmente feito para Zeus. Estendeu a comida para o guaxinim, que sem pensar duas vezes pegou o biscoito e correu para um canto, parecendo não querer dividir. Gregory se limitou a rir e se dedicou a revisar a matéria daquele dia, estava tão concentrado que não viu Zeus atacando de novo e enfiando metade do corpo na mochila de Gregory, que estava no chão, para caçar mais coisas. Pegou uma barra de cereal e saiu correndo, sem dar chances para seu dono tomar a embalagem de suas patinhas. 

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