27. Decisões difíceis

"Eu estive sem dormir à noite, porque eu não sei como me sinto

Eu estava esperando por você, só para dizer algo verdadeiro

Há uma luz na estrada e eu acho que você sabe

A manhã chegou e eu tenho que ir

...

Mas se somos fortes o suficiente para deixá-lo entrar

Nós somos fortes o suficiente para deixá-lo ir oh oh

Deixe tudo ir, deixe tudo ir, deixe sair tudo, agora"

Let it all go - Birdy ( feat. RHODES)


Não poderia ficar parada ali, como se fosse uma estátua. Lentamente caminhou em direção a sua tão amada Kombi, que conquistara com muito esforço e logo deu partida, indo em direção ao trabalho. Passou o dia todo quieta, contemplativa no seu próprio mundo, e Matt não pôde deixar de notar isso. Se aproximou dela e encostou no balcão, com os braços cruzados e perguntou:

- Desembucha. O que aconteceu? O principezinho te magoou?

- Acho que, na verdade, sou eu quem vai o magoar.

- Do que está falando?

- Sabe que vou embora assim que terminar minha faculdade, não é? - Respondeu ela, se levantando de onde estava arrumando algumas armações - Gregory está se apegando a mim mais do que eu gostaria, é nítido isso. Não queria que isso entre nós tomasse proporções tão grandes, mas saiu um pouco do controle.

- Hum... E o que vai fazer em relação a isso?

- Ainda não sei. Não quero magoá-lo, mas sinto que quanto mais tempo eu ficar com ele, mais profunda vai ser a ligação dele comigo e mais machucado ele vai ficar quando eu for embora. Não vou mudar de ideia em sair pelo mundo de novo, e ele não pode ir comigo... Nem quero que vá.

- Então sabe que precisa ser sincera com ele, não é? Gregory parece ser uma boa pessoa, não é justo deixá-lo sem saber o que está acontecendo.

- Eu sei, está bem, Matt?! Não precisa me deixar com mais remorso ainda. - Ela suspirou cansada e com os olhos enchendo de lágrimas, completou - Não gostaria de ter que tomar essa decisão.

- Não decida nada de cabeça cheia, vá para casa e pense um pouco para que não se arrependa de sua decisão depois. Se precisar de companhia estarei sempre aqui... Não se esqueça de também pensar em você. Gregory pode sair machucado dessa relação, mas e o seu coração? Como ficará? Pense bem nisso.

- Eu irei pensar. Obrigada, Matt.

Ela o abraçou apertado e fechou os olhos, tentando em vão evitar que as lágrimas escorressem por seu rosto.

- Só não posso te acompanhar hoje, tenho um encontro e não vou perder a oportunidade de sair com aquela gostosa.

Elisa riu, se afastando do amigo e balançando a cabeça negativamente, ele era um mulherengo incurável.

Quando chegou em casa, encontrou Emma deitada no sofá, com um tampão no olho, enquanto Francis estava na cozinha preparando o café. Imediatamente foi em direção a amiga e a abraçou apertado fazendo todo tipo de pergunta sobre a cirurgia, mas Emma sabia que a amiga queria perguntar outra coisa, por outra pessoa.

Com um sorriso sugestivo ela disse:

- Ele está te esperando lá em cima.

- Ah... O Greg está aí?

- Sim! Está esperando o quê? Vai logo ficar com seu homem e me deixa sozinha com o meu!

Sem muito ânimo Elisa se levantou do sofá e começou a subir as escadas, ela era uma mistura de ansiedade nervosismo.

Como encará-lo depois daquele dia?

Chegou ao quarto, que estava uma bagunça por sinal, e o encontrou abaixado, observando a luminária estranha que ela tinha, como se fosse uma criança encantada com aquilo.

Ela só não sabia dizer o porquê, aquela luminária era algo tão simples, só tinha algumas bolinhas vermelhas que subiam e desciam no meio de um líquido e que de noite pareciam acender.

- Greg. - Chamou ela.

Ele se virou, rapidamente, se sobressaltando um pouco como se tivesse sido pego no flagra, se atrapalhou todo e acabou tropeçando em um pequeno baú ali perto. Toda aquela altura só colaborava para ele parecer ainda mais desengonçado. Gregory acabou indo de encontro ao chão, levando consigo o cabideiro o derrubando por cima de si e jogando todas as roupas no chão.

Elisa não conseguiu segurar a risada, principalmente porque ele permanecia parado, tentando entender o que havia acontecido. Ela se aproximou e se abaixou em frente a ele, e levantou a camiseta que tinha caído em sua cabeça, cobrindo a face ruborizada dele. Um sorriso travesso atravessou os lábios de Gregory, que pareceu ainda mais infantil com aquela expressão culpada.

- Me desculpe. - Disse ele.

- Como você é fofo!

- Atrapalhado você quis dizer. - Respondeu ele, com uma careta.

- Também.

Elisa o ajudou a se levantar e logo começou a arrumar o quarto, queria evitar a todo custo olhar para Gregory, pois sabia que ele perceberia seu desconforto. Com certeza iria perguntar o que estava acontecendo, e ela não queria explicar, não queria ter aquela conversa, não naquele momento.

Enquanto isso, ele apenas a observava ir de um lado para o outro sem sequer lhe dirigir uma palavra. Automaticamente uma vozinha dentro de sua cabeça começou a gritar que havia algo errado ou que talvez ele tivesse feito algo errado, mas buscando na memória os dias anteriores, não havia nada de errado que ele conseguisse se lembrar.

Sendo assim, resolveu perguntar:

- Está tudo bem?

- Está sim. - Respondeu Eliza, prontamente - E você?

- Estou... Você está estranha.

- Por que acha isso?

- Não olhou para mim e tampouco me cumprimentou. Eu fiz algo de errado?

Elisa paralisou ao ouvir a pergunta. O que ela poderia responder?

Óbvio que ele não fizera nada de errado, mas com certeza perguntaria o que a estava incomodando, ela não queria dar explicações, tampouco queria ser grosseira com Gregory. Então inventou a primeira desculpa que lhe veio à mente.

- Não, não fez nada de errado. É que eu só estou cansada e com dor de cabeça.

- Ah... Quer que eu faça algo? Precisa de uma aspirina?

- Não, eu só... Só preciso ficar sozinha. Não sou uma boa companhia hoje. Me desculpe, Greg.

Um pouco decepcionado ele assentiu e mesmo assim abriu um sorriso compreensivo. Se despediu dela com um beijo rápido e saiu do quarto em silêncio, deixando Elisa sozinha com seus próprios pensamentos.

Ela se jogou na cama e não conseguiu evitar que algumas lágrimas descessem pelo seu rosto. Quanto mais demorasse para resolver aquela situação, pior seria.

Se sentia uma idiota por deixar que Monique lhe perturbasse tanto daquela forma, mas ela tinha dito a verdade, o problema era que Elisa não queria lidar com essa verdade. Sempre fora tão fácil chegar e sair das cidades, não deixar nada para trás e se despedir das pessoas, mas ali não. Ali ela criara laços bem mais fortes e não se tratava somente de Gregory, mas de seus outros amigos também. Se sentia uma egoísta por só pensar em si e não em como todos ficariam depois que partisse, e ela nunca tinha sido assim.

Passou praticamente a noite toda pensando, procurando uma solução menos dolorosa, mas não havia nenhuma alternativa melhor do que aquela.

Pela manhã, se levantou e tomou um banho demorado e quente, tentando se preparar para a conversa que teria com Gregory, tentando buscar dentro de si alguma coragem. Fez o café e deixou arrumado para que Emma tomasse depois, saiu silenciosamente e entrou na Kombi indo em direção à faculdade. Quando chegou, ficou alguns minutos parada ainda atrás do volante, encarando o nada e tentando acalmar o turbilhão que era sua mente.

Sabia que Gregory muito provavelmente já teria chegado e a esperava para entrar. Tentou sair, mas suas pernas simplesmente não a obedeciam, se recusavam a mexer, então respirou fundo várias e várias vezes, procurando se acalmar e convencer a si mesma de que aquilo era apenas uma conversa amigável. Com esse pensamento em mente, ela saiu e depois de trancar seu carro foi na direção que desejava, na entrada viu Monique acenando descaradamente para ela, com um sorrisinho vitorioso no rosto.

Elisa apenas abaixou a cabeça e resolveu ignorar aquela moça que em tão pouco tempo se tornara detestável para ela. Como havia previsto, Gregory a esperava perto da mesma árvore que sempre ficava. Tomando fôlego ela se aproximou.

- Bom dia. - Disse.

- Bom dia. - Cumprimentou ele, com um beijo.

- Onde está Francis?

- Foi para sua casa ver como Emma estava antes de vir. Não encontrou com ele?

- Não, eu saí um pouco mais cedo... Será que podemos conversar?

Gregory estranhou aquele tom de voz que Elisa tinha usado, principalmente porque ela mal correspondeu o beijo que ele tinha lhe dado e no dia anterior sequer lhe dera atenção. Não queria parecer um idiota carente e inseguro, mas sabia que algo estava errado. Demorou alguns segundos para responder, enquanto a analisava, mas por fim disse:

- Claro. Aonde quer ir?

- Pode ser aqui mesmo, o que tenho para dizer é rápido. - Respondeu ela, parecendo insegura.

- Tudo bem, pode falar. Aconteceu alguma coisa?

- Não quero que fique chateado comigo, Gregory, só estou pensando no bem de nós dois.

- Está me deixando preocupado.

- A-acho que isso não vai dar certo. - Disse Elisa de uma vez.

- Isso...?

- Entre a gente. Eu pensei bem e acho que deveríamos parar por aqui e evitar frustrações futuras. Evitar que nos machuquemos.

- Está querendo dizer que quer terminar? - Perguntou ele, inseguro.

Elisa apenas abaixou a cabeça para esconder as lágrimas que já empoçavam seus olhos e começou a torcer os dedos nervosamente, sussurrando:

- Sim... Quando tudo terminar eu irei embora, não poderei ficar aqui. Entenda que só quero te poupar, não quero te magoar porque eu sei que quanto mais tempo permanecermos juntos, pior será a despedida. Eu nunca fiquei tanto tempo assim com alguém e em alguns lugares sequer me relacionei... Foi só com você que isso aconteceu e você é especial demais para mim. Não posso conviver com a culpa de ter te magoado.

Gregory permaneceu parado, sem saber ao certo o que dizer. Naquele momento seu peito doía e ele sequer saberia explicar o motivo, era como um aperto, uma agonia que se acumulara ali e no fundo ele já sabia que algo assim aconteceria. Só não queria aceitar que aquilo estivesse acontecendo.

Elisa não queria que ele se apegasse a ela, mas já era tarde demais porque Gregory não conseguia imaginar um dia sem que ela estivesse presente, e se imaginava era algo muito estranho. Era como um rombo, um pedaço que faltava.

Mas ele a entendia, ou pelo menos tentava, não poderia prendê-la e jamais faria isso. Sendo assim, tentando manter a naturalidade na voz, respondeu:

- Tudo bem.

- Tudo... bem? - Inquiriu ela, insegura, elevando a cabeça para olhá-lo.

- Sim. Tudo bem. Se quiser ir, vá.

- Eu achei... Que ficaria chateado ou bravo.

- Não vou negar que estou chateado, eu gosto muito de você, Elisa. Mas não tenho o direito de ficar bravo. Se você não se sente bem com isso, então terei que deixá-la ir. Não vou e nem quero prendê-la, não tenho direito sobre você, prefiro vê-la feliz seguindo seu caminho. Saiba que sempre estarei aqui se precisar de mim.

Elisa permaneceu parada encarando-o e se perguntando de que conto de fadas Gregory poderia ter saído, porque não era possível alguém ser tão compreensível daquele jeito, ou talvez ela apenas não estivesse acostumada... Talvez ele fosse apenas um raro exemplar.

Sem se dar conta do que estava fazendo, ela o abraçou apertado e deixou as lágrimas descerem sem resistência. Se tudo pudesse ser diferente...

Mas não estava ao seu alcance, ela não poderia mudar aquilo, e ele não entenderia mesmo que ela tentasse lhe explicar.

- Me desculpe. - Soluçou ela - Não queria te decepcionar.

- Elisa, você não precisa pedir desculpas por nada, nem se preocupar em me decepcionar. Você é livre, pode fazer o que quiser e ninguém tem o direito de te prender, nem mesmo eu. Eu ficarei feliz se você estiver feliz.

- Você é incrível, merece alguém muito melhor.

Gregory a soltou e gentilmente a afastou, secando uma lágrima que descia pelo rosto repleto de sardas, ele completou:

- Você foi minha melhor. Mas aceito que tudo tenha um fim. Obrigado, Elisa.

- Eu que tenho que te agradecer por tudo que me proporcionou. Não é uma despedida, afinal ainda nos veremos aqui, mas acho bom nos afastarmos por enquanto.

- Claro. Tem razão. Mas e quando você for embora?

- Você saberá.

- Certo...

Ele abaixou a cabeça e enfiou as mãos no bolso, em seu típico gesto de nervosismo. Ficaram em silêncio alguns segundos até Elisa lhe dar um beijo no rosto e se afastar devagar. Gregory não se atreveu a olhá-la se afastar, permaneceu o tempo todo de cabeça baixa e sequer soube quanto tempo ficou parado ali, apenas com seus pensamentos que eram um turbilhão. Não deveria ter se apaixonado... Apaixonado.

Só então ele percebeu que estava apaixonado, tinha evitado a todo custo aquela palavra, mas no fim ela o atormentou da mesma forma.

O que iria fazer agora? Tentar esquecer? Seguir em frente? Como?

Começou a caminhar na direção da sala de aula e sequer prestava atenção ao que acontecia ao seu redor, tinha entrado no piloto automático. Se sentou no mesmo lugar de sempre e permaneceu encarando o quadro onde o professor começava a passar a matéria, sequer percebeu quando Francis chegou atrasado na aula e se sentou ao seu lado.

- E aí o que o professor está passando? - Perguntou seu amigo, afobado.

- Hã? - Inquiriu ele, voltando a si.

- Do que o professor está falando?

- Eu não sei.

- Sério isso? Não estava prestando atenção? - Quando Gregory apenas balançou a cabeça negativamente, Francis completou - O que está acontecendo com você? Parece estranho hoje.

- Depois falamos sobre isso.

Ele se virou para frente e permaneceu quieto, em seu próprio mundo. Francis percebeu que o amigo não estava nada bem, então se virou para frente também, o deixando em paz.

Mas no fim da aula não conteve a curiosidade, mal esperou que Gregory saísse da sala e o puxou para um canto no corredor, dizendo:

- Pode ir me contando o que aconteceu.

- A Elisa terminou comigo. Seja lá o que for que tínhamos, não temos mais.

- O quê? Por que isso agora?

- Eu não sei ao certo. Ela diz que vai embora quando terminar tudo e não quer que nos apeguemos mais. Ela tem seus motivos.

- Não acredito. Vocês eram perfeitos, se encaixavam tão bem!

- Tudo acaba um dia, Francis. Eu... Eu acho que vou embora, não quero ficar aqui hoje.

- Tudo bem, depois te passo a matéria. - Francis hesitou por alguns segundos, para depois abrir um sorriso sugestivo e completar - Jogatina hoje?

- Não me leve a mal, Francis, mas hoje preciso ficar sozinho.

- Entendo. Se precisar é só mandar mensagem.

- Obrigado.

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