1 . Café da Realeza
Um ano e meio antes...
Gregory estava na mais perfeita paz, sentado em sua cama, fazendo seu ritual matinal. Todos os dias ele se levantava uma hora mais cedo do que deveria, praticava meditação por meia hora e o que restava usava para se arrumar e sair de casa sem atrasos. Aquela manhã não era diferente, tudo estava em silêncio, o que era raro, na casa dos Lambertini.
Apenas as músicas nos fones eram ouvidas... Até alguém bater à porta, gritando:
— Tio Greg, levanta logo. Já estou pronto.
Benjamin. Desde que entrara na adolescência o garoto não dava paz para ninguém na casa... Na verdade, ele nunca deu, não havia um dia sequer que ele não aprontasse algo. Gregory resolveu ignorar o sobrinho e continuar sua meditação, mas era praticamente impossível porque o garoto continuava batendo na porta e gritando:
— Vamos, seu preguiçoso, se eu já estou de pé, você também já deve estar... Tio Greg, você prometeu nos levar na escola hoje. Se eu perder a prova a culpa será toda sua. Vai mesmo arriscar o meu futuro?... Se não abrir eu juro que vou arrombar.
Gregory continuou em silêncio, tentando voltar para sua paz, mas ela foi para o espaço quando ouviu um grande estrondo na porta. Ela abriu os olhos rapidamente e tirou os fones de ouvido.
— A primeira já foi, na segunda eu derrubo a porta. – Continuou o menino.
Outro estrondo foi ouvido e dessa vez a porta até tremeu.
— Se acalma, Gregory, ele é seu sobrinho. Só tem quinze anos, é um adolescente chato! – Resmungou para si mesmo.
O terceiro estrondo veio mais forte e dessa vez ele não suportou, foi em direção à porta e a abriu, dando de frente com Benjamin, que vinha na direção da porta novamente. Porém, deu de frente com Gregory, levando os dois ao chão.
— Qual o seu problema, garoto?
Benjamin se levantou e saiu correndo do quarto, ao ver seu tio o ameaçar e correr atrás dele.
— Volta aqui, Benjamin. Eu vou te matar!
Nicolas surgiu no corredor, saindo de seu quarto e Benjamin aproveitou a chance e se escondeu atrás do pai, lançando um sorrisinho cínico, mostrando o aparelho nos dentes e as covinhas nas bochechas, para o tio.
— O que está acontecendo aqui? – Questionou Nicolas.
— Seu filho não tem um pingo de paz. – Acusou Gregory.
— O tio Greg que não queria levantar. Eu só fui fazer um favor, ele ia se atrasar.
— Mas que garoto chato!
— Calma, Greg! – Se intrometeu Nicolas – Para que todo esse estresse logo cedo?
— Porque seu filho sequer me deixou terminar minha meditação! Como quer que eu fique calmo?
Nicolas se virou para o filho e disse:
— Está entendendo porque é importante a meditação dele? Agora não o incomode mais, desça e vá tomar seu café.
Gregory apenas respirou fundo e voltou para o quarto, não sem antes escutar uma vozinha vinda do corredor, que gritava:
— Hora de pular na cama do tio Gueg.
Avistou Eloisa, a filha caçula de Nicolas e Micaela, entrar correndo no quarto e pular em cima da sua cama a fazendo de pula-pula.
— Elô, não deveria estar dormindo? Ainda é muito cedo para estar acordada.
— Eu quero pular na cama, tio Gueg.
— É nisso que dá sua mãe ficar te colocando para dormir cedo.
Gregory apenas observou a pequena, que esbanjava uma energia fora do comum, os grandes cachos nas pontas dos cabelos castanhos pareciam molas conforme o movimento que a garotinha de cinco anos fazia. Por fim ela se cansou e se sentou na cama, observando o tio começar a arrumar a roupa que usaria.
— Vai me levar no parque hoje, tio?
— Não prometo nada, Elô, mas vou tentar.
— Mas disse que ia me levar!
— Eu disse que talvez te levaria. Não invente histórias.
— Mas que trapaceiro! – Respondeu ela, cruzando os braços.
Gregory parou para observar a pequena, que com tão pouca idade já era marrenta igual a mãe. Era impressionante como ela se parecia com Micaela, podia-se dizer que era uma cópia idêntica. O único vestígio de que ela era filha de Nicolas também, era o olho castanho que tinha... Que era somente um mesmo, o outro era de um azul intenso como o de Micaela. A heterocromia fazia a menina parecer mais fofa do que já era.
Ele caminhou na direção da sobrinha e a pegou no colo, dizendo:
— A senhorita é muito exigente, eu tenho muita coisa para fazer, sabia?
— O papai disse que você só vai para a escola.
— Porque seu papai é um metido a besta que fez duas faculdades ao mesmo tempo e pensa que todo mundo pode dar conta. Acontece que somos diferentes, não concorda?
— Igual meus olhos, tios Gueg?
Ele riu e respondeu:
— Sim, princesa, igual seus olhos. E isso é muito bom. Nos faz únicos. Agora volta para sua cama e aproveite que ainda não tem que levantar cedo para ir à escola.
— Posso dormir na sua cama, posso? – Pediu ela, com um olhar suplicante, que Gregory não conseguiu resistir.
— Tudo bem. Pode, mas não faça muita bagunça.
— Ela não vai fazer bagunça nenhuma porque vai voltar para a cama dela. – Interrompeu Micaela, que estava na porta do quarto – Que coisa feia, Eloisa, perturbar seu tio logo de manhã.
— Ela não me perturba, Micaela, esse papel é do Ben.
Micaela riu e adentrou o quarto, pegando a filha no colo.
— Ele tirou sua concentração de novo, não é?
— Para variar.
— Eu terei uma conversa com ele.
— Não adianta, Micaela, o Nicolas já conversou com ele milhares de vezes.
— Não adianta porque o Nicolas não usa os mesmos métodos que os meus. Tenha um bom dia, Greg.
Tão rápido como surgiu, Micaela saiu, e Gregory se pegou pensando quais eram os métodos que ela utilizaria com Benjamin, afinal, só ela conseguia colocar aquele garoto no seu devido lugar. Deixando esses pensamentos de lado, ele foi em direção ao banheiro, que ficava na porta ao lado da cama, ligou o chuveiro e entrou sem se lembrar dos óculos, ele já perdera a conta de quantas vezes fizera aquilo.
Tirou os óculos e deixou em cima do vaso sanitário e tomou um banho quente, quase fervendo, era assim que gostava. Quando saiu, a primeira coisa que fez foi colocar os óculos novamente, não enxergava praticamente nada sem eles, o que naquele caso não adiantou muita coisa, estavam embaçados pelo vapor que saiu do chuveiro. Tateou até a porta e a abriu, voltando para o quarto.
Colocou uma calça jeans, um tênis e sua camiseta de algum herói que provavelmente só ele saberia o nome. Pegou a mochila, as chaves do carro e desceu para tomar café.
Na sala já se encontravam sua mãe, seu irmão e seu sobrinho, Micaela e as outras duas meninas ainda não tinham descido. Tomaram café em silêncio como era de costume, e Benjamin foi o primeiro a terminar, depois ficou encarando o tio com um sorriso. As vezes Gregory tinha vontade de afundar a cabeça do garoto numa privada, mas respirava fundo e contava até dez, o que fazia a vontade passar.
Teve os pensamentos interrompidos quando Sofia entrou correndo, jogou sua mochila no chão e começou a arrumar o café.
— Bom dia, papai. Bom dia, vovó. Bom dia, tio Greg. E bom dia, Cabeção. – Disse ela, enfiando pão na boca.
— Sofia, devagar! Assim vai se engasgar. – Repreendeu Nicolas.
— Eu já estou atrasada, papai. – Respondeu a garota de cabelos tão negros quanto os do pai, com a boca cheia de pão.
— Pois eu não, mas já estou saindo. Então se quiseram carona, andem logo. – Disse Gregory, se levantando, dando um beijo em sua mãe e saindo.
Os dois adolescentes correram atrás dele e logo passaram à sua frente, saindo da casa e indo em direção ao carro que já estava estacionado em frente à casa.
Benjamin correu para a porta da frente e a abriu, praticamente pulando para o banco do carona.
— É minha vez de ir na frente, Beni! – Resmungou Sofia.
— Bobeou dançou, pode ir para trás, pentelha. – Respondeu ele, fechando a porta.
— Olha quem fala! Quem se comporta igual criança aqui é você. É minha vez de ir na frente.
— Eu sou o mais velho, eu vou na frente.
— Mais velho por três anos só!
Sofia abriu a porta do carro e agarrou o braço do irmão, tentando o puxar para fora. Normalmente Gregory não se metia nas brigas dos sobrinhos, mas às vezes era inevitável, principalmente quando se tratava de Benjamin e Sofia. A menina, que era a filha do meio, tinha um temperamento terrível... Provavelmente herdado do pai. Não aceitava perder, e Benjamin também não ajudava nem um pouco provocando a irmã.
— Já chega! Sofia, vai para trás e Benjamin, cale a boca.
A contragosto a menina entrou na parte de trás e cruzou os braços, bufando de raiva, enquanto Benjamin exibia mais um dos sorrisinhos irritantes. Logo Gregory deu partida no carro e saiu dirigindo em direção à cidade, por alguns minutos permaneceram calados, o clima entre os irmãos não estava nada bom, então Gregory resolveu quebrar o silêncio:
— Eu nunca vi adolescentes tão animados para ir à escola. Vai ter alguma coisa hoje?
— Não, o Beni só está com paquera na escola, por isso quer ir logo. – Respondeu Sofia.
— Eu não estou com paquera! Ela é só minha amiga.
— Ah, claro! Amigos que andam de mãos dadas e ficam de beijinhos.
Sofia fazia um bico, imitando um beijo, enquanto fechava os olhos e imitava o irmão.
— Fica quieta, coruja. – Provocou ele, fazendo menção aos grandes olhos castanhos da menina.
— Fica quieto você, cabeção.
— Anã de jardim.
— Abridor de garrafa!
— Ei, foi golpe baixo!
Gregory apenas suspirou, pedindo a Deus paciência, enquanto Sofia continuava:
— Cuidado para não machucar a boca da Eduarda com esses dentes tortos.
— Eles não são tortos!
— Não precisaria usar aparelho se não fossem.
— Você é uma chata implicante.
— E você está de paquerinha. Beni e Eduarda andando de mãos dadas, lá se vão os dois pela calçada, junto vão bem agarradinhos, só falta darem dois beijinhos. – Cantarolou a menina, numa clara tentativa de irritar o mais velho.
— Você é uma infantil. Fala isso porque não consegue conversar com o Pedro, não tem coragem. Ou achou que eu não iria notar?
Sofia ficou subitamente irritada e chutou o banco do irmão, o que foi o estopim para Gregory frear no meio da rua e esbravejar:
— Agora já chega, vocês dois! Ninguém aguenta mais essa implicância, não vou aturar briga dentro do meu carro. Os dois estão errados e ponto! Se aprontarem mais uma dessa eu vou deixar irem a pé para a escola, fui claro?
— Sim, tio Greg. – Responderam os dois em uníssono.
— Ótimo.
Ele voltou a dirigir e o resto do caminho foi em silêncio, para seu contentamento. Não tinha coisa pior do que aguentar dois adolescentes implicando um com o outro. E apesar dos dois serem tão diferentes na aparência, a personalidade deles era muito parecida, o que quase sempre resultava em briga.
Pensando melhor, Gregory achava engraçado a forma que seus sobrinhos eram tão diferentes e ao mesmo tempo tão semelhantes. Benjamin era uma peste, adorava perturbar todos, os olhos azuis e os cabelos negros e bagunçados do garoto, denunciavam sua personalidade, ele era basicamente uma mistura de Nicolas e Micaela, o equilíbrio perfeito.
Sofia era um pouco mais centrada, porém pouco paciente, isso porque só tinha doze anos de idade, imaginava como ela ia ficar quando adulta. Aquilo só podia ser resultado do tempo que ela passava junto de Nicolas, a garota praticamente não desgrudava dele, Gregory se perguntava se ela se identificava mais com o pai, visto que ela poderia se passar por uma cópia dele, mas do sexo feminino. Os cabelos negros e lisos e os olhos de um castanho intenso... O que eram características do próprio Gregory, já que ele se parecia tanto com o irmão.
E tinha Eloisa, ela era uma incógnita. Era agitada como ninguém era naquela casa, talvez fosse pelo fato de ser apenas uma criança, mas ao mesmo tempo era doce e sensível.
Deixando esses pensamentos de lado, Gregory deixou os adolescentes em frente ao enorme prédio da escola e partiu para sua faculdade, que não era muito longe dali.
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