𝟎𝟎. 𝗉𝗋𝗈𝗅𝗈𝗀𝗎𝖾.
000. ⠀⠀⠀␥⠀⠀𝓕𝗂𝗅𝗂𝗉𝖺 𝓕𝖾𝗋𝗋𝖾𝗂𝗋𝖺
❆⠀𓈒 ׁ ˖⠀𝓕𝚎𝚊𝚜𝚝 𝒪𝚏 ℱ𝙰𝙻𝚂𝙴𝙷𝙾𝙾𝙳𝚂. ⠀֪ ʾ
EU TOMAVA UM GOLE DA água na minha garrafinha azul enquanto ouvia Isobel Roque, minha prima. Prima. Só isso já é motivo suficiente para justificar o tormento. A mulher é uma especialista em falar coisas que ninguém pediu, de uma forma que parece que o mundo gira em torno dela. E, claro, tinha que ser sobre o podcast. Sempre o podcast.
— Ouvi dizer que você vai cobrir a Fórmula 1, não é? Que incrível! — disse ela, com aquele sorriso falso que só aumenta a minha vontade de jogar a garrafinha na cabeça dela.
Eu retribuí o sorriso, claro. Gentileza gera gentileza, não é o que dizem?
— Ah, sim, Isobel. Estou muito animada. E obrigada por mencionar isso. Acho que ninguém ia perceber se você não comentasse.
Por dentro, eu já estava rindo. Uma risada seca, cheia de ironia. Porque, veja bem, Isobel tem essa habilidade única de falar o óbvio como se estivesse revelando um segredo de estado. Se ela pudesse, transformaria "o céu é azul" em manchete.
Ela continuou sorrindo, achando que estávamos tendo uma conversa genuína. É engraçado como ela nunca percebe o sarcasmo. Talvez porque, para entender sarcasmo, seja necessário um mínimo de autocrítica — algo que claramente não está no repertório da Isobel.
E assim seguimos, ela achando que está sendo encantadora, e eu tentando decidir se era mais prático ignorá-la ou sufocá-la com a própria vaidade.
Eu mantinha o sorriso enquanto Isobel se empolgava com um monólogo sobre "a dedicação necessária para manter um podcast de sucesso". Sei bem o que é trabalhar duro, mas ouvir isso dela sempre soa como uma desculpa para me usar como muleta para manter o projeto vivo. Claro, eu finjo que não percebo. É mais fácil assim.
O fato é que minha vida mudou muito nos últimos anos. Comecei como streamer quase por acidente, transmitindo meus jogos para meia dúzia de pessoas enquanto tentava superar um computador que parecia implorar para ser aposentado. Mas, com o tempo, a coisa cresceu. Hoje, sou uma criadora de conteúdo que conseguiu um espaço considerável no meio. Isso não aconteceu do dia para a noite, e eu sou grata por cada pessoa que me acompanha.
Mas aqui vai um segredo que ninguém te conta: ser famosa não é tão incrível quanto parece. É cansativo. Eu amo o que faço, adoro minha comunidade e valorizo cada conquista, mas tem uma parte disso tudo que me desgasta profundamente. A parte de ter que sempre estar disponível, de sorrir quando você só quer ficar quieta, de lidar com gente que acha que conhece cada detalhe da sua vida só porque viu dois clipes no TikTok.
A privacidade desaparece, e, com ela, vai um pedaço da sua sanidade. Às vezes, eu só queria ser a pessoa que desliga o computador e volta para a vida sem ninguém perguntar “quando vai sair o próximo vídeo?” ou “você não vai responder aquele comentário?”.
— Sério, Filipa, você precisa participar mais vezes do meu podcast. As pessoas amaram sua última participação — ela disse, com um sorriso tão artificial que quase dava para ver as engrenagens girando por trás.
Eu retribuí, claro. Nunca é bom fechar portas, especialmente quando se trata de família.
— Claro, Isobel, sempre que precisar. Você sabe como eu fico feliz em ajudar.
Por dentro, minha paciência estava no limite, mas continuei sorrindo. Faz parte do jogo. Só queria que, às vezes, fosse mais fácil encontrar um pouco de silêncio no meio do barulho.
Se passaram semanas desde o podcast, mas, inacreditavelmente, aquela pergunta óbvia da Isobel ainda martelava na minha cabeça. E não porque foi brilhante, porque, sinceramente, não foi. Mas porque desencadeou uma avalanche de comentários ridículos que eu não conseguia ignorar. Era fantástico ir cobrir a Fórmula 1, um sonho para qualquer pessoa com um mínimo de noção. Mas, claro, a internet sempre tem algo a dizer, e nunca é bom.
"Ela nem deve gostar de verdade de Fórmula 1."
"Duvido que faça uma cobertura decente."
"Só está indo porque é famosa."
Ah, claro. Porque gostar de algo e ser competente é, aparentemente, uma exclusividade reservada a um seleto grupo de especialistas anônimos que vivem nos comentários alheios. Aparentemente, não é suficiente ter trabalhado anos para construir uma carreira. Não, você tem que provar diariamente que merece estar onde está, especialmente para pessoas que provavelmente não sabem nem trocar um pneu.
Agora, aqui estou, sentada no avião, a caminho do tal evento incrível, mas tudo o que consigo pensar é em como estou longe do chão. Literalmente. Olhar pela janela só reforça a ideia. Lá embaixo, o mundo parecia pequeno e insignificante, uma visão quase terapêutica. Mas então, meus olhos desviaram para a porta de emergência.
Por um breve momento, imaginei como seria abrir aquela porta e me lançar para fora. Uma queda livre que, ironicamente, pareceria libertadora. Claro, eu não sou idiota o suficiente para realmente fazer isso. Mas, convenhamos, a ideia tem seu charme. Talvez seja o humor ácido falando, ou talvez seja a exaustão de lidar com gente que acha que pode ditar como devo viver minha vida.
Ri sozinha, uma risada seca e baixa, enquanto ajeitava o fone de ouvido. Não era a queda que eu temia, mas o peso constante de carregar expectativas que nunca pedi. Apertando o cinto, eu me convenci de que a única coisa a fazer era encarar aquilo tudo. Afinal, saltar — de verdade ou metaforicamente — não estava nos planos. Ainda.
Olhei para o lado e quase engasguei. Aí, meu senhor. Era Felipe Drugovich. Sim, o Felipe Drugovich. O piloto em ascensão da Aston Martin. Ou... é possível chamá-lo de piloto oficialmente? Ele não era exatamente titular ainda, mas, tecnicamente, estava lá. Não que isso importasse muito no momento, porque, bem, ele estava sentado a um banco de distância de mim.
Tentei não encarar, mas falhei miseravelmente. Meu cérebro entrou em um curto-circuito entre "não olha, seja discreta" e "meu Deus, é o Felipe Drugovich, olha de novo". Aparentemente, optei pela segunda.
E ele... ele estava me olhando de volta. Com um olhar que, honestamente, eu não sabia decifrar. Estranho? Maluco? Julgador? Será que ele estava me julgando? Ou era só coisa da minha cabeça?
Espere aí. E se eu estivesse julgando ele? Porque, pensando bem, eu estava. Não em voz alta, claro, mas minha cabeça já estava analisando tudo: o cabelo meio bagunçado, a expressão séria demais para alguém sentado em um voo comercial e, principalmente, o fato de ele ser tão... calmo.
— Tudo bem? — ele perguntou, quebrando o silêncio, a voz carregada de um sotaque que soava mais simpático do que eu esperava.
— Sim, claro. — Respondi rápido demais, talvez alto demais.
Ele sorriu de canto, como se soubesse exatamente o que estava acontecendo. E eu, bom, fiz o que qualquer pessoa faria. Afundei na poltrona, fingindo que estava super interessada na revista de bordo. Porque, claro, nada grita "naturalidade" como ignorar alguém que você claramente reconheceu.
Me afundei na poltrona, folheando a revista de bordo, tentando parecer ocupada enquanto encarava uma foto da Adriana Lima no último desfile da Victoria’s Secret. Não que eu estivesse realmente interessada, mas precisava de algo que dissesse "não estou prestando atenção em você" com força suficiente para ele acreditar.
Mas, é claro, meus olhos decidiram trair minha tentativa de parecer indiferente. Voltei a encará-lo. E lá estava ele, Felipe Drugovich, ainda me olhando.
— Você tá me julgando? — soltei, seca, sem filtro, porque se ele queria me analisar, que pelo menos fosse honesto.
Ele riu. Não uma risada normal, mas uma dessas bobas que parece dizer "eu sei algo que você não sabe". Ele desviou o olhar por um segundo, só para depois voltar com aquele sorrisinho de canto irritantemente confiante.
— Não... não... só talvez — respondeu, como se isso fosse suficiente para encerrar o assunto.
— Ótimo — retruquei, fechando a revista com um estalo que chamou a atenção de metade do avião. — Porque, sinceramente, eu também estava te julgando. E não sei o que é mais estranho: o fato de você ser tão calmo ou o fato de achar que eu não perceberia.
A risada dele ficou um pouco mais forte, e ele balançou a cabeça, como se estivesse lidando com uma criança malcriada.
— Ok, ponto para você.
Revirei os olhos e voltei a abrir a revista, fingindo que a Adriana Lima tinha acabado de me contar um segredo revolucionário. Mas, por dentro, eu só pensava: que tipo de pessoa ri enquanto é julgada?
O olhar de Felipe me atingiu de uma forma que eu não estava preparada para lidar. A sensação foi tão estranha que, por um momento, me senti fora do meu próprio corpo, como se tivesse sido tomada por algo. Não era desejo, nem curiosidade. Era... raiva. Raiva pura, sem motivo algum. Só uma chama acesa dentro de mim, aquecendo meu sangue, e tudo que eu queria fazer era explodir.
────────────⭑ ֗ 💍 E ESTE FOI O PRÓLOGO ! então, o que acharam, amores? Eu amo esses dois!
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top