Capítulo 4

Embora meus pensamentos naquela noite tenham pipocado em várias direções diferentes, não sonhei com absolutamente nada em que pensei antes de dormir. Apenas com Ethan de novo e agora o sonho se repetia como o anterior. A única coisa diferente era a agonia que parecia sentir cada vez mais. Todas as vezes acordava assustada, mas pelo menos ainda tinha a certeza de que estava vivo.

Passaram-se mais três dias até que finalmente chegamos aos entornos do pântano. Assim que senti o mau cheiro do lugar, tive a confirmação de que aquele era mesmo o lugar com o qual havia sonhado. Ethan estava ali. Senti meu coração se acelerar, meus pés estavam doloridos, meu nariz ardia com o mau cheiro e minha boca estava seca, mas não tinha vontade de parar.

Caminhávamos com cuidado após o alerta de Ivy. Havíamos entrado no território dos Trolls. Pensei comigo que não precisava ter avisado nada, todos fomos capazes de sentir o cheiro de podridão do local. A atmosfera se tornara escura, úmida e mau cheirosa; o chão coberto por uma mistura de lama e água suja. Minhas pernas estavam mergulhadas até os joelhos e ficava um pouco difícil me movimentar. Julie, Cristian, Ruy, Lewis e Zein tinham sorte por conseguirem voar.

As árvores dali tinham troncos grossos, que estavam esverdeados por causa do musgo que crescia neles. As copas possuíam espécies de galhos verdes que se dobravam até quase alcançar a água, esses galhos também eram cobertos por uma espécie de musgo verde escuro. Boiando na água imunda havia algumas plantas parecidas com as que encontrava no meu mundo, algo como igapós e vitórias régias. Havia poucas flores crescendo em um lugar ou outro, mas no geral a paisagem era composta por musgo, lama e igapós.

Parei de andar por uma pequena fração de tempo para olhar o céu, que estava repleto de nuvens cinza escuras e parecia estar armando uma tempestade. Onde poderíamos encontrar abrigo aqui? Acho que essas árvores não parecem muito firmes para servirem realmente como cabanas...

Primeiro, ouvi um som alto, que me lembrou do barulho de um trovão e me fez olhar para cima novamente, depois percebi um movimento à minha direita, infelizmente tarde demais para que conseguisse me mexer. Fiquei parada olhando enquanto um enorme tronco de árvore voava em minha direção.

Aquela coisa teria atingido minha cabeça e com certeza a teria estourado como se fosse apenas um balão de gás, mas para minha sorte Zein estava mais atento que o restante de nós e no último minuto se atirou sobre mim e me derrubou naquela água nojenta. Pelo menos isso evitou que o ataque me acertasse e morresse naquela água nojenta.

- Estão atacando! - Ivy berrou, enquanto Zein me ajudava a levantar rapidamente e os outros se posicionavam para lutar.

Diante de meus olhos ainda assustados com o que acabara de acontecer, pude ver a cena toda se desenrolando. Cinco criaturas surgiram das árvores e fecharam o cerco ao nosso redor. Pude avaliar a aparência da que estava mais perto de mim e percebi que todas apresentavam as mesmas características.

Tinham a pele em um tom de verde bem escuro, olhos pequenos para o rosto grande e ovalado, tinham as orelhas e o nariz do tamanho de batatas e não tinham qualquer indício de cabelo no alto de suas cabeças sujas e oleosas. Vestiam roupas simples: uma blusa amarrotada e completamente suja, principalmente de lama, calças largas e esfarrapadas, tão sujas quanto o restante das roupas. As criaturas eram quase do tamanho das árvores ao nosso redor, que estimei terem em média uns três metros de altura.

Não calçavam nada nos pés, em contrapartida, nas mãos levavam enormes escudos, alguns de metal e outros de madeira; como armas usavam clavas de madeira que pareciam ser apenas troncos de pequenas árvores arrancados e esculpidos rudemente, com exceção de uma ou outra que parecia mais trabalhada e apresentava fileiras de espinhos bem posicionados. Lembrei-me do fundador que se apresentara para mim na caverna de cristal e fiquei confusa. A aparência dele não tinha nada a ver com isso.

-Nós... - tive que limpar minha garganta ao tentar falar. - Nós viemos em paz.

A criatura me analisou por algum tempo com seus olhos miúdos para um rosto tão grande. Em seguida, sorriu exibindo uma fileira de enormes dentes achatados e podres, não pude evitar que meu estômago embrulhasse ao sentir o mau hálito dela, cheguei até a me sentir tonta. Talvez uma conversa não tenha sido a melhor ideia...

Zein gritou meu nome e me empurrou de novo, caindo sobre mim na água imunda e me salvando de outro golpe da criatura de hálito de esgoto. Deviam pertencer a uma das tribos que ainda guardava rancor pela guerra. Ele se recuperou mais rápido que eu assim que parou de me tocar, pois assim não sentiria mais nada novamente.

-Ignis Imber Umbrae! - Zein se posicionou a minha frente e conjurou um feitiço que fez aparecer uma espécie de chuva de fogo roxa em cima da criatura, que urrou de dor e ficou com a pele e as roupas chamuscadas. - Acho melhor devolver as sombras para você, Alessia.

- Não. - Levantei-me rapidamente a fim de mostrar que era perfeitamente capaz de lutar por mim mesma. - Pode continuar com elas. Eu me viro.

Ivy e Noah haviam conjurado arcos e flechas mágicos e disparavam flechas cor de bronze na direção das criaturas. Quando as flechas de Ivy acertavam seu alvo, soltavam uma espécie de gás que fazia a criatura ficar tonta por alguns segundos. Já as de Noah, explodiam ao tocar a pele da criatura e faziam com que apresentasse algumas queimaduras.

Dahlie e Cristian trabalhavam em conjunto, conjurando feitiços que pareciam se completar nos ataques e nas defesas. Ruy e Julie estavam enfrentando uma das criaturas, enquanto Julie conjurava feitiços, Ruy atacava pelos céus com suas garras poderosas. Procurei Lewis pela cena, mas não consegui encontrá-lo. Quando estava começando a me desesperar ouvimos a voz dele gritar do alto:

- Não ataquem com fogo! Também não estão adiantando os demais feitiços. A lama e a sujeira do corpo deles estão detendo os ataques. Devem ter magia!

No mesmo instante paramos os ataques. Estavam todos cansados e isso deu chance aos Trolls para tentar revidar. Enquanto Ruy ajudou Dahlie a desviar de um dos ataques, Cristian e Lewis levantaram voo para evitar as clavas e Lewis foi obrigado a desviar de um tronco que fora lançado para acertá-lo. Julie também levantou voo, mas Zein não fez o mesmo e o Troll que nos atacava se aproveitou disso para atacá-lo.

- Zein, tire o amuleto! Posso segurá-lo para você como Dahlie fez com o de Cristian e Julie, com o do Lewis. - Gritei quando escapou por pouco do ataque.

O Troll ergueu a clava novamente e se preparou para atacar quando Zein arremessou seu amuleto para mim e o pendurei no pescoço. A criatura pareceu confusa quando acertou a clava em Zein e ela passou direto, espirrando água e lama para todo o lado. O Troll tentou acertá-lo por mais três vezes e ao ver que não conseguia se dirigiu para mim com um olhar raivoso.

Três Trolls lançavam troncos de árvores e bolas de lama na direção de meus amigos que ainda estavam sobrevoando a área e haviam parado de atacar. Assim que percebi que a criatura vinha em minha direção, tive uma ideia e recordei um dos encantamentos que havia aprendido ainda em Fantasy, só esperava que desse tempo de conjurá-lo.

- Gelidus in Aquam! Indistincta manque puritatis! Infinite etiam prisca nouitate, nunc obtestor!

Quando terminei de pronunciar as palavras, o Troll já estava bem perto e preparado para me esmagar com a clava, mas o encantamento deu certo e logo senti meu sangue gelar e uma energia fluir por todo o meu corpo partindo do coração e se concentrando em minhas mãos. Uma espécie de onda o atingiu e passou a limpar toda a sujeira presente no corpo e nas roupas dele. O Troll urrou, irado e baixou a clava para me acertar, mas a água o havia atordoado e errou o ataque. Ter errado o ataque não impediu que um pequeno tsunami de lama, água suja e igapós me derrubasse no chão.

- Ataquem com água e limpem o corpo deles! Depois usem os demais feitiços! - Gritei para os demais, enquanto me levantava do chão e lançava outro feitiço aquático no Troll. - Gelidus in Aquam!

Esse último me auxiliou a lançar quatro ataques seguidos sem precisar pronunciar palavras mágicas todas as vezes. A água jorrava a partir de minhas mãos como um jato potente e atingia as criaturas. Nosso grupo passou a trabalhar em equipe e enquanto Lewis e eu limpávamos os corpos dos Trolls, os demais atacavam. Noah terminava o serviço, os amarrando com a ajuda de seu Poder e de alguns cipós.

Após prendermos todas as criaturas, nos posicionamos em duplas para vigiá-las e Cristian passou a interrogar uma por uma. Perguntava por que tinham nos atacado, ao que todos responderam dizendo que invadimos o território deles, e perguntava também se haviam visto algum vampiro passar por ali há alguns dias, o que eles responderam com um mal-humorado "NÃO".

Senti meus ombros desabarem e comecei a ficar apreensiva. Cristian suspirou pesadamente, parecia irritado. Dahlie se aproximou dele e o abraçou com delicadeza. Zein percebeu que não estava muito bem e se aproximou mais de mim. Lewis tornou a perguntar coisas para os Trolls, que continuaram a responder rabugentos que não sabiam de nada e que não viram ninguém. Dahlie também tentou arrancar alguma informação deles, mas não conseguiu nada além de uma cantada horrível que irritou Cristian.

- Se seu amigo estar mesmo por aqui, já dever ter virado patê vampiro. - Um dos Trolls falou com sua voz grave e cavernosa, me observando com um sorriso podre e maldoso. Seu vocabulário deixava muito a desejar. - Querer saber? Vampiro merecer virar jantar!

As cinco criaturas começaram a rir e com isso seus corpos se agitaram. Noah teve que dobrar as forças para mantê-los presos e raciocinei que não aguentaria isso por muito mais tempo. O riso das criaturas criou uma espécie de chama em mim e senti meu sangue ferver. Quando gritei para que calassem a boca, não percebi que estava gritando. Um vento forte balançou as copas das árvores e todos ficaram imóveis, me observando. Quatro dos Trolls pararam de rir, exceto o que estava bem na minha frente, o que fez a brincadeira.

- Eu não estou brincando. - Minha voz estava diferente, parecia ter certo poder nela e era incapaz de controlar minha irritação. - Vou perguntar uma última vez e espero que você fale a verdade. - Encarei o Troll ignorando sua aparência repugnante e falei pausadamente, porém firme. - Você viu um grupo de sete pessoas passar por aqui há uns dias?

- Não ser da sua conta. - O Troll não tirava aquele sorriso nojento do rosto e seus quatro amigos voltaram a gargalhar. A raiva tomou conta de mim, virei o corpo para a direita, estendi um dos braços e lancei o feitiço "Summa Frigore", que congelou por completo o corpo do Troll mais distante. Os outros três, assim como meus amigos, estavam com expressões assustadas, mas o que estava na minha frente parecia não se intimidar. - Trevor não ter medo de bruxinha.

- Não tem medo, é? - Dessa vez virei novamente e lancei um feitiço que nem me lembrava de conhecer "Radius Debilitatio". Um raio dourado disparou da minha mão e outro dos Trolls parou de rir, ficando paralisado com faíscas douradas piscando em seu corpo vez ou outra. Noah agora só precisava segurar três Trolls em cipós, mas mesmo assim resolvi me apressar.

- Se bruxinha matar Trevor, não saber respostas. - O Troll, que agora sabia que, se chamava Trevor, permanecia sorrindo e sua expressão continuava fria.

- É a última vez que vou perguntar, ou você me fala por bem ou vou arrancar as respostas por mal. - Sentia-me cada vez mais irritada e algo me dizia que só conseguiria as respostas se o deixasse com medo. Os dois Trolls restantes que o acompanhavam passaram a gritar e pedir para que dissesse algo logo.

- Trevor não falar. Bruxinha não matar. Não ter coragem. - Trevor parecia estar se divertindo, ria enquanto falava e me analisava de cima a baixo. Zein se aproximou um pouco mais e envolveu minha cintura de lado quando o Troll começou a me analisar. Tentei não dirigir minha irritação a ele, afinal, só estava tentando me proteger. Entretanto, não pude evitar dirigir minha raiva ao Troll, olhei em seus olhos fixamente e deixei que meu rosto parecesse zangado e ameaçador.

- Primeiro: não sou uma bruxa. Segundo: sou perfeitamente capaz de matar através da minha Lembrança Guerreira. - Deixei que absorvesse minhas palavras e continuei. - Agora diga logo o quero saber. Sinto que você sabe onde meu amigo está e tenho certeza de que está vivo. Caso ainda se recuse... Factus Est Ignis! - Conjurei uma espada de fogo e ouvi gritos abafados vindos de meus amigos. Os outros dois Trolls pareceram assustados quando os vi pelo canto do olho. Voltei a fitar os olhos escuros do Troll à minha frente. - Eu arrancarei as respostas.

- Tentar arrancar. - Trevor continuava com o sorriso no rosto, mas pude ver em seus olhos que estava com medo. Não sabia mais o que fazer, não pretendia machucá-lo. Então, outro feitiço me veio à mente e soube como continuar o interrogatório.

- Lectio Animae! - Com esse feitiço seria capaz de ler sua alma e assim descobrir as respostas de que precisava.

Fiquei extremamente aliviada quando encontrei o que procurava, porém, essa sensação durou pouco. Ethan estava deitado num monte de palha, em uma espécie de cabana feita em uma dessas árvores com galhos que iam até o chão. Ao contrário do chão molhado e enlameado, o lugar onde estava tinha uma terra escura e seca para pisar. Estava um pouco escuro, mas vi que estava desacordado e tinha no rosto uma expressão de dor. Um lençol que parecia ter sido feito com sacos velhos de batata cobria seu corpo até o pescoço e sua pele estava mais branca que nunca.

Não percebi que havia fechado os olhos, mas quando os abri novamente me senti tonta e procurei apoio. Zein me segurou pela cintura com cuidado, apoiando meu corpo no seu. Lancei um olhar rápido para Trevor e notei que estava desacordado, mas sua ajuda não era mais necessária. Sabia como chegar onde Ethan estava e faria isso assim que me recuperasse da tontura. A espada de fogo havia sumido e a noite começara a cair. Precisávamos sair dali e seguir adiante.

- Alessia! Ela está bem? - Lewis se aproximou rapidamente. Não percebi quando Zein me tomara nos braços, após pegar de volta o medalhão que estava comigo.

- Não se preocupe. - Ivy estava ao lado de Lewis e sorri ao perceber que me observava com orgulho. - Só gastou energia demais com esses feitiços todos.

- Precisamos seguir em frente. - Ouvi minha voz e apoiei a cabeça no peito de Zein, ainda conseguindo me manter acordada, mas me sentia exausta. - Sei para onde ir.

- Tudo bem. Concordo que não podemos ficar aqui. - Ivy começou a reunir os demais antes que Zein e Lewis pudessem protestar. Noah soltou os Trolls que restaram e ambos pareceram assustados demais para atacar. Fugiram, deixando os companheiros ali. Noah também havia gasto muita energia e, por isso, Ruy se ofereceu para levá-lo nas costas durante o restante do caminho, até que conseguisse andar com as próprias pernas.

Detinha todas as informações e fui guiando nosso caminho até um conjunto de árvores ocas, grandes o suficiente para servirem de cabanas e que ficavam próximas de onde Ethan estava sendo guardado. Sabia que haveria mais quatro Trolls cuidando da pequena aldeia de onde aqueles cinco que nos atacaram vieram. Sabia que três estavam incapacitados e não voltariam. De alguma forma também sabia que os dois que fugiram não iriam chegar à aldeia, porque não conheciam o caminho de volta. Trevor era o único daquele grupo que sabia o caminho, pois era o líder deles. Naquela aldeia também havia mais seis Trolls, no entanto, estes estavam trabalhando longe dali e não voltariam a tempo de pegar nosso ataque.

Dividimos o grupo para as duas árvores mais limpas. O chão já era feito da mesma terra de onde Ethan estava e, tirando o cheiro ruim, dava para dormir com certo conforto. Zein se ofereceu para fazer a vigília esta noite, mas Lewis disse que faria a vigília e que poderia ficar comigo. Não sei porque estavam pensando que precisava de proteção mesmo depois do ataque de fúria que tive com os Trolls. Talvez tivessem medo que tivesse usado poder demais e estivesse fraca até para me mover.

Na árvore onde estava ficaram Zein, Dahlie e Cristian e o casal não parava de dizer o quanto estavam impressionados com meu desempenho. Dahlie admitiu que nem ela sabia usar aquele último feitiço que conjurei e Cristian ficou elogiando a perfeição e a precisão de meus ataques à distância. Quando Dahlie tornou a falar da espada de fogo, pedi desculpas, me virei para ficar de frente para Zein, e assim, de costas para eles, desejei um boa noite a todos e adormeci instantaneamente. Não sei se meu cérebro já sabia que encontraria Ethan no dia seguinte, mas dessa vez não sonhei com ele.

...

Como havia lido a mente do líder dos Trolls, sabia perfeitamente onde os outros estariam quando chegássemos à aldeia, se é que poderíamos chamar aquilo de aldeia. Havia uma espécie de clareira em forma de um círculo perfeito e em cada uma das árvores da beirada havia uma espécie de cabana formada pelos galhos da copa das árvores, que se dobravam até quase atingir o chão, assim como as árvores que encontramos antes de Trevor e os outros quatro Trolls nos atacarem.

Neutralizamos os que estavam protegendo as moradias e descobri que o prisioneiro, de acordo com o que havia entendido, viraria jantar essa noite, já que a carne finalmente estava bem batida. Fiquei pensando o que isso queria dizer, mas quando finalmente encontrei Ethan não pude acreditar que estava num estado tão lastimável.

Não havia ossos quebrados, já que os ossos dos vampiros são muito mais fortes que os das demais criaturas, mas havia manchas roxas, vermelhas e esverdeadas espalhadas pela parte da pele que estava descoberta, longe daquele lençol sujo e áspero. Também havia alguns cortes em seus bíceps e tórax. Não pude evitar sentir náuseas, quando o odor de sangue misturado ao cheiro de podridão do lugar alcançou minhas narinas, já sensíveis há muito tempo.

Mesmo assim quis me aproximar, precisava ter certeza de que estava vivo e não sonhar à noite passada me fez ter um mau pressentimento. Lewis e Zein não me deixaram chegar tão perto quanto queria, mas me asseguraram de que estava respirando e que ainda tinha certa quantidade de sangue em seu corpo para que sobrevivesse por mais uns dois dias.

Isso me desesperou ao invés de me acalmar e só sosseguei quando prometeram que me deixariam lhe doar sangue, assim que nos afastássemos da aldeia Troll. Ethan não acordava e foi necessário improvisar uma maca e usar magia para carregá-lo pela floresta conosco. Ivy sabia para que lado ir e deixamos que nos guiasse. Lewis seguia logo atrás dela, Dahlie e Cristian iam na sequência, seguidos por Ruy e Julie. Por fim, eu, Zein e Noah, que sustentava a magia que levava Ethan.

Fiquei razoavelmente feliz quando nos afastamos do pântano escuro e malcheiroso e as árvores voltaram a ter copas verdes e exalar ar puro e fresco. Paramos com o cair da noite e Ruy encontrou um pequeno lago onde poderíamos nos lavar, já que ainda estávamos completamente sujos de lama e seja lá mais o que havia naquela água do pântano.

Se não estivesse tão preocupada com Ethan, teria sentido mais o que aquela água havia feito com meu corpo e meu cabelo. Minha pele estava ressecada e com cheiro ruim, meu cabelo estava duro e embaraçado e nem quis me aventurar a tentar sentir o cheiro do que mais parecia um ninho de ratos.

Dahlie e Julie me acompanharam até a lagoa. Fomos escolhidas para ir primeiro porque havíamos caído mais vezes que os demais e a lama parecia estar mais incrustada em nós, mesmo com a chuva que tomamos ao caminhar no dia anterior. Talvez fosse porque a lama era mágica.

A luz da lua era suficiente para iluminar as águas do pequeno lago e isso o fazia parecer etéreo. A água era fria, mas isso era reconfortante já que o tempo se aqueceu ainda mais e o ar se tornou mais seco desde que saímos do pântano. As árvores no entorno do lago eram pequenas em comparação com as demais e estavam todas floridas, cada uma com uma cor diferente. Parecia um arco-íris florido e.... Brilhante?

Enquanto esfregava meus braços e mal notava a lama saindo quase instantaneamente, pude perceber também que as flores nas copas das árvores começaram a brilhar e não era possível que fosse só por causa da lua. Chamei a atenção de Dahlie e Julie, mas não perceberam até que algumas das flores começaram a crescer tanto que fecharam as passagens entre as árvores, nos trancando na lagoa. Estava em choque e não conseguia raciocinar como aquelas flores podiam crescer tanto, até que uma vozinha, como o tilintar de sinos, alcançou meus ouvidos e perguntou quem éramos nós.

Ouvi Dahlie sussurrar alguma coisa e sorrir observando as flores. Julie parecia um pouco desconfortável e meu cérebro finalmente processou que aquela vozinha pertencia a uma fada. Ouvi Dahlie dizer, ao se aproximar de mim, que provavelmente estávamos em um lago de fadas.

- Sinto muito por invadir e sujar seu lago. - Disse depois de limpar a garganta e ter certeza de que conseguiria falar. - Nosso grupo foi atacado pelos Trolls e estamos a quase dois dias fugindo do pântano deles. Precisávamos urgentemente nos lavar.

A fada, que parecia mais uma borboletinha brilhante, cresceu com uma explosão de luz e se mostrou com um tamanho proporcional ao nosso. Tinha as asas verdes e um vestido longo da mesma cor, que parecia ser feito com folhas da primavera e várias flores brancas semelhantes à rosas e cravos. Seus pés estavam descalços e seus cabelos longos e ondulados reluziam em um tom dourado em sua cabeça, dando uma aparência deslumbrante. O rosto da fada era delicado, sua pele era levemente esverdeada e seus olhos, em um tom de verde mais escuro, pareciam sorrir enquanto falava conosco.

- Está tudo bem. Não se preocupem com a água. Ela se limpa sozinha, podem continuar. Sou Flora, uma fada das flores e a atual Princesa das Fadas. Prazer em conhecê-las.

- Ah! Sou Alessia, esta é Julie, uma ninfa e aquela é Dahlie, a líder espiritual dos druidas e uma das fundadoras de Fantasy. - Abri um sorriso e minhas amigas cumprimentaram a fada, que não parecia surpresa pela presença de Dahlie.

- Ficamos sabendo que um grupo se aventuraria por Fantasy para tentar salvar o reino da tirania de Leslie. Creio que sejam os líderes da suposta rebelião. Outro grupo passou por aqui também. Estavam procurando a aldeia dos elfos e se perderam. Indiquei o caminho a eles, mas antes me contaram seus objetivos por aqui e nos convidaram para participar da rebelião. - A fada estava sentada na margem do lago enquanto terminávamos de nos lavar.

- E o que vocês disseram? - Dahlie parecia hesitante ao dizer isso e Julie ainda parecia nervosa na presença da fada. Lembrei-me vagamente sobre uma aula que tive no castelo que dizia que fadas e ninfas se tornaram inimigas por motivos territoriais.

- Muitas fadas partiram com eles, mas eu e algumas de minhas irmãs preferimos ficar. Vocês os conhecem? - Flora parecia curiosa.

- Sim. Nosso grupo se dividiu, mas nossa missão é a mesma. Eles pretendem fazer algum tipo de guerra convocando a população? - Dahlie estava completamente absorta na conversa e se secava na margem, com uma das toalhas que pegamos nas mochilas mágicas.

- Creio que sim. Havia dez Trolls com eles e daqui foram cerca de quinze fadas para ajudar na luta contra Leslie. - Flora parecia calma, mas notei algo sombrio em seu olhar. Provavelmente estava preocupada com suas irmãs que acompanharam Leon e os demais.

Terminamos todas de nos lavar e avisamos Flora que mais de nossos amigos viriam se limpar ali também. Assentiu com um sorriso leve e liberou a passagem fazendo as flores ficarem pequenas e normais novamente. Pedi à Flora para que me deixasse levar um pouco da água, já que um de nossos amigos estava ferido e não poderia vir até ali para se lavar. Ela permitiu e ainda me deu um recipiente para levar a água, que parecia mais uma enorme flor copo de leite, entalhada em prata. Não era pesada e provavelmente era mágica.

Dahlie, Julie e eu nos despedimos e retornamos ao nosso improvisado acampamento. Avisamos nossos amigos sobre o lago pertencer às fadas e explicamos que Flora permitiu que nos lavássemos lá. Estendemos nossos sacos de dormir por sobre a grama macia e passamos a observar as árvores, enquanto Ruy e Cristian se revezavam na vigília e os outros se alternavam para tomar banho no lago. Cristian se ofereceu antes para limpar Ethan e os seus machucados e tentar vestir alguma coisa nele para que pudesse se livrar daquele lençol horrível. Estava apenas aguardando Cristian terminar para ir até ele e doar a quantidade de sangue de que precisasse para se recuperar e, no mínimo, abrir os olhos.

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