Capítulo 2
Cristian, Lewis e eu seguimos viagem após os outros terem montado uma espécie de acampamento. Em minha forma transcendental, o ar não parecia mais escasso e o calor do chão não era mais algo forte, já que não o tocava diretamente. O vento ainda soprava gélido, mas isso não me incomodava, já que não sentia frio. Era até agradável.
Flutuando, conseguimos avançar ainda mais rápido e mal notei quando ruínas começaram a fazer parte da paisagem. O chão parecia coberto por uma areia cinza, talvez fuligem. Havia pedras cinzas repletas de musgo espalhadas por todo o canto, alguns agrupamentos pareciam indicar que anteriormente aquilo teria sido uma parede ou algo do tipo.
Conforme avançávamos minha visão era capaz de identificar, vez ou outra, alguns vultos brancos que passavam em uma velocidade acima do normal de um monte de pedras ao outro. Estranhamente, não tinha medo, pois minha consciência dizia que se eu era um fantasma não tinha como esses vultos me machucarem.
Depois de alguns minutos flutuando pude avistar uma ruína maior que as demais e concluí que aquilo foi parte de um castelo. Estava até bem conservado em comparação às demais construções. Lewis e Cristian deram uma pausa e se voltaram para mim, explicando que aquele era o Castelo da Ruína, provavelmente onde Zein deveria estar no momento, de acordo com os meus sonhos.
Apesar de acreditar que espíritos não possuíam coração em sua forma transcendental, senti uma palpitação do lado esquerdo do peito e deduzi que deveria ser meu coração físico se acelerando. Atravessamos o restante da distância até o castelo e a paisagem não mudou muito. Paramos em frente a um enorme portal selado por grandes e grossas barras de ferro enferrujado.
- Como vamos fazer para entrar? - Analisei as possibilidades que surgiam em minha mente. Notei que Lewis e Cristian se entreolharam antes de responder.
- Podemos atravessar objetos sólidos. - Lewis disse por fim e sorriu para tentar conter o riso. - Tente apenas fechar os olhos e atravessar.
Obedeci suas instruções, me sentindo completamente idiota, e não me surpreendi quando consegui atravessar as grades maciças, senti apenas um arrepio percorrer meu corpo e ao abrir os olhos outra vez, estava do outro lado.
- Isso é engraçado. - Sorri enquanto seguia Lewis e Cristian pelos corredores obscuros e frios do castelo em ruínas. Era completamente diferente dos castelos de Fantasy e Magic: enquanto este era vazio e triste, os outros pareciam alegres e eram bem decorados.
- O que é engraçado? - Lewis diminuiu sua velocidade para me acompanhar.
- Atravessar as grades. Não há ninguém aqui?
- Estão nos observando sem aparecer, Alessia. - Estava com uma expressão sombria.
- Por quê? - Senti meu coração palpitar mais rápido e de repente aquela segurança toda que sentia se esvaiu.
- Estão nos analisando. - Cristian diminuiu seu ritmo também e passou a flutuar do meu outro lado, fazendo com que ficasse entre os dois.
Os momentos seguintes foram longos minutos de tensão e apesar de no início não ter notado as figuras que nos observavam, agora podia até senti-las ao nosso redor. Continuamos a flutuar pelos corredores e me perguntei se Lewis ou Cristian saberiam para onde estávamos indo. Diversos pensamentos passavam pela minha cabeça com uma frequência assustadora, no entanto, o pensamento que sempre persistia era o que me fazia procurar Zein entre as figuras que nos observavam.
- Olá. Posso ajudá-los? - A voz doce de uma mulher nos alcançou antes mesmo de vermos a figura que apareceu na nossa frente.
Era uma mulher com a minha altura, cabelos longos ondulados e olhos acinzentados que transmitiam certa tristeza ou talvez cansaço. Sua pele era branca e quase completamente transparente, suas vestes eram compostas por uma comprida saia cor de pérola e uma blusa de mangas bufantes com a mesma cor da saia.
Toda a sua imagem me fazia pensar que fosse uma espécie de espírito, o que de fato era. Realmente passava a impressão certa sobre a espécie a qual pertencia, mas pensando bem..., todas as figuras que apareceram até agora transmitiam muito bem a ideia de fantasma. Apenas Lewis e Cristian pareciam mais carnais que esses outros, talvez por terem medalhões....
- Nós chegamos agora... estamos procurando uma pessoa. É a Senhora que... ahn... comanda aqui? - Observei os rostos ao nosso redor e, por fim, voltei a encarar a mulher.
- É perceptível que são novatos. - Nos olhou de cima a baixo com uma expressão de desaprovação. - Sou uma das supervisoras que toma conta do local. Por que estão procurando alguém daqui? Nesse lugar há apenas almas tentando encontrar a redenção.
- Não quer saber nem quem estamos procurando? - Ouvi minha voz soar indignada, sem ter consciência de que estava dizendo alguma coisa.
- De qualquer forma, não poderei ajudá-los. Você acha que conheço todas as almas que estão aqui? - A mulher riu ironicamente. - Diga o motivo que os leva a procurar tal pessoa e talvez permita que a encontrem.
Encarei a mulher por um longo tempo. As figuras ao nosso redor pareciam ansiosas para ouvir minha resposta, talvez tivessem esperança de que estivéssemos ali para buscar algum deles. A expressão da mulher variou de impaciência à irritação e ainda não sabia o que dizer. Busquei ajuda lançando olhares de súplica ao Lewis e ao Cristian, que entenderam o meu sinal imediatamente.
- Há uma pessoa aqui que nos deve algumas explicações... - Lewis começou a falar, mas Cristian o cortou com um tom de voz sério e poderoso.
- Você vai nos deixar continuar se não quiser problemas, por acaso não está me reconhecendo Lúcia?
- Não. Quem seria você? É bom que seja alguém importante, estou quase chamando os fantasmas da guarda para retirá-los daqui. - A mulher lançou a Cristian um olhar frio.
- Sou Cristian, o Líder dos Fantasmas e um dos fundadores dos três reinos mágicos. - Assim que Cristian falou, as figuras ao nosso redor desapareceram por algum motivo, fugindo assustadas. E Lúcia finalmente alterou sua expressão de pedra para algo entre surpresa, confusão e medo.
- Você está morto! Todos estavam mortos! - Lúcia gaguejava e negava com a cabeça. - A última fundadora chegou não faz nem um ano...!
- Acontece que Antonieta mentiu para vocês. Os fundadores estão todos vivos e abrigados em Magic. Com exceção de mim, Dahlie e Leon, que estamos aqui em missão para salvar o mundo mágico do poder e da ambição de Leslie, a atual rainha de vocês. - A voz de Cristian soava segura e poderosa. Acho que se estivesse no lugar de Lúcia já teria me desculpado e saído correndo, ou flutuando.
- Pode me dar um minuto? Vou conferir se o que está dizendo é verdade. - Lúcia se aproximou e Cristian deu alguns passos à frente.
Ele parou e endireitou a postura, ergueu a cabeça e olhou a mulher de igual para igual. Ela não pareceu se importar com isso e começou a fazer a tal análise. Nenhum dos dois se mexia ou desviava o olhar, pareciam estar se comunicando telepaticamente ou fazendo um jogo de quem fica mais tempo sem piscar. Provavelmente a primeira alternativa era a correta.
Lewis sussurrou em meu ouvido, explicando que ela estava usando suas habilidades para ler a mente dele e descobrir se tudo o que dizia era verdade. Esperamos por um longo tempo em silêncio enquanto os dois permaneciam imóveis, até que finalmente Lúcia balançou a cabeça e lançou a Cristian um olhar ao mesmo tempo amedrontado e admirado.
- Está bem. Podem continuar. Talvez encontrem essa pessoa em algum dos quartos da antiga masmorra. É lá que guardamos os fantasmas recém-chegados. - E indicou o caminho a seguir. Logo depois desapareceu, entrando pela parede da esquerda.
Enquanto seguíamos até o fim do corredor para encontrar uma pequena porta de madeira descascada, Cristian ia resmungando sobre os fantasmas terem perdido sua postura e seu respeito perante seus superiores. Atravessamos a porta e dessa vez a sensação da travessia durou um pouco mais, Lewis explicou que essa porta era mais grossa e maciça que a outra e por isso tive essa impressão.
Algumas tochas iluminavam vagamente o corredor, que nos fazia descer e descer cada vez mais fundo. As paredes de pedra pareciam agora emitir espécies de ondas de calor e tenho certeza de que se meu corpo fosse sólido já teria morrido desidratada. Até como fantasma podia sentir a sensação quente e abafada desses corredores que pareciam se fechar cada vez mais e nunca ter fim.
Em determinado momento do trajeto, Lewis me perguntou se estava me sentindo bem e só então percebi que olhava as paredes e o teto como se fossem desabar e me esmagar ali mesmo. Os dois riram da minha expressão de terror por um longo trecho, até que comecei a apertar minhas mãos uma na outra e curvar minha coluna até que fiquei mais parecida com o Corcunda de Notre Dame do que com um fantasma.
- Alessia, está tudo bem. Você pode atravessar as paredes lembra? Não tem como te esmagarem. - Lewis falou com um tom de voz ameno, tentando me acalmar.
Tentei me concentrar em suas palavras, mas logo minha mente passou a formular perguntas do tipo: Para que tem paredes aqui se os fantasmas podem atravessá-las? E como eles mantêm os novatos presos se eles podem atravessar as paredes? Pensar sobre esse tipo de coisa me distraiu enquanto avançávamos. Finalmente o corredor parou de afundar e revelou uma grande área plana em forma de semicírculo, que dividia o caminho em três corredores largos e idênticos, com tetos abobadados.
- Algum palpite? - Observei os três corredores, nervosa.
- Não há nenhuma diferença entre eles. São todos iguais. - Cristian avaliou um por um. - Vamos ter que procurar nos três.
- Podemos nos dividir e quem encontrar grita para avisar os demais. - Sugeri. - Tenho certeza que esses corredores produzem eco.
- Você vai ficar bem sozinha? - Lewis veio até mim e analisou meu rosto por um tempo. - Acredito que esses corredores aqui em baixo sejam enfeitiçados para que fantasmas não consigam atravessá-los, do contrário, todos os prisioneiros iriam fugir.
- Acho que estou começando a me acostumar com esse lugar. - Tentei fazê-lo acreditar na minha mentira. - Além do mais, posso levar uma tocha comigo caso o caminho se torne escuro demais.
- Fantasmas não conseguem carregar tochas, Alessia. - Cristian se aproximou mais de nós.
- Ah. Bem... será que eu não consigo? Não sou exatamente um fantasma, não é? - Ponderei a possibilidade para tentar convencê-los.
- Você pode tentar. - Cristian escolheu o túnel do meio e seguiu adiante. - Sua sugestão é a melhor para nos ajudar a poupar tempo. Detesto a maneira como este lugar está agora.
- Qualquer coisa, grite. - Lewis repetiu a mesma coisa mais umas três vezes e depois escolheu o túnel da esquerda, sumindo de vista.
Respirei fundo e tentei manter minha mente concentrada em meu objetivo. Também tentei pegar uma das tochas e não me surpreendi quando consegui erguê-la e levá-la comigo. Confesso que fiquei aliviada por poder levar a tocha comigo, porque os túneis não eram tão iluminados quanto o corredor principal.
Conforme fui flutuando por entre as paredes de pedra, o calor foi aumentando e logo avistei a primeira porta de ferro, completamente fechada, exceto pela pequena janela na altura do meu rosto. A janelinha devia ter uns vinte centímetros de largura por quinze de altura e era parcialmente fechada por grades finas também feitas de ferro. Espiei pela pequena abertura entre as barras e lá dentro avistei um homem que parecia, fisicamente, ser um elfo, embora tivesse as características de um fantasma.
O homem tinha cabelos compridos e escuros presos atrás da cabeça, uma expressão triste e exausta, a pele estava tão clara que era possível ver através dela. Definitivamente era um fantasma. Por que mantinham os recém-chegados presos assim? Eles não deveriam estar tendo outra chance de viver? Isso não poderia ser considerado uma nova vida....
Enquanto minha mente me levava para longe, o homem dentro da cela conseguiu me ver e não percebi quando se aproximou das barras para me observar melhor. Primeiro parecia temeroso e assustado, sua postura estava encolhida e curvada, demonstrando medo. O que será que estava pensando? Pedi desculpas por incomodá-lo e ele pareceu relaxar.
Afastei-me da porta e segui em frente. Pude notar que todas as celas haviam sido decoradas para parecerem quartos simples. Tinham uma cama, um armário pequeno, um lavabo, uma mesa com cadeira repleta de alguns papeis e canetas, uma poltrona e uma estante com alguns poucos livros. Não havia janelas. Já estava ficando cansada de "andar" de porta em porta procurando um rosto familiar, quando, já no final do corredor, encontrei alguém conhecido.
A antiga Rainha dos Vampiros estava com um vestido longo, roxo e desbotado, os cabelos soltos caindo por sobre os ombros e ao longo das costas. Estava sentada na poltrona do quarto lendo um livro grosso de capa vermelha, não consegui ler o título. O quarto estava iluminado por um castiçal de velas, como os demais quartos, mas essa iluminação parecia escassa, já que o quarto estava mergulhado numa atmosfera sombria. Tentei fazer com que não me visse, mas me afastei tarde demais. Num movimento rápido, já estava com o rosto próximo à janela da porta e suas mãos apertavam as barras com força.
- Você! - Sua voz era raivosa e cavernosa. - Por sua culpa estou aqui! - Seu tom de voz ia aumentando conforme falava e isso me causou arrepios. - MENTIROSOS! FALSOS! TODOS VOCÊS SÃO UNS DESGRAÇADOS! ODEIO VOCÊS! VOU TE MATAR, PRINCESINHA DOS REBELDES!
- Está louca... - foi tudo que consegui sussurrar em meio ao meu assombro e incredulidade. Faltavam ainda três portas e senti um enorme aperto em meu coração quando não encontrei Zein em nenhuma delas. Talvez já tivesse sido solto.... Esse pensamento apareceu para me animar, porém algo me dizia que isso não era verdade.
Suspirei ainda ouvindo os gritos enlouquecidos da antiga rainha e os socos que dava, em vão, na porta. Encostei a mão na parede para tomar coragem e voltar pelo enorme corredor, mas meu toque causou alguma espécie de reação e fiquei com medo que tivesse disparado algum tipo de alarme por tocar na parede. Talvez pensassem que fosse uma prisioneira tentando escapar.
Prendi a respiração e não pude evitar ficar imóvel enquanto a parede se movia e revelava uma escadaria de pedra em espiral, que levava para o alto do que deveria ser uma torre. Hesitei por um tempo antes de subir, mas ao constatar que ninguém apareceu para me arrastar para uma cela ou algo do tipo, resolvi seguir em frente. Minha tocha era a única fonte de luz ao longo da escada e depois de vários intermináveis degraus de pedra, finalmente cheguei ao topo, onde havia duas portas.
As portas eram feitas de algum tipo de metal, mas deveriam ter sido pintadas, pois exibiam uma coloração alaranjada diferente da cor do que poderia ser ferrugem. Uma das portas estava completamente fechada e até a janelinha estava coberta por uma espécie de portinhola de ferro.
Segui para a porta seguinte e esta estava com a janelinha aberta. Alguma coisa se revirava em meu peito e imaginei que meu coração estivesse acelerado de novo. Isso com certeza não era um bom sinal. Será que atrás daquela porta havia algum tipo de perigo? Algum criminoso posto em segurança máxima?
Provavelmente o fantasma preso nesse quarto merecia um tratamento especial. O quarto atrás da porta possuía uma cama maior que as demais, com um enxoval bonito de coloração roxa e dourada. A mesa e a cadeira possuíam entalhes mais trabalhados na madeira cor de tabaco. A poltrona parecia ser de couro preto e no chão descansava um tapete com as mesmas cores do enxoval da cama. Na estante havia mais livros que nos demais quartos e na parede havia um espelho que me parecia familiar.... O quarto também tinha uma janela pequena, fechada com barras de ferro como as da porta.
- Quem está aí? - Uma voz ecoou de dentro do quarto e cobri o perímetro que me era visível, tentando encontrar quem disse isso. Alguma coisa estava acontecendo com meu coração, que já não parecia mais apenas uma palpitação, havia se acelerado ainda mais e temi que isso estivesse tentando me indicar algum sinal de perigo.
- Desculpa incomodar. Estou procurando uma pessoa. - Ouvi minha voz, antes mesmo de conseguir me livrar da tremedeira que tomou conta do meu corpo.
- Alessia? - A voz agora se tornava mais conhecida em minha mente e me afastei da janelinha quando uma figura surgiu em meu campo de visão.
- Ai, meu Deus! É você! - Não consegui dizer mais nada e também era incapaz de disfarçar minhas mãos trêmulas.
- Eu não acredito.... Você não estava mentindo. Eu não estava sonhando. - Dizia atônito, com a expressão de assombro dando lugar a um sorriso e olhos marejados. Não sabia que fantasmas podiam chorar, mas percebi que também estava chorando. Minha mente estava confusa e não conseguia pensar com clareza para tentar agir.
Quando finalmente consegui me recuperar, disse que estava ali para tirá-lo dessa suposta prisão e levá-lo comigo numa missão especial que depois contaria. Sua versão fantasma era exatamente a mesma versão que me recordava de quando era um vampiro. Pensei que sua pele estaria transparente, mas não estava e não parecia estar flutuando.
Voltei a me aproximar da janelinha e notei que de seu pescoço pendia uma corrente fina, na extremidade se encontrava um medalhão parecido com o que Lewis usava. Tentou estender a mão além da grade para me tocar, mas algum tipo de feitiço o repeliu e senti um aperto no coração.
Mesmo sabendo que a porta estava enfeitiçada tentei fazer o mesmo e minha surpresa foi que consegui atravessar o braço pela janelinha para tocar o rosto dele. Quando sentiu meu toque, sorriu e apoiou a cabeça em minha mão com os olhos fechados, acariciei seu rosto suavemente até que abriu os olhos novamente e me encarou, confuso.
- Como você consegue atravessar a grade? E por que posso sentir seu toque? Você está transparente. Como chegou aqui? - Sua voz de repente parecia urgente e sua expressão era preocupada.
- Não sei como consegui atravessar a grade. Você pode sentir meu toque porque tenho esse tipo de poder. E não precisa se preocupar, não morri. Estou assim temporariamente. - Tentei tranquilizá-lo da melhor forma possível, mas eu mesma não estava calma. Sentia a necessidade de tirá-lo dali imediatamente e abraçá-lo forte. Lembrei-me da conversa que tive com Undine em Magic e ela tinha razão... estava com saudades e isso só podia significar que o amava de alguma forma.
- Você não vai conseguir me tirar daqui, Alessia. Acreditam que sou uma ameaça em potencial. - Zein tinha agora uma expressão triste e um meio sorriso no rosto. Aos meus olhos, conseguia ser bonito de qualquer maneira e constatar isso estava começando a me deixar sem graça.
Seu cabelo havia crescido um pouco e estava caindo por sobre as orelhas, algumas mechas de cabelo caíam sobre os olhos cor de mel. Seus olhos pareciam cansados, mas agora havia um brilho diferente neles. Não eram como os olhos cinzentos dos demais prisioneiros. Isso me fez questionar o motivo pelo qual os olhos de todos os prisioneiros eram acinzentados e os dele permaneciam da mesma cor. Sua pele permanecia com o mesmo bronzeado suave de antes e seu corpo ainda possuía o físico forte.
- Ameaça? Que tipo de ameaça? - Tentei retirar a mão da janela, mas ele acompanhou meu movimento como se não quisesse que me afastasse. Permaneci na mesma posição.
- Desde o dia em que tentaram me exorcizar e você me salvou, venho ouvindo algumas conversas. Pressentiram meu poder quando cheguei, mas não conseguiram distinguir que tipo de poder possuía. Sabiam que poderia ser uma ameaça e, por isso, me colocaram nesse quarto. Está repleto de feitiços e magias poderosas que me impedem de sair ou usar qualquer tipo de feitiço. Quando você me salvou, acreditaram que aquilo era uma espécie de mensagem dos Poderes, dizendo que estavam fazendo a coisa errada ao tentar me extinguir.
- Mas por que pensaram algo assim?
- Quando você me salvou tudo que pudemos ver foi a sua silhueta. Era apenas uma figura formada por uma luz forte, bonita e poderosa. Li algumas coisas sobre os anjos nos quais os humanos acreditam e acho que você estava parecida com um deles. - Ele sorria e agora colocou a mão sobre a minha, que ainda tocava seu rosto. - Isso assustou os líderes daqui e não tentaram mais me exorcizar. Na verdade, apenas me largaram aqui.
- Ninguém vem aqui? Não te trazem comida? - Fiquei horrorizada, mas sua risada me reconfortou.
- Fantasmas não precisam comer.
- E você ficou sozinho esse tempo todo? - O aperto em meu coração voltara agora e não conseguia suportar a ideia de ficar completamente sozinha por tanto tempo. Ele não parecia triste ao confirmar o que havia dito. - As trevas não tentaram te encontrar? - Sabia que perguntar isso poderia causar alguma reação ruim nele, mas precisava saber.
- Não. Acredito que tenham me abandonado e não compreendo que tipo de poder os líderes daqui acreditam que tenho. - Sua expressão demonstrava certo alívio.
- Vou te tirar daqui. - Falei de repente, após um tempo em silêncio, e me deixou afastar.
Talvez conseguisse abrir a porta. Observei a porta com atenção, mas não localizei nenhuma espécie de fechadura ou maçaneta. Confesso que me senti um pouco decepcionada, mas estava decidida a não desistir. Tomei certa distância e analisei a porta, tentaria passar por ela no estilo dos fantasmas e se não conseguisse... bem, seria constrangedor, mas valeria como tentativa.
Comecei a flutuar em direção a porta e pedi para que Zein se afastasse, cortando sua fala, que perguntava o que estava tentando fazer. Fechei os olhos e esperei o impacto que revelaria meu fracasso, porém, quando abri os olhos e olhei ao meu redor a porta estava aberta e Zein me observava incrédulo.
- Deu certo...? - Sorria como uma boba e sentia meu coração saltitando em meu peito.
- Como você...?
- Não há tempo a perder! Vamos! - Segurei-o pelo braço e percebi que quando o toquei, estremeceu. Infelizmente não pude raciocinar muito sobre essa reação, porque também senti uma espécie de corrente percorrer meu corpo, me fazendo arrepiar. Seria o alarme por libertar um preso? Precisava encontrar o Lewis e o Cristian o mais rápido possível!
Flutuamos para fora do quarto o mais rápido possível e ele parecia não acreditar que havia conseguido sair dali. Acabei largando a tocha no chão em frente à porta do quarto e, por isso, tivemos que descer as escadas no escuro, o que na verdade não foi um problema, já que não tínhamos necessidade de enxergar os degraus.
Chegamos ao corredor com as outras celas e pedi para apenas seguir o mais rápido que pudesse sem se importar com os gritos e resmungos dos demais prisioneiros. No meio do caminho, encontramos Lewis e Cristian, pareciam estar preocupados, mas logo a preocupação sumiu de suas expressões ao ver que havia encontrado Zein e que ainda por cima havia conseguido libertá-lo.
- Pensamos que alguma coisa tivesse acontecido. - Lewis foi o primeiro a falar e agora parecia zangado.
- Por que não nos chamou? - Cristian arqueou a sobrancelha em sinal de desaprovação.
- Acho melhor conversarmos depois, tenho certeza de que se os líderes descobrirem que saí, não vão ficar muito contentes. - Zein se intrometeu na conversa deixando sua voz transparecer urgência.
Lewis e Cristian desistiram de entrar em uma discussão e passaram a nos guiar para longe dali. Voltamos ao corredor que me deixara claustrofóbica, no entanto, dessa vez, não tive tempo de prestar atenção nas paredes e no teto. Tínhamos que ir o mais rápido que conseguíssemos. Cristian seguia na frente, guiando nosso caminho, Zein e eu seguíamos logo atrás e por último estava o Lewis.
Em determinado trecho do extenso corredor que agora nos levava de volta à superfície, me perguntei se não conseguiríamos simplesmente atravessar as paredes e seguir reto até encontrar o ar livre novamente. Achei melhor não dizer nada e apenas obedecer ao caminho pelo qual Cristian nos levava, afinal, deveria saber o que estava fazendo.
- Encontraram a pessoa que... o que ele está fazendo com vocês? - Lúcia nos encontrou no exato momento em que saímos de volta ao corredor principal do castelo. Seu rosto se tornara sombrio e enquanto se preparava para gritar alguma coisa, de repente seu corpo se dissolveu em luz e sumiu. Percebi que o contorno de uma das mãos de Cristian agora assumia um brilho arroxeado e só então processei a cena: havia lançado algum tipo de feitiço na mulher e o pronunciou tão discretamente que mal pude ouvir.
- Diminuam um pouco o ritmo para que não pensem que estamos tentando fugir, mas continuem o mais rápido possível. - Cristian nos instruiu enquanto ele mesmo cumpria o que havia acabado de dizer.
Uma capa seria boa agora, para que não pudessem ver Zein...
No instante que pensei isso notei que o manto que vestia em meu corpo físico não estava comigo ao me transformar em espírito, aliás... minhas roupas normais também haviam mudado. Meus pés estavam descalços, minha calça era branca e larga, usava uma blusa cor de creme com mangas longas e largas no lugar da regata cinza e da calça legging preta de antes da transformação.
Deixei o censo de moda um pouco de lado e voltei a raciocinar. As figuras voltavam a aparecer pelos cantos do castelo, mas sempre se afastavam de nós rapidamente, talvez por medo de Cristian. Saímos sem qualquer dificuldade e lá fora era perceptível o início da noite. Os vultos antes brancos, agora eram escuros e não mais pareciam se esconder ou fugir, se projetavam como se tentassem nos pegar.
Nosso pequeno grupo começou a flutuar tão rápido que poderia dizer que estávamos voando, os vultos pareciam borrões e tentavam ainda mais avidamente nos alcançar. Algumas vezes senti dedos frios e garras arranharem meus braços e pernas. A dor não era terrível, mas era irritante e me fazia ter vontade de parar e matar essas coisas. Um comportamento bem atípico da minha personalidade.
Não sei se Zein percebeu meus olhares raivosos para os borrões ao nosso redor, mas segurou minha mão forte e acelerou ainda mais. Infelizmente, ao tocar minha mão, passava também a sentir os arranhões e os ataques de seja lá o que estava nos atacando. Tentei me livrar da mão dele, mas segurou mais forte. Quando finalmente conseguimos sair do Vale da Morte, aquelas coisas já não nos atacavam mais, nem ao menos nos seguiam e isso foi um alívio. Pudemos diminuir um pouco a velocidade.
- Precisamos chegar ao acampamento. - Lewis tinha uma expressão de cansaço. Fantasmas ficavam cansados? Cristian e Zein tinham a mesma expressão, o que me fez concluir que sim. - Alessia precisa voltar ao seu corpo.
Voltamos a flutuar seguindo a trilha por entre as árvores escuras e ainda mais sinistras por causa do anoitecer. O chão ainda irradiava o calor de quando estava dia e o vento permanecia gelado, embora soprasse com mais força agora. Chegamos ao acampamento no turno de vigia de Ruy e assim que nos viu, pousou para esperar a nossa chegada.
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Aqui está o capítulo 2, espero que estejam gostando da história! A história tem, ao todo, 18 capítulos (se eu não mudar na correção) + um capítulo bônus com as traduções de todos os feitiços usados ao longo da trilogia!
Não tenham medo de comentar. Gosto de saber o que estão achando da história! <3
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