Capítulo 11
Acordei um pouco atordoada por ter dormido tanto. Quando estávamos na floresta, não conseguíamos dormir por tantas horas seguidas. Meu corpo estava mais relaxado do que nos últimos dias e até minha mente havia desacelerado um pouco. Deixei Ethan dormindo e decidi me arrumar o quanto antes.
Vesti outra calça legging preta, uma regata cinza e calcei um dos tênis azuis que havia comprado há tanto tempo. Não estava muito elegante, mas era o melhor que podia ser feito no momento. Amarrei meu cabelo num rabo de cavalo alto, depois, desci para pegar algo para comer na cozinha.
— Alessia, já acordou? — Levei um susto ao virar-me e ver Zein entrando logo atrás de mim.
— É... ahn, acho que sim. — Sorri um pouco sem graça e abri um dos armários, caçando o que comer. — Conseguiu descansar bem?
— Sim, obrigado por perguntar... — percebi pelo canto do olho que se movimentava impaciente. — É verdade que você e o Ethan vão se casar?
— Quem te disse isso? — Virei-me novamente para encará-lo e tinha certeza de que meu rosto estava mais branco do que leite.
— Não interessa... é verdade?
— Ahn.... Bem, sim. Acho que sim. Assim que toda essa loucura acabar. — Encostei-me na bancada da pia e suspirei, fitando o chão. Zein se aproximou devagar e parou logo à minha frente.
— Está feliz com isso?
— Por que não estaria? — Ergui meu olhar para fitar o dele e senti meu coração pular de susto quando passou a se aproximar ainda mais. Engoli em seco e fechei os olhos, com medo do que tentaria fazer, mas apenas me abraçou forte e senti-me uma completa idiota outra vez.
— Parabéns. Fico feliz por você ter encontrado outra pessoa capaz de completar seu coração.
Ele me soltou rapidamente quando outras pessoas começaram a entrar na cozinha em busca de um café da manhã, que descobri ser quase o almoço. Zein saiu da cozinha com uma garrafa do sangue que havia estocado lá e não o vi mais até o momento em que Leon nos convocou para falar com Leslie novamente.
...
— Boa tarde, Alessia. — Leslie sorriu ao me ver. — Como passou a noite?
— Chega de conversa, Leslie. Vamos logo ao que viemos tratar. — Leon interrompeu minha resposta e não sei porque não tive vontade de respondê-lo dessa vez.
— Só vou contar para ela. Quero que os demais saiam da sala.
— Nem pensar! — Ethan se aproximou rápido de mim e me puxou contra si. — Não vamos deixá-la sozinha com você!
— Você só pode ter ficado mais louca do que antes se pensava que aceitaríamos isso! — Zein passou na nossa frente e encarou Leslie com raiva.
— Pelo menos se afastem, então. — E deu de ombros.
— Certo. Eles vão se afastar. — Olhei cada um de meus amigos até que todos assentissem e se afastassem. Apenas Ethan e Zein se recusavam a ficar longe. — Por favor, vocês dois também. Ela não pode me atacar estando presa.
— Nada garante isso! — Ethan estava com os braços cruzados em frente ao corpo.
— Pode muito bem fazer com que a névoa saia da jaula e te ataque. — Zein estava ao meu lado e assumiu uma posição decidida de quem não iria se retirar de onde estava.
— Os rapazes podem ficar com você, Alessia. Não me importo. — Leslie encarou os dois com desdém, depois voltou a olhar para mim. Suspirei cansada e me aproximei de uma vez.
— Diga logo. — Encarei-a fixamente.
— Use seus poderes e leia minha mente.
— O que? Está falando sério?
— Por que diabos não estaria?
— Está bem. — Concentrei-me nas palavras que usei para ler a mente do Troll na floresta e repeti-as, focando toda a minha atenção em Leslie. Não demorou muito para que sua barreira mental cedesse e me deixasse acessar seus pensamentos mais profundos.
Tentei controlar minha respiração e minha própria mente para que me guiasse ao que precisava saber: onde estava a cura de Ária. Primeiro, sua mente me guiou até um poço como o de Magic, mas este parecia abandonado e esquecido em alguma caverna escura e sombria.
Depois, o lugar mudou e parecia que estava debaixo da água, havia várias criaturas marinhas nadando e muitos corais coloridos que compunham o cenário mágico do fundo do oceano.
A terceira imagem a aparecer foi a de um castelo magnífico feito com pedras azuis, corais, conchas e vitrais coloridos. O mais assustador era que o castelo estava submerso. A cena mudou outra vez e me guiou para o interior do castelo submarino, uma luz forte brilhava e me guiava para algum ponto lá dentro. Algo me dizia que a coisa que emitia aquela luz era a cura que tanto procurávamos. Então, tudo acabou e saí da mente dela. Minhas pernas estavam bambas e Ethan imediatamente se adiantou para me segurar.
— Alessia? O que houve? — E me segurou desajeitadamente por debaixo dos braços.
— Você está bem? O que essa coisa fez com você? — Zein se aproximou de nós com uma expressão de raiva misturada à preocupação.
— Estou bem. É só o feitiço que usei. Drenou um pouco da minha energia. — Consegui ficar em pé sobre minhas próprias pernas e logo os demais tornaram a se posicionar em torno da jaula.
— Alessia, diga-me o que você viu. — Leon me encarou com um misto de curiosidade e ressentimento.
— Não adianta você saber, orelhudo. Apenas Alessia, Ivy e Zein poderão seguir nessa jornada. — Leslie riu com desdém e Leon precisou ser detido para não enfiar suas flechas na cabeça dela.
— Do que está falando? — Zein voltou seu olhar para a irmã de Ivy e todos os demais fizeram o mesmo.
— A cura está em Enchantment, mais especificamente no palácio. — O sorriso dela era de triunfo e deleite. — Diga a eles irmãzinha, por que apenas vocês três poderão ir?
— Meu reino foi amaldiçoado pela magia das Sombras. Só entra no palácio quem a possuir em sua alma. — Ivy suspirou e encarou Ethan, como se soubesse o que diria em seguida. — Não, você não vai junto. Precisa ficar aqui e manter o portal seguro para nossa volta. Fique de olho em Leslie por nós.
— Você deve estar tão louca quanto ela se acha mesmo que não vou junto!
— Ethan, por favor. Não vamos demorar, sei onde encontrar a cura. — Virei-me e segurei seu rosto entre minhas mãos para obrigá-lo a me olhar. — Não quero que algo de mau aconteça a você. Se essa tal maldição do reino só vai deixar nós três passarmos, então não quero que mais ninguém vá junto.
— Mas, Alessia... — seu olhar misturava preocupação, incredulidade e desespero. — Como pode me pedir para...
— Não estou te pedindo para me abandonar. Estou pedindo para ficar e cuidar dos demais por mim. — E continuei aos sussurros. — Impeça Leon de cometer qualquer loucura ou injustiça, não parece em seu perfeito estado mental. Talvez seja a raiva que sente por Leslie.
— Está bem, mas tome cuidado, por favor. — E me beijou apaixonadamente, diferente de todas as outras vezes. Agora havia certa urgência e uma pitada de medo por não saber se faria isso novamente. — E você! — Disse apontando para o Zein. — É bom cuidar dela direito!
— Não se preocupe com isso. — Zein assentiu com a expressão mais séria do que nunca.
— Só temos um problema... — comentei antes que todos se dispersassem. — Enchantment fica submerso. Como eu e Ivy vamos respirar lá? Zein é um fantasma, para ele não há problema, mas para nós, sim.
— Posso preparar uma poção para que se transformem em sereias por quarenta e oito horas. — Undine se adiantou e sorriu triunfante.
— E quanto tempo vai demorar para que fique pronta? — Ivy encarou-a, pensativa.
— Se conseguirem encontrar os ingredientes de que preciso ficará pronta na madrugada de amanhã.
— Vou mandar todos que estiverem livres atrás dos ingredientes. — Leon falou antes que Ivy sequer abrisse a boca. — Apenas Alessia, Ivy e Zein poderão descansar essa noite. Os demais ouçam as instruções da criatura e busquem tudo o que pedir.
Ethan não ficou muito contente por não poder ficar comigo essa noite, mas aceitou fazer o que Undine pedisse. Zein, Ivy e eu seguimos para os quartos após a janta e passamos algum tempo reunidos no dormitório de Zein para resolver o que seria útil levarmos conosco.
Voltei ao meu quarto emocionalmente exausta, e agradeci por Ethan não ter podido ficar comigo, apesar de meu coração pesar ao pensar que talvez não conseguisse voltar de Enchantment.... Com certeza, essa tal cura não era algo fácil de se alcançar e haveriam desafios a serem enfrentados.
Ao acordar sozinha na manhã seguinte, quase acreditei que tudo que vivi fora apenas um sonho muito maluco, mas essa ilusão durou pouco quando notei que estava no quarto de um castelo, mais precisamente do castelo de Fantasy.
Levantei-me da cama e espiei a vista lá fora. Ainda era bem cedo e talvez tivesse sido a primeira a acordar.... Ah, não. Esqueci-me de que os outros não dormiram essa noite, pois ficaram ajudando Undine.
Após um banho longo e relaxante, vesti um dos vestidos que encontrei pelo quarto, mesmo que não me lembrasse de tê-lo comprado. Era um vestido longo e branco, estilo idade média, mas nada pomposo, era daqueles mais simples, como os que as camponesas usavam. Calcei uma sapatilha, que também encontrei pelo quarto e desci as escadas até a cozinha, para comer alguma coisa antes de ser mandada para Enchantment.
Encontrei Undine e os demais no salão onde Leslie ainda era mantida prisioneira. Dirigi-me até o caldeirão que foi colocado no centro e espiei lá dentro. Estava cheio pela metade com um líquido gosmento e azul claro. O cheiro também não era dos mais agradáveis, mas nada daquilo se comparava ao cheiro que senti no pântano dos Trolls, então não havia porque reclamar.
— Vamos ter que beber isso? — Senti um nó na garganta ao imaginar aquela coisa sendo empurrada goela abaixo.
Undine riu da minha expressão ao explicar que deveríamos apenas passar aquilo pelas pernas e pescoço pouco antes de entrar no portal. Senti um alívio tão grande que quase dei pulinhos de alegria.
— Espera! Onde fica o portal de Fantasy?
— No poço. Você sabe onde está, Alessia. — Leslie parecia ainda mais maltratada que ontem. Estaria com sede de sangue? Afinal, assumiu o papel da antiga Rainha dos Vampiros. — Siga seus instintos e encontrará o poço.
— Certo. Então... Ivy, Zein, venham comigo, por favor. — Dirigi meu olhar aos dois e Undine me deteve pelo braço.
— Acalme-se. Ainda precisam pegar os frascos com a poção. — E me entregou dois frascos azuis compridos e repletos daquela gosma.
— Precisamos passar na pele ou nas roupas serve?
— Precisa entrar em contato com a pele de vocês, peça para o garoto fantasma virar de costas enquanto passam. — E arqueou a sobrancelha enquanto lançava a Zein um olhar de "é bom você fazer o que mandarem".
Ele assentiu rapidamente assim que Ethan entendeu o que ela quis dizer e passou a observá-lo da mesma forma. Decidi me despedir dele antes de partir, mesmo que não fosse exatamente uma despedida.
— Promete que vai tomar cuidado, não é? — E segurou meu rosto com um pouco mais de força que o necessário, encarando meus olhos fixamente. — Promete?
— Vou tentar.
— Prometa!
— Eu prometo. — E o abracei o mais forte que meus braços aguentaram.
Depois, nos separou um pouco e me beijou rapidamente, já que todos estavam observando. Afastei-me com o rosto corado pela demonstração de carinho em público e ignorei o olhar de desprezo de Leon. Segui com Ivy e Zein até onde meus instintos me diziam ser uma das passagens que levaria aos calabouços esquecidos do castelo.
Algo me dizia que teríamos que andar por corredores nada agradáveis até chegar ao nosso destino. Zein levava a mochila que planejamos na noite anterior, enquanto Ivy e eu levávamos bolsas menores, penduradas transversalmente.
— Tem certeza de para onde estamos indo, Alessia? — Zein tocou de leve meu cotovelo, o que me fez parar por um instante no meio de um dos corredores cinzentos e claustrofóbicos do subsolo.
— Sim. Leslie mandou seguir os meus instintos e é isso que estou fazendo.
Desviei de seu toque e continuei a andar, ansiosa para sair logo em um corredor maior e mais largo, de preferência com portas e janelas. Quando pensei que ia acabar desmaiando por falta de ar, finalmente encontramos a porta que nos levaria de uma vez à espécie de gruta onde estava escondido o portal.
— Ah! Finalmente! — Já sentia meu corpo suado e sabia que não era pelo esforço, mas pela claustrofobia que desenvolvi em algum momento dessa longa jornada. — Ali está o poço. Ivy, precisamos rodeá-lo fazendo um triângulo após passar o líquido e não podemos demorar, pois assim que nos transformarmos precisaremos de água para respirar.
— Afirmativo, comandante! — Ivy riu ao me cumprimentar com uma saudação típica do exército do meu mundo e Zein nos encarou como se fôssemos duas malucas. — Zein, pode virar de costas, por favor?
— Tenho uma ideia melhor, Ivy. — Sorri e pedi para as Sombras fazerem uma espécie de cortina de fumaça, assim não conseguiria nos ver.
— Ótima ideia.
— Eu não achei! Não confia em mim, Alessia? — E pareceu bem ofendido ao dizer isso. Senti uma leve pontada de culpa, mas agora que já estava feito não iria pedir para que desmanchassem outra vez.
A poção de Undine mais parecia uma daquelas pomadas para relaxar musculatura. Assim que entrava em contado com sua pele fazia-a formigar, como se milhões de agulhas pontudas estivessem pinicando aquela região. Ivy e eu tornamos a nos vestir e as Sombras desfizeram a cortina de fumaça, em seguida, nos aproximamos do poço e o rodeamos um pouco até termos a certeza de que não era algum tipo de armadilha. Ivy até lançou alguns feitiços para testá-lo antes de usarmos.
— Aparentemente, não há nada aqui... — disse após o terceiro feitiço que novamente não acusou nada de anormal.
— Então vamos logo. Não temos tempo a perder.
Formamos um triângulo em torno da boca circular do poço, depois fechamos os olhos e passamos os três juntos a recitar um feitiço diferente do que usamos em Magic para chegar a Fantasy.
Leslie havia explicado que como não transportaríamos muita gente a quantidade de sangue que ela própria havia despejado ali ao longo dos anos ao lado da antiga rainha já seria suficiente. Também nos ensinou esse novo feitiço para que não desperdiçássemos energia ao conjurar o outro, que abrangeria uma área bem maior e menos necessária.
"Antiquis magicae
Faed per sanguinem
Pure matrix copiose flunt vires
Sippeing nunc
Terna educun paria clausis oculis
Teres tacito pectore
Trium fortes animas
Ad ultimum destinatio munere!"
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