Capítulo 20

- E você acha que sua atitude foi certa!?

- Não, mas eu não queria ver a reação do Paulo! Eu não suportaria vê-lo triste! - Denise fechou o rosto em uma expressão dolorosa - Isso iria acabar comigo!

- Então, fez tudo apenas pensando em você!? - falávamos sobre a atitude nada gentil dela em mentir para Paulo. Estávamos em meu quarto, quando disse que precisava conversar com ela e Gabriel, Denise pediu que fossem individualmente, me contou que Gabriel tinha ciúmes de Paulo e não queria que ele a ouvisse falar do amigo.

- Não!

- Sim. Ou acha que só porque você não o viu chorar ele não sofreu!?

- Agatha, eu…

- Quero que saiba que nossa conversa não tem o objetivo de te convencer a largar o Gabriel e correr para os braços do Paulo! Eu só quero que você entenda que por mais difícil que seja a situação você precisa encará-la com sinceridade!  - toquei o ombro de Denise fazendo-a me encarar - Percebe que com essa atitude, você perdeu a amizade do Paulo!?

- Sim… como eu disse, ele tem se mantido distante! - lágrimas dançaram pelo rosto de Denise, que tentou secá-las em vão. - E eu sei que mereço!

- Peça perdão a ele!

- Eu penso nisso à todo momento! - ela fungou. - Acha que ele me perdoaria!?

- Claro que sim! - sorri - Mas, não pense que terá a amizade dele de volta! Pelo menos, não como antes!

- Porque as coisas tem que ser assim!?

- Você escolheu que fossem assim. - suspirei - Mas, não se preocupe, depois do perdão, melhora! Só não repita tal atitude!

- Não mesmo! - Denise forçou um sorriso.

- Lembre-se o que a Bíblia diz sobre sinceridade: “A justiça do sincero endireitará o seu caminho, mas o perverso pela sua falsidade cairá” - recitei o versículo cinco do capítulo onze de Provérbios - Ou seja, quando deixamos de lado a honestidade abrimos caminho para inúmeros males em nossas vidas! São problemas atrás de problemas.

- Eu não quero ter mais problemas por esta atitude mal pensada! - Denise fixou o olhar nos pés por alguns segundos e depois voltou a me encarar - Vou falar com Paulo e depois com o Gabriel.

- Feche os olhos! - a abracei - Vamos fazer uma oração.

Era evidente o arrependimento de Denise, mas ela não sabia como agir. Estava confusa e até confessou que não tinha certeza, nem mesmo, se levaria adiante a relação “enrolada” com Gabriel. Meu conselho não foi que ela o deixasse por deixar, mas que eles conversassem, afinal, a pouca idade, a forma como tudo começou e o título dado aquela relação já era uma baita confusão!

Não consegui falar com Gabriel naquele dia, ele estava fugindo, era óbvio que já deduzia o motivo de nossa conversa e que o arrependimento ainda não havia chegado ao coração dele, diferente de Denise.

Já era quase dezoito horas quando Luna entrou em meu quarto às pressas:

- Ele apareceu! - ela falou rápido demais fazendo-me pular da cama e deixar de lado a leitura que fazia de um livro da bíblia - Veio buscar o carro.

Luna estava arrumada para ir a igreja e mesmo calçando uma sandália de salto alto correu mais rápido do que eu até o andar de baixo.

- Você não vai falar com ele, vai!? - Edu entrou em minha frente antes de eu alcançar a porta, a resposta devia estar estampada em minhas expressões faciais - Agatha, você tem que aprender que nem todas as pessoas tem um bom coração como o seu!

Luna já estava na rua, eu encarava Edu a ponto de empurrá-lo porta a fora junto comigo. Eu sabia que ele não fazia aquilo por mal, seu rosto ainda marcado pela violência do dia anterior explicava tudo!

- Eu só quero saber como ele está! - toquei os braços de Edu - Tenho certeza que ficará tudo bem!

- Ok - Edu bufou - Mas se ele tiver algum comportamento que se assemelhe ao de ontem, chamarei a polícia sem pensar duas vezes!

Luna estava em frente ao portão, olhava na direção em que o carro havia ficado. Quando pisei na calçada Anderson já se despedia de Antônio, o vizinho. Apesar de ter se passado quase vinte quatro horas do abandono do carro, ele não havia chamado o guincho.

Anderson deu uma volta no carro, fixou o olhar em seu  interior,  algo o fez bater a mão na testa, como uma autorepreensão.

Comecei a caminhar em sua direção involuntariamente, percebi segundos depois quando Luna disse:

- Se precisar é só dar um grito! - virei-me para encará-la - Estarei na janela.

Em um movimento de cabeça agradeci e voltei a caminhar na direção do carro mal estacionado. Anderson percebeu minha aproximação e passou a caminhar em minha direção, sua mão direita estava enfaixada, pela primeira vez o via com o cabelo sem máscara fixadora - naturalmente bagunçado - e vestindo moletom. Um sorriso torto se formou nos lábios dele, não o de sempre, havia algo em suas expressões que não soube decifrar de imediato, era como se ele reprimisse algo em si.

Foi rápido, seus passos largos me alcançaram e então ele me abraçou, seu corpo se sacudiu percebi que ele estava chorando quando seus braços se apertaram a minha volta.

- Eu.. - Anderson tentou falar, mas foi interrompido pelo próprio choro. Ficamos por mais um tempo abraçados até que senti que ele estava preparado para me encarar.

- Está tudo bem!? - foquei nos olhos molhados pelas lágrimas - Por onde esteve!?

- Eu não sei por onde começar… - Em vão tentou secar algumas lágrimas - Perdão por ontem! Eu.. errei feio!

- Já está perdoado! Mas, nunca mais toque em mim ou em meu irmão daquela forma! - sorri - Fiquei preocupada! Por onde andou!? E Como está sua mão?

- Estive perdido pelo caminho… - Anderson curvou a cabeça limpando algumas lágrimas teimosas - Um bom samaritano me encontrou e cuidou de mim.

Abri um largo sorriso observando a rua em nossa volta, estava tranquila para um domingo, talvez por causa do frio. No entanto, lá estava eu com moletom e pés descalços no asfalto. Quando Luna avisou-me sobre Anderson não pensei em mais nada à não ser vê-lo e saber como ele estava.

- Porque está rindo!? - a expressão confusa de Anderson fez-me sorrir ainda mais.

- Porque foi exatamente o que pedi a Deus em uma curta oração ontem! - suspirei - Que um bom samaritano cuidasse de você! E mais uma vez Ele me ouviu, Deus é perfeito.

- Você tem que parar de fazer isso...- Anderson fez menção de tocar meu rosto, mas por algum motivo desistiu - Eu não mereço.

Não soube o que dizer naquele momento, um silêncio pairou entre nós, nos olhamos por um tempo, Anderson não parecia desconfortável com a situação, eu também não me incomodei. Fitei o céu já completamente escuro.

- Sua mão ficou muito machucada?

- Apenas dois​ ou três pontos….  - Anderson deu de ombros - Talvez, quatro! - completou soltando​ aquela famosa piscadela, sorri.

- Guardei​ suas coisas lá em casa, incluindo o dvd.

- E eu achando que havia sido roubado! - Anderson levou as mãos à nuca e depois sentou-se​ na calçada,  o segui e sentei-me ao seu lado - Ufa! Que alívio.

- Parece que tem algo que você não me contou… - falei observando cada detalhe no asfalto, rachaduras e pequenas formigas andando entre elas. - Ou estou enganada!?

- Eu não queria te ver hoje... - Anderson começou a falar,  continuei com​ os olhos fixos no asfalto - Queria me preparar para te pedir perdão, mas foi mais fácil do que imaginei! Chorar em sua frente não me deixou constrangido, pelo contrário, foi como se eu tivesse lavado a alma… posso respirar outra vez.

Sorri, dessa vez virando levemente a cabeça para fitar os olhos castanhos me observando.

- Estive em uma igreja hoje e veja só que coincidência - a ênfase na palavra coincidência revelava a leve ironia - O pastor falou sobre o filho pródigo e a mulher adúltera, sabe qual a relação entre esses dois!?

- Posso imaginar.

- Os dois mereciam a morte segundo a lei, mas foram perdoados com graça e amor… Obrigado por fazer parte da galera de Cristo! A verdadeira galera!

- O quê!? Galera!? - gargalhei.

- É, aqueles que imitam os passos de Jesus Cristo, ao invés de apenas segui-lo! - Ele sorriu - Foi o que o pastor falou hoje. Vejo isso em você! Amor, graça… paz!

- Ahhh tenho muito o que aprender com Cristo ainda! Em muitos momentos estou apenas o seguindo! - abracei minhas pernas - E não digo isso para você discordar e falar que eu sou ótima e blá, blá, blá! Digo porque sei e admito o quanto posso ser hipócrita e egoísta! Mas, fico feliz em poder compartilhar um pouco de Cristo com você!

- Fica difícil de acreditar em seu egoísmo e hipocrisia depois de ter me mostrado seu melhor lado!

- Esse é o problema, Anderson! - suspirei - Geralmente acreditamos apenas naquilo que, obviamente, enxergamos!

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