Capítulo 10
Eu estava descalça sobre a grama de um verde vívido e úmido, as flores a minha volta eram brancas como meu vestido, um vestido leve que rodava junto comigo, eu era conduzida por uma mão, a mão de um dono sem rosto, isso mesmo, eu não conseguia ver seu rosto, mas me sentia amada e segura naquela nossa dança. Uma valsa sem padrão, uma valsa que fazia minha alma bailar entre raios de sol de um novo amanhecer.
Quando abri meus olhos àquela manhã tive certeza do que estava acontecendo, Deus estava trabalhando em meu íntimo e nada e ninguém poderia impedí-lo!
“Bem sei que tudo podes, e nenhum dos teus pensamentos podem ser impedidos”
Jó 42:2
Jó foi um homem que perdeu riqueza, filhos… Mas, não a fé em Deus! Em nenhum momento blasfemou ou duvidou de sua palavra. Depois de inúmeras indagações compreendeu que o querer de Deus sempre é, e deve ser, superior em nossas vidas. Tudo foi restituído na vida de Jó, porém, nada foi como antes! Sua riqueza foi dobrada assim como os anos de vida, em seus rabanhos e pastos havia prosperidade e suas filhas eram tão belas que jamais foi encontrada beleza como a delas na face da terra.
Ou seja, não tem porque duvidarmos que o MELHOR de Deus vai muito além daquilo que imaginamos ou desejamos! E que é mais real do que costumam anunciar.
“ Ora, aquele que é poderoso para fazer tudo mais abundantemente além daquilo que pedimos ou pensamos, segundo o poder que em nós opera, a esse glória na igreja, por Jesus Cristo, em todas as gerações, para todo o sempre. Amém.”
Efésios 3:20 e 21
Passei pela cozinha para tomar um copo de água antes de sair de casa, eu não costumava tomar café da manhã no meu doce lar, meu dejejum se resumia à um pão de queijo acompanhado de um suco de laranja ou capuccino comprados em uma padaria próxima à empresa. Mas, naquela terça-feira de céu nublado em que eu estava imersa no sonho mais sublime que já havia tido esbarrei-me com meu pai, então a rotina seria outra!
- Pai! - falei surpresa já o abraçando e dando-lhe um beijo estalado na bochecha - Bom dia!
- Bom dia, gatinha! - ele sorriu - Vamos tomar café juntos!?
- Claro! - fui até o armário pegar uma xícara e um prato - Saiu mais cedo do trabalho!?
- Sim, ontem entrei mais cedo - papai pegava a margarina e a geleia na geladeira. Ele trabalhava a noite e por isso, dificilmente nos víamos todos os dias, nossos encontros eram rápidos, quando chegava do trabalho ele estava se arrumando para ir ao dele ou as vezes nem assim nos encontrávamos.
- E como andam as coisas? - perguntei sentando-me no meu lugar de sempre a mesa, de frente para ele, servindo o café em nossas xícaras.
- Bem. E você!? - ele se sentou já cortando o pão sovado em sua frente. - Sua mãe me disse que você saiu com um rapaz outro dia.
- Ah sim. - minha mãe não escondia nada do meu pai, claro que mais cedo ou mais tarde ela compartilharia essa informação com ele - Ele é apenas um amigo, estou o ajudando a voltar para Deus.
- É, ela me disse. - papai tomou um gole de café antes de prosseguir, também tomei um gole do meu já imaginando qual seria o próximo assunto - Só tome cuidado, filha. Não quero que sofra outra vez.
- Sofrer por amor é algo que eu também não quero, pai.
- Se depender de nós você nunca mais irá sofrer! - ele sorriu - Mas, isso não significa que você tem que desistir! Precisa dar uma nova chance para si. Aliás, ninguém sofre por amor, sofre pela ausência dele e este foi o seu caso.
Se meu pai tivesse dito isso há pouco mais de um ano atrás eu teria batido o pé feito uma menininha mimada e dito em letras garrafais “O LUIZ ME AMA, você não sabe de nada!”. Mas, naquele instante só me restava concordar com o Sr. Ulisses. Afinal, o que é amor a não ser cuidado e respeito!?
Ah sim, quando tiravam-me a “razão” eu virava uma fera! Obviamente eu havia amadurecido, e muito, nos últimos meses. Hoje compreendo com mais facilidade os conselhos e advertências dos meus pais, apesar de ser maior de idade os escuto e os obedeço como nunca o fiz antes. Até me questiono: Porque eu não era assim antes!? O que eu tinha na cabeça!?
É amiguinhos, vivendo e aprendendo!!!
- Promete que lhe dará uma chance quando se sentir pronta!? - papai insistiu.
- Claro que sim! - sorri e papai voltou a passar geleia em mais uma fatia de pão - Pai!?
- Sim!?
- Eu te amo!
- Eu te amo mais! - ele sorriu erguendo um pouco o bigode grisalho.
- Que milagre a cozinha ocupada a essa hora! - Edu entrou na cozinha animado, aliás ele sempre era animado pela manhã, não sei como conseguia ser assim. - Como vocês estão!? - emendou enquanto tirava uma fatia de pão com geleia do meu prato.
- Bem se você parar de roubar meu pão! - falei fingindo estar brava, minha vontade era rir daquele jeitão dele.
- É só um pedacinho de pão!
- Onde vai com tanta pressa, filho!? - papai encarou Edu que buscava uma xícara no armário enquanto mastigava o pão.
- Trabalhar! - Edu falou com a boca cheia - Hoje tem visita na obra.
Edu trabalhava no setor de projetos de uma construtora, estava terminando a faculdade, em poucos meses teríamos um arquiteto em casa. Foi por causa dele que conheci Luiz, eles estiveram juntos em vários projetos na empresa, eram amigos até o engenheiro civil recém formado me largar meses antes de nosso casamento. Edu não aceitou a atitude do até então amigo, lembro das últimas palavras dele como amigo de Luiz:
- Cara, se você fosse homem de verdade nem, sequer, havia namorado minha irmã enquanto pensava em outra mulher!
Edu era a pessoa mais calma que eu conhecia, mas a situação mexeu com a cabeça dele. Não podia culpá-lo, aquilo mexeu com a cabeça de todos, das duas famílias.
- Então se alimente direito - papai falou servindo café na xícara de Edu - Saco vazio não para em pé.
- Vou precisar do seu carro na próxima semana! - disse me levantando da mesa - Estou dando apoio na produção do encontro de casais que terá na igreja e não vai dá pra contar com a Marina, ela estará resolvendo outras coisas do evento.
- Ah é verdade - Edu falou e de repente esboçou um rosto desanimado - Espero que a Marinês esteja melhor, comprei nossos convites e estávamos tão animados para esse encontro…
- Ela estará bem! - pisquei para ele - Eu só tenho que buscar as toalhas de mesas e outros itens de cozinha que foram alugado para o jantar por isso, preciso do carro.
- Sem problemas! - Edu tomou um último gole do café ainda em pé - Vamos, te levo até o metrô.
Abraçamos papai ao mesmo tempo para nos despedirmos dele e seguimos para a garagem, era o início de um típico dia de trabalho, ou não.
Aquele dia, nublado, com vento frio e uma fina garoa não me deu coragem de sair para almoçar, pedi um yakissoba que foi devorado em dez minutos na copa que havia no andar que trabalhava e, logo, voltei à montanha de notas fiscais, recibos e pastas de projetos de publicidade e eventos, eu estava imersa na conferência de alguns cálculos quando o telefone em minha mesa tocou:
- Agatha, é a Maria Eduarda aqui da recepção, tudo bem!?
- Oi… tudo bem.
- Tem uma entrega para o Arthur, você pode retirar!?
- Claro. - falei já imaginando que a ida até o térreo seria um bom momento para a pausa que meu cérebro ansiava - Já estou descendo.
Assim que as portas do elevador se abriram avistei o rapaz com jaqueta de couro e capacete na mão sentado no banco estofado da recepção. Passei a catraca segurando um riso, o motivo do riso!? Era exatamente o que eu queria saber, coleguinhas!
Ele sorriu para mim e se levantou, tinha flores em uma mão, colocou o capacete sobre o banco e foi ao meu encontro.
- Hoje não é quarta-feira e não são tulipas amarelas - falei apontando para o buquê.
- Hoje é terça-feira, aniversário da dona Sônia e isso aqui são hortênsias, as flores favoritas dela! - Timóteo falou sorrindo.
- Quem é dona Sônia!?
- Esposa do Arthur, as tulipas são sempre para dona Isaura, mãe dele. - Timóteo entregou-me as hortênsias e uma cesta de chocolates e em seguida um cartão - Diga que o cartão é co…
- Cortesia. Sim, eu digo! - o interrompi sorrindo - Pelo visto você conhece meu chefe mais do que eu!
- Nada como uma boa conversa para conhecermos melhor nossos clientes.- ele se afastou um pouco para tirar algo do bolso - Ah e isso é para a linda assistente dele.
- Ela está de licença maternidade. - Timóteo revirou os olhos e transformou seu rosto em uma expressão que dizia “Não se faça de difícil” o que ele não sabia é que eu era difícil. - Mas, posso entregar quando ela voltar.
- A assistente dela então! - ele estendeu um envelope azul, como de uma carta, em minha direção - Só abra depois, ok!?
- Ok. - peguei o envelope ainda receosa e o encarei por bons segundos.
- Até mais! - Timóteo chamou minha atenção para si.
- Até! - comecei a andar em direção às catracas pensativa, afinal o que podia ter dentro do envelope para mim!?
- Ah, Agatha! - Timóteo me chamou e quando virei ele já estava bem próximo a mim - Você acredita no Espírito Santo!?
- Claro. - sorri.
- Isso é bom. - ele sorriu.
- Sim… mas, qual o motivo da pergunta!?
- Saberá quando abrir o envelope! - Timóteo começou se afastar lentamente - Ótimo trabalho!
- Obrigada.
É galera, cada surpresa que se vacilar meu coração não aguenta! Timóteo era um bom rapaz, desde a confusão com as Tulipas passamos a nos falar por telefone ou pessoalmente. Arthur, meu gerente, fez questão que todas as tulipas amarelas fossem solicitadas na floricultura “Lírio dos Vales”, por isso, o contato era quase que constante com o rapaz. Claro que nem sempre nos falávamos, às vezes uma senhora atendia o telefone na floricultura e ela mesma se encarregava do meu pedido, em outras não era Timóteo o responsável pela entrega, no entanto, eu sentia que ele sempre ficava muito feliz em me atender de alguma forma!
Excepcionalmente, naquele dia Arthur decidiu, ele mesmo, solicitar as hortênsias para sua esposa, além daquilo ser uma tremenda surpresa para mim tinha o caso daquele envelope azul em minha mão direita não parar de me encarar, apesar de parecer o contrário, ele estranhamente me pedia para ser aberto.
Assim que deixei as flores acompanhadas da cesta de chocolates e o cartão sobre a mesa de Arthur me dirigi a minha que, aliás, estava repleta de papéis! Encarei mais uma vez o envelope azul e decidi que o abriria a caminho de casa, o joguei dentro da bolsa e voltei aos cálculos.
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