EPÍLOGO

Melissa encarou o espelho.

O corpo, finalmente moldado de acordo com sua mente e alma, era ao mesmo tempo certo e estranho. Sentia espasmos no local onde o antigo membro havia estado, como se sua memória física insistisse em lembrar o que já não existia.

Ela passou os dedos pelas cicatrizes das perfurações e hematomas, que agora eram mais suaves, mas ainda inconfundíveis. Havia se tornado um habito toca-las e dizer os nomes dos irmãos.

Deu uma volta sobre si mesma, observando as novas curvas, os ângulos femininos. Mas o espelho só refletia o corpo.

Quando fechavas os olhos só tinha silêncio, sem o empurra e puxa. Antes, sua mente era um campo de batalhas. Taiko, cantarolando uma música nova. Lapam, pensando em roteiros com mechas, armas sagradas e amores fracassados. Valentina, criando construções arquitetônicas com eco urbanismo. Chico ponderando sobre as filosofias de vida. Jão, criando rotinas saudáveis. Eloah, questionando as ações de todos. Erik buscando adrenalina. E, claro, Marjori, pensando nos gastos e como maximar seu tempo usando o corpo.

Melissa se sentou de frente ao espelho, abrindo as pernas para observar sua nova forma. "É isso que eu queria?", pensou. Mas a pergunta parecia vir de outro lugar.

"Ou isso é o que elas queriam?"

Ela se vestiu, ajustando o vestido sobre a pele nova e delicada. Olhou ao redor do quarto da casa nova — a casa que ninguém mais conhecia. Havia trancado as faculdades dos irmãos, cancelado os aluguéis, fechado as portas para o passado de todos eles.

As investigações sobre a morte de Natália tinham sido arquivadas por falta de provas. 

Ela tinha um novo corpo e uma nova vida, mas sentia que não era algo que ela desejava ainda. Ela parecia viver a vida de outra pessoa, mas sem os irmãos.

Antes, eles tinham que reversar o uso do corpo. Tabelas com horários e calendários tinham sido criados e eram seguido a risca. E mesmo nos piores momentos, eles se reuniam. Brigavam, gritavam, discutiam, mas sempre estavam ali. Agora, só restava ela. Ou quase.

Havia algo no fundo da sua mente que ainda incomodava. 

Era um sussurro, baixo e quase imperceptível, ecoava em sua mente. 

Melissa pressionou as mãos contra as têmporas, tentando silenciá-lo. 

Era uma voz sem forma, sem dono. Um sussurro que parecia vir de dentro e de fora ao mesmo tempo. O som ganhou altura até envolver a moça com um coral de ecos em timbres e alturas diferente.

"Sempre após um trauma, alguém vem a luz. Essa é a regra, você sabe muito bem, você nasceu assim."

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