Ponte de Madeira
Quando meus pais chegaram com a grande ideia de me inscreverem em uma colônia de férias no meio do mato, eu sabia que não ia dar certo.
E não foi por falta de argumentação, acredite! Eu pontuei todas as razões existentes para provar que não tinha como dar certo, inclusive cheguei a mostrar que podia dar muito errado...
Mas sabe de que adiantou?
NADA!
Meus pais sempre gostaram de uma aventura. Eles se conheceram fazendo rapel, marcaram encontros (todos envolvendo algum tipo de aventura, claro) até que começaram a namorar... E daí eles foram morar juntos e eu nasci!
Eu, uma adolescente normal.
Não que seja anormal gostar de aventura! Não tenho nada contra quem gosta! É só que EU particularmente não gosto... Nem um pouco!
Prefiro passar meu tempo ouvindo música e dançando. Dançar é o que me acalma, é o que faz eu me sentir livre, é o que eu escolho fazer toda vez que eu estou estressada.
Só que, para os meus pais, dançar não é o suficiente. Eles acham que eu deveria sair mais e me conectar mais com a natureza. Segundo eles, não é normal uma adolescente preferir ficar dentro de casa, mas especificamente dentro do quarto, ouvindo música o final de semana inteiro e dançando sem parar... Na opinião deles falta eu sair para me enturmar e pegar mais sol e ar puro.
Eu até concordo com eles... Quer dizer, realmente não é legal ficar trancada dentro de casa e eu sei da importância de pegar sol para produzir vitamina D. Só que não é bem assim como eles dizem...
Eu saio! Só que eu gosto de ir ao shopping e à noite meu passeio preferido é algum lugar que dê para dançar! E eu também tenho o meu grupo, no caso são outras três meninas que têm em comum a paixão pela música e dança! Esse é o meu grupo. Não é porque não ando com pessoas que marcam passeios aventureiros que eu não tenha amigos ou um grupo... Ele só é diferente do que os meus pais esperam que seja.
De qualquer forma, voltando a minha questão inicial, eu sabia que não ia dar certo essa colônia de férias. E eu realmente achei, por algum momento, que eu tinha dado argumentos suficientes para os meus pais desistirem da ideia. Inclusive eu já estava pensando em levantar do sofá da sala para pesquisar algum curso de férias de dança, afinal, se o problema era a preocupação dos meus pais de que eu passasse o dia inteiro trancada em casa, eu só precisava me inscrever em um curso de dança... Com certeza eu encontraria algo independente do ritmo que fosse, já que o meu negócio é dançar!
Eu só não contava que os meus pais me avisassem que já tinham pago a colônia de férias e que no dia seguinte eu já partiria para a minha primeira aventura (segundo palavras deles).
Era uma causa perdida e eu só não me recusei a sair de casa no dia seguinte, porque soube que a minha melhor amiga também estava na mesma situação que eu. Não sei se é por isso que nós duas somos tão amigas, o fato é que ela também ama dançar e os pais dela também acham que ela deveria aproveitar a adolescência para se aventurar mais.
Assim que nós chegamos no meio do mato (ou na colônia, tanto faz, no fim das contas vai dar no mesmo: a colônia fica literalmente no meio do mato), nós fomos direto para o chalé onde íamos dormir e começamos a conversar com as meninas que já estavam por lá. Naquele primeiro dia a gente não teve nenhuma atividade, então aproveitamos o sol na beira do lago durante toda a tarde e, depois do jantar, voltamos para o chalé e dançamos muito com a caixa de som bluetooth que eu tinha levado.
Parecia que nem tudo estava perdido...
Parecia... Até chegar o dia seguinte.
Com toda a honestidade do mundo, como os monitores podiam chamar o que a gente fazia de "atividades"? Para mim aquilo era pior do que treinamento militar! Não que eu de fato soubesse no que consistia um treinamento militar, mas acredito que seja algo bem parecido com as "atividades" que eram propostas para a gente: cabo de guerra, pegue a bandeira do inimigo, circuito com obstáculos, pique-esconde na mata...
Será que meus pais queriam me mandar para a guerra?!
Não vou negar que estou me divertindo bastante!
O nosso grupo só perde! Mas as gargalhadas que a gente dá compensa qualquer derrota, por mais vergonhosa que seja.
Como aconteceu quando a gente perdeu no pique-esconde porque tivemos uma crise de riso quando a Júlia caiu sentada e um monte de folha seca ficou grudada no seu cabelo.
Ou quando a gente achou que tinha ganhado no cabo de guerra e afrouxamos o aperto da corda na mesma hora em que o outro lado puxou com toda força e nós caímos uma em cima da outra.
E até quando a Melissa saiu correndo toda feliz que tinha conseguido pegar a bandeira do grupo inimigo sem nenhuma dificuldade, até o monitor avisar para ela que, na verdade, ela tinha pegado a nossa própria bandeira.
Pois é... Eu falei que as derrotas tinham sido vergonhosas! Mas a gente não estava nem ligando para isso!
E eu jurava que eu poderia me acostumar a isso tudo aqui e passar tranquilamente bem até o final das férias...
Eu só não contava com o que eu estava paralisada para enfrentar bem a minha frente: uma ponte de madeira!
Por que a minha amiga desnaturada tinha que sentir mal estar hoje? Justamente hoje? Justamente no dia em que a gente faria uma trilha e que, no meio dessa trilha, teria uma ponte?
Uma ponte de madeira!
Uma ponte de madeira que balançava!
Uma ponte de madeira que balançava e rangia!
Uma ponte de madeira que balançava e rangia e estava a muitos metros de altura!
- Você vai? - Ouço uma voz próximo ao meu ouvido e dou um pulo com o susto. - Desculpa, não queria te assustar!
- Tá. - Respondo no automático e volto a encarar o abismo.
- Você precisa de uma ajuda para atravessar a ponte? - Ele volta a perguntar, mas dessa vez, pelo menos, eu não volto a levar um susto.
- Não.
- Tem certeza?
- Sim.
- Então pode ir... - Ele faz um sinal com a mão para que eu siga o meu caminho.
- Ah, não! Tá tudo bem! Eu não vou! - Balanço minhas mãos de forma um pouco exagerada. Quem vai julgar? Eu estava em pânico!
- Como assim? - Ele pergunta confuso.
- Eu não vou passar aí, não. Pode ir!
- Eu achei que você disse que não precisava de ajuda...
- E eu não preciso. - O encarei pela primeira vez.
- Então você vai atravessar a ponte sozinha?
- Atravessar a ponte? - Pergunto nervosa. - Sozinha? - Solto uma gargalhada nervosa, mas logo tento me controlar. - Eu acho que você não entendeu direito... Eu disse que não preciso de ajuda, mas não é porque está tudo bem, é só porque eu não vou passar ali de jeito nenhum! Por isso eu não preciso de ajuda!
- E como você vai fazer para voltar para o acampamento?
- Volto pelo caminho de onde viemos. - Aponto com o dedo para as minhas costas.
- E você sabe que caminho é esse? - Ele pergunta curioso e tentando esconder um sorriso.
- Claro que sei! - Respondo altiva e olho para trás. - Foi por ali. - Aponto para uma parte da mata, mas logo fico na dúvida se realmente tinha sido por ali... Quando eu cheguei aqui a mata já era tão fechada assim ou fechou de repente?
- Você não parece muito confiante no caminho...
- Olha, eu posso ter ficado um pouco em dúvida, sim, mas isso não quer dizer que eu vou passar por essa ponte!
- Qual é o problema da ponte?
- O fato dela ser uma ponte?! - Respondo sarcástica. - Isso resume totalmente qual é o problema!
- É uma ponte! Tá tranquilo!
- Não é "só uma ponte"! - Eu me viro para encarar a ponte da qual estamos falando. - É um monte de pedaços de madeira, que estão presos por uma corda! E eu não faço ideia desde quando eles estão aí! E essa madeira fica pegando sol e chuva e vento... E nem tem uma placa informando quanto de peso ela suporta e quando foi feita a última manutenção nela! - Respiro fundo depois de soltar todas as minhas preocupações de uma vez só.
- Nossa! - Ele também se vira para encarar a ponte. - Eu nunca pensei em tantos detalhes ao olhar para uma ponte... - Ele finge estar pensativo.
- Deve ser por isso que você já atravessou outras pontes! - Respondo sarcástica.
- Provavelmente. - Ele volta a me encarar. - Mas se eu ficasse parado toda vez que eu encontrasse uma ponte a minha frente, eu deixaria de chegar a muitos lugares. E eu não estou falando só de pontes de verdade, mas de qualquer obstáculo que me impeça de chegar onde eu realmente quero.
- Você falou muito bonito e até me deu vontade de superar os meus medos e tal... Mas, ainda assim, não acho que estou pronta para, digamos, arriscar a minha vida! - A parte final sai em um tom agudo. Eu sentia que estava prestes a chorar.
- Me diz o que você mais gosta de fazer!
- Ouvir música e dançar.- Respondo na hora.
- Ótimo! Vai ser mais fácil do que pensei! - Ele pega o celular dele, coloca uma música da moda e volta a me encarar. - Gosta dessa música?
- Bem, é a minha preferida! Como você sabia? - Fico realmente curiosa.
- Não sabia! Foi a primeira que tocou e, provavelmente, isso é um sinal.
- Sinal de quê?
- De que nós temos exatamente - ele olhou para a tela do celular antes de bloquear e colocar no bolso da bermuda - três minutos e sete segundos para atravessar a ponte!
- Você pirou? - Questiono mais alto do que pretendia.
- Não! - Ele segura as minhas duas mãos e eu me sinto estranhamente calma.
- Eu já disse que não vou atravessar essa ponte!
- Eu sei que é pedir muito, mas será que você pode confiar em mim?
- Como você disse, é pedir muito!
- Mas eu acho que tenho um crédito já que eu acertei a sua música preferida.
- Você assumiu que foi sorte!
- Ainda assim... Essa música que está tocando é a sua preferida e você só precisa focar nela. - Ele olhou no fundo dos meus olhos e parecia que eu tinha acabado de ficar presa neles.
- Focar só na música? - Pergunto baixo, ainda com o meu olhar preso ao dele.
- E no que mais você quiser focar... - Desvio o meu olhar para o lábios dele para encontrar um sorriso sincero, mas logo volto a olhar para os seus olhos. De alguma forma, olhar para eles me passava segurança.
- Eu não sei se vou conseguir fazer isso...
- Não pensa em conseguir, só pensa na música e em mim.
- Ok. - Respiro fundo. - E depois eu faço o quê?
- Continua fazendo o que você está fazendo.
- Olhar para os seus olhos e segurar a sua mão?
- Se é isso o que você está fazendo... Então sim! Continua olhando para os meus olhos e segurando a minha mão!
- E a gente vai ficar parado aqui desse jeito até quando? - Não consigo segurar um sorriso. Afinal, eu realmente não me importaria de ficar por mais alguma horas segurando as mãos dele...
- O tempo que você quiser. - Sorri alto e na hora que eu ia baixar a cabeça, ele se aproximou de mim e levantou meu queixo . - Não!
- Por que não? - Senti meu corpo inteiro ficar tenso na mesma hora.
- Porque quando a gente não consegue fazer uma coisa sozinho, só precisa confiar em quem quer nos ajudar.
Eu olhei para baixo. Não porque eu não confiasse nele, pelo contrário. Eu olhei para baixo porque ele tinha feito eu atravessar a ponte mal me conhecendo. Ele tinha ganhado a minha confiança de uma forma tão fácil! Isso nunca tinha acontecido antes. E eu sabia que, independente do lugar onde eu estivesse, ele não ia desistir de mim.
A gente já estava praticamente no final da ponte. Mais dois passos e chegávamos em terra firme. Do outro lado da montanha. Do outro lado do meu medo.
Soltei as nossas mãos e joguei meus braços envolta do pescoço dele. Só nesse momento que eu percebi que ele estava com o uniforme de monitor do acampamento. Ele poderia ter voltado comigo pelo caminho de onde viemos. Ele não precisava ter gasto todo aquele tempo e conversa comigo.
Mas ele fez. Isso que importava.
De alguma forma ele sabia que eu precisava mais dele do que de qualquer outra coisa.
Ahhhhhhhhh!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! s2
Ouso dizer que esse é o meu conto preferido deste livro!!
Fofo demais, com muitos pontos para a gente refletir, um crush super demais...
Enfim, um dos melhores que já escrevi (na minha opinião)!
O que acharam?!
Se vocês aceitarem um conselho, reflitam sobre esse conto! A personagem precisou enfrentar uma ponte de verdade, mas na vida, às vezes, precisamos enfrentar pontes que não são construções, mas obstáculos que precisamos enfrentar no nosso dia-a-dia. Alguns mais fáceis de serem superados, outros bem difíceis. Só que, com ajuda, sempre poderemos encontrar um jeito de passar pelas fases mais díficeis.
Até o recadinho de agradecimento e despedida por me acompanharem em mais este livro!
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