Ônibus
Estou irritada, impaciente e impotente.
Estudar na Universidade Federal para mim significava muita coisa:
Eu tinha que pegar quatro ônibus cheios todos os dias;
Pegava um trânsito horrível todos os dias;
Estudava longe pra caramba;
Torcia para que essa fase acabasse o mais rápido possível!
Pois é... Eu não estava nos meus melhores dias... Mais uma vez.
Volto a encarar a janela do ônibus, mas nada mudou. Ele continua praticamente sem se movimentar, o sol continua transformando o ônibus em um verdadeiro forno e a minha cabeça continua a doer por causa da fome, calor e estresse.
Tudo o que eu quero é chegar em casa, tomar um banho fresco e comer!
- Ninguém merece esse trânsito, né?
Olho para o lado e me deparo com o garoto sentado ao meu lado me encarando. Ele tinha entrado no ônibus ainda dentro da faculdade.
- Nem fala! - Meu desânimo é tão grande que sinto meus ombros caírem.
- Mas esse trânsito tão ruim não é sempre, né?
- Não... Mas é um saco de qualquer jeito!
- Com certeza!
- O que será que aconteceu? - Volto a encarar a janela.
- Não disse nada no rádio... - Ele comenta olhando para o celular e o fone de ouvido que estavam em cima da mochila. - Falando nisso, é melhor eu guardar! - Ele abre a mochila, jogando o celular de qualquer jeito para dentro.
- Melhor mesmo!
- Falta muito tempo para você acabar a faculdade?
- Um ano! - Faço uma cara deprimente e arranco um sorriso dele. - É sério, não aguento mais passar por isso todos os dias!
- Pelo menos você já está acabando!
- E você?
- Termino mês que vem!
- Que inveja! - Não controlo minha empolgação e ele solta uma gargalhada baixa.
- Nossa! - O sorriso continua estampando os lábios dele.
- Falando sério... Parabéns!
- Valeu! Ano que vem chega a sua vez também!
- Sim! - Cruzo os dedos e sorrio. - Não vejo a hora desse dia chegar!
- O que você estuda?
- Biologia, e você?
- Arquitetura.
- Legal!
- É, eu gosto bastante! Principalmente agora no final... Já posso fazer bastante coisa no estágio e tô participando de um processo seletivo para ser contratado assim que me formar!
- Nossa, que legal! Parabéns mais uma vez! - Apesar de mal conhecê-lo fico feliz com tudo o que ele está me contando.
- Obrigado!
- Você já fez algum projeto?
- Bem, não sozinho, mas eu estou participando de um projeto que tem várias ideias minhas.
- Que demais! Como é? - Me ajeito no banco do ônibus para poder olhar melhor para o novo colega que eu tinha feito.
- Bem, não é porque a ideia é minha, mas é bem legal!
Ele começa a contar sobre o shopping que estava sendo construído em um condomínio de casas e prédios de alto padrão, próximo ao lugar onde eu moro. A empolgação dele é tanta que ele simplesmente mal para de falar, só fazendo isso quando realmente já está sem ar. Ainda assim, ele toda hora me pergunta se eu estou entendendo e até pegou um papel para fazer um desenho para que eu entendesse melhor.
- Muito legal! Sério!
- Valeu!
- Quando inaugurar eu com certeza vou querer visitar para poder ver tudo isso funcionando!
- Sério? - Ele demonstra surpresa.
- Claro! Poxa, você ficou um tempão falando de cada mínimo detalhe... Sei lá! Eu acho até que vou me achar quando estiver lá dentro... - Ergo um pouco a cabeça e finjo estar esnobando as pessoas. - Vou parar todo mundo e dizer: "Eu conheci a pessoa que ajudou a construir tudo isso aqui!"
- Também não é para tanto... O shopping nem vai ser tão grande assim!
- Mas é o seu primeiro projeto, as suas ideias estarão lá e você sempre vai lembrar dele com um carinho especial.
- Isso é verdade...
- Então! E, além do mais, não é todo dia que a gente conhece um dos arquitetos do shopping que frequentamos!
- Ok! Você tá certa!
- Uhum! - Balanço afirmativamente a cabeça e volto a olhar pela janela.
- Até que agora está andando bem.
- Sim! Está muito quente! Não vejo a hora de chegar em casa e tomar um banho para refrescar!
- Eu só vou poder fazer isso a noite. - Ele finge estar triste.
- Tem ar condicionado onde você vai ficar agora?
- Dentro do escritório, sim. Quando estivermos visitando a obra, não.
- Ai. - Faço uma careta compreensiva. - Espero que você só precise ficar no escritório hoje, então.
- Acho bem difícil, mas tomara que seja assim!
- "A esperança é a última que morre"! - Ele concorda com a cabeça.
- E quanto a você?
- O que tem eu?
- Eu me empolguei e passei boa parte do trânsito e do caminho só falando sobre o shopping...
- Ah, mas estava interessante!
- Só que agora eu queria saber um pouco mais de você...
- Sobre mim?
- Sim.
- O que exatamente você gostaria de saber sobre mim? - Sorrio tentando esconder o nervosismo que surgiu de repente.
- Bem, você disse que estuda Biologia e que se forma no ano que vem... Você está fazendo estágio e já sabe com o que vai querer trabalhar quando terminar a faculdade?
- Não e não! - Ele sorri ao ouvir minha resposta. - Eu não estou fazendo estágio no momento porque eu tenho outras ideias na minha cabeça...
- Não pretende trabalhar com Biologia quando se formar?
- Não é isso... É só que eu gosto muito de estudar e sinto que preciso aprender um pouco mais até descobrir o que realmente me encanta dentro da Biologia. No momento eu sou monitora na faculdade.
- Uau, que legal!
- Pois é! E eu tenho me interessado muito por vários projetos de pesquisa, então eu tomei a decisão de não procurar emprego. Estou participando de todos os grupos que posso participar, mesmo que eu só possa ser ouvinte, e, assim que eu me formar, eu vou fazer direto a prova para o Mestrado.
- Nossa! São grandes planos! - Ele comenta impressionado.
- São sim!
- Quero dizer, eu sei que é impressionante ter um Mestrado, mas eu não consigo pensar em emendar assim que me formar. No futuro, quem sabe, mas por enquanto preciso de um descanso da sala de aula, pelo menos! - Ele sorri divertido e eu o acompanho. Eu sei que não são todos que pensam como eu.
- Eu sei! Na verdade tem muita gente que já julgou mal essa decisão que eu tomei.
- Como assim?
- Ah, quando eu digo que não quero procurar um emprego para poder me dedicar por mais alguns anos aos estudos, tem gente que acha que eu só quero viver debaixo da asa dos meus pais...
- Essas pessoas estão loucas?
- Acredite se quiser, mas eu já ouvi isso.
- Não liga para elas! Com certeza elas não têm a competência de passar para um Mestrado e ficam julgando quem se esforça para conseguir! - Ele brinca.
- O que mais magoa é que eram pessoas que eu considerava amigas.
- Se não podem apoiar uma decisão sua, então não são suas amigas de verdade. Quando a amizade é verdadeira, mesmo que a gente vá se dar muito mal, nossos amigos vão lutar por nós até o fim. Sempre tendo em vista o nosso bem estar e as nossas vontades.
- Você está certo!
- Eu gostei muito de te conhecer! Eu sei que você não queria ter pego esse trânsito e que não vê a hora de chegar em casa e tomar o banho que você tanto quer, mas eu gostei de tudo o que aconteceu... A gente não teria conseguido conversar tanto!
- Eu também gostei muito! Apesar de ainda querer muito tomar um banho, - nós dois sorrimos - a sua companhia foi muito boa!
- Já tá chegando o ponto pra eu descer... Será que você pode me dar o seu número de telefone?
- Claro!
Na mesma hora ele abre a mochila e rapidamente tira o celular de lá. Dito o meu número para ele e ele deixa chamar até que eu sinta o celular vibrar dentro da minha mochila.
- Tá tocando! - Abaixo minha cabeça para poder procurar, mas o ouço se despedir de mim enquanto levanta.
- Não esquece de salvar! Hoje à noite, depois que eu finalmente tomar o meu banho, a gente se fala! Tchau!
- Tchau! - Falo alto, virando minha cabeça para vê-lo descer.
Volto a encarar o celular que já estava na minha mão e desbloqueio para encontrar o número dele nas minhas chamadas perdidas. Aperto para salvar o contato e só então me dou conta de que eu não sei o nome dele e nem ele sabe o meu.
Sorrio espantada com tudo o que tinha acabado de acontecer e o sorriso aumenta com a ideia que tive.
Digito "Garoto do Ônibus" e salvo o contato.
E um pensamento toma conta da minha cabeça:
Como ele vai salvar o meu contato?
Acho que a maioria já pegou aquele trânsito horrível, dentro do ônibus, em pleno verão, né?!
Mas, se for para fazer uma amizade, até que vale a pena! Rs
Agora uma chamada importante, não vamos esquecer de que a gente não deve conversar com estranhos e sair dando o número de telefone, hein?! Isso aqui é uma história de FICÇÃO! Como eu já disse, "príncipes encantados" a gente SÓ vai encontrar nos livros.
Esperando os comentários e as estrelinhas!
Até o próximo conto!
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