05 - Escolhas e Consequências
Eu olhei para a prateleira de troféus no quarto de Satoru, todas em primeiro lugar. Eu senti ele afagar meus cabelos enquanto eu mantinha a cabeça no peito dele ouvindo as batidas de seu coração e sentindo seu corpo quente. Nós dois como viemos ao mundo falando sobre a vida e coisas que gostávamos. A gente pulou muitas etapas, tínhamos que tentar recuperar as informações entre elas.
— Você é toda trincada. Digo, seu corpo.
Virei a cabeça para olhar para ele e me ajeitei em seu peito.
— Eu treinei incessantemente todos os dias.
— Eu meio que foi assim também.
— Só que você foi uma criança desejada. — Eu disse entristecida.
— Seus pais não te queriam?
— Acho que não. Minha mãe fugiu com um cara bonitão quando eu era pequena e meu pai nunca quis uma filha. Pelo menos não mulher.
— Isso... é bem complicado.
— Sabe por que me chamo Akira?
— Porque você é brilhante e iluminada?
— Não. Meu pai queria um filho homem. Aí ele teve um sonho e disse que era a confirmação. Ele colocou o nome Akira, porque achou que era um homem. Aí eu nasci. Dizem que ele nem me pegou no colo. Me rejeitou totalmente. Como se eu fosse um filhotinho indesejado e pulguento.
— Sua mãe fugiu com outro homem e te deixou para trás?
— É. Daí meu pai me treinou. Bom, na verdade não ele exatamente. O meu tio Hiei. Ele foi para mim a figura paterna enquanto meu pai amaldiçoava minha mãe por ter deixado ele. E a minha figura materna foi uma cobra peçonhenta chamada Kaede. Minha madrasta. A única coisa boa que ela fez foi a minha irmã Haru.
— Outra mulher?
— Meu pai diz que é amaldiçoado. Ele nunca gostou muito de mim, principalmente depois do que a minha mãe fez.
— Mal sabe ele que você tem muitos atributos. — Ele me puxou mais para cima dele e me abraçou e depois selou um beijo caloroso em meus lábios.
— Isso é você quem diz...
— E aquele seu amigo? O Gyu? Vocês foram namorados ou alguma coisa assim? Eu pensei que vocês estavam juntos o dia que vi vocês na loja de conveniência.
— A gente foi criado junto. Ele é como um irmão.
— Ele claramente não te vê dessa maneira.
— Eu... meio que finjo que não vejo. Eu sei que é insensível da minha parte.
— Não acho. Você só não pode corresponder os sentimentos dele da mesma forma e não fica tocando em assuntos que podem atrapalhar a amizade de vocês
— É. Agora chega de falar de mim. Me fala sobre você.
— Eu não tenho muito o que dizer. Eu não tive muito contato com meus pais e me tornei o líder do clã muito cedo. Que como você pode ver sou o único desse clã. Eu tive tudo que eu quis, do jeito que eu quis. E fui criado com um único objetivo: ser o mais forte. E eu treino para isso desde então.
Eu olhei para seus olhos e percebi que ele não parecia feliz. Parecia... solitário.
— Ser o mais forte?
— É, honey, estar no topo sabe? Só que quando você está lá em cima, você fica distante demais das outras pessoas.
— Por isso você age como se não se importasse com nada?
— Parece que quando eu sou assim, as pessoas me enxergam de alguma maneira. — ele disse apoiando a cabeça no braço. — As pessoas me veem de duas formas, ou elas têm medo de mim, ou elas me bajulam. Por isso gosto de você e do Suguru. Me veem como iguais. Independente de poder e de força.
— Para mim, você é cheio de defeitos como qualquer outro. Afinal, você é um ser humano. E se serve de alguma coisa, eu também sou uma pessoa solitária.
Ele se ajeitou na cama e tocou meu rosto o acariciando. E depois sorriu de forma doce.
— Sabia que me lembrei de você?
Ah, ele parecia saber tudo que eu queria ouvir. Ou eu era carente demais de afeto e me apeguei em cada mísero detalhe que ele oferecia a mim.
— Você se lembrou?
— Sim, a menina de quimono de flor de cerejeira. Seu rosto não mudou muito. Seus olhos verdes, o cabelinho preto. Aí quando te vi na escadaria eu me aproximei para ver se era mesmo quem eu pensava.
— E eu fui muito grossa. Desculpa.
— Tranquilo. Eu até gosto desse seu lado selvagem. — Ele disse com um olhar luxurioso.
— Seu safado! — Eu lhe dei um empurrão de leve e me levantei. — Eu tenho que ir.
— Dorme aqui. — Ele me disse com cara de cachorrinho sem dono.
— Meu pai vai me matar. — Nem sei na verdade. Ele nunca ligou para nada. Só queria que eu ficasse forte. E se dependesse dele, ele teria me vendido para algum velho escroto amigo dele.
— Liga pra ele e fala que tinha um trabalho de escola na casa da Shoko e que você atrasou.
— Mas, e meu uniforme? Minha mochila?
— Pede aquela sua amiga trazer para você cedinho.
— Você pede a todas as garotas para dormir aqui? — Eu disse cruzando os braços.
— Não, só você. Fica, vai? Por favor? — Eu não tinha juízo naquela época e para ser sincera não mudou muito depois.
— Tá bom.
Liguei para Kaede e contei a primeira mentira de muitas. Ela respondeu com certo desdém, acho que ela sabia o que estava acontecendo. Afinal, ela também foi uma adolescente.
Eu e Satoru éramos precoces. A gente vivia como se o amanhã não existisse e mergulhamos de cabeça naquele romance.Se você procurar o significado de tórrido, vai encontrar que significa quente em exagero, ardente. E era justamente isso que nosso romance era. A gente dormiu junto não só aquela noite, passava mais tempo na casa dele do que na minha. Eu fingia que ia para casa, entrava no quarto, quando dava certa hora, pulava a janela e ia até a casa dele e só voltava de madrugada. Nós éramos adolescentes com os hormônios à flor da pele.
Nunca falamos sobre namoro, ele mesmo dizia que odiava a rotina e não acreditava em relacionamentos. Mas, mesmo assim ficamos juntos por um bom tempo. Com o tempo passou a ficar difícil de disfarçar. Todo mundo percebeu que nós éramos algo mais. E quando a gente ia para a casa dele, o mundo inteiro lá fora parecia sumir e era só eu e ele. Fizemos tudo que podíamos, nos descobrimos, nos conhecemos e nos amamos. Ele podia negar o quanto quisesse, mas ele também gostava da minha companhia. Se não, ele teria me mandado embora para casa a muito tempo.
Eu só dormia em casa quando ele tinha missão. Tinha que dar o ar da graça de vez em quando. Cheguei da escola na parte da tarde e a primeira pessoa que encontro é o Gyu, a gente não se falava desde o dia em Takeshita Street. Ele fez uma cara triste quando me viu e abaixou a cabeça e seguiu.
— Gyu. Espera.
— O que você quer Kira?
— A gente tem que conversar.
— Não tenho nada para falar com você.
— Gyu, por favor. É importante.
— Você some, por sei lá, dois meses? E aí vem querendo conversar? — Gyu disse irritado. Ele tinha razão, mas eu sempre fui uma mulher individualista.
— Eu preciso contar uma coisa para você. Queria que fosse a primeira pessoa a saber.
— O que? Que você e o grandão da família Gojo estão se pegando?
— Tá tão óbvio assim?
— Não Kira, imagina. Você foi embora com ele aquele dia e depois não dormiu em casa. Você acha que ninguém ia perceber que vocês dois estavam transando?
— Também não precisa falar assim Gyu.
— E você quer que eu fale o que? Que vocês foram estudar? Você tá dormindo na casa dele quase todos os dias Kira. — Ele disse a última frase sussurrando. — Você ao menos o conhece?
— Eu estou apaixonada Gyu... Eu não consigo agir diferente. Eu só quero estar com ele todos os dias.
— E eu respeito seus sentimentos, eu só preciso de um tempo para processar tudo. – Gyu disse com lágrimas nos olhos.
Aquilo me quebrou de uma tal forma que até hoje eu me culpo. Ter magoado alguém como o Gyu me deixava em frangalhos. Eu acho que ele merecia amar alguém que não fosse eu. Eu gostava do perigo, da adrenalina, da intensidade. Só que Gyu era exatamente o oposto disso.
Toda vez que a gente brigava eu ia para o nosso centro de treinamento e treinava até meu corpo não aguentar mais. Era a forma que eu tinha de extravasar a raiva.
— Vocês brigaram de novo? — Hiei disse se aproximando com uma mochila no ombro.
— Não sei do que está falando tio.
Hiei era irmão do meu pai. O segundo filho de um casamento tradicional do clã Yosano. Um homem honrado, honesto e justo. Completamente o oposto do meu pai. Quando meu pai infla o peito e diz: "eu te treinei era uma grande mentira.". Hiei me treinou. E não só isso, ele me ajudou em momentos que nunca vou esquecer.
— Você e Gyu. Era só vocês brigarem que você vinha para cá treinar até não poder mais.
— Ele... não entende.
— Que compartilhar, querida? A gente pode fazer isso enquanto a gente uns equipamentos.
Eu suspirei e fui até Hiei o ajudar com a tarefa.
— Eu tô apaixonada tio.
— Pelo Gyu?
— Não. É um outro cara. Eu mergulhei de cabeça.
— Vocês dois já...? — Hiei me aconselhou muitas coisas ao longo da vida. Acho que não segui nenhuma delas
— Já. No primeiro dia...
— Então o negócio entre vocês deve soltar até faísca.
— Eu fui muito precoce, tio?
— Foi. Mas, se é o que você queria eu não julgo. É difícil controlar sentimentos, principalmente o desejo.
— Eu amo ele tio. Não consigo pensar de outra forma
— Paixão e amor são diferentes. Então é na casa dele que você dorme todas as noites?
— Porra todo mundo sabe?
— Sabe. Você nunca foi discreta.
— Até meu pai?
— Seu pai não liga. Se brincar ele mesmo te venderia e você sabe. Ele não se importa com você ou seus sentimentos. Ele na verdade tá dando pulos de alegria quando soube quem era o rapaz.
— Até isso vocês sabem?
— Não existem segredos nestas paredes meu anjo e você sabe. Além do mais, saber da possibilidade de um filho do clã Gojo com o clã Yosano o deixou muito empolgado. Por isso ele finge que não vê suas fugas noturnas.
Sabe quando você se sente tão mal que se o mundo se abrisse e te engolisse era a melhor coisa para você? Era assim que eu me sentia. Meu pai sabia de tudo, não. Todo mundo sabia de tudo. Mas, por ser o líder do clã Gojo todo se fez de besta. Ele estava me vendendo do mesmo jeito, na esperança da gente cometer um deslize e eu carregar o herdeiro de um dos clãs mais poderosos do nosso país.
— Nossa.
— Não se sinta assim meu anjo. Talvez o filho do clã Gojo seja melhor do que o que o seu pai planejou para você.
— Como assim tio?
Hiei percebeu que havia falado mais do que devia. Só que ele insistisse em mudar de assunto ou mentir seria muito pior. Ele soltou os ombros pesadamente e disse com certa tristeza no olhar.
— Seu pai ia te arranjar um casamento de todo jeito. Interesses políticos. Ele tava conversando com os Zenin, e ofereceu você para o babaca do Naoya. Ele disse que já que gostam tanto da genética da sua mãe, eles iam adorar você.
— Minha mãe? O que?
— Sua mãe fugiu com um Zenin. Toji Zenin.
O nome do tal homem nunca havia sido mencionado até aquele momento pelo meu tio. Ele sempre mencionou o cara como "o Bonitão". Eu realmente não sabia como me sentir e nem o que fazer.
— Eu vou indo tio.
— Kira...
— São informações demais para um dia só.
(...)
Era difícil lidar com a minha família. Lidar com um pai que tinha um desvio de caráter tão grande que às vezes eu me perguntava se ele não sentia culpa quando deitava a cabeça no travesseiro quando dormia a noite. É claro que não. Ele não se importava com nada além de si mesmo.
Saber que eu estava sendo usada de todas as formas possíveis me deixou muito mal. Eu poderia deixar de me encontrar com o Satoru, mas como eu disse ele era como uma droga para mim. Altamente viciante. Estar com ele era tudo que eu queria.
A gente andava por aí como se realmente fossemos namorados. E realmente éramos. Ele só não gostava do rótulo, do título. Acho que dizer que estava relacionando com alguém o dava medo de que sua liberdade havia sido tomada. Se ele me traía, se envolvia com outra pessoa eu nunca fiz questão de saber. O que os olhos não veem o coração não sente e quem procura acha. E como não tínhamos um título, eu nunca cobrei nada dele.
Com o tempo a gente passou a sair por aí de mãos dadas. Íamos a lanchonetes, cinema, parque. E passamos a sair também com os amigos. Bom, pelo menos os da escola, porque o Gyu parou de falar comigo. E sim, isso também me magoava, só que o Gyu era como se fosse um irmão. Eu pensava que em algum momento ele iria voltar a falar comigo. Como todos os irmãos fazem.
Naquela tarde, acho que foi um mês antes de tudo acontecer. Nós nos reunimos no Karaokê. Eu, Satoru, Shoko e Suguru, além de alguns novatos, acho que eram Haibara e Nanami. Não me lembro mais exatamente. Eu passei o tempo todo pensando na minha vida, distante. Eu nem consegui me concentrar, parei no tempo vendo o Haibara estragar alguma música que ele jurava que estava cantando.
— Honey? — Satoru me chamou pela segunda vez, eu acho. — Tá distante.
— Desculpa. Eu tô meio cansada.
— Quer ir embora? — Ele me disse atencioso, disso eu nunca pude reclamar. Era alguém que era bom amar.
— Não. Tá tranquilo.
— E aí casal? Vem ou não vem? — Shoko chamou empolgada.
— Vai lá. Eu não sou uma boa cantora. — Incentivei ele a se divertir. Eu nunca quis envolver ele nos meus problemas. Sempre fui de resolver meus problemas sozinha. Parando hoje para pensar se eu tivesse dito tudo a ele, nada do que veio depois teria acontecido. Mas, eu tinha tanto medo dele me deixar, de não querer mais me ver, que eu o mantive longe de tudo. Eu sendo individualista como sempre.
Satoru cantava bem. Zero surpresa na verdade. Era um gênio nato. Eu amava a voz dele, do jeito que ele cantava olhando para mim os refrões românticos. No fim ele acabou de arrastando para cantar junto com ele. Este momento eu relembro com nostalgia, de uma época que não voltaria mais. Assim como todas da minha juventude.
Depois do Karaokê nós fomos juntos para a casa dele. Como meu pai sabia de tudo eu resolvi tocar o Foda-se e estava praticamente morando com o Satoru. Eu devia ter sido mais prudente, mas acho que isso nunca fez parte do meu vocabulário, pelo menos não naquela época.
Eu estava deitada na cama dele olhando ele terminar de jogar videogame. Eu ainda estava pensando em tudo ao mesmo tempo. Ele estava sentado no chão encostado na cama, virou-se para mim e se apoiou no colchão.
— Tá muito estranha. Por acaso, você não gosta mais de mim, ou está brava comigo com alguma coisa?
— Não, é só a minha família. Eu não tenho uma família estruturada.
— Percebi mesmo. Você passa a maior parte do tempo aqui comigo e eles simplesmente não dizem nada.
Porque era interessante para eles. Mas, eu não ia dizer isso para ele.
— Pois é... — Respondi sem graça.
— Olha, e se a gente fosse para a praia este fim de semana? Okinawa? Que você acha? É a nossa última semana de férias.
— É verdade. Seria uma boa mesmo.
— Então, fechou. Vou amar ver você de biquíni, aliás tá com um peitão. Eles cresceram?
— Não! — Eu ri do comentário safadinho dele.
Satoru estava empolgado até demais. Tinha um jeito especial que era só dele de dizer que se importava comigo e queria me ver bem. E nós fomos para a praia, nos divertimos tanto que eu quase me esqueci dos inúmeros problemas. Da quantidade de coisas que estava acontecendo. Nossa turma estava lá, os amigos da escola não tinha como ser mais perfeito.
Eu estava debaixo de um guarda sol ao lado da Shoko que não era muito adepta de se bronzear. Ela se escorou sobre os braços da cadeira de praia em que estava e olhou para mim.
— Você anda meio pálida.
— Eu? — Perguntei despercebida.
— Sim, tá doente?
— Não que eu saiba.
— E como está sendo essa relação de vocês? Esse namoro?
— Não é bem um namoro.
— É o que então? Você praticamente mora com ele.
— Não exatamente, a gente nunca rotulou o que temos. Digamos que estamos nos conhecendo.
— Muito bem pelo visto.
Eu me lembrei de algo que eu deveria ter perguntado desde o início e não sabia como. Eu parei para pensar em o que meu pai, que era um colecionador barra traficante barra mafioso, iria querer que estivesse na escola. Era por isso que eu estava tão distante. Isso eu tinha herdado do meu pai. A mente que fica o tempo todo pensando no próximo passo. Foi quando estive a sós com a Shoko que me lembrei da ferramenta de valor inestimável. Um prato cheio para o meu pai. A Naku Mibojin.
— Shoko?
— Hum?
— Aquela ferramenta de valor inestimável, o que exatamente ela faz, você sabe?
— Eu não sei muito sobre ela. Talvez o Gojo te informe melhor porque se não me engano a ferramenta meio que está em posse do clã dele e foi cedida ao colégio.
— Entendi. — Então eu teria que ir atrás dessa informação a todo custo.
A casa em que estávamos pertencia à família Gojo. Uma enorme residência na beira da praia. Tinha uma vista do tipo que só se vê em catálogos de viagem. Haviam inúmeros quartos, além de sauna e academia.
Ele solicitou antecipadamente que os funcionários limpassem tudo e se encarregassem do jantar. O cardápio do jantar tinha frutos do mar e mais algumas comidas tradicionais mesmo, eu não lembro bem o que era. Nós nos sentamos à mesa juntos, éramos uma turma de 6 pessoas. Eu, Satoru, Shoko, Suguru, Nanami e Haibara. E tinha as veteranas Mei Mei e Utahime, mas elas não puderam ir devido a uma missão. A gente estava rindo e brincando, falando sobre o dia a dia da escola. A cozinheira chegou logo depois com um prato de natto, quando o cheiro chegou no meu nariz, eu senti meu estômago revirar, levantei da mesa apressada e saí correndo até o banheiro e vomitei tudo que tinha comido durante o dia.
— Honey? Você tá bem? Quer que a Shoko cuide de você? — Satoru disse do outro lado da porta.
— Eu tô sim, deve ser algo que não caiu bem no estômago.
— Mesmo assim, a Shoko vai cuidar de você.
Eu levantei do chão ainda enjoada. Eu tremia, estava branca como papel. Depois eles me levaram até o quarto e me deitaram na cama. Tudo ainda rodava. A Shoko cuidou de mim e depois eu dormi. Acordei com Satoru deitado do meu lado abraçado comigo.
— Acordou... tá se sentindo bem meu anjo?
— Tô sim.
— Que bom. Fiquei preocupado.
— Deve ser algo que eu comi. Mas, relaxa que eu tô bem agora. Tá?
— Não me dá esse susto mais viu? — Ele beijou o alto da minha cabeça e se levantou.
Eu estava doente, mas tinha um trabalho a fazer. Tinha que descobrir antes que meu pai botasse o plano em prática. Me ajeitei na cama, pedi a ele um copo d'água e depois ele sentou-se na cama diante de mim.
— Amor? — Eu comecei procurando a melhor forma de perguntar.
— Hum?
— O que é a Naku Mibojin?
— Tá falando da espada?
— Sim. Eu ouvi a Shoko dizer que é de valor inestimável. O que poderia fazer ela valer tanto?
— Bem, ela pertenceu à Masakado Taira, um dos três grandes espíritos vingativos. E por algum motivo foi parar no clã Gojo. Dizem que ela tem vida própria. Que seu corte era certeiro mesmo que o usuário não saiba manejar, além disso Masakado Taira imbuiu sua própria energia nela, e sua técnica era basicamente manipulação espiritual.
— Manipulação Espiritual?
— Ele invocava fantasmas.
Eu parei por um instante e lembrei da minha própria técnica. Eu não tinha tido tempo até então de mostrar a ninguém da escola. Então não sabiam sobre minha técnica, que era justamente sobre isso. Invocar fantasmas baseado somente em pactos com os espíritos. Se fosse o espírito de um feiticeiro eu poderia usar todo o seu arsenal de feitiço. Algo que meu pai gostava de deixar em segredo.
— Isso é interessante... — Disfarcei meu choque.
— Mas, tem um porém. A espada escolhe seu usuário. O que significa que nem mesmo eu poderia usá-la se ela não quisesse.
— E o que acontece se usar sem ela escolher.
— Suga sua energia amaldiçoada e depois sua energia vital.
— Nossa.
— Por que esse interesse todo honey?
— Nada. Eu achei o nome interessante. E o fato dela ser de valor inestimável.
— Tá, vou pegar algo para você comer. — Eu vi Satoru se levantar e sair do quarto.
Eu fiquei sentada na cama pensando para variar. O fato dessa espada fazer isso tudo justificava muita coisa. O que Satoru não sabia era que o clã Yosano era descendente de Masakado Taira. O que aumentava nossas chances de ser escolhido pela espada. Merda.
Ouvi alguém bater na porta, disse um entra e Shoko surgiu na porta sorridente. Ela sentou-se na minha cama e ficou me olhando um tempo e depois disse.
— Tá melhor?
— Sim. — Eu disse sem graça.
— Eu não gosto de rodeios Kira. Eu vou ser direta. — A frase dela começou a me assustar. — Você está grávida?
E naquele instante foi como se o chão abrisse debaixo dos meus pés. Eu fiquei atônita, paralisada. A única coisa que consegui falar foi:
— Que?
— É. Grávida. Vocês estão se prevenindo?
— Claro! — Que não. Éramos adolescentes imprudentes. Acho que nem pensamos nisso.
— Tá, mesmo assim é melhor você fazer um teste de gravidez, só para ter certeza. — Ela tirou da bolsa uma caixinha. — Aqui, comprei pra você. Faz, só para tirar da cabeça. Sua menstruação está atrasada?
Eu nem tinha parado para pensar nisso. Os dias foram passando tão rápido que nem me atentei a isso.
— Não... — menti. — Mas, eu vou fazer, para tirar da cabeça, né?
— Qualquer coisa tô aqui.
Shoko era uma boa pessoa. Meio distante, mas tinha um coração bom. Eu olhei para a caixinha e em seguida vi ela sair do quarto e fechar a porta. Li as instruções, e depois escondi a caixa. Eu teria que esperar até o dia seguinte. Satoru dormia pouco, o sono dele era extremamente leve e durava umas quatro horas por noite. Eu também não dormi naquela noite, passei em claro preocupada com a suposta gravidez. Esperei ele dormir, levantei bem devagar, peguei a caixa e caminhei nas pontas dos pés até o banheiro. Eu fiquei ansiosa batendo a perna esperando o prazo do teste. Meu estômago parecia estar revirando outra vez, mas naquele momento era de nervoso. Peguei o resultado e eu juro que eu senti como se minha alma tivesse saído do meu corpo. Dois resquícios. Eu estava grávida. Para o meu desespero e a alegria do meu pai.
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