Capítulo 9 - parte 5 (não revisado)
Encosta em frente à casa dela, que é relativamente perto. Para não chamar atenção, vai na sua BMW e já a encontra esperando no portão. Da janela, a mãe olha a filha sair. Observa o rapaz e aprova-o. Ele é educado, sai do carro e abre a porta para a filha. Parece dirigir com cautela, mas estranha que um menor dirija assim tão tranquilamente.
O dia está agradável e Daniel abre a capota. Vão passeando pela cidade, com ele mostrando os lugares mais bonitos. Finalmente, segue para a praia de Ipanema, estaciona o carro e convida-a para passear.
– Este lugar é muito bonito.
– É sim. Gostas de sorvete?
– Sorvete? O que é sorvete?
– Ice cream. – Sorri-lhe.
– Oh, you speak English! (Falas inglês!)
– Calma, Jessy – dá uma pequena risada – apenas falei uma palavra. Isso não me faz uma pessoa que saiba inglês. Além do mais, tu é que tens de saber português.
– Ok. Eu gosto de sorvete – afirma, rindo – por que me chamou de Jessy?
Daniel sente aquela risada como um raio de sol aquecendo o seu coração. Sem tirar os olhos dos olhos, diz:
– Bem, é bonito e combina contigo. Não gostas?
– Gosto sim. Na verdade é o meu apelido desde a infância.
– Vem, ali há uma sorveteria bem bacana e podemos sentar na beira da praia. Sabes, há cem anos este lugar era sujo e poluído. Hoje é um paraíso.
Ajuda-a a escolher os sabores e sentam-se em uma mesa, na praia. Jéssica olha para ele, tão calado a não ser quando lhe mostra algo ou lhe responde.
– E você, fale-me sobre si. – Pede, alegre.
– Eu não tenho nada de especial para ser dito. Sou apenas uma pessoa como qualquer outra.
– Não me parece – insiste, sorrindo para Dan – mas parece muito tímido. Às vezes tenho a sensação que conheço você desde sempre, só que você não é assim. É alegre, jovial.
– Talvez um dia eu volte a ser assim. – Responde.
– Ah, então existe algo aí na sua linda cabecinha que o deixa triste e tímido.
– Olha, eu não gostaria de falar sobre mim agora, ok?
– Desculpe. – Ela fica triste, fechando o semblante.
– Jessy, eu passei por um período muito ruim e ando um pouco confuso. Não precisas te desculpar pois a culpa é minha. – Ele sorri para ela com carinho e a garota alegra-se. Ao fim de algum tempo, ela pergunta:
– Você acha possível a gente conhecer alguém antes mesmo de ver essa pessoa? Até mesmo apaixonar-se por esse alguém?
– Por que não? – Daniel sente-se desnorteado. – Afinal, o coração tem razões que a própria razão desconhece.
– Caramba, você conhece Shakespeare?
– Somente algumas obras – comenta, sorrindo – mas essa frase não é dele, e sim do Blaise Pascal. Tu conheces Shakespeare?
– Claro, eu adoro as obras dele. Além do mais, temos... tínhamos, de estudá-lo na escola. Engraçado, podia jurar que essa frase era dele.
– A sua frase mais famosa é: "há mais coisas entre o céu e a terra, do que sonha a tua vã filosofia."
– Eu sei dessa frase, mas pensei que a outra também fosse.
– Está ficando tarde e devemos retornar para nos prepararmos para o atletismo.
Caminham de volta para o carro e Daniel para em frente à sua casa, olhando para ela.
– Queres que te espere? – Pergunta.
– Se não te importares. Troco-me em dez minutos. – Já começa a falar ao modo gaúcho, embora ainda com o "s" chiado, pois é bastante adaptável.
Daniel aguarda, sentindo-se cada vez mais confuso. Estar perto dela é algo que o inebria e por outro lado amedronta, mas sabe que nunca mais poderá ficar longe da garota. Poucos minutos depois, Jessy aparece vestindo um short e camiseta. Sua beleza é impressionante e nem a Suzana é tão perfeita. Discretamente, suspira fundo ao vê-la. Na escola, deixa-a na arquibancada em frente à pista e vai para o vestiário trocar de roupa ao mesmo tempo que chega Bianca.
– Oi, Daniel, tudo bem?
– Oi, Bianca – cumprimenta – esta é Jéssica e está na minha turma. Veio dos Estados Unidos esta semana. Jessy: Bianca, a melhor corredora da equipe. É do Uruguai.
– Olá, Bianca – diz Jéssica, em espanhol – tudo bem? Que bom que conheço alguém que fala castelhano. Assim, posso continuar treinando, se não te importares, é claro.
– Olá, Jéssica, claro que não me importo, mas preciso falar português, pois ainda tenho dificuldade. – Vira-se para Daniel. – Vamos aquecer?
– Vamos. Jéssica, deves aguardar o treinador para o teste.
– Certo, estarei aqui aguardando.
Os dois começam a correr e Jéssica fica desconfiada, pois está na cara que a garota é apaixonada por ele. Ela corre num ritmo que seria meio alucinante para uma pessoa normal. Sabe que pode aguentar aquilo facilmente e vê a tranquilidade com que Daniel a acompanha, começando a ficar impressionada. Ainda por cima, ambos conversam como se estivessem apenas dando um passeio a pé. Não resiste e ativa a telepatia.
– "...s como podes saber disso, Bianca?" – Não consegue ouvir Daniel, mas percebe o que Bianca ouve. – "Simples, Daniel, tu estás fora do normal. Vejo que andas nervoso e és sempre tão calmo, tão seguro de ti." – Ela responde.
– "Eu pensava que tinha um grande autocontrole, mas vejo que me enganei. É verdade sim, Bianca. E ela está-me afetando muito." – Para espanto da Jéssica, a garota aumenta bastante o ritmo do passo, mas Daniel segue-a sem esforço algum.
– "Não devias. E tem mais, eu acho que aconteceu o mesmo com ela. Quando olha para ti os seus olhos brilham. Afinal, o que te afeta tanto?" – Pergunta Bianca. Ele demora a responder, até que diz:
– "Às vezes parece que estou traindo Daniela. Sei que é tolice o que digo. Afinal como posso trair alguém que já faleceu, mas fico desorientado."
– "Então é isso." – Pensa Jéssica. – "Ele perdeu alguém e por isso a tristeza toda. Pobrezinho do meu amor, mas de quem eles estão falando?"
– "Ora que tolice, Daniel. Mesmo que ela tenha sido muito especial e acredito que foi, já partiu. Daniela vai ficar na tua memória para sempre como uma coisa boa. Esse amor não será substituído, não a estarás traindo. Estarás sentindo um novo amor. Sinceramente, seria um desperdício se um cara tão bacana como tu nunca mais se apaixonasse. Só tenho pena que não seja eu, mas tudo bem. Ela é simpática e muito mais bonita que a moça do teu trabalho, a Suzana. Apesar de que Suzana era a mais bonita daquele restaurante. Que coincidência fazermos aniversário no mesmo dia." – Embora não tenha dito, Jéssica ouve que é em onze de Março, também sendo o seu. Bianca acelera mais ainda o ritmo. – "Mas pensa bem, Daniel, pois ela não vai esperar para sempre."
Nesse preciso momento chega Geovâni e avista Jéssica, imediatamente começando a assediá-la. Ela, que ainda está com a telepatia "ligada", sente a sua mente e fica horrorizada. Tenta afastar-se, mas ele pressiona, aproximando-se mais e rindo, bancando o bom.
Daniel nota e dispara numa velocidade que deixa Bianca completamente impotente para acompanhar, levando menos de quatro segundos para atravessar os cinquenta metros que os separam. Boquiaberta, Bianca aproxima-se, olhando. Assim que Jéssica recua um passo, Daniel põe-se exatamente entre ambos.
– De novo, Geovâni! Já te dissemos para deixar as gurias em paz, caramba. – A voz é calma e firme, com o olhar de um Dragão Branco. Uma pessoa normal teria cedido, mas esse sujeito não.
– Que foi, babacão? – Diz, grosseiro. – Se tu pensas que fiquei impressionado com aquela montagem no youtube, estás muito enganado. Eu posso te arrebentar com uma mão só.
– Como sempre, resolves tudo pela violência. Rebenta e vais passar alguns anos na cadeia. Quem sai perdendo? Tu, que pensas que podes vencer qualquer um agindo sem razão e pronto... cadeia. Já olhaste à tua volta? Consegues rebentar todos nós?
Uma vintena de atletas cercam-no.
– Vai-te, cara. Deixa as gurias em paz, do contrário um dia encontrarás alguém que não poderás engolir e ficarás muito engasgado. Por que não esqueces a violência e vives uma vida normal?
– Seu idiota, amante de amarelas. Um dia ainda te pego. – Essa apanha o Daniel tão de jeito que ele começa a retesar a musculatura e avança um passo. Dois colegas veem o que vai acontecer e entram na frente do Daniel, empurrando o grandalhão para trás. Jéssica puxa-o pelo braço.
– Vem, Daniel, não vale a pena. – Ela puxa por ele, enquanto os outros afastam Geovâni, ameaçando-o. Jessy abraça-o de leve, e diz. – Obrigada. Ele é muito mau. Sinto maldade nele.
– Acho que ele nunca vai entender que a violência é fútil.
– É verdade, mas devias cuidar. Ele podia ter-te machucado.
– Ele é violento e esse tipo de gente tem medo quando é enfrentada. De qualquer forma, pode ser que ele tivesse uma surpresa muito desagradável. Olha, chegou o professor, vem.
Daniel apresenta Jéssica ao treinador. Este manda-a dar umas voltas para aquecer e ela começa a correr num ritmo muito puxado para um simples aquecimento. Toninho pensa que a moça quer se mostrar, mas não perde o fôlego. A pedido, Bianca começa a acompanhá-la.
– Ei, agora tenho mais um parceiro capaz de me acompanhar. Gostas de correr, Jéssica?
– Adoro. Eu corria muito em Boston.
– Olha, não liga para aquele brutamontes. Todos os outros rapazes são legais e nos protegem dele, especialmente Daniel.
– Tu gostas dele, não é, Bianca? – Ela fala em castelhano.
– É sim, mas ele não me quer porque gosta de outra pessoa, só que está um pouco confuso, mas isso vai passar logo. Ele é muito bondoso e atencioso.
– Eu vejo. E também vejo que és uma boa amiga. – A americana fica triste. – Ele praticamente arriscou a vida para me proteger daquele monstro e se o cara bate nele acho que o mata. Meu Deus, eu fiquei apavorada. Mas quando ele disse aquela coisa horrível, até parecia que estava crescendo e avançou para o imbecil, que eu pensei que o ia matar. O cara chamou-o de amante de amarelas. Tu sabes o que foi isso?
– Sei, mas talvez seja melhor ele te falar, senão vai parecer que eu estou fofocando. Vamos acelerar um pouco. O treinador mandou ver o quanto tu aguentas.
– Xi, Bianca, vais ter que suar muito para me vencer. – Ela sorri à nova amiga. As duas começam a acelerar cada vez mais e, para surpresa da Bianca, esta é incapaz de sustentar o ritmo da Jéssica, precisando de parar. O treinador chama-as, satisfeito.
– Jéssica, né? Muito bom, estás aprovada. Eu só queria mais duas como vocês para formar um time de revesamento. Acho que seriamos campeões do mundo.
No fim da aula, Daniel leva as duas garotas para casa. Deixa primeiro a Bianca e depois a Jéssica. Esta dá-lhe um beijo no rosto agradecendo pelo dia, o que o deixa fora do mundo. No outro dia, de manhã, vão para a aula. No intervalo, os quatro saem para a piscina e Jéssica pede para falar com a Cláudia. Paulo acha ótimo pois quer tirar uma dúvida com Daniel.
– Dan, eu estou aprendendo as respirações, mas tenho dúvidas. Aqui tem uma sala livre, podes me ajudar?
– Claro, tchê. – A sala é excelente com tatames e equipamento para artes marciais. Paulo começa a demonstrar um exercício para Daniel, que fica impressionado com a evolução do amigo.
– Paulo, respira pelo diafragma. Absorve mais oxigênio... Isso. Agora canaliza para o ki. Golpeia. – A pancada no saco de lona fá-lo balançar bastante. – Muito bom, mas tens de melhorar a postura e a musculatura do abdômen. Começa fazendo uns mil abdominais por dia e sobe gradativamente para dois mil. O mesmo em apoios. Olha. Põe a mão no meu diafragma.
Paulo obedece e sente como se tocasse uma parede de concreto armado.
― ☼ ―
Bianca vem caminhando pelo corredor quando ouve vozes na sala de artes marciais. Curiosa espreita pela janela da porta, que está fechada, e vê Paulo mais Daniel, o primeiro pressionando o abdômen do amigo que está sem a camiseta. A moça fica impressionada com o físico do colega. Logo a seguir, observa Daniel ficar de frente para o saco de pancadas. Este abre as pernas, agachando-se e ficando com as mãos de punhos cerrados na cintura.
Espantada, não consegue tirar os olhos dele que faz um movimento rápido e golpeia o saco de lona, destruindo-o no mesmo ato com um estrondo. De olhos arregalados, observa tudo, sem conseguir sair dali, vendo ambos treinarem.
― ☼ ―
– Meu Deus, Dan! – Afirma Paulo assustado.
– Foi mal, e olha que eu estava usando a mesma força de um Azul. O mestre Lee acha que poderás tornar-te Azul ou Verde. Bem, já que ficamos sem o saco, ataca-me. Vou me nivelar a um Azul. Podes acertar-me que não me ferirás.
Paulo começa a treinar com o amigo, atacando-o sem parar e Daniel defende-se sem a menor dificuldade. Ao fim de um tempo para e o parceiro desfere um forte soco no peito amigo. Este nem se mexe, mas a mão do Paulo fica dolorida.
– Ok, acho melhor pararmos. – Diz. – Estás bem?
– Sim, foi leve. Bah, cara, tu pareces uma muralha e não um ser humano.
Daniel dá uma risada alegre.
― ☼ ―
Cada vez mais impressionada, Bianca observa os dois, pensando no que Daniel dissera uma vez.
– "Meu Deus, quando ele disse que não gostava de violência, mas isso não significava que não estava preparado para ela, jamais imaginei que fosse capaz disso, nem mesmo em sonhos."
Quando vê que eles param, sai de fininho.
– "Tenho até pena daquele monstro, se tentar brigar." – Pensa, saindo contente por saber que está mais segura do que nunca.
― ☼ ―
Um dos escritores mais famosos do mundo.
Blaise Pascal, filósofo e inventor francês. Criou a primeira calculadora mecânica.
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top