Capítulo 8 - parte 8 (não revisado)
Na favela, ninguém sai para catar lixo e aguardam ansiosamente o cumprimento da promessa. Alguns têm dúvidas, mas Zé argumenta que, se ele quisesse enrolar a turma, jamais teria deixado aquela fortuna para comprarem alimentos. Têm comida para cinco dias e, por isso, estão tranquilos. Pelo meio da manhã começam a ouvir ao longe o barulho de vários veículos pesados. Do nada avistam um comboio de caminhões, um trator e uma van encabeçando a fila. Estes param à frente da favela e, da van, desce um homem de gravata, sério. Olha aquela população à sua frente e pergunta:
– Quem é o senhor "Zé"?
– Vai, irmão – diz a mãe da criança que Daniel salvara – aqui estão eles. O rapaz cumpriu a promessa.
O homem avança e afirma:
– Eu sou José Pedro, líder da comunidade.
– Que coincidência, amigo – diz o homem da gravata estendendo a mão – também sou José Pedro. O chefe mandou vir aqui falar consigo para acertarmos a construção. Os caminhões estão trazendo lages para fazerem o muro de proteção. Isso será a primeira coisa a fazer.
– Olhe, tchê, quem é esse chefe. Eu falei com um rapaz ontem que prometeu ajuda deu muita grana pra gente, mas ele não parecia chefe de ninguém. Quem tem chefe é índio!
– Amigo – comenta o engenheiro, sorrindo – chefe é uma forma carinhosa que nós usamos para falar do nosso patrão, Daniel Moreira. Foi ele que esteve aqui ontem e deu o dinheiro para vocês.
– Mas ele é um jovem! Não deve ter mais de dezoito anos!
– Ele tem dezesseis anos e é o nosso chefe. Um bom chefe. Todos nós o amamos pois ele é patrão e amigo. Mandou-nos aqui para planejar com o senhor como será o novo lugar. – Aponta para a favela. –Aquilo será tudo derrubado. Venha, vou-lhe mostrar.
Levando o homem, apresenta uma planta do local que a prefeitura fornecera e os engenheiros e arquitetos da Cybercomp, às pressas, criaram um belo projeto residencial.
– Para cada família, vamos fazer uma casa de três quartos. Será um sobradinho de dois andares. Aqui no meio, termos a administração da comunidade, como um condomínio, que é o que passarão a ser. Ao lado, ficará a quadra de esportes, com o campo de futebol, ginástica e atletismo. Do outro lado, vamos fazer uma escola e o posto de saúde. De costas para a rua, virado para vocês, um parque com um salão de festas e várias churrasqueiras. Para lá, aponta para um terreno baldio ao lado da favela, será a usina de reciclagem e uma fábrica de beneficiamento de alumínio, bem como um galpão de triagem. Já receberão tudo pronto, até o maquinário, e enviaremos uma equipe de especialistas para ensinarem a tocar o negócio. O vosso cliente já está garantido pois a empresa do chefe irá comprar toda a produção e, o que sobrar, ele ajudará a vender para outras indústrias.
– Mas cadê ele? – Pergunta o homem, desconfiado.
– Ele está com o prefeito, tentando convencê-lo a ajudar. Você não pode sair de perto de nós, pois quer muito falar com o senhor.
– Vocês são como acertar na loteria. Pena que não foi seis meses atrás. – Deixa cair uma lágrima. – Talvez meu filho ainda estivesse vivo.
– Infelizmente, Zé, só soubemos do vosso problema ontem e Daniel não pode ver ninguém sofrendo. Bem, temos que começar. Aqui está o material para o muro. O chefe disse que paga tudo, mas vocês é que vão construir e nós orientamos. Onde posso descarregar?
– Deixa comigo, xará. – Diz o líder, Grita com toda a força para os moradores. – Gente, este material é pra fazer o muro na estrada. Mais nenhuma criança irá morrer. VAMOS, ajudem a descarregar.
– O chefe vem pelas duas horas da tarde e você precisa deixar o campinho de futebol livre, pois o prefeito virá de helicóptero. Juntamente, começaremos a construir a área da comunidade. Depois, vamos para as casas de vocês. Ele orientou para fazerem um sorteio, pois não dá pra construir todas as casas ao mesmo tempo. Mas, como vocês são muitos, é possível erguer dez ou doze casas de cada vez. Será rápido, porque usaremos lajes pré moldadas. Só tem uma coisa. Ele avisou que se tiver uma mentira ou corrupção, abandona vocês na mesma hora. Nisso, é radical.
Naquela favela de desesperados, nasce uma esperança e começam a trabalhar juntos para protegerem a própria comunidade. A sensação de união daquelas setecentas e vinte famílias lutando para sobreviver é muito forte. Ao verem uma tábua de salvação no meio do oceano da vida, revolto de crueldade, unem-se e agarram-na com todas as forças. Como um só corpo, começam a trabalhar incansavelmente pelo próprio futuro. Um pouco antes das duas da tarde, Daniel encosta. Avista o engenheiro e o tal do Zé. Sai do carro e anda em direção a eles, estendendo a mão para cumprimentar. Após, chama o líder de lado:
– Amigo, falei com o prefeito e consegui esta terra toda para vocês, inclusive ali. Lá, vamos construir uma fábrica e vocês nunca mais irão pegar lixo. A partir de agora, vão comprá-lo. Preciso de falar com você sobre outra coisa. – O par sai conversando.
O prefeito chega junto com Suzana. Esta está muito bonita, usando uma blusa azul, que cai sobre os ombros e um saia preta. Quando o helicóptero silencia, o burgomestre começa seu discurso e promete que na manhã seguinte já vão começar as obras de saneamento e pavimentação. Depois, entrega para o líder, um documento simbólico de posse das terras para toda a comunidade. O documento verdadeiro, cada um vai receber quando terminar as casas. O prefeito é aplaudido por todos, embora eles saibam muito bem a quem devem agradecer. Depois, vai-se embora no helicóptero.
– Vai chegar aqui um caminhão com material para a construção de um galpão pré-fabricado – diz Daniel para Zé – que vocês devem mandar erguer ali ao lado do campo de futebol. Lá dentro, faremos um refeitório e uma cozinha. Como ainda não dispõem de energia elétrica, vamos trazer da Cybercomp um reator nuclear miniatura. Terão também um telão e poderão passar filmes à noite.
Mal termina de falar encosta não um, mas dois caminhões e um ônibus cheio de operários. Eles trazem também um guindaste para retirar o material. A construção pré-fabricada será feita pelos operários que chegaram. Daniel despede-se deles e retira-se com Suzana. Os dois fazem uma verdadeira maratona para cumprirem a meta desejada e, quando o dia está no fim, dão por terminada a tarefa. Ele não está cansado, mas Suzi sim. No carro, recosta-se no banco e dá uma espreguiçadinha leve.
– Acho que agora merecemos um descanso – comenta – que dia cheio, Dan.
– Mas produtivo – diz, pondo a mão no seu joelho. Esta suspira e abre ligeiramente a perna na direção dele, que interpreta isso como um convite e, carinhosamente, sobe a mão devagar. Ela dá um suspiro. – Xi, diz ele não tem nada por baixo?
– Ora – responde com ar bem malicioso – a calcinha marca esta saia, então não pus. Além disso, disseste que precisavas de mim! Daí, eu vim preparada.
– Queres ir onde? – Pergunta ele com uma risada.
– Hum, eu quero um banho, pode ser de piscina, um jantar e aquele exercício especial, que só tu sabes fazer. Não necessariamente nessa ordem. Assim sendo, acho que a tua casa é mais indicada, sem falar que está bem pertinho. Ah sim – continua, ainda mais maliciosa. – O sutiã também marca a blusa e fica com a alça aparecendo.
– Mas não vejo alça nenhuma – afirma ele, entrando na brincadeira e subindo a mão.
– Pois é... – ela arremata com o olhar de pura sedução.
Quando chegam a casa, Daniel manda o computador entrar em modo privado, sobe as escadas para pegar o traje de banho dele e o biquíni dela, que ficara lá, retornando para o jardim e avistando a Suzi mergulhar na água tal como Deus a fez. Encolhe os ombros, tira a sunga e também mergulha. Nada até ela, que sorri convidativa. Ambos abraçam-se e ele sente nos braços a maciez do seu belo corpo. Beijam-se por um tempo, curtindo um ao outro...
― ☼ ―
A semana na favela é maravilhosa e o muro fica pronto logo no primeiro dia, graças às lajes pré-moldadas, onde as mulheres começam a plantar mudas de trepadeira. Há até uma guarita com entrada através de uma cancela. Apesar dos moradores serem os trabalhadores das suas próprias casas, uma equipe de engenheiros e arquitetos auxiliam-nos e orientam-nos. Enquanto os homens fazem o trabalho pesado das obras, as mulheres limpam o lugar de todo o lixo, levando para uma área onde este será separado e reciclado. O galpão, durante o dia vira uma escola improvisada, em que alguns professores ensinam as crianças. Todos os dias de manhã cedo, um médico, um pediatra e um dentista aparecem para ver os moradores e tratar deles. Da mesma forma, um caminhão de alimentos leva-lhes tudo o que necessitam. No terceiro dia, o terreno já está limpo e o pequeno riacho nos fundos também. A equipe da prefeitura faz as obras de saneamento básico e a energia elétrica temporária já está distribuída. À noite, antes de dormirem, assistem um filme no telão gigantesco que Daniel mandou instalar no salão. Esse povo começa a saber o que é um pouco de felicidade.
No sábado da véspera de Natal, conforme Daniel havia combinado com vários fornecedores, um exército de veículos de todos os tipos para em frente à favela e começam a descarregar, dentro do galpão, uma quantidade enorme de comida, bebidas e doces. Só de perus há mais de setecentos e os moradores estão abismados, pois nunca tiveram algo que se parecesse com um Natal. Zé chama-os para um intervalo:
– Gente – grita para ser ouvido por todos – este é um presente de Natal que Daniel nos deu. Hoje à noite, teremos a melhor festa das nossas vidas.
As mulheres, que não podem trabalhar em todas as tarefas das obras por exigirem esforço físico, começam a preparar a festa, montando bancos e mesas no campo de futebol. Além de comidas e bebidas, tinham mandado um sistema de iluminação e som completos. Aparece, também, um caminhão só com roupas, onde cada um escolhe vestimentas novas. Aquela gente começa a sentir o verdadeiro prazer de viver, pois até há uma semana apenas sobreviviam. À noite, uma turma de músicos de CTG, contratados pelo Daniel, aparece e começa a tocar para eles. É o inicio da primeira festa verdadeira que essa gente tem na vida. Por volta das dez horas, um caminhão gigantesco vem pela estrada, bem devagar, todo iluminado com luzes piscando. Quando avistam-no, as crianças começam logo a berrar.
– Papai Noel, Papai Noel. – O caminhão gigantesco entra ali dentro, com um Papai Noel em cima da carroceria, acenando. À volta dele, há sete duendes, na verdade anões, vestidos a rigor. O caminhão para e Papai Noel, junto com os duendes, desce.
– Ho ho ho, feliz Natal – diz o bom velhinho, abraçando aquelas crianças que nunca tinham ganho nada de bom. Os duendes abrem o caminhão que está recheado até ao topo de brinquedos. Sobem para dentro do mesmo e começam a ajudar Daniel a distribuir os presentes. Mestre Lee, que conduziu o veículo, vai ajudar e uma hora depois quase não resta nada. As crianças brincam, cheias de alegria, correndo e gritando. Nisso, Daniel avista uma menina de uns quatro anos, sozinha e sem nada, sentada no chão, muito triste. Pega uma boneca enorme, lindíssima, e vai até ela, fazendo-lhe um carinho na cabecinha.
– Oi, pequenina, não queres um presente do Papai Noel?
Chorando, ela vira-se para ele e grita, enquanto afasta a mão dele da sua cabeça:
– NÃO, Papai Noel é mau. Ele é amigo do Papai do Céu que levou meu irmãozinho e meu pai. Agora não tenho ninguém. – Sai chorando.
– Desculpe – a mãe da menina aproxima-se do Daniel – o irmão dela morreu atropelado faz seis meses e ela culpa o Papai do Céu. Nunca mais sorriu nem se alegrou ou brincou com outra criança.
– Não dá para a culpar. – Diz Daniel, desanimado. – Eu sei muito bem como é isso.
Senta-se no caminhão, muito abatido. Ao seu lado, mestre Lee fica em silêncio. Chateado por não ter conseguido alegrar a menina, cobre o rosto com as mãos e falando mais para si do que para os outros, diz em meio a um suspiro.
– O que será que a Dani faria para ajudar esta criança?
– Ora, pequeno Dragão, não é óbvio? – Intervém Lee. – A senhorita Chang iria canalizar essa tristeza transformando-a em amor. Basta encontrar algo que a menina possa amar, que seja só para ela.
– Fácil falar, mestre, mas quem tinha esse dom era ela. Ai que saudades que eu sinto... canalizar, o amor? Mas claro, um cachorro! Só que, onde diabo vou achar um cachorro a esta hora?
– Senhor – um dos duendes que passa ouve a conversa – eu vi aqui perto uma casa anunciando filhotes à venda. Eram box.. box... não lembro!
– Boxer. Perfeito. Venha comigo. – Alguns dos empregados da Cybercomp, que são solitários, passam Natal com eles e Daniel vê uns carros estacionados. Consegue um emprestado e o anão mostra-lhe o caminho. Após rodarem cerca de dois quilômetros, o jovem Moreira para em frente a uma casa com uma placa anunciando os filhotes. Descem e batem na porta, sendo atendidos por um garoto de uns dez anos, que vê o Papai Noel com um Duende. Observa os dois de olhos arregalados.
– Oi, querido, posso falar com o teu pai?
– S... s... só um momento. – Diz este, de olhos esbugalhados. Fecha a porta e sai correndo para dentro de casa. – Pai, tu não tinhas dito que o Papai Noel não existe?
– Ora, filho, de novo essa conversa?
– Bah, é que lá na porta tem o Papai Noel e um Leprechau que querem falar com o senhor.
Espantado, o pai levanta-se e abre a porta, vendo o que filho dissera.
– Boa noite, senhor, desculpe incomodá-lo nesta noite tão importante, mas é por uma boa causa. Por favor venda-nos um cachorro. Não importa o preço.
– Vocês não pensam em fazer algum ritual macabro com filhotes não é? – Pergunta o homem, desconfiado.
– Claro que não, senhor. Estamos ajudando as pessoas da favela aqui perto. Eu comprei um caminhão de brinquedos para as crianças, mas há uma menininha de uns quatro anos que perdeu o irmão e o pai há muito pouco tempo. Está demasiado triste e nós acreditamos que um cachorro poderá trazê-la de volta, substituindo a sua perda. Não importa o preço. O que o senhor quiser, estou disposto a pagar, mas tem de ser agora.
– Entrem, venham. Os filhotes estão aqui. – O homem abre a porta. É uma ninhada muito bonita e Daniel escolhe um macho, perguntando:
– Quanto lhe devo? O senhor não faz ideia da ajuda que me deu.
– Não me deve nada, meu amigo, eu não suporto ver uma criança sofrer e fica como um presente meu para ela. Uma forma de ajudar aquela gente tão pobre.
– Obrigado, amigo, muito obrigado. Desculpe se não demoro aqui, mas tenho uma criança para conquistar. Feliz Natal e mais uma vez, obrigado.
– Vá com Deus, amigo, feliz Natal.
Os dois metem-se no carro e saem disparados para a favela. Quando Daniel chega, vê a menina sozinha num canto. Aproxima-se discretamente e mostra-lhe o cachorro. Pela primeira vez, vê uma reação.
– Ele é bebezinho e não tem ninguém para amar. – Põe o bichinho no seu colo. Este lambe o rosto da menina. – Ele precisa que cuidem dele. Sabes de alguém que queira cuidar dele?
– Eu cuido dele – ela abraça o cãozinho, falando com a sua vozinha de criança – posso cuidar dele?
– Claro, minha linda. Ele é teu, se quiseres.
Não muito longe, a mãe da menina que vive eternamente preocupada com a filha, observa tudo. De repente, vê a pequenina levantar-se e dar um grande abraço e um beijo no Daniel, rindo! Ela nem acredita no que vê e começa a chorar de comoção.
– Ele não tem um nome ainda – diz Daniel/Papai Noel, para a petiza – e precisas de escolher um nome para.
– Vou chamar ele de Miguel, o nome do meu irmãozinho. Obrigada, Papai Noel – ela abraça e beija Daniel – desculpe quando eu disse que o senhor é mau. Eu estava enganada.
Sai correndo com o cão nos braços em direção à mãe, mal aguentando com o peso dele.
– Mamãe, mamãe, olha o que o Papai Noel me deu. O nome dele é Miguel... Por que estás chorando mamãe?
– Nada, filha. – Diz a mãe, secando os olhos com a mão. – É muito bonito sim. – Olha para Daniel, mas ele já saíra dali. – Vai brincar com ele, mas cuidado que é muito bebê.
Ela levanta-se e sai à procura do seu benfeitor.
Muito emocionado, Daniel vê a menina ir embora. Senta-se na traseira do caminhão, sozinho. Suspira fundo e diz para si mesmo:
– Obrigado pelo incentivo, minha amada. Se não fosses tu, eu jamais teria tido esta ideia.
– "Claro que terias, meu amor." – Dani está na frente dele, novamente toda de branco e com a aura dourada. – "Tu és muito especial, darias um jeito."
– Ai, minha princesa – ergue o braço para o rosto dela, num carinho imaginário e cheio de ternura – como eu sinto a tua falta. Como dói a tua ausência. Por que partiste tão cedo?
– "Terá de ser assim, meu anjo. Voltaremos a nos encontrar e tu sabes disso. Agora lembra-te: Suzana cuida bem de ti, mas ela não é a tua companheira desta vida. O que vocês sentem são essencialmente flashes de memórias da vossa vida anterior. Será tão passageiro quanto eu e não insistas ou provocarás a tua destruição." – Ela aproxima-se dele e toca-lhe os lábios com um beijo que só é sentido no plano espiritual. – "Fizeste uma coisa maravilhosa aqui neste pequeno mundo esquecido por todos menos por ti. Agora preciso de ir, mas estarei sempre cuidando de ti."
– Não me deixes, minha Danizinha. – Uma lágrima solitária corre dos seus olhos.
– "Jamais te deixei ou deixarei. Nunca te esqueças."
– Eu sei. É apenas a solidão falando mais alto.
– "Adeus, amor, feliz Natal. Te amo para sempre."
– Adeus minha linda. Também te amo para sempre.
A mãe da menina procura Daniel quando ouve vozes perto do caminhão. Aproxima-se e vê o jovem conversando com uma moça muito linda, mas feita de uma luz dourada.
– "É um anjo" – pensa – "por isso ele conseguiu o milagre."
Feliz, volta e deixa os dois santos em paz.
― ☼ ―
Zé e a irmã estão à procura do Daniel quando ele o vê conversando sozinho, mas está muito longe para ouvir.
– Irmã, olha lá, ele fala sozinho. Será que é tan-tan?
– Ele não está sozinho, Zé! Eu vejo uma mulher com ele. Chinesa e muito bonita, mas é um espirito! Ela brilha com uma luz dourada e ele chora. Acho que não somos os únicos aqui que perdemos alguém que amávamos. Mas, pelo menos, ela aparece para ele. O meu marido desapareceu de corpo e espírito.
– Pensemos noutra coisa, irmã. Vamos deixá-lo em paz.
– Espera, ela foi-se. Vem, vamos falar com ele.
– Senhor, está tudo bem? Por que não se junta a nós?
– Oi, dona Maria. Estava descansando um pouco. – Tem a voz muito triste. Levanta-se, tira o disfarce do Papai Noel e respira fundo. – Então, o pessoal está gostando? As crianças estão contentes?
– Todos nós estamos, menos o senhor. – Afirma Zé. – Você está muito solitário e triste!
– Tem razão, vamos para lá. Aquela fantasia estava ficando muito quente.
– Senhor – pergunta Maria, enquanto caminham – quem era a moça? Ela o faz triste?
– Não, ela não me faz triste. A ausência dela é que me faz triste. Ela era a minha noiva e ia pra China ver um médico por causa de uma doença que tinha quando o avião caiu. Mas conseguiu vê-la?
– Sim consegui. Sinto muito ela ter partido tão cedo. Devia ser muito especial.
– Era sim – responde – ela era a coisa mais especial que eu já tive na minha vida.
– Vocês vão-se encontrar de novo. Acredite em mim, eu sou espírita e vejo coisas que os outros não veem.
– Eu sei, também vejo, mas nem por isso a dor diminui quando me lembro. – Daniel não sabe por que motivo está abrindo o coração para eles, mas são sinceros e amigos. – Vamos lá. Não é hora de tristezas.
A mãe da menina aparece à sua frente e abraça-o com força.
– Obrigada – diz, emocionada. – O senhor trouxe a minha filha de volta para a vida. Desde que perdi meu marido faz dois anos atrás e depois meu filhinho, ela não ria nem brincava. Às vezes ficava dias calada. Fez um milagre!
– Ela vai ficar bem e esse cachorro é de uma raça muito especial. Eles são animais que amam muito as crianças e cuidam delas, bons guardas. Enquanto vocês não tiveram condições de se sustentarem, eu garanto o sustento de todos, até dos animais. Não se preocupe. Estou muito contente por ajudar essa menininha tão bonita. Como está ela?
– Está brincando com o filho da Maria. Sempre brincavam antes.
Daniel junta-se à festa, disfarça a sua tristeza e une-se à comunidade. Ao fim de um par de horas, retira-se discretamente para a sua casa. Ele mora a menos de dez quilômetros e decide ir correndo, pois gosta do exercício. Faz um sinal discreto para o mestre Lee e vai embora.
Quando chega a casa, decide que o melhor é dormir e deita-se na cama, adormecendo quase imediatamente. Na manhã seguinte, acorda e lembra-se do sonho. Ela é linda e amorosa.
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