Capítulo 8 - parte 5 (não revisado)
- Ele está melhor - Cláudia fala para a nova amiga - já sorri um pouco. Por uns tempos pensei que nunca mais o veria alegre.
- É verdade - responde Suzi - acho que nos ajudamos mutuamente.
- Será que isso entre vocês não vai acabar mal?
- Talvez, mas neste momento os benefícios são maiores. Eu, por mim, vivia o resto da vida com ele, mas sei que não será assim e Dani disse mais de uma vez. Ela sabia e estou pronta para enfrentar isso. Olha esta foto, meu Deus como ele é gatinho! Quem diria que uma pessoa tão calma e doce quanto ele, possa se transformar na mais formidável arma de combate que eu já vi. Que estrago que ele fez naquele policial e isso com uma bala no braço.
- Olha, Suzi, não toques nesse assunto. Ele odeia violência e não gosta de ferir as pessoas, mesmo quando tem razão. Bateu nuns brutamontes na escola, pois tentaram agarrar Daniela. Um cara filmou e pôs no youtube. O sujeito teve uma porrada de costelas quebradas e até perfurou um pulmão. E olha que foi uma única pancada. Eram seis ou sete. A luta durou exatos quatro segundos. Ele pediu desculpas por os ter ferido mas eles não lhe deram outra alternativa. Ficou muito chateado, segundo Paulo. Eu vi o vídeo no youtube e nem despenteou os cabelos. É assustador. O que ele fez esta semana foi ainda pior. Acertou o cara de longe, nem o tocou! Impressionante. Olha esta que eu tirei do Paulinho, ele também é um gatinho.
- Claro que é - diz Suzana, distraída. Mudando de assunto continua - será que ele voltará a amar alguém do mesmo jeito que amou a Dani?
- Acho que sim, mas levará tempo. Senão, será um desperdício.
As duas riem.
- Ei, garotas - diz Paulo - o papo de vocês está animado mas a carne está pronta. Quem se candidata?
O almoço é bom, descontraído. Após, Paulo convida-os a passearem no Mustang. Daniel põe um bermuda esportiva, com uma camiseta folgada. Suzana veste com um calção de brim justo, muito curto e uma blusa branca, que deixa os dois sem fôlego e rende ao Paulo um pequeno beliscão. Cláudia até parece que tinha combinado com a Su, pois estão com roupas semelhantes. Já Paulo, veste jeans e camiseta.
- Ei Paulo, este carrinho é bacana - diz o amigo - bem confortável e anda bem.
- É ótimo. Olha só, estamos num lugar estranho. Aquilo ali parece uma favela!
- Infelizmente é uma favela - arremata Suzi - dá pena ver gente vivendo assim.
À beia da estrada, arbustos rasos fazem divisa com um lugar deprimente. As casas são de papelão. Atrás delas, vê-se resquícios de um pequeno córrego cheio de lixo corre lentamente.
- É realmente muito triste - confirma Daniel - meu Deus, Paulo. Para o carro agora. PARA!
Não muito longe deles vem um veículo em sentido contrário, aproximando-se com velocidade bastante elevada. O grito do Daniel é tão imperioso que Paulo freia forte. Antes mesmo do carro terminar de parar, Daniel já havia solto o cinto de segurança e, sem que alguém possa reagir, dá um tremendo salto por cima do carro, praticamente voando uns quinze metros. Nesse preciso momento, uma bola atravessa a rua e um menininho de uns três anos vem correndo atrás da mesma. Daniel termina o salto exatamente em frente à criança, já na mão oposta, onde vem o outro carro. Atrás da criança, mas ainda longe, vem uma mulher desesperada, aos gritos. Daniel pega o garoto ao colo e dá outro salto gigantesco para fora da estrada, no mesmo instante em que o veículo passa. A mulher grita um "não" desesperado e cai no chão inanimada, sem chegar a ver o filho salvo da morte certa por um milagre do destino. Cerca de vinte metros depois, o carro dá uma freada e uma guinada, saindo da estrada e capotando várias vezes. Tudo isto ocorre em um piscar de olhos e ninguém é capaz de assimilar a cena. Somente depois que tudo silencia os outros três saem do carro e Suzana corre, muito assustada. Daniel entrega-lhe a criança e diz:
- Não o largues. Paulo, vê a mãe do menino. - Sai correndo para o carro acidentado, que está de lado, encostado a uma árvore. Olha para dentro e vê quatro jovens e várias garrafas de bebida. Uma está claramente morta e os demais em estado muito grave.
- Cláudia, liga para a polícia e pede duas ambulâncias. - Grita, preocupado. - Retesando a musculatura, puxa a porta que cede e sai toda torta. Tenta chegar aos feridos mas não consegue. Levanta-se e, fazendo uma força tremenda, desvira o carro, para espanto da Cláudia que está com o telefone na mão, olhando para aquele lado. Desiste de mexer nos corpos pois há risco de danos na coluna e volta para o outro lado da estrada. Nesse momento a mulher está acordando e começa a gritar, ao ver o carro rebentado.
- Meu filho - soluça desesperada - meu filho, mataram o meu filho.
- Não. Ele está a salvo - Daniel pega a criança no colo e mostra para a mulher - olha. Está aqui.
Ela corre aos soluços e agarra na criança apertando-a contra o peito.
- Mamãe, mamãe, ele é o super-homem. Veio voando e me tirou da rua. Daí ele voou de novo para aqui. Ele é o super-homem!
- Meu Deus, obrigada, senhor. - Ela ainda treme muito. - Não sei o que faria sem ele. Já morreram seis crianças aqui só neste mês.
- Pronto, já passou - acalma-a Suzana - sente-se aqui.
Começam a aparecer outros moradores da pequena favela, todos com cara de poucos amigos e muitos trazem nas mãos pedaços de pau. Um deles começa a falar:
- Vocês riquinhos acham que podem tudo. Vêm para aqui fazer peguinhas de carro e acabam matando as nossas crianças. Nós podemos ser podres e humildes, mas temos os mesmos direitos que vocês. Desta vez, não escapam. - Afirma, avançando sobre eles.
- PARE. - O tom de voz que Daniel usa é tão imperioso que praticamente paralisa o homem. - Veja, bom homem, nós paramos para acudir a criança e não vinhamos correndo.
- Tio - diz o pequenino, ele é o super-homem e não pode bater nele. Ele voou e me tirou da frente do carro. Depois desvirou aquele outro só com uma mão, eu vi!
- É verdade, Zé, eles salvaram Luciano. O outro carro que passou é que estava correndo. - Comenta a mãe da criança, fazendo o homem baixar a guarda.
- Desculpe, rapaz. Meu filho morreu aqui quando eu trabalhava. Nós somos muito podres e não temos como proteger as crianças que brincam. Vivemos de catar lixo e vender para recicladores.
Suzana aproxima-se do Daniel e põe a mão no seu ombro, dizendo baixo:
- Temos de fazer alguma coisa por esta gente, Dan.
- Temos sim, gatinha, e eu posso ajudar. Acho que este ano, o papai Noel vai chegar mais cedo uma semana. - Dirigindo-se para o homem, que parece ser o líder, pergunta-lhe. - Quantas famílias vocês são aqui?
- Somos setecentas e vinte famílias e a maior parte de nós já sofreu alguma perda. O pior é que a justiça não faz nada. Não somos criminosos, apenas podres só que nos tratam como bandidos. É muito ruim.
- Vocês moram em barracos e ninguém tem uma casa decente. Vou fazer uma proposta: vocês fazem um mutirão e eu forneço todo o material de construção e engenheiros. Transformaremos esta favela em um bairro digno de se viver. Vocês construirão as vossas casas. O que acha?
- Rapaz, você não entendeu. Nós não temos como pagar nada e temos que trabalhar para garantir o pouco alimento que conseguimos. Já viu alguém gordo aqui? Nós passamos FOME!
- Fique tranquilo, homem. Eu forneço todo o material e alimento que precisarem. Podemos construir uma escola de turno integral para as crianças e uma usina de reciclagem para vocês. Não precisam se preocupar em pagar. Não se trata de um empréstimo e sim de uma doação. Se quiserem dar algo em troca, basta a vossa amizade. Cada casa terá tudo o que precisar, moveis, eletrodomésticos, tudo. Eu prometo a vocês.
- Pode ter certeza que seriamos eternamente gratos a você, rapaz, mas como vou saber que vai cumprir a sua promessa.
- Não sabe, mas eu não arriscaria a minha vida para salvar esta criança se fosse um cara safado ou mentiroso, não acha?
O homem aproxima-se e estende a mão.
- Obrigado.
- Muito bem. Segunda-feira mandarei aqui um caminhão com material de construção para começarem a fazer um muro que impeça as crianças de virem para a rua. Ninguém precisará de ir trabalhar pois eu garanto o vosso sustento a partir de hoje até ao dia em que vocês puderem tocar a vossa usina de reciclagem. Construiremos uma casa para cada família. Será preciso escolher um lugar para a usina e outro para a escola. E acho que uma pequena associação de moradores, com um parque esportivo, salão de festas e um posto médico. Agora, onde podemos arrumar um caminhão?
- Não temos veículos aqui. Mas há um pessoal - aponta para trás - que faz carretos e tem um ou dois caminhões.
- Então faça o seguinte, tome aqui algum dinheiro - Daniel tira da carteira todo o dinheiro que carrega consigo que, em geral, é bastante - deve haver uns oito mil créditos aí. Alugue esse caminhão e encha-o de comida. Distribua por todos vocês igualmente. Na segunda-feira, ninguém deverá sair para trabalhar, pois a partir daí irão começar a construir vossas casas. Eu prometo para vocês que, se depender de mim, ninguém nunca mais irá sofrer neste lugar. E tome meu cartão. Qualquer problema que tiver, qualquer mesmo, ligue para mim. Não importa a hora do dia ou da noite. Pode ligar a cobrar.
As mãos do homem até tremem com aquela ajuda caída do céu e a mãe da criança abraça Daniel.
- Obrigada, senhor. Obrigada de novo. - Ela ainda está nervosa.
- Dan - diz Paulo - um deles está se mexendo e também vejo a polícia chegando.
Daniel dirige-se para o carro acidentado e seu olhar é gelado, quando vê o motorista tentando se mexer.
- Não te mexas, idiota, se não quiseres ficar paralítico. Viste o que fizeste? Olha a garota ao teu lado. Mataste-a.
Ele olha para o lado e, quando vê que Daniel não mentiu, começa a chorar. A policia encosta, junto com duas ambulâncias. O policial desce e vem ver.
- O que aconteceu aqui?
- Eles vinham trafegando em sentido contrário ao nosso, voando... - Daniel conta a história. - O motorista já voltou a si, mas eu não os quis tirar do carro com medo de causar lesões.
- Ele é o super-homem, seu guarda - diz o menino, correndo para o colo do Daniel - Ele voou e me tirou da rua. Eu disse que o super-homem existe, mas ninguém acredita em mim. Ele é, eu sei, eu sei.
Daniel faz um carinho no garoto e sorri para ele.
- Não sou o super-homem, meu amor. Mas obrigado pelo elogio.
- O que é elogio?
- Elogio é quando a gente fala uma coisa boa para alguém.
- Ah tá. De nada. - Corre de volta para a mãe.
- Sargento, se não se importa, vamos seguir o nosso caminho. O senhor tem aí bastantes testemunhas e um exame toxicológico é prova mais que suficiente. O carro deles está cheio de garrafas.
- Obrigado, rapaz. Ainda bem que viu a bola. Esta estrada é amaldiçoada. Já morreram muitas crianças aqui.
- Isso vai mudar, eu prometo. - Dizendo isto, Daniel volta para os moradores.
- Estamos combinados? Acha que o dinheiro é suficiente para todos vocês?
- Sim, senhor. Não sabemos como agradecer.
- Não precisa. Ninguém merece viver assim. - Despedem-se e seguem viagem.
- Tu és maravilhoso - Suzana dá-lhe um longo beijo - esta gente jamais te esquecerá.
O casal da frente está muito calado.
- Gente salvamos o dia, por que estão tão calados?
- Eu podia ter morto aquele garoto. - Afirma Paulo, ainda apavorado.
- Não, não terias. Ias passar antes dele, mas o outro carro ia matá-lo.
- Como sabias, Dan? - Pergunta Cláudia, muito séria. - E como pudeste dar dois saltos tão monstruosos?
- Eu sou capaz de prever o perigo segundos antes de acontecer. Por isso consigo dirigir a trezentos por hora, como um sexto sentido. O salto teve a ajuda da frenagem do carro.
- O primeiro talvez, Daniel, mas não o segundo. E vi tu virares o carro capotado com apenas uma mão, estava olhando para esse lado a tentar ligar para a polícia. Estou bem inclinada a acreditar no menino, super-Dan! Além disso, há aquele dia em que a Dani teve o desmaio. Eu estava assustada por ela, mas depois dei-me conta que tu não deste a volta à piscina para a socorrer, pulaste sobre ela. E a piscina deve ter uns dez metros de largura. E o teu braço, super-Dan? Levaste um tiro na segunda e hoje, sábado, não tens nem uma marca.
- Cláudia. Se és minha amiga, não me perguntes o que eu não quero dizer agora. Já falei para Paulo que, quando for ocasião, conto para vocês. Eu não sou alienígena nem nenhuma dessas maluquices que dá nos desenhos da TV. Apenas sou um pouco melhor. Considera como um dom e não sou super. Posso ser ferido e até morto. O meu corpo tem uma capacidade de recuperação fenomenal, por isso não tenho marcas. Por favor, não me perguntem mais nada e mantenham segredo que terão a minha gratidão.
- Ok, mas não vais escapar de umas brincadeiras nossas, super-Dan - responde Cláudia com uma risada - em particular, é claro.
Daniel faz uma careta, mas confia cegamente nos amigos que tem.
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