Capítulo 10 - parte 5 (não revisado)

Natália acorda no meio da noite. Sente-se em paz e feliz com o desenrolar dos acontecimentos, pois o sonho que teve é uma lembrança de um passado distante, quando ela estava grávida da sua filha e uma moça oriental, muito bonita, dissera que esta estava destinada a mudar o mundo. Depois de presenciar os feitos do Daniel e o amor tão forte que ele e a sua filha nutrem um pelo outro em tão pouco tempo, conclui que é esse o caminho que o seu sonho ditara. Seu marido, Isaac, é outro homem. Ele sempre foi um bom esposo, fogoso e que a satisfaz totalmente; mas, nos últimos anos e com os problemas por que passavam, haviam negligenciado um pouco do seu relacionamento pessoal. Agora, sem as preocupações que enfrentou, ainda mais depois que Daniel descobriu que ele abusava da saúde e ela trabalhando com ele, as coisas mudaram. Eles parecem estar em uma segunda lua de mel e estão redescobrindo a paixão juvenil que, como resultado, trouxe Jéssica para a sua vida. Por isso, ela sente-se leve, feliz e muito agradecida ao genro. Levanta-se para ir ao banheiro e, quando volta, vai à janela ver o luar, que está lindo. Em baixo, nota duas silhuetas sentadas lado a lado, em posição de lótus, identificando-os.

– "Eles não precisam de dormir" – pensa – "deve ser um tédio quando se está sozinho, mas agora estão unidos. Tenho a certeza que não vai demorar muito para decidirem viver juntos. A relação deles, apesar da pouca idade, é tão madura ou mais que a minha. O Isaac terá de entender isso." – Volta para a cama e adormece aconchegada no ombro do marido, muito feliz.

― ☼ ―

Bianca dorme o resto da noite sem pesadelos e, pelas quatro e meia, Daniel sai da meditação acompanhado da namorada, que está sintonizada com a sua mente. O céu está avermelhado, mas o sol ainda não nasceu. Ele pega um pequeno aparelho de som em que põe a tocar uma música chinesa para Tai-Chi-Chuan, começando a praticar. Jéssica, continuando o elo mental, imita-o e, lado a lado, ambos parecem um só. Ela simplesmente adora essa nova descoberta, como se sempre tivesse o conhecimento, mas só agora o descobrisse.

Paulo acorda muito cedo, pois lembra-se do que Daniel disse sobre o nascer do sol. Dá um beijo na Cláudia, que ainda dorme, e levanta-se pois são quase cinco horas. Põe uma bermuda e pega na máquina fotográfica. Quando chega ao pátio, vê o casal a praticar e não perde a oportunidade e tirar umas fotografias. Fica fascinado com a beleza da Jéssica, pois jamais viu uma garota tão bonita. O sol ainda não nasceu, mas o céu já está todo azul. O mar, mistura reflexos avermelhados, quase um carmesim. As nuvens, que não são muitas, apresentam tons em vermelho e laranja. Extasiado, Paulo tira dezenas de fotografias.

Doutor Chang e a esposa também acordam muito cedo e levantam-se. Ao aproximar-se da janela, vê Daniel e Jéssica praticando e dá-se conta que há tempos que ele não faz. A esposa aproxima-se e, percebendo o desejo do marido, pergunta:

– Vamos acompanhá-los, Nelson? – Descem e juntam-se ao casal. O Paulo sorri ao ver o grupo aumentado e tira mais fotos.

– Suzi – diz João ao ouvido dela – quero ver o sol nascer, vens comigo?

– Fala sério, amor. Ainda estou com sono. Vai tu.

Beija-a, coloca uma bermuda e dirige-se para o pátio. Lá, encontra a pequena turma. Como adora Tai-Chi, junta-se ao grupo. Os cinco estão de frente para o mar, aguardando o nascer do sol.

Repentinamente, uma ponta deste aparece, como se o oceano fosse rasgado no horizonte e ele surgisse de dentro das suas águas. Imediatamente, o mar tinge-se de uma tonalidade carmesim muito forte. Paulo, fascinado com tanta beleza, tira uma foto atrás da outra. Os cinco praticantes estão em um nível de consciência muito aumentado e sentem aquele fenômeno de uma forma intensa, como se fossem parte de tudo. Isso traz-lhes uma comunhão intrínseca com a natureza. Finalmente, a bola de fogo sai das entranhas da água e levanta-se muito devagar para, no firmamento, trazer luz a mais um dia que acaba de iniciar.

Meia hora depois, param de praticar pois a música acaba.

– Bom dia, pai, mãe, João. Espero que tenham gostado do espetáculo.

– Filho, há algum tempo que não me sinto tão rejuvenescido.

– Eu também, Daniel – comenta May Ling – foi um presente maravilhoso.

Falam em cantonês, mas a Jéssica entende porque ouve a mente do namorado. O único que nada capta é João, que diz:

– Bom dia, foi um espetáculo e tanto. Gostei de praticar acompanhado com vocês, pois normalmente eu faço sozinho. Juntos, é bem mais agradável.

– Com certeza, rapaz – diz doutor Chang – este lugar é simplesmente um paraíso.

O Paulo termina de tirar as fotografias e junta-se a eles.

– Deves ter gasto meio cartão de memória só agora – diz Daniel, rindo – e faltam nove dias.

– Que é isso – Paulo dá uma risada – o cartão tem um terabyte, irmãozinho. Além do mais, trouxe o meu portátil. Basta esvaziar nele.

– Ok, carinha. O resto do pessoal ainda está no sono. Quem quer tomar café? Estou com fome.

Dirigem-se para a cozinha, pois ainda é muito cedo para os empregados chegarem. No caminho, Jéssica e Daniel "conversam."

– "Amor, foi maravilhoso. Sinto-me como se tivesse dormido a noite toda."

– "É, eu sou capaz de ficar quinze dias sem dormir, mas se meditar por algumas horas de vez em quando, sou capaz de ficar acordado mais de dois meses."

– "Adorei o Tai-Chi-Chuan, mas não seria capaz de fazer sem estar ligada a ti."

Ele sorri para ela e dá-lhe um beijo leve.

– "São precisos anos para aprender; mas, se ficares ligada a mim, aprenderás rapidamente."

O doutor Chang e a esposa, vão atrás do grupo e ele cutuca a mulher, apontando o casal. Com o dedo, aponta a mente dele e traça uma reta para a dela, fazendo sinal de que falam. Ela acena que compreende e já havia notado. Sabe que a garota deveria ser muito especial para Daniel apaixonar-se por ela, especialmente depois do relacionamento tão intenso que teve com a sua filha. A beleza dessa moça não seria pré-requisito suficiente para ele amá-la. Ela deveria ter qualidades muitíssimo especiais. Sorri com aprovação, pois gosta muito do rapaz e vivia preocupada com ele desde a morte da filha. Alias, ela nunca foi a única, mas agora está feliz por ele e satisfeita em ver que, apesar de tudo, continua a venerar a sua filha, tratando-os por mãe e pai.

Depois do café feito por eles, João volta para o quarto para ver a Suzana e o casal Chang vai passear, descendo pela escarpa até à praia. Paulo chama Daniel:

– Irmãozinho, eu quero te mostrar uma coisa. Desenvolvi um estilo meu. Acho que é legal e penso que posso vencer quase qualquer um. Podemos ver?

– Claro, Paulinho, vamos nessa, mas deixa-me por uma roupa adequada.

– Ok, também vou subir e pôr uma calça adequada.

Após uns minutos, os dois descem para o pátio. Vestem apenas calças de quimono de Kung-Fu, pretas e de um tecido extremamente robusto.

– Vejo que vieste preparado para isso – diz Daniel, sorrindo.

– Vim sim, mas e tu?

– Eu tenho quimonos em todo o lugar, mas este está um pouco curto, pois cresci ligeiramente. – Dá uma risada. – Vamos, meu velho. Vou-me nivelar a um Azul para não ficar pesado para ti. Como vão as respirações?

– Bem. Já estou fazendo quatro mil abdominais e apoios.

– Ótimo. Deves estar muito mais forte agora.

– Sinto-me muito forte, realmente.

No pátio, Daniel manda Paulo respirar e nota que a musculatura do amigo está bem mais rija.

Posicionam-se frente a frente e cumprimentam-se. Paulo ataca velozmente com movimentos perfeitos, caindo no bloqueio do Daniel. Atacam e contra atacam rapidamente e Paulo consegue defender-se sem dificuldade dos ataques do amigo, que sorri alegre ao ver tanta evolução.

– Estás fantástico, amigão. Consegues enfrentar um Azul facilmente.

– Quero derrotar um Azul, maninho.

Enquanto lutam, João vem descendo as escadas com a Suzana. Ele vê o combate e vai em direção aos dois. Suzana, que gosta de ver, vai junto. Nesse exato momento, Paulo muda o estilo e desfere um golpe preciso no Daniel que o apanha em cheio, fazendo-o cair de costas.

– Estás pronto, Paulinho. Venceste um Azul. – João não chega a ouvir isso, mas corre em direção aos dois e põe-se no meio.

– Paulo. Você é forte demais para Daniel. Vai acabar por machucá-lo. – O jovem franze o sobrolho, olhando para João como se estivesse vendo um doido varrido. – Se quiser, podemos treinar juntos.

– Achas que o podes vencer, João? – Daniel pergunta tranquilamente. O amigo adivinha que este não quer que João saiba quem ele é. – Paulo é extremamente forte.

– Podemos tentar. Estás disposto, Paulo?

– Claro.

João tira a camiseta e Paulo nota um dragão azul tatuado no braço, sorrindo feliz porque vai enfrentar um Azul verdadeiro. Cumprimentam-se e começam a lutar. João ataca, mas não consegue alcançar Paulo, o que o deixa espantado. Por quase cinco minutos os dois atacam e contra atacam em um baile mortal e belo em função do equilíbrio, até que Paulo desfere um golpe com o estilo que criou e João cai por terra.

– Desculpa, mano, foi mal. Tá tudo bem contigo? – Pergunta.

– Minha nossa, Paulo, fantástico. És um lutador maravilhoso. Acabaste de derrubar um Dragão Azul. Tens ideia do que isso significa?

– Sim, o meu mestre é um Vermelho. Vi a tatuagem. Sinto-me honrado, amigo.

– A honra é minha, Paulo. Podemos continuar? Gostaria de ver esse estilo que é novo para mim.

– Eu criei este estilo faz pouco tempo. Ainda o aprimoro.

– Faço questão de conhecê-lo.

Aproximam-se e cumprimentam-se. Nova sequência de golpes e Paulo vai ganhando confiança no seu estilo. Após trinta segundos João cai novamente. Este inclina-se e diz:

– Deves informar o teu mestre que derrotaste um Dragão Azul. No mínimo és um Azul, mas acho que podes ser Verde. Estou muito honrado em ter enfrentado um oponente tão eficiente.

– Ora, meu irmão, quem está honrado sou eu, pois tinha dúvidas sobre a minha capacidade nova.

– Faz quanto tempo lutas Kung-Fu?

– Cerca de seis meses.

– SEIS MESES? – João fica de olhos esbugalhados. – Estás de sacanagem comigo!

– Não, meu amigo, fui campeão de boxe. Quando vi Daniel lutar, quis aprender. Entrei no grupo da Cybercomp, de formação de seguranças. O mestre Lee é o nosso instrutor. Eu tenho um dom natural. Acho que em outra vida devo ter sido um mestre.

– Parabéns, Paulo, eu também tenho um dom natural, mas para chegar onde estou, levei uns bons anos.

– Com certeza tu não deste todo o teu gás com medo de me ferir. Se quiseres, podemos recomeçar.

Os dois recomeçam o combate, mas, invariavelmente, o João cai, derrotado.

– Paulo – diz este – é uma honra imensa, mas eu não sou páreo para ti. Parabéns. És um futuro Dragão Verde.

Daniel sorri abertamente. Eles cumprimentam-se e conversam mais. Ele olha para Jéssica que os observa à distância e pergunta:

– "Por que não o deixas saber quem és?"

– "Porque ele sabe da minha relação anterior com Suzana. Eu não quero comparações. Ela está-se apegando a ele e tenho medo que ele ache que não é páreo para mim em relação a ela. Vamos dar-lhe tempo. Ainda bem que Paulinho entendeu."

– "Mas ela sabe?"

– "Sabe, mas também sabe que qualquer comparação pode assustá-lo. Nós conversamos muito sobre isso." – Ele abre a mente para a lembrança.

– "Entendo, amor, mas isso me deu um ciuminho."

– "Que tolice, princesa. Basta ver a minha mente para saberes a verdade."

– "Claro." – Ela manda a imagem de um beijo.

Os outros começam a acordar e Fonseca desce, alegre como sempre, junto com os pais da Jéssica. Logo depois vêm os pais da Bianca, que é a última a acordar. Espreguiça-se na cama e abre os olhos, feliz. Lembra-se do pesadelo e de ter vencido o mesmo. Lembra-se, também, do beijo de boa noite que recebeu do Fonseca. Estava muito cansada, mas agora, em memória, saboreia a lembrança. Levanta-se e toma um banho. Põe uma roupa leve que a deixa bem bonita. É uma das roupas da Dani e decide de si para si que deve repensar melhor nas suas escolhas. Até àquele momento ela usava sempre roupas folgadas que escondiam o corpo. Mas agora, gosta do impacto que provoca, especialmente no Fonseca.

– "É um gato" - pensa. Desce as escadas e encontra todos os amigos reunidos.

– Olha Bianca! Bom dia, rainha do paraíso – diz Fonseca, sorrindo-lhe – eu já estava chorando de saudades.

Ela sorri. Toma-lhe o braço e leva-a para tomar café, sentando-a na mesa, servindo-a com carinho. Olha a moça como um cachorrinho olha o dono e diz:

– Já volto.

Sai apressado para as traseiras da casa e volta, minutos depois, com um rosa na mão que lhe estende:

– É para ti, meu amor. Toma o meu coração que está aqui dentro.

Fonzeca. – Diz ela.

– Fonseca – corrige o rapaz – mas podes me chamar de Manoel.

– Manoel Fonseca – continua ela – alguém me deu um beijo muito gostoso ontem, mas eu estava muito cansada para reagir. Agora, ia entender melhor esse beijo.

Ele para, desarmado pela simplicidade da garota. Delicadamente, tira a rosa das mãos dela e toma-a nos braços para lhe dar um beijo que irá selar de vez por todas a sua carreira de solteirão. Depois, serve-lhe o café cheio de carinho, fazendo tudo o que ela deseja.

À tarde, jogam uma partida de polo na piscina que pela quantidade de pessoas, torna-se muito divertida A parte mais engraçada é quando Bianca marca um gol. Fonseca abraça-a e ela puxa-o pelo pescoço dando-lhe um longo beijo. Ele, derretido, deixa-se levar até que nota que está tudo em silêncio. Abre os olhos e vê todos a olharem para eles, sorridentes.

– O que foi, gente – diz, sem perder a pose – afinal os escravos também amam! – Volta a beijá-la, sob uma chuva de aplausos dos amigos. Depois do jogo, alguns vão passear, outros descem até à praia. Daniel pega no telefone e liga para o mestre Lee, falando em hakka para a Suzana não entender.

– Mestre Lee? Como vão as coisas? ... Que bom. Mestre, Paulo está pronto para o teste de Verde. Poderia preparar isso na próxima oportunidade?

– "Claro, Daniel. Tenho mais um candidato, a Azul. Lembras-te do chinês que não quis lutar contigo na apresentação?"

– Sim, eu gostei dele. Equilibrado, gentil, com uma força excelente.

– Pois é, ele não sabe ainda, mas é um Azul de certeza.

– Que bom, deveremos fazer uma festa para eles.

João olha para Suzana e pergunta:

– O que ele diz?

– Fala em um dialeto que não conheço – responde – quer privacidade. Quando for a hora dirá. É sempre assim. Não te preocupes que jamais fará algo pelas nossas costas pois é demasiado íntegro.

– Ok. Eu gosto dele desde a primeira vez que o vi na loja de automóveis, mas ele era muito triste naquela época e nem parece a mesma pessoa.

– Amor, ele tinha acabado de perder a noiva. O que tu achas?

– É, eu sei. Eu não gostaria de te perder. Não agora, que te encontrei.

– Só me perdes se quiseres – diz, beijando-o – pois, por mim, não te largo.

Daniel desliga o telefone e sorri-lhes:

– Vamos dar um passeio na floresta?

Os quatro saem juntos para dar a volta pela floresta até à praia. Na casa, não fica ninguém, pois os outros já haviam descido pelo penhasco. Daniel conhece o terreno como a palma da mão e leva-os em segurança. Em silêncio ele e Jéssica não param de conversar. Já o João e Suzana estão calados, curtindo o passeio. É uma sensação maravilhosa, para quem vive na cidade, estar naquele lugar, onde o silêncio só é quebrado pelas ondas do mar e o canto das aves. A Jéssica ama cada passo que dá, pois onde ela vivia antes, isso era algo que só via na televisão. Sente a comunhão com o Daniel cada vez mas estreita e sabe que ele é para sempre. São demasiado semelhantes e nunca gostou dos rapazes da sua idade por isso: era demasiado madura para eles e, ainda por cima, as suas habilidades distanciavam-na mais. Entretanto, vê que não é necessário ser especial para ser mais maduro. Paulo e Cláudia têm uma maturidade grande, e Bianca, embora tenha apenas um ano a mais que ela, também é bastante madura. Claro que os demais são bem mais velhos e, por isso, têm a cabeça no lugar. Até mesmo Fonseca, que se faz de criança, emana segurança e estabilidade. Deve ser por isso que Bianca encantou-se por ele tão rapidamente. Ainda bem, pois ela só iria sofrer estando com eles e apaixonada pelo Dan. Sabe que, em pouco tempo, isso vai mudar, já está mudando!

Repentinamente a floresta desaparece para dar lugar ao mar.

– Meu Deus – diz ela – que lindo!

– É, meu amor, muito lindo.

Enquanto caminham pela praia, Suzana e João vão mais devagar, distanciando-se e ele diz:

– Suzi, já viste como eles falam pouco e afinam tanto? Agem como se estivessem conversando sem parar, mas as palavras que dizem são desconexas, como se faltasse metade delas!

– Ora, João – Suzana, ri – ainda não notaste? Eles são telepatas!

– Caramba, será que ela andou lendo o meu pensamento?

– Ora safado, andaste a pensar besteira sobre ela? – Pergunta, dando-lhe um beliscão.

– Claro que não – diz ele, rindo – besteira só penso sobre ti, mas confesso que fiquei muito impressionado com ela, qualquer homem ficaria. Ela tem uma beleza ímpar, mas tu também, amor.

– Tá bom, melhor deixar assim – diz Suzana – antes que te entregues. Não te preocupes, eles não ficam lendo pensamentos.

Depois de uma curva, entram na enseada em baixo da escarpa da casa do Daniel. Lá, estão todos os outros, tomando banho de mar. Mais tarde, deitados na praia, Cláudia pergunta.

– Daniel, estas cavernas aqui são passiveis de se explorar?

– Elas são enormes. Há mais de trezentos anos, isto era um reduto de contrabandistas e é fácil de se perder aí, mas eu conheço algumas. Uma delas, vai dar em casa. Há uma passagem secreta, provavelmente feita pelos contrabandistas.

– Podemos conhecer? – Pergunta, empolgada.

– Sim, mas não agora pois precisamos de usar tênis e lanternas. Do contrário, sofreremos acidentes. Podemos ir amanhã, de lá para cá.

Fonseca e Bianca estão completamente alheios à conversa e só têm olhos um para o outro. De mãos dadas, ficam sentados na rebentação, olhando para o horizonte.

– "Olha aqueles dois, amor" – pensa Jéssica – "esqueceram do mundo. Até o pai dela já está estranhando."

– "Isso é positivo para eles. Manoel é um cara sensacional e está muito apaixonado por ela. Vai dar certo, podes crer, e o pai dela não está estranhando não. Está aliviado por ver a filha bem, depois do que aconteceu."

– "Logo tu, que dizes que não devemos ler os pensamentos dos outros ficas vendo os deles!"

– "Não, amor. Eu estou constatando. Não invado os pensamentos dos outros."

Começa a escurecer e o grupo volta para casa. Após o jantar, nova roda de violão forma-se e Francisco participa junto com os jovens, que gostam da voz dele. Vai ficando tarde e vão-se retirando lentamente até que ficam apenas Daniel e Jéssica. Após ficarem um tempão quietos no mais completo silêncio, decidem subir para se deitarem. A Bianca dorme sem pesadelos e o casal fica satisfeito. No dia seguinte, Daniel mostra a passagem secreta que sai do escritório da casa, descendo até ao mar. É um alçapão escondido embaixo de um tapete de peles. Todos vão explorar o lugar, que é escuro e úmido, mas ninguém se importa devido à curiosidade enorme. A escuridão é tão grande que apenas avanção com a luz das lanternas, indo por uma espécie de rampa em espiral. Repentinamente, encontram uma caverna grande. Esta, tem bem vinte metros em uma forma quase circular e, por ela, há vários túneis. Uma luz fraca vem de três deles.

– Ali os túneis terminam em pequenas cavernas que se abrem para o mar a cerca de trinta e cinco metros acima dele. Se quiserem ver, basta seguirmos por eles. Estes cinco, vão para outras cavernas maiores ainda, um verdadeiro labirinto. Aquele – aponta o mais afastado – vai para o nosso destino.

– Olhem – diz Francisco, apontando com a lanterna – há caixas de madeira ali ao fundo, Elas contém alguma coisa?

– Não. Estão vazias e são muito velhas. Devem ter pertencido aos contrabandistas que aqui vinham e nem sei como não se desmancharam ainda. Acho que esta caverna eram um depósito secreto deles. Vamos descer até ao nível do mar? Sigam-me.

Daniel pega um túnel baixo e escuro, que começa nova descida bem íngreme. Ele aponta para os amigos uma espécie de corrimão para que se agarrem.

– Cuidado com a cabeça, gente. – Avisa. Após quase uma hora caminhando bem devagar, estão em uma nova caverna. Desta, também saem vários túneis e, de um deles, ouve-se o barulho do mar, sendo justamente por ele que descem. A intensidade vai ficando maior e também está ficando claro. Entram em uma caverna grande, com vários buracos no alto que parecem pequenas janelas. Uma abertura de cerca de quinze metros dá quase no nível da rebentação por onde a água do mar entra espumando e faz uma pequena enseada, sendo possível entrar de bote na maré alta. Daniel mostra-lhes um pequeno túnel ao fundo da caverna por onde seguem e saem na praia atrás de um arbusto que o oculta completamente.

– É possível ir pela entrada grande, mas é arriscado. Os contrabandistas deviam vir por aqui.

– Sensacional – comenta João, exprimindo o que pensam – fico imaginando como seria naquele tempo.

– Bem, acho melhor voltarmos pela floresta. – Diz Daniel. – O passeio é mais bonito, mas maior. Quem se habilita?

Todos gostam da ideia e o anfitrião segue na frente, orientando-os. Subitamente, o seu ouvido apurado capta um ruido e para imediatamente, fazendo sinal de silêncio. Caminham devagar atrás dele e, após uma curva na trilha, deparam-se com um espetáculo de beleza incrível: um bando de pequenos macacos brinca na maior algazarra em uma pequena clareira. Paulo, feliz da vida, tira uma boa dúzia de fotografias. O resto do caminho, apesar de muito bonito não traz mais nada de especial.

Quando chegam à casa, estão mortos de fome, pois já passa do horário de almoço. Os funcionários preparam rapidamente uma refeição, que todos comem com prazer. Fonseca é o promeiro a falar:

– Mudando de saco para mala, quem vocês acham que vai ganhar o campeonato Gaúcho? – Pergunta.

– Grêmio, é claro. – Dizem Paulo, João e Daniel em uníssono.

– Xiiii, me ferrei. – Brinca. – Pelo jeito só tem gremista aqui. Quem é colorado?

Cláudia e o doutor Chang levantam a mão, sorrindo.

– Ora, pai, não conhecia esse seu lado negro da força. – Diz Daniel fazendo-se de sério. – Nem o teu, Claudinha.

Todos riem da piada até que Paulo emenda:

– Gente, colorado bem doente é o nosso empregado. O cara até macumba faz, na final do campeonato!

– Meu amigo – interrompe Fonseca, professoral – se macumba ganhasse jogo de futebol, o campeonato Baiano terminava empatado.

Todos os que entendem, caem na gargalhada. Natária explica para o marido e a filha, e a Bianca para os pais. Estes também acham muito engraçado.

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