Capítulo 91
Eu finalmente entreguei os pontos. Tinha certeza que logo eu acordaria vomitando sangue assim como minha mãe um dia. Ela vivia sobre tanta pressão e estresse no trabalho que desenvolveu úlceras que lhe causaram enjoos antes de se romperem. Eu estava sentindo o mesmo e estava com medo de se transformar em algo pior, então aqui estava eu, sentada no consultório arranjado de Harlan.
- São só os enjoos? - ele perguntou depois de eu explicar como me sentia.
- Sim, são piores de amanhã, deve ser por estar com o estômago vazio - eu disse e ele assentiu antes de entrelaçar os dedos sobre a mesa.
- Seu ciclo menstrual está em dia? - ele perguntou - Você acha que pode estar grávida?
Eu neguei e expliquei minha condição para ele, nas mesmas palavras que o médico disse quando revelou que eu não podia engravidar, pelo menos não dá forma convencional. Eu teria que passar por uma série de tratamentos antes de sequer pensar em uma fertilização, e as chances de conseguir eram mínimas. E esse é o motivo de eu não ter ciclos regulares. Às vezes ficava meses sem vir e não era uma preocupação para mim.
- Você poderia fazer um teste, sabe, só para garantir - ele deslizou um teste de farmácia sobre a mesa.
- Não é necessário - eu empurrei o teste de novo para ele.
- Não posso te dar algo sem ter certeza, Ellie, espero que entenda.
Por um segundo eu olhei para o teste. Era só fazer isso e pronto, ele me daria um remédio e eu ficaria boa. Mas havia algo que me puxava contra, porque eu tinha certeza que não havia a chance de eu estar grávida.
- Eu acabei de lembrar que prometi fazer algo para Maggie - eu agarrei o teste de sobre a mesa - Eu volto quando puder.
*
O trailer estava vazio porque Paul estava fora. Depois de uma hora olhando para a maldita caixinha, eu a abri e comecei a ler as instruções. Eu nunca havia feito um teste de gravidez na minha vida, então li e reli o maldito passo a passo e vi que era só fazer xixi e esperar.
Eu não o soltei enquanto esperava o resultado, e então ele apareceu. Eu fechei os olhos e permiti que o teste de gravidez caísse na pia. Duas listras. Uma onda esmagadora de emoção tomou meu corpo, deixando minhas pernas fracas.
Duas listras significava que eu estava grávida. Isso era impossível.
Eu não sei como, mas quando dei por mim, estava abrindo a porta do trailer médico, e Harlan me olhou surpreso.
- Essas coisas... esses testes não são cem por cento garantidos, certo? Porque esse aqui deu positivo, e eu tenho certeza que está errado - eu levantei o teste para ele.
- Podemos fazer a ultrassom se você está com dúvidas - ele sugeriu, me indicando para sentar na maca.
Isso era impossível de estar acontecendo, talvez fosse um desequilíbrio hormonal que fez o teste falhar e dar positivo, mas mesmo assim senti meu coração vir na boca enquanto caminhava e deitava naquela maca.
Harlan puxou o aparelho de ultrassom para perto e sentou-se na cadeira.
- Levante sua camisa - ele pediu - Ok, agora isso pode ser um pouco frio - Harlan avisou antes espalhar o gel e colocar o sensor sobre meu abdômen - Ok, vamos ver o que temos - ele desviou a atenção para a tela.
Eu olhei para o teto, não conseguia pensar em olhar para aquela tela granulada. Eu contei até quarenta e oito, foi o número que eu parei quando Harlan falou.
- O teste está correto, aqui - ele apontou para um círculo preto - É o seu saco vitelino, e aquele pequeno feijão dentro dele é o seu bebê.
Meu Deus.
Todo o sangue pareceu parar em minhas veias e eu senti o ar preso em minha garganta. Era real. Não uma ilusão ou um erro do teste de gravidez. Eu estava grávida.
Eu nunca quis ser mãe. Eu gostava de crianças, mas eu não queria ter uma. Eu não tinha aquele feeling materno, nem coragem, ainda mais nesse mundo fodido. Minha mente conjurou o rosto dele, da pessoa que eu não queria sequer pensar que poderia ser o pai.
Mas podia ser do Daryl. Tinha que ser dele.
- Quanto tempo? - eu perguntei, engolindo o medo da resposta - Eu estou de quanto tempo?
Não era preciso uma conta muito elaborada para saber se era de Daryl ou não. Eu tinha que estar com menos de dois meses.
Harlan mexeu mais o aparelho, franzido a testa para a tela que só ele entendia.
Menos de dois meses, por favor. Menos de dois meses...
- Três meses - ele disse, apertando mais o sensor na parte baixa do meu abdômen.
Não.
Não.
Não...
Eu sentei, ignorando o gel melado na minha barriga.
- Espera, ainda tem... - Harlan começou, mas desistiu e me entregou uma toalha de papel e eu limpei minha barriga.
De costas, eu fechei os olhos por um momento, tentando absorver o que tinha descoberto.
Eu estava grávida.
Grávida dele.
Grávida da criança de um monstro.
- Eu tenho algumas vitaminas pré-natais aqui, você pode...
- Quais são minhas opções? - eu o cortei. Ele piscou, como se eu tivesse falado chinês e ele estava tentando traduzir.
- Você está cogitando...
- Foi exatamente isso que eu quis dizer.
Eu me senti menos que nada. Tão impotente, tão cruel, mas como eu poderia ir em frente com isso? Como eu poderia ter o filho de um homem que me fez tanto mal? Como eu poderia criar uma parte dele dentro de mim? E se essa criança crescesse e fosse tão mal e sem amor quanto ele? Como eu poderia trazer uma criança para esse mundo?
- Ellie, você...
- Estamos na Virgínia, pelo que sei o aborto é legal nesse destrito. Você não pode me negar isso - eu disse, praticamente implorando.
Ele sabia de quem era esse bebê e acho que isso o amoleceu a ceder e me dar uma cartela com pequenos comprimidos.
- Pense bem, não tome uma decisão cega. Não haverá volta depois disso - ele me disse, mas antes que eu conseguisse pegar a cartela, ele me entregou outra, a de vitaminas pré-natais - Leve essa também e decida.
*
3 meses.
São 12 semanas. 91 dias. 2.191 horas 131.487 minutos. 7.889.238 segundos.
E durante todo esse tempo, eu carregava algo dentro de mim sem sequer desconfiar que poderia. Eu não havia derramado uma lágrima ainda, estava entorpecida demais para ter uma reação dessas.
Eu me lembro das palavras que ele disse aquele dia no trailer:
Algo sempre vai me manter perto de você, mesmo que não estejamos juntos.
Eu pensei que estava ficando louca. Tentei me convencer de que estava alucinando, que esse era apenas um sonho horrível e que eu iria acordar.
Nada disso é real. Nada disso é real.
Eu queria que fosse de Daryl. Um bebê dele, um pequeno ser que não carregasse tanta bagagem antes mesmo de nascer. Um bebê fruto de um amor real, algo palpável e bonito, e não de um relacionamento tóxico com um monstro que não fez mais do que me machucar, e que agora eatava me fazendo querer machucar algo que sequer tinha culpa de estar crescendo dentro de mim.
Talvez no fundo eu seja um monstro como ele. Talvez essa fosse a melhor escolha para todos. Como eu poderia olhar nos olhos do meu irmão e dizer que estava carregando o filho de um homem que matou pessoas que ele amava? Mas como eu poderia matar uma vida? Do que isso me diferenciava dele?
Quando eu consegui parar de chorar, encarei as duas cartelas de remédios a minha frente e tomei minha decisão.
Qual será a decisão que a Ellie vai tomar? O que vcs fariam no lugar dela?
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top