Capítulo 45

DIAS DEPOIS

Eu estava sozinha há algumas horas e meu pensamento voou para um hamburger com batata frita e sorvete de limão. Nesses dias que se passaram eu não estava com apetite e a única coisa que me motivava a comer era eu não ficar doente e fraca.

Senti meu estômago revirar de fome, mas sabia que logo alguém ia trazer o jantar. Sentada no sofá eu batuquei com os dedos no couro, não conseguindo ficar parada.

Tirei todos os livros da prateleira em uma explosão de energia ansiosa, empilhando-os no chão para organizá-los em ordem alfabética, o barulho da tv passando um dvd aleatório nublava minha mente imperativa.

O barulho continuou enquanto eu trabalhava, sentada de pernas cruzadas no chão, perdendo a noção do tempo enquanto empilhava os livros em uma ordem específica.

Um livro com as poesias de Lérmontov estava no meio da bagunça no chão e eu não soube como nunca o tinha visto antes por aqui. Lembro de ter escrito um artigo na faculdade sobre o poema Demon, que se encaixava perfeitamente na situação que eu estava agora.

- Como não notei você aqui antes, hein? - eu sussurrei quando fiquei de pé, folheando o livro.

- Esse é novo - uma voz profunda respondeu atrás de mim.

Algum tipo de cruzamento entre um grito e um gemido gutural voou para fora da minha boca quando o livro que eu estava segurando foi jogado para trás, acertando Negan no estômago antes de cair de volta no chão.

Arquejando, agarrei meu coração enquanto olhava para um rosto muito divertido e bonito, e minhas pálpebras tremeram.

- Você me assustou - eu consegui resmungar enquanto ele se agachava ao meu lado, olhando para as pilhas de livros com as sobrancelhas levantadas - Eu decidi colocá-los em ordem. Espero que você não se importe.

- Sem problemas - foi tudo o que ele disse enquanto estendia a mão para me ajudar a ficar de pé. Quando finalmente ficamos cara a cara, tentei culpar o susto que acabei de receber pelo meu coração ainda acelerado, mas sabia que no fundo não era a única razão.

Os profundos olhos castanhos de Negan estavam vagando pelo meu rosto antes de olhar para as minhas roupas, um sorriso satisfeito cruzando seus lábios enquanto ele gesticulava em direção à mesa.

Ele parecia descansado, vestindo um par de jeans que lhe serviam como uma segunda pele e uma camiseta cinza grudada no peito.

Isso me fez lembrar que eu acordei pela manhã e tudo que eu tinha para vestir eram camisolas e pijamas.

- Onde estão minhas roupas?

- Mandei lavar antes de trazer aqui para cima, junto com as que estavam no seu armário no quarto antigo - disse quando pegou minha mão, correndo o polegar pela parte de cima enquanto eu olhava para longe.

- Porque? - perguntei quando o olhei.

- Para estarem limpas quando você por no armário? - ele disse como se fosse óbvio e era - Você está bem?

- Sim.

Sim, eu era uma completa mentirosa.
As mentiras apenas saíram da minha boca agora como nada. Eu não estava bem, eu estava numa montanha russa emocional que a cada dia me deixava de um jeito, e era uma coisa tão bagunçada que eu comecei a achar eu estava com algum problema mental.

- Eu sei que não está cem por cento - ele disse, usando a outra mão para inclinar meu rosto para o dele - Mas vai ficar, eu prometo.

- Eu só estou me perguntando por que você deixou só as roupas de dormir, eu acho.

Não era mentira. Sua boca se contorceu antes de responder, mantendo os dedos no meu queixo.

- Porque você nunca pareceu mais fodidamente adorável do que quando anda pelo quarto assim, sonolenta e de pijamas.

Quase imediatamente senti minhas bochechas esquentarem e seu sorriso se alargou. Ele me persuadiu até a mesa onde duas bandejas cobertas estavam esperando, e eu sentei no meu lugar habitual enquanto esperava que ele se juntasse a mim.

A versão ao vivo do Hotel California começou a tocar no filme e eu sorri para mim mesma. Meu pai tocava essa música implacavelmente. Todas as canções dos Eagles, na verdade, e eu olhei para cima para ver que Negan tinha tomado seu lugar e estava me observando com curiosidade.

- Meu pai amava essa música - esclareci e ele assentiu em compreensão antes de apontar para a bandeja.

- Uma surpresa para você.

Com um pouco de receio, tirei a tampa, ofegando de surpresa com a refeição. Sentado em um prato branco havia um hambúrguer e uma enorme porção de batatas fritas, juntamente com o que parecia com cenoura e beterraba ralados. Minha refeição favorita absoluta no planeta - exceto pela salada - e eu estava faminta por isso de um jeito descontrolado.

- É um hambúrguer de feijão preto - ele me avisou e sorriu - Eu ainda não capturei uma vaca.

- Obrigado - eu respirei o cheiro da comida, pegando uma batata frita enquanto a boca de Negan se torcia em desgosto.

- Esqueci que você não come essas coisas - debochei antes de colocá-la na minha boca, meus olhos se fechando em êxtase. Era ainda melhor do que eu me lembrava, e deixei escapar um pequeno gemido de prazer.

Quando meus olhos se abriram novamente, vi que Negan ainda estava me observando como se eu fosse um experimento científico, e levantei minhas sobrancelhas para ele até que ele pegou uma das batatas fritas com um resmungo.

Ele provou com cuidado antes de colocar a coisa inteira em sua boca.

- Não é ruim.

- Eu te disse - eu sorri antes de pegar o meu hambúrguer e tomar uma mordida. Não era tão bom quanto a coisa real, mas era muito gostoso, e eu mastigava alegremente enquanto a música continuava a tocar. Foi realmente um gesto muito doce, e eu sorri para ele novamente antes de me concentrar na minha refeição.

Nenhum de nós realmente conversava durante o jantar, mas tudo bem para mim, e alguém bateu na porta quando Negan terminou sua última fritura, e ele limpou a boca rapidamente antes de ir para a porta.

A voz de um homem surgiu e eu não entendi o que ele e Negan estavam conversando, mas Negan rapidamente  fechou a porta e pegou a jaqueta.

- Tenho que ir - disse enquanto a vestia - Só passei para deixar seu jantar e ver como estava.

- Vai sair? - eu fiquei de pé e ele assentiu.

- Nada fora dos portões. Apenas uma reunião para alguns ajustes sobre assuntos pendentes. Há coisas que não se pode mandar os outros fazerem por mim - ele piscou antes de me dar um beijo.

- Eu te espero - eu disse e ele deu um grande sorriso e beijou minha testa.

- Não é necessário. Vou voltar tarde, durma e juro que amanhã conversamos - avisou, me lembrando que ele não havia me dado nenhuma resposta sobre o que havíamos combinado aquela noite no terraço.

Me deixava doente só em pensar que ele não havia cumprido, mas me deixava ainda mais ter que perguntar, e eu sinceramente estava naquela em que se ele estivesse mentindo, seria só outra coisa para acrescentar na lista.

Seria necessário que eu apenas descesse no andar de baixo para confirmar e Negan também sabia disso, então ele não estava mentindo sabendo que eu ia descobrir.

Horas depois eu olhei para o relógio e já passava da meia noite, não havia como uma reunião demorar isso tudo e meu estômago já estava se revirando com a quantidade de pensamentos na minha cabeça.

Eu desci e quando passei em frente a onde era o salão onde eu ficava junto com Sherry e as outras, a porta estava fechada. Forcei a maçaneta, mas estava trancada. Negan havia barulho nenhum lá dentro e eu assumi que ele havia cumprido o prometido, mas eu iria confirmar quando o visse.

Eu andei pelos corredores, não encontrando nenhum Salvador no caminho mas de repente senti alguém atrás de mim, rapidamente me virei e não havia nada. Eu estou ficando louca.

Andei até a frente da sala de reuniões, encontrando a porta entreaberta.

A sala de reuniões tinha uma grande mesa de madeira grossa rodeada de cadeiras e Negan estava sentado na ponta, as sobrancelhas franzidas em concentração enquanto olhava um grande livro de anotações em cima da mesa.

Só quando ele levantou o rosto eu vi que ele não estava sozinho. Uma mulher de cabelos negros e curtos se aproximou, juntamente com um garotinho agarrando sua mão. Eles pararam ao lado de onde Negan estava sentado.

- Você sabe por que eu te chamei aqui, Amelia? - a voz de Negan rompeu o silêncio, e meus pêlos se arrepiaram. Ele não ia fazer o que eu estava pensando, ou ia?

O garotinho que devia ter uns cinco ou seis anos começou a tossir e ela se agachou na frente dele, pedindo para que se acalmasse e respirasse. Quando ele parou ela se ergueu novamente.

- Bom, primeiro para dizer que sinto muito pela morte do seu marido. Ele era um dos meus melhores homens - Negan disse e ela agradeceu com um manejo de cabeça - Segundo porque soube do seu garoto.

Com a mão enluvada Negan arrastou uma folha pela mesa até ela.

- São pontos suficientes para você e o menino viverem e para os remédios até ele se recuperar - esclareceu e eu ouvi a mulher começar a chorar e Negan ficou de pé.

- Obrigado, senhor, muito obrigado - ela disse com a voz embargada e avisou o menino - Agradeça, Louis.

O garotinho estendeu a mão com o braço fino para Negan e ele a pegou, segurando o sorriso.

- Bom, terminamos aqui, Amelia - Negan avisou, fazendo um gesto para que ela saísse - Essa conversa não sai daqui - ele avisou como uma ameaça.

Um sorriso surgiu no meu rosto, um verdadeiro que eu não dava há muito tempo. Era a primeira vez que eu via Negan fazendo algo realmente bom a alguém sem pedir nada em troca e antes que eu pudesse empurrar a porta aberta completamente para entrar, senti alguém atrás de mim e algo gelado na minha nuca.

- Tente alguma coisa e eu vou estourar seus miolos.

Eu não precisei virar para saber de quem era a voz pressionando uma arma na minha nuca. Era Marie.

Eu não tive tempo de reagir ou tentar algo porque fui empurrada para dentro da sala de Negan, tropeçando e caindo de joelhos no chão duro.

- Mas que....- a frase de Negan morreu no meio do caminho quando ele se deu conta do que estava acontecendo.

Eu levantei mas não fui longe, Marie mantinha a arma apontada diretamente para minha cabeça.

- Ninguém se mexe - ela avisou e fechou a porta. Eu dei um olhar desesperado para Negan e depois olhei para a mãe que escondia o garotinho atrás dela, o protegendo com o corpo.

O sangue rugia em seus ouvidos. Minha cabeça latejava enquanto tentava desesperadamente analisar os fatos e compreender a realidade.

- Que porra você pensa que está fazendo? - Negan rugiu, mas quando deu um passo a frente, ela apontou para ele.

- Mandei não se mexer, desgraçado - ela rosnou com um olhar louco, a arma tremendo em sua mão. O garotinho começou a choramingar e eu me desesperei.

- Marie, você não precisa fazer isso - tentei falar com ela, mas ela riu.

- Cala a boca! - ela gritou de repente, num acesso de raiva.

- Abaixa essa merda e te dou uma chance de sair disso viva - Negan avisou e ela riu, os olhos vermelhos e inchados.

- Você ainda não entendeu? Eu vou matar vocês dois, mas primeiro vou matar ela na sua frente - ela apontou para mim, e novamente para Negan e então franziu a sobrancelha - Não, eu vou fazer melhor. Você vai matá-la.

Eu vi o jeito que Negan pareceu desmoronar diante de meus olhos. Onde havia um homem furioso, desafiador e exultante, de pé na minha frente, agora seus ombros caíram e ele me olhava com o olhar que mostrava cada fragmento de seu ser se partido.

- É a última vez que eu vou mandar você abaixar essa arma, Marie - Negan disse de novo, mas eu conhecia aquele olhar em seu rosto. Isso não ia acabar bem. Alguém ia morrer.

Negan olhou de relance para o taco em cima da mesa, inalcansável de pegar sem ter que passar por Marie.

- Você tá olhando para seu taco de merda? - ela rosnou - O taco que matou meu irmão!?

Eu olhei para ela com horror em meus olhos, sua boca estava ligeiramente aberta, como se tentasse formar palavras que não viriam.

- Ele tentou me estuprar - falei o mais suavemente que pude e tremi quando ela deu um passo para mais perto de mim.

- Você fez meu irmão ser morto. Tirou a única pessoa que eu tinha - ela sussurrou, balançando a arma enquanto falava - Meu irmão...

- Ok, Marie. Eu fiz isso, me desculpe - Negan falou numa tentativa falha de tentar ludibriá-la, e ela balançou a cabeça.

- Acha que eu vou acreditar?

- Você está triste, eu sei, mas seu irmão tentou estuprar Ellie, sua amiga - ele continuou, a voz calmante, mas ela o interrompeu.

- Cala a boca! - Marie gritou, uma mecha de seu cabelo caindo sobre o rosto manchado de raiva - De joelhos - ela rosnou para mim, mas eu não me movi, olhei para Negan, que estava parado e consciente que se tentasse qualquer coisa, ela atiraria em mim.

- Você não quer matar ninguém, eu sei - eu falei, erguendo as mãos para acalmá-la.

- Eu mandei ficar de joelhos, não deve ser tão difícil pra você, puta - disse com os dentes cerrados, mas eu estava tão paralisada que não consegui me mover.

Ela estava numa distância segura para atirar antes que Negan chegasse nela, eu sabia e ela sabia, por isso estava tão segura. Meu sangue virou gelo quando ela olhou para o garotinho e sua mãe, estáticos e amedrontados, sem dizer uma palavra enquanto tentavam sufocar o choro.

- Tudo bem, tudo bem - eu disse desesperadamente e ajoelhei no chão duro de madeira. Ela deu mais um passo para trás, circulando nós quatro e gesticulou para Negan.

- Do lado dela - avisou e Negan se moveu lentamente até perto de mim, seu peito descendo e subindo pesadamente.

Eu dei um leve aceno de cabeça, dizendo que estava tudo bem, mesmo não estando. Eu ia morrer agora.

Era como um pesadelo em câmera lenta. A maneira como meu coração parecia que iria sair do seu peito, eu não conseguia respirar. O zumbido em meus ouvidos era ensurdecedor.

- O que você está planejando, Marie? - Negan insistiu em falar de novo - Matar Ellie não vai fazer nada do que aconteceu mudar.

- Quem disse que eu vou matá-la? - ela riu, um sorriso satisfeito cruzando seus lábios enquanto meus olhos se arregalam - Você quem vai.

O punho de Negan se apertou ao lado do meu rosto, mas ele não emitiu nenhum som, não teve tempo.

- Queria que fosse com seu taco, mas sei que tentaria me acertar antes - ela disse e eu não tive coragem de olhar para cima - Então você vai bater ela. Quero que a chute, bem na cabeça, e depois continue chutando, até que fique como a cabeça do meu irmão.

Negan não se moveu e não falou. Ele era alguém que sempre debochava até nas piores situações, mas ele não abriu a boca.

- Como se sente estando do outro lado? - ela debochou, o tempo todo se movendo, rodeando como um animal. Quando Negan não respondeu e o garotinho fez um murmúrio de choro chamando sua mãe, ela os olhou.

- Eu não esperava platéia, então vamos começar eliminando alguém para você ver que eu não tô brincando - ela não deu o espaço de uma respiração antes de puxar o gatilho. Meu grito ecoou quando vi a cabeça da mãe do menino explodir na minha frente, salpicando sangue quente no meu rosto.

Os restante aconteceu como um borrão. Negan voou em cima dela e outros tiros ecoaram enquanto eles lutavam. Eu não consegui levantar, e quando olhei para onde estava a mulher baleada, meu coração caiu ao ver o garotinho caído ao seu lado, também atingido no pescoço, as poças de sangue no chão se encontrando.

- Não, não, não... - eu sussurrei, engatinhando até eles. Eu peguei o pequeno corpo, puxando para meu colo, minha mão inutilmente tentando parar o sangramento - Você vai ficar bem...

O sangue quente e viscoso tomou o tecido da minha camisola e Negan ficou de pé, disparando um último tiro na cabeça de Marie antes da porta do escritório se romper e um bando de Salvadores armados entrarem seguidos de Dwight.

- O que... - Dwight começou, olhando a desgraça ao redor, parando em mim.

- Você foi atingida? - Negan gritou, se agachando ao meu lado e eu neguei freneticamente.

- Chame o médico, ele ainda está vivo! - eu gritei, fazendo mais pressão em seu pescoço.

Alguns homens saíram rapidamente e eu olhei para Dwight.

- Me dá sua camisa - pedi e ele tirou a blusa xadrez de flanela que vestia por cima de outra branca.

Eu a enrolei firmemente no pescoço do menino, fazendo pressão para estancar o sangue.

- Ele ainda tá vivo - eu disse, sentindo o batimento fraco contra meus dedos. Negan estava com os olhos arregalados, a adrenalina pulsante em seu olhar vendo o garotinho se esvaindo em sangue.

- O que aconteceu aqui? - Dwight perguntou, andando para perto do corpo de Marie - É a irmã do...

- É - Negan disse antes de Dwight terminar - Ela tentou matar Ellie e eu consegui derrubá-la. Mas não tive a mesma sorte com o garoto e a mãe. Me dá ele aqui - Negan resmungou e colocou as mãos por debaixo do corpinho do menino, o tomando nos braços e eu levantei junto, continuando a fazer pressão até encontrar Harlan no corredor.

- O que aconteceu? - ele perguntou olhando para o menino e depois para mim, encharcada de sangue.

- Ele levou um tiro no pescoço - eu disse, tremulando e logo entramos na enfermaria.

Negan o deitou na maca e Harlan tirou a blusa cheia de sangue do ferimento. O olhar que ele deu me corroeu a alma.

- Você precisa salvá-lo, ele não tinha nada a ver... - eu comecei a dizer enquanto passava a mão em seus cabelos, não conseguindo finalizar quando tive que sufocar um soluço.

Ele estava pálido, os lábios arroxeados e não era preciso ser médico para saber que isso era um mal sinal.

- Ele ainda tem pulso, mas a bala está alojada - Harlan disse enquanto examinava e limpava para ver mais claramente - Se eu tirar, ele vai sangrar ainda mais e se eu deixar, ele não vai resistir. Não há muito o que fazer.

- Você vai só ficar olhando ele morrer? - eu perguntei sem acreditar - Você é médico, não vai nem tentar?

Minha voz saiu entredentes e Negan tocou meu ombro, fazendo negativo com a cabeça. Eu não podia acreditar que dois inocentes morreram por minha causa.

- Por favor, ele é só um garotinho... - sussurrei olhando o rosto pálido dele, o sangue em todos os lugares.

- O projétil destruiu a carótida, ele não vai sobreviver - Harlan disse e sua voz rachou - É mais cômodo... é menos doloroso para ele não mexer... dará uma morte mais tranquila.

Quando olhei para Negan, ele estava tão atordoado quando eu. Ele falou alguma coisa para o médico, mas eu não ouvi porque meus olhos foram puxados novamente para o garotinho quase sem vida deitado na maca.

- Me desculpe - eu sussurrei, empurrando seus cabelos lisos, sem saber mais o que dizer - Eu não vou te deixar sozinho.

- Ellie - a voz de Negan surgiu ao mesmo tempo que sua mão tocou minhas costas. Eu olhei para cima, vendo-o com a camisa encharcada de sangue, e o rosto machucado.

- Porque ela fez isso? Ele é só um garotinho.

- Eu sinto muito - Negan disse antes de envolver os braços ao meu redor.

Negan colocou os dedos no pulso dele e não precisou falar para que eu soubesse que ele já se foi. Eu enterrei o rosto em seu peito, não me importando com o sangue e chorei, as cenas passando como um filme na minha mente. Negan encostou a testa na minha e disse alguma coisa, me persuadindo a sair da sala com ele, mas eu neguei.

- Eu vou ficar, eu tenho que... eu não posso deixá-lo virar uma daquelas coisas - limpei meu rosto, as lágrimas misturando-se com o sangue em minhas mãos.

- Eu faço isso - Negan disse e pegou um lençol branco, cobrindo-o - Eu faço, você não precisa.

Eu concordei, fazer isso me deixaria pior ainda. Eu virei de costas quando Negan tirou a faca da bainha e o som do metal entrando foi rápido e brutal.

Quando Negan tocou meu ombro, eu virei para ver o corpo coberto.

- Eu quero enterrá-los - eu disse mesmo sabendo que Negan não fazia isso aqui - Por favor. Eles tem que descansar, juntos.

- Eu vou fazer isso - ele garantiu e eu o segurei pela camisa.

- Promete.

- Eu juro - ele disse com firmeza, a dor em seus olhos era ainda mais forte que a minha porque ele queria desesperadamente escondê-la - Amanhã de manhã.

- Ela não - eu disse - Marie não. Você pode pôr ela na cerca, se quiser.

O piso do chuveiro era carmesim enquanto eu ficava debaixo do jato de água com Negan.

Depois de me ajudar a tirar o sangue do meu corpo ele estava se limpando, sem dizer uma palavra ou brincadeira. Eu pensei em Carl, em como ele teve sorte de ter conseguido sobreviver a um tiro na cabeça. Imaginei o desespero de Rick e o alívio quando Carl voltou, mesmo que com um olho a menos, mas ele estava vivo.

Eu sequer sequei os cabelos antes de deitar nos travesseiros com Negan atrás de mim, me segurando contra ele.

- Louis - eu disse depois de um longo minuto - O nome dele era Louis, caso você faça uma cruz.

- Eu vou fazer - ele sussurrou e beijou meu ombro.

Eu esperava que um dia eu me perdoasse por isso.

The sofrência never ends ksksks

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