66 - Não quero morrer carbonizada!
AMORA
Até que o percurso não foi tão desagradável quanto imaginei. Ingrid sabia ser educada quando queria, o que acabou tornando nossa conversa minimamente suportável.
Assim que chegamos no térreo, fomos caminhando até a parte externa do hotel, onde ficava a maravilhosa sauna. Admito que aquele lugar fazia com que me sentisse podre de rica, e, sinceramente, era uma sensação que amava.
Como prometido, quando adentramos o local abafado, Rocha fica para trás, dando-nos a devida privacidade. Ainda bem, pois sua presença me dava calafrios.
Não sou de reparar na aparência das pessoas, mas aquele olho de vidro e cicatriz enorme ali próxima me causavam arrepios. E, além disso, o homem não aparentava ser gente boa... nem um pouco. Ou simplesmente não tinha ido com a cara dele. Foda-se, não me importo.
Sento-me em um dos bancos braços de mármore grudado à parede, e ela senta no outro, que ficava de frente para o meu. Inicialmente, um silêncio extremamente desagradável tomou conta do ambiente. Ao que tudo indica, Ingrid estava muito envergonhada com o que tinha rolado.
Deixo o celular solto ao meu lado, cruzo os braços e encaro-a, com a sobrancelha arqueada. Não me aguento nesse tipo de situação! Juro que queria ser uma pessoa mais contida, mas é simplesmente impossível!
- Vim aqui pra você ficar me encarando? - debocho.
Ela dá uma risadinha e balança a cabeça negativamente.
- Para com isso, Amora! - diz, envergonhada - É que realmente não sei por onde começar...
- Já começou por aí! - dou um sorriso debochado. Deus que me perdoe, mas não conseguia lidar com aquela vaca de forma madura! - Vamos, Ingrid! Desembucha!
- Ah, lindinha... - suspira e tira o roupão que antes tampava seu corpo nu. Assim como Henrique, Ingrid era toda tatuada. Devo admitir que, por mais que fosse maluca, era uma mulher bonita - eu exagerei. Tanto minha vida quanto a de Henrique seguiram rumos diferentes. Passado é passado... e... sei lá, acho que o fato de vê-lo com uma garota tão linda mexeu comigo. Vacilei muito com ele, sabe?
- É, compreensível. Mas convenhamos que não teria lógica algum meu marido esperar papo de dezessete anos para o seu retorno. Deveria ficar feliz por ele ter te superado e seguido a vida, da mesma forma que acredito que Henrique sinta o mesmo quando se trata de você.
Ingrid dá um sorriso largo, aparentemente forçado, mas deixo passar. Não tinha porque alimentar aquela merda de briga.
- Estamos resolvidas, minha linda? - diz Ingrid, simpática - Eu não vou mais entrar no seu caminho, juro! - sorri.
- Claro que esta... - começo a responder, mas logo sou interrompida por um forte alarme de incêndio. Puta que pariu!
Levanto rapidamente, agarro o braço de Ingrid e falo:
- Vem, Ingrid, vamos sair daqui! - puxo seu corpo em direção à porta.
- Vai abrindo a porta enquanto coloco o roupão! Rápido, pelo amor de Deus, não quero morrer carbonizada! - pede, desesperada.
Abro a porta o mais rápido que consigo e dou de cara com Rocha, que demonstra uma calma fora do normal para a situação caótica. Não me importo, apenas saio correndo para fora e observo a grande aglomeração de pessoas que se reunião na área externa do hotel. Em menos de um minuto Ingrid aparece ao meu lado. Ainda bem que tinha conseguido sair rápido, não queria carregar a culpa de sua morte.
HENRIQUE
Sou acordado por um alto alarme de incêndio, o que já me faz começar o dia em pânico. Cadê Amora? Que horas são? Meus amigos estão seguros?
Antes de tomar qualquer atitude, procuro Amora pelo quarto. Estava nu, em frente às janelas de vidro, mas não me importei. Porra, onde estava minha mulher?
Desisto depois de um tempo, afinal, já estava mais que óbvio que ela não estava ali. Coloco uma bermuda, sem me preocupar com cueca e saio correndo pelo corredor, em direção às escadas. Não correria o risco de utilizar o elevador com um possível incêndio acontecendo.
Para minha sorte, dou de cara com Mahmoud e Daniele, também indo em direção às escadas.
- Vocês sabem aonde Amora está? - pergunto, preocupado.
- A maluca da sua esposa - diz Mahmoud, preocupado - decidiu ter uma conversinha com sua EX-esposa. Agora essa puta não responde o celular e estou cheio de medo de ter que encobrir um assassinato! - bufa.
- Meu Deus? - faço careta - Tem certeza disso? - questiono, fazendo os dois pararem no meio do caminho.
Mahmoud mostra o celular, e a porra de um calafrio percorre todo meu corpo. Que porra estava acontecendo!?
Como se estivesse lendo meus pensamentos, Dani responde:
- Elas só estão tentando resolver suas diferenças. Amora não vai fazer nenhuma merda! Agora, pelo amor de Deus, - abre a porta da escadaria - vamos? Não quero morrer queimada!
Respiro fundo e, ao lado de Mahmoud, a acompanho. Espero que esteja certa e que Ingrid não tenha feito nada para prejudica-la. Como uma boa escorpiana, sei do que Ingrid é capaz para se vingar.
Tudo estava uma confusão. Alguns seguranças do local tentavam organizar os hospedes, mas eram muitas pessoas desesperadas no mesmo lugar. Porra, eu precisava saber se meus amigos estavam bem, e mais ainda, se meu marido estava seguro.
Avisto Lázaro e Janna saindo do refeitório do hotel, o que me gera alivio imediato. Menos duas pessoas para me preocupar.
Os dois andam rapidamente em minha direção, e logo observam a presença de Ingrid ao meu lado. Janna eleva uma das sobrancelhas imediatamente, demonstrando imediatamente sua insatisfação com a situação.
- O que está rolando aqui? - cruza os braços. Lázaro observa a esposa com ar de desaprovação, mas ela ignora. Ao que tudo indica, Janna havia criado um forte ranço por Ingrid.
Os dois estavam muito bem vestidos. Lázaro usava uma bermuda de grife, provavelmente escolhida pela esposa, e uma blusa polo rosa claro. Janna usava um vestido longo rosa bebê com alguns desenhos abstratos, combinando com o marido.
Ingrid dá um passo à frente e sorri de lado.
- Estávamos resolvendo nossos problemas... - dá de ombros - e agora estamos de boa. Quase amigas, né?
Encaro a mulher, reviro os olhos e dou um sorriso. Acho seu questionamento engraçado! Quer dizer, resolver nossas diferenças até que não era algo tão absurdo, mas amigas? Pelo amor de Deus, é de cair o cu da bunda. Não sou tão boa assim.
Respiro fundo e resolvo falar em tom brincante, para que a mulher não se sinta constrangida.
- Não exagera, Leroy!
Ela ri como resposta, e meu 'plano' dá certo. Janna me olha, completamente confusa com a situação.
- Ainda não entendi muito bem o que está rolando por aqui! - diz Janna, perplexa. Não a julgo, até porque, né? Muitos acontecimentos em pouco tempo.
- Admito que também estou confuso! - diz Lázaro, com uma das sobrancelhas elevadas.
Antes que Ingrid comece explicar a motivação daquilo tudo estar acontecendo, Henrique, Mahmoud e Daniele nos alcançam. Meu marido vem correndo rapidamente em minha direção, como se quisesse conferir se realmente estava tudo bem.
Assim que chega perto o suficiente, dá um rápido e delicado beijo em meus lábios. Aquilo é o suficiente para me deixar 'animada'.
- Meu amor - afasta-se, segura minha bochecha e observa os detalhes de meu rosto -, está tudo bem? - encara a ex-esposa, emburrado - Ingrid aprontou algo com você?
A mulher o encara emburrada e toma a palavra para sim.
- Nossa, assim você me ofende! - coloca a mão no peito, ofendida - Apenas estava querendo selar a paz entre nós duas! Quer dizer, o que passou, passou... - dá de ombros e sorri forçadamente - não vou mais atrapalhar vocês.
Henrique encara a mulher com ar duvidoso, como se aquilo estivesse 'bom demais para ser verdade'. Mas ignorou, pois um dos gerentes começou a chamar a atenção dos hospedes com um autofalante.
- Bom dia, meus queridos! Depois de averiguar, chegamos à conclusão de que o alarme de incêndio foi equivocado. Peço desculpas pelo transtorno! - desliga o aparelho e dá de costas para todos que estavam ali.
Nos encaramos confusos, até porque aquilo não fazia muito sentido. Já estávamos incomodados com as excessivas quedas de energia, agora teríamos que lidar com os alarmes falsos? Isso é porque o hotel é de 'luxo'.
- Agora que tudo está muito bem esclarecido - diz Dani, forçando um sorriso amigável -, que tal tomarmos café da manhã, em? Estou morrendo de fome!
- Leu meus pensamentos - diz Mahmoud, com um sorriso largo.
Todos concordam, o que me anima, pois também estava cheia de fome. Quando estávamos prestes a ir, Ingrid chama nossa atenção.
- Ah, fofinhos, agradeço pelo convite - sorri e encara o Rocha -, mas temos que resolver alguns probleminhas. Mais tarde nos encontramos por ai! - manda um beijinho no ar, direcionado a todos e dá de costas, ao lado de seu segurança.
Quando está longe o suficiente para não escutar mais, Janna encara a mulher com ar debochado e questiona.
- O que faz essa maluca pensar que ela estava incluída no convite do café da manhã? - franze o cenho, fazendo careta.
Lázaro ri e da um leve tapa no ombro da esposa.
- Não seja tão cruel, amor! - dá uma gargalhada.
- Estou falando sério! - coloca as mãos na cintura - Ela ainda não percebeu que ninguém - arregala os olhos - gosta de sua presença? E que ela só serviu para bancar as passagens?
Encaro minha amiga, em tom de desaprovação. Todos ficam em silêncio, inclusive Henrique, que parecia não ter curtido muito o comentário dela.
- Você pegou pesado, Janna! - respondo - Ela não é tão ruim. Está tentando melhorar!
Ela revira os olhos, mas mantém o silêncio.
- Gente, pelo amor de Deus - Mahmoud toma a frente -, vamos parar com essa pseudo discussão e ir comer? Estou cheio de fome!
- Concordo plenamente! - Henrique afirma e joga o braço ao redor de meus ombros - Vamos?
- Pelo amor de Deus! - diz Dani.
Vamos andando em direção ao refeitório, mudando o foco da conversa. Em poucos minutos, o clima ruim já tinha se esvaído. Era tão bom estar em família.
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