• Capítulo Nove •
Kevin não esperava que a noite fosse acabar daquele modo. Na verdade, ele não esperava mesmo que iria se oferecer para ficar ali, com ela.
Mas algo dentro dele, algo bem ridículo, aliás, se remexeu quando encarou os olhos verdes esmeralda de Rebecca e ela lhe disse que não queria ir à festa. E, simples assim, ele soube que não podia descer as escadas e curtir uma noitada deixando-a ali sozinha.
O que era... estranho. Por que ele se importava, afinal de contas? Tudo o que aquela garota havia lhe trazido até então era dor de cabeça. Literalmente.
Mas ele ainda estava ali, de meias e sentado confortavelmente no carpete do quarto dela, sem se importar com o celular que não parava de vibrar em seu bolso, sinalizando várias mensagens que provavelmente eram dos seus colegas da escola, perguntando onde diabos ele estava.
Olhando para o quarto todo lilás e rosa de Rebecca, ele poderia facilmente responder a eles que havia invadido o mundo de uma princesinha de contos de fadas.
"Não precisa ficar aqui se não quiser", ela disse de repente, chamando sua atenção. Rebecca estava sentada em sua frente vestindo um pijama horrível estampado de coroas e sapos, mas que por algum motivo não ficava tão ruim assim nela. "Parece que uma galera quer que você vá à festa." Ela indicou o celular no bolso da calça que ele vestia, que não parava de vibrar.
Kevin sacou o celular e deu uma rápida lida nas mensagens, sem interesse. Só se preocupou em responder a de Max, dizendo que não iria à festa.
Aparentemente, Alana estava tentando convencer seu amigo a ter uma noite agitada, mas ele estava dizendo que só sairia se Kevin os fizesse companhia por um tempo.
Bom, que pena. Kev não estava pensando em ir a lugar nenhum.
Depois de colocar o telefone no silêncio e voltar a guardá-lo no bolso, ele olhou para Rebecca e piscou, abrindo um sorrisinho.
"Então, não vai me dizer?"
Ela franziu as sobrancelhas para ele.
"Dizer o quê?"
"Por que não quis ir à festa, se você mesma disse que seu plano era se tornar popular."
Rebecca se remexeu, desconfortável, e desviou os olhos dos dele.
"Pensei que iria deixar isso para lá", ela falou simplesmente.
"E eu pensei ter te dito mais cedo que sou curioso."
Ela ficou em silêncio por alguns instantes e depois falou:
"Só não estou habituada a festas e coisas assim."
"Nunca foi a alguma?", Kevin perguntou, tentando disfarçar o espanto.
Rebecca fez que não com a cabeça.
"Não essas com gente da minha idade", ela respondeu, fazendo círculos imaginários no carpete e se recusando a olhar para ele. "Por favor, não me julgue."
Kevin fechou a boca e forçou-se a não dizer nada que poderia ser grosseiro. Mas... Puxa a vida! Ela nunca tinha ido a uma festa com a galera da idade dela? Sério? Ele não sabia se aquilo era humanamente possível...
"Não vou te julgar", ele disse depois de assimilar tudo um pouco. "Mas nós dois temos de concordar que isso é estranho."
Rebecca olhou para ele com um pequeno sorriso.
"Há muitas outras coisas que me divertem mais do que uma festa."
"E como você sabe? Nunca foi a alguma..."
Rebecca abriu a boca para responder, mas nenhuma palavra foi dita.
Kevin piscou para ela e sentiu uma sensação de vitória avassaladora se apoderar dele.
"Te peguei. Finalmente..."
Ela simplesmente revirou os olhos, mas Kev teria de ser cego para não ver a sombra do sorriso em seus lábios.
"Gosto de escrever no blog", ela disse então. "De ver filmes e séries, ler livros, ficar com meus irmãos..."
"Eu também gosto de tudo isso, tirando a parte do blog, mas é bom sair e esvaziar a cabeça às vezes. E nem estou falando de bebidas, embora elas deixem tudo ainda melhor..."
"Sou do tipo caseiro."
"Se quer ser popular, vai ter de mudar isso um pouco", ele disse, o que julgava ser um fato. "Aliás, já que temos tempo, você podia me contar os motivos por trás dessa sua parte no nosso acordo", ele falou, porque não podia deixar de tentar.
"Vai sonhando..."
Ela então se levantou e pegou dois travesseiros em sua cama, jogando um para ele e se apoiando no outro ao voltar para o carpete fofinho.
"Meu Deus, estou parecendo uma garotinha em uma festa do pijama", disse Kevin com uma careta, ao pegar o travesseiro rosa e apoiar os cotovelos nele. "Se um dia contar isso para alguém, loira, eu te jogo dessa torre."
Becca riu e se deitou de barriga para baixo, balançando as pernas para o alto e sorrindo meigamente para Kevin.
"Não se preocupe, macho alfa, não vou deixar que ninguém saiba que você está perdendo sua noite de sexta-feira para ficar aqui jogando papo com uma garota. Aliás, devo me sentir especial?"
"Nem pensar."
Ela riu.
"Me conta sobre o seu blog", Kevin pediu, olhando para ela. "Por qual motivo você o criou e tudo mais."
Rebecca piscou e olhou para ele com uma sobrancelha erguida.
"Tem certeza de que quer ouvir sobre o meu blog enjoativo de tão doce?", ela perguntou, implicante, repetindo as palavras que ele havia escrito para ela no dia anterior por e-mail.
"Não", ele respondeu no mesmo tom que o dela. "Mas achei que seria educado perguntar."
Rebecca sorriu e seus olhos verdes se perderam por um instante, como se de repente ela estivesse em outro lugar.
"Bom, eu não sei ao certo o que me deu... No dia em que criei o blog, tinha acabado de ver uma comédia romântica muito boa e cheia de questões amorosas que valiam a pena pensar sobre. Percebi que não tinha ninguém com quem pudesse conversar sobre isso e então comecei o processo de criar um blog. Foi totalmente no impulso e eu só fui organizar as coisas depois." Ela soltou um suspiro meio apaixonado que fez Kevin segurar a risada. "É claro que no início ninguém nem sabia que o blog existia, mas as visualizações aos poucos chegaram e eu percebi que as pessoas gostavam dos meus textos e que eu mandava bem em questões sobre relacionamentos. Elas começaram a fazer perguntas sobre suas vidas e eu comecei a responder. Então uma garota do colégio, uma líder de torcida, encontrou o blog por acaso e começou a divulgar para a escola inteira!" Rebecca sorriu carinhosamente. "Antes que eu pudesse perceber, muitos alunos do colégio estavam me fazendo perguntas e acompanhando meus textos, diziam que tinham percebido através do que eu escrevia que um amor de verdade é bem melhor do que casos passageiros." Ela suspirou e virou os olhos para Kevin. "Bom, você já sabe o fim da história. Eu uni certos casais desde que meu blog se infiltrou no colégio de Luncarty."
Kevin, apesar de achar a história fascinante, fez uma careta.
"E acabou com outros", ele acrescentou.
"Não acabei com relacionamentos. Talvez com casinhos, mas não relacionamentos de verdade..."
Kevin não concordava muito com aquela linha de pensamento, mas não discutiu.
"Bom, parabéns, você construiu um império", ele falou, fazendo com que as bochechas de Rebecca corassem. "Mas não consigo deixar de lado algo que me diz que você nunca teve um relacionamento na vida e fica aí dando conselhos amorosos a torto e a direito."
No mesmo instante o calor no rosto dela sumiu, dando lugar a uma palidez impressionante. Kev se sentiu um pouco mal.
"E como sabe que nunca tive um relacionamento?", ela perguntou com o nariz empinado, parecendo tentar manter alguma dignidade.
"Consigo farejar esse tipo de coisa", ele respondeu simplesmente, mas antes que pudesse falar mais, um travesseiro voou na sua cara. Kevin o pegou no ar antes que pudesse atingi-lo. "Você deve ter se esquecido, loira", ele começou, sorrindo pretensiosamente para ela, "que eu sou o melhor jogador do time da escola e meus reflexos são extremamente precisos."
"Ah, cala a boca."
Ela se levantou e correu até ele para pegar o travesseiro de volta, mas Kevin riu e o usou como escudo, segurando forte. Quanto mais ela puxava mais ele ria, o que a deixava ainda mais nervosa e engraçada, e quando percebeu os dois estavam rolando pelo carpete lutando por um travesseiro idiota.
Eles pararam quando o corpo de Kevin bateu na estante com os filmes de Rebecca e ela tentou recuperar o travesseiro novamente. Ele estava rindo tanto que perdeu a força dos braços e Becca arrancou o travesseiro de suas mãos. Mas ela não esperava que venceria tão fácil, pois assim que jogou o travesseiro longe tombou para frente sem querer e precisou colocar as duas mãos abertas no peito dele para se equilibrar.
Kevin segurou seus pulsos e os olhos deles se encontraram. Tudo o que ele conseguia ver dela era um emaranhado de quase um metro de cabelo loiro e olhos verdes assustados e reluzentes. O rosto claro de Rebecca estava corado pelo esforço de tentar vencer dele e, pela primeira vez, Kevin percebeu que ela realmente era muito bonita. Mesmo descabelada daquele jeito.
Rebecca, por sua vez, sentiu seu rosto ficar ainda mais quente enquanto eles olhavam um para o outro. Ela tentou procurar algo para dizer e quebrar aquele gelo, qualquer coisa, e quando seus olhos encontraram algo que ainda não tinha percebido na testa de Kevin, as palavras saíram de sua boca antes que ela pudesse impedi-las:
"O que é isso na sua testa?"
"O quê?"
Ele teve alguma dificuldade para entender do que ela estava falando, pois estava tão fascinado com a cor daqueles olhos que precisou de um segundo para voltar à superfície.
Porém, quando sua mente processou a pergunta, ele sentiu a barriga embrulhar e o bile subir a garganta.
Com dificuldade, Kev se afastou dela.
"Me machuquei quando era criança", respondeu vagamente, lutando para afastar as imagens claras como água que vieram a sua mente.
Merda, por que ele se lembrava tão bem daquilo? Por que as lembranças das agressões se recusavam a ficar perdidas no tempo? Elas nunca voltavam em borrões como a maioria das memórias. Eram sempre claras e vividas. Não importava o quanto Kevin tentasse sufocá-las.
"Como se machucou?", Becca perguntou, nem se dando conta do que estava falando. Havia ficado meio atordoada pelo que tinha acontecido e tentava distrair tanto a si mesma quanto a ele.
"Eu não lembro", Kevin respondeu novamente. Ele estava de costas para ela, o que era uma benção. Nunca havia sido muito bom em mentir. "Minha mãe diz que cai do balanço no jardim de infância."
"Algo que toda criança passa uma vez na vida", ela respondeu vagamente.
Então ele voltou a se sentar no carpete, abrindo um sorriso para ela.
"Eu venci a guerra de travesseiros, só para deixar claro."
"Venceu nada!", ela respondeu no mesmo instante, agora completamente indignada. "Eu tirei ele de você."
"Porque eu deixei."
"Seu mentiroso."
Kevin riu e tentou se concentrar naquilo. No presente. Mas agora ele sentia a cicatriz em sua testa pulsar com a lembrança de uma noite em específico, anos atrás, quando tinha batido a cabeça na quina de uma mesinha de casa.
Quem dera se aquilo tivesse sido só um acidente...
"Então, já que você furou sua parte no acordo, porque não começa a me dar alguns conselhos de conquista?", ele perguntou, forçando um sorriso. "Eu ainda quero aprender."
"Certo", ela disse, passando as mãos pelos cabelos tentando ajeitá-los. "Para começar, preciso saber se está interessado em alguém em específico, senhor. Isso pode facilitar as coisas."
Kevin apenas negou com tranquilidade, dobrando as pernas e apoiando os enormes braços nos joelhos.
"Nem por aquela garota que te deu um fora semana passada?", Rebecca perguntou, para ter certeza.
"Nem ela", ele respondeu sucinto. "É sério. Como eu disse, só acho válido aprender algumas coisas se a oportunidade chegar."
Rebecca franziu as sobrancelhas para ele.
"Se a garota certa chegar, você quis dizer."
Ele abriu um sorrisinho e revirou os olhos.
"Pode ser."
"Bom..." Rebecca meditou por um instante, avaliando o caso. "Você é do tipo que costuma ligar no dia seguinte?", ela perguntou nervosamente, e Kevin viu um calor avassalador tomar conta do rosto dela. Obviamente estava muito desconfortável com a pergunta.
Kevin quis rir, mas sabia que aquilo só a intimidaria ainda mais.
"Não, eu não ligo no dia seguinte", ele respondeu condescende. "Mas antes que você me chame de canalha, posso dizer que sempre deixo minhas intenções o mais claras possível com as garotas com quem... Bom, você sabe o quê", ele falou, se divertindo ao vê-la ficar ainda mais vermelha. "Então não é como se elas esperassem que eu fosse ligar também."
"Bom, isso vai ter de mudar quando encontrar alguém por quem vai se interessar", ela disse pragmática, abraçando seu travesseiro. "Se está a fim de alguém de verdade, dê atenção, mas não esperando algo em troca por isso."
Kevin assentiu lentamente, absorvendo as informações.
"Muitos caras acreditam que, por terem convidado uma garota para sair e pagado a conta, o mínimo que elas podem fazer é dá-los um beijo de despedida ou algo assim. Mas isso é horrível e tremendamente machista." Becca olhou séria para Kevin. "Não é porque você já está muito interessado na garota que ela também está muito interessada em você. Quem quer entrar em um relacionamento de verdade deve saber que as coisas levam um tempo para acontecer para os dois lados. Ninguém se apaixona do dia para noite."
"Então, basicamente, o primeiro passo é não pressionar a garota", ele repetiu, olhando para Rebecca. Estava se sentindo um pouco idiota e se seus amigos o vissem provavelmente ririam da cara dele, mas não se importava nem um pouco. Um dia, aquilo seria importante. "Temos que engatar uma marcha lenta, então?"
"Isso", respondeu Rebecca. "A não ser que a garota esteja na mesma marcha que você."
Kevin sorriu de lado.
"Gosto mais dessa opção."
"Mas não é sempre que ela vai acontecer."
"Certo, o que mais?"
"Nunca finja que está ouvindo a garota quando definitivamente não está", ela recitou, séria.
"Pode ser mais específica? Minha área não é essa, tenho um pouco de dificuldade quando o quesito é relacionamento sério."
Becca estreitou os olhos para ele e sorriu de maneira evasiva.
"Mesmo? Eu nem percebi."
"Fala logo."
"Bom, o que quero dizer é que todo mundo gosta de ser ouvido com atenção", continuou ela, tentando seguir sua linha de raciocínio. "Todos têm algo a dizer e você deve escutar a pessoa que está tentando conhecer. Se estiverem em um jantar ou qualquer coisa do tipo, escute a garota de verdade. Não fique divagando sobre o jogo que vai passar às oito ou as flores que você tem de cuidar no dia seguinte."
"Primeiramente, eu não cuido de flores", disse Kevin, fazendo com que Becca lhe lançasse um olhar mortífero. "Em segundo, o que faço se o papo da garota for muito chato?"
"Então você pode tentar mudar de assunto gentilmente. Ou, talvez, com mais algumas doses de papo chato, você vai perceber que ela não tem muito a ver com você e que talvez não faça sentido insistir em alguém assim."
Kevin suspirou, curvando os ombros.
"Meu Deus, você só me deu alguns conselhos e eu já estou cansado."
Rebecca riu.
"Quem disse que viver um grande amor é fácil?"
"Me poupe dessas suas frases melosas, Princesa. Nem eu mereço outro..."
Mas antes que Kevin pudesse completar, Rebecca avançou até ele de repente e tampou sua boca. Ele arregalou os olhos e olhou para ela, que parecia tão apavorada como se uma legião de mortos estivesse se aproximando.
"Rebecca?", uma voz masculina chamou lá debaixo. "Por que sua porta está aberta desse jeito? Eu pensei ter ouvido alguma coisa..."
Então, claro como cristal, o som de passos subindo as escadas em caracol foi ouvido.
Kevin se levantou de supetão, pronto para encarar o pai de Rebecca e tentar explicar que eles não estavam fazendo nada demais. Droga! Ele não estava nada ansioso para enfrentar pais furiosos...
Mas, antes que fizesse qualquer coisa, Rebecca o pegou pelo braço e abriu as portas do armário, indicando um espaço vazio e grande junto ao chão.
Antes que ele pudesse protestar, Rebecca o jogou dentro do armário como um saco de esterco.
"Fique quieto", ela disse apenas com os lábios, e Kevin percebeu que ela estava prestes a desmaiar.
"Eu posso conversar com ele", Kevin sussurrou de volta, se encolhendo no armário como um caracol. "Não precisa..."
Mas antes que ele pudesse concluir, Rebecca correu pelo quarto, pegou seus sapatos e os jogou na cara dele.
Por um instante Kevin quis jogar os sapatos de volta nela como uma criança birrenta.
Então, sem nem se importar com o que ele tinha a dizer, Rebecca fechou as portas do guarda-roupa, deixando-o ali naquele espaço minúsculo e escuro, tendo de suportar o cheiro do próprio chulé.
_____________________♥️___________________
Oii gente! Como prometido, capítulo novo no domingo <3 Espero que consiga manter esse ritmo de postagens (amém).
E então, me contem o que acharam! Estou ansiosa para saber! A Rebecca e o Kevin parecem sempre estar se metendo em uma enrascada e outra. Eu adoro hahaha
Gente, por hoje é isso, volto na quarta com mais um capítulo novinho para vocês!
Beijos,
Ceci.
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