Capítulo 7

Percorri a casa em busca de Fenrir mas acabei notando uma peculiaridade na casa, todas as portas mesmo as que davam para os banheiros eram numeradas e acabei me lembrando de Liat falando algo sobre uma sala 37. Segui a numeração bagunçada e aleatória até encontrar a sala, quando entrei dei de cara com Fenrir servindo duas xícaras de chá e em seguida fechando as janelas e as cortinas, saindo sem dizer absolutamente nada.

Me preparei para sentar e alguns instantes depois, Liat chegou fechando a porta, se sentando à minha frente separadas apenas por uma mesa pequena e singela se não fosse os entalhes em ouro que reparei ao passar levemente a mão sobre os entalhes. Liat pegou uma xícara ainda fumegante, assoprou e bebeu um pouco, fiz o mesmo para não deixá-la sozinha.

— Já te disseram que é péssima se escondendo? — Ela perguntou suspirando cansada.

— Sinto muito, não foi minha intenção! — Respondo rapidamente depois de beber e sentir minha língua queimar um pouco.

— Agora, o que quer aqui? Vindo aqui, sinceramente, não consigo entender.

— Conhece-la. — Respondo na mesma seriedade e serenidade de Liat. — Gostaria de saber mais sobre você, Liat e consequentemente de Amy, antes que possamos vê-la. — Peço em seguida terminando meu chá.

Liat pareceu pensar no que diria antes de suspirar rendida, terminando seu chá e colocando a xícara vazia na mesa, se levantou e foi até um pequeno armário retirando uma caixinha de madeira com cadeado e em seguida, tirando de um buraco no chão debaixo do armarinho, uma chave antes de voltar a se sentar, deixando a caixinha na mesa.

— Existem apenas três pinturas que não queimaram. — Ela contou enquanto abria a caixa.

Retirando a primeira pintura de uma mulher de pele negra, olhos cor de mel, um longo cabelo preto vestindo um lindo vestido delicado branco e com um sorriso encantador. Peguei a foto para ver melhor, virando a foto encontrei um pequeno texto de dedicatória.

Meu sol, minha lua, ilumina meus dias e guia minhas noites, aqui estou, uma sonhadora em busca da eternidade para que possa olhar por vocês.

ASS: Emmyle

— Minha mãe escreveu antes de morrer. — Contou com uma voz melancólica e baixa.

— Sinto muito, ela era realmente linda. — Murmuro realmente triste, porém notando a beleza dela.

— Ela morreu esse ano, estava cuidando de você no enterro então não pude vir. — Liat continuou antes que eu pudesse falar. — Isso não faz diferença, ela nem foi enterrada de verdade, foi queimada junto com os pertences menos valiosos, fotos ou qualquer recordação e o que sobrou foi vendido depois.

— Quem ordenaria isso?! — Exclamei incrédula.

— O Senhor Saturne. — Revela com um tom irônico e com desgosto.

— Mas ela era esposa dele... Como teria coragem?... — Digo em choque vendo Liat dar de ombros como se isso fosse banal.

Liat parecia levar bem a conversa sobre a mãe falecida e tirando da caixa outro desenho, agora de uma menina com o mesmo sorriso largo da mãe de Liat, conclui que devia ser Amy. Ela tinha a mesma pele bronzeada de Liat, um cabelo preto bagunçado cortado de modo curtíssimo, os olhos cor de mel e, mesmo no desenho, uma aparência frágil.

— Amy virou empregada assim que nasceu por ser cega, ele julgou que ela era inútil até mesmo para reproduzir. Ele teria matado ela se não fosse por minha mãe que era a única, tirando Fenrir, a tratar minha irmã como um ser humano! — Sua voz acabou se elevando. — Sabia que ele estava demorando para matá-la.

— O que?! — Exclamo perplexa.

— Você ouviu a conversa, o jeito Sarang. — Me envergonho ao lembrar que os espiei. — Nós resolvemos nossos problemas com as próprias mãos sem envolver a família real. Então Saturne fez isso. Tem o modo de matar para cada um, uma garganta cortada para as crianças, esfaqueamento para as mulheres e para os homens é a castração, humilhação e autocanibalismo. — Liat explicou com naturalidade. — Ninguém tira o posto dos Sarang por esse motivo. A podridão da família.

— É a própria filha, Liat! Isso é... — A palavra não saiu da minha garganta ao lembrar da rainha.

— Só estou viva porque sou bonita e sou a melhor em manuseio de agulhas como armas letais, então é apenas por isso que sobrevivi e todos demonstram "amor" por mim. — Revelou com um sorriso triste nos lábios.

— Eu....

— Tem tanta coisa que quero te contar, Dea! Você não imagina! — Liat me interrompe e segura minhas mãos. — Por favor, não me odeie. Não tenho mais nada a não ser você e Theodoro para proteger! — Pede com a voz trêmula e o olhar embaçado de lágrimas.

— Jamais te odiaria! — Respondo o óbvio. — Você tem a mim, Aemy, Theodoro, Raely, Kylo e até mesmo Nora ao seu lado. Somos sua família, Liat. Não importa que não seja de sangue.

— Vamos ver, Amy. — A voz de Liat estava exausta.

Me levantei junto a ela e apenas a segui em silêncio até uma parte distante da casa onde havia uma porta entreaberta que assim empurrada, revelou uma criança que logo reconheci que era Amy, estirada no chão com o pescoço cortado e os olhos arregalados. Coloquei a mão na boca e segurei firmemente a caixa na outra. Liat andou até Amy com cuidado, juntando o corpo gélido da irmã contra o dela, cantarolando uma música de ninar baixo, mas ainda era possível escutar. Esperei ela ter seu momento, se levantando e indo até mim com parte do vestido ensanguentada, o que mostrava que o assassinato fora recente.

Fechei meus olhos por algum tempo em um pedido silencioso para que os deuses cuidassem dela melhor do que ela foi cuidada nesse mundo mortal, abri os olhos sentindo uma amargura no peito que demorei para entender o que era.

— Você pode ir já que ela...

— Com licença. — Interrompo Liat saindo da sala depois de deixar a caixa com ela.

Estava com apenas uma determinação em mente! Sai da casa indo para o quintal de entrada procurando-o com o olhar, as pessoas haviam se reunido lá novamente e o desespero me pegou com força mas não podia parar agora. Apertei minhas mãos com força, cravando as unhas na palma da mão e andando com passos firmes até Saturne que se encontrava no centro.

— Chefe da guarda real, Saturne Sarang. — O chamo me esforçando para manter a voz estável.

— Eu ordeno que faça um funeral decente para a Lady Amy Sarang! — Ordeno e para minha surpresa, ele nem moveu um músculo. — Quero isso em uma hora! Agora! — Exijo elevando minha voz.

Saturne fechou a expressão e resmungou algumas palavras jogadas antes de chamar os servos e repassar ordens para um enterro que seria feito às pressas porém devia ser o melhor possível. Ele me olhou como se eu não passasse de uma criança que sempre está muda e não deveria abrir a boca, o desprezo claro em seus olhos.

— Sim, Prince...

— Não me lembro de ter esquecido os bons modos, papai. — Liat fala surgindo ao meu lado com passos calmos.

Saturne reprimiu os lábios e franziu o cenho suspirando pesado como se contivesse a raiva, fez uma reverência profunda, revezando o olhar mortal entre mim e Liat sem medo das consequências.

— Sim, Vossa Alteza. Se me permite. — Ele pediu a permissão e eu concedi, deixando que saísse.

Observamos Saturne sair resmungando e com as mãos em punho como se fosse socar alguém, abri minhas mãos, tirei as luvas que não rasgaram e encarei as palmas que estavam avermelhadas e com as marcas das unhas mas por sorte não cortou a pele.

— A caixa, fique com ela para o enterro. — Peço devagar. — Vou pedir para a rainha para que Amy seja dada como o significado de anjo e quero que passe um tempo com ela, mesmo que não da maneira que queria. — Digo coçando a nuca.

— Obrigada por tudo, Amy ficaria feliz por ter mais alguém que se importe com ela. — Sorri com o que Liat disse,

Abracei Liat e fechei os olhos por um breve minuto, desejando que onde quer que Amy estivesse, nos braços de qualquer deus que seja, que ela possa sentir meu eterno afeto por ela e que possa descansar em paz agora. Caminhei até a carruagem e quando o cocheiro foi abrir a porta, olhei para trás uma última vez e pude ver uma criança de vestido lilás e um corte no pescoço cicatrizado ao lado de Liat. Quando a criança sorriu, percebi que era Amy que agora acenava para mim e segundos depois, assim que pisquei, havia desaparecido. Entrei na carruagem boquiaberta sem crer no que meus olhos viram, tentei relaxar na viagem que se seguiu porém meus pensamentos iam e vinham apenas em uma única coisa: Amy.

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