pedrinhas na janela

ainda 20 de março

quarto do Jungkook,

aproximadamente 08:00 p.m.

JUNGKOOK

— Ele atendeu? Oh, Deus, ele atendeu! Yoongi, ele atendeu! — Namjoon grita do outro lado da linha, no exato momento em que aceito sua ligação e quase sinto meus tímpanos estourarem — Olha aqui seu merdinha, onde você estava?

Reviro os olhos enquanto escuto sua voz alta demais para o meu gosto. Hipócrita, esta é a melhor palavra para definir Namjoon. Depois de ligar sem parar para minha casa, ao ponto de irritar minha mãe e eu ser obrigado a atender, ele começa a surtar. Como se tudo isso não fosse culpa dele, que me abandonou sozinho com aquele loiro irritante, e como se isso também não fosse motivo o suficente para eu o ignorar. 

— Você sabe, estudando com o Jimin. — O provoco, só para variar.

Ouço um barulho esquisito vir do outro lado e tenho quase certeza de que foi uma risada abafada. Não posso falar a verdade pelo telefone, já que sempre existe a possibilidade de meu irmão ou minha mãe estarem ouvindo de algum outro lugar da casa. Afinal, a chamada foi transferida da sala para o meu quarto e, como eu demorei séculos para atender, as almas fofoqueiras da minha familía devem estar se perguntando que tipo de assunto extremamente importante Namjoon quer tratar comigo.

— Estudando minhas bolas! — ele grita — Fala a verdade agora!

E lá se foi a minha tentativa de ser discreto.

— Não estou te entendendo, Joon. Foi você quem foi embora e me deixou a mercê do Jimin.

— E o que diabos isso tem a ver? Eu só fiz isso porque você ia embora sem mim. — reviro os olhos mais uma vez. Ele é ridículo. — Só que você sumiu durante a tarde inteira, então pensei que algo ruim tinha acontecido.

— Tivesse pensando antes, então. Sem contar que sempre fico te esperando depois que a aula acaba, exijo direitos iguais.

Namjoon dá uma risada debochada. Nojento.

— Não muda de assunto. Por que você sumiu durante tanto tempo?

Respiro fundo, cogitando se devo responder. Estou deitado em minha confortável cama com meu confortável HQ  em mãos e tudo que quero é conseguir ler em paz, o que, obviamente, é impossível no momento. No entanto, caso eu não responda Namjoon com o que ele quer ouvir, provavelmente não vai demorar nada para que ele venha bater em minha porta e me encher o saco com suas perguntas. Nesse caso, vai ser realmente impossível fugir dele.

É por isso que vou continuar mentindo.

— Estávamos estudando. Durante a tarde inteira...

Solto uma risada quando escuto Namjoon dar o seu melhor para conseguir não me xingar, mas o som morre assim que escuto um barulho esquisito. No começo acho que é minha imaginação, mas depois de alguns segundos fica óbvio que não estou ouvindo coisas.

Tem algum trouxa sem noção do perigo jogando pedrinhas na minha janela.

Levanto devagar, ignorando Namjoon que agora fala sem parar, e deixo o telefone em cima da mesa. Continuo ouvindo o barulho das pedras se chocando contra minha janela e vou até o banheiro o mais rápido possível.

Quando volto, o som ainda está lá. Ótimo. Com cuidado para não derramar o conteúdo que tenho em mãos, caminho até a janela e a abro de uma vez. Quando faço isso, uma pedra vem voando em minha direção e tenho que desviar para o lado, escapando dela por um triz.

Esse definitivamente é o limite. Sem nem mesmo olhar quem está lá embaixo, viro o balde de água que tenho em mãos, e tenho certeza de que deixei ensopado quem quer que esteja me importunando.

Quando resolvo olhar para baixo, vejo um Jimin surpreso me encarando. Ele parece não conseguir decidir entre ficar bravo ou apenas chocado.

Eu mesmo estou dando meu melhor para não rir de como ele está encharcado, parado embaixo de minha janela, com cara de tacho. Por dentro, entretanto, ainda estou irritado.

O que eu devo fazer com esse idiota? Ou melhor, o que diabos ele está fazendo aqui? Já é noite e tivemos o suficiente um do outro por hoje, não? Eu mesmo não aguento mais olhar para essa cara sonsa dele.

No momento em que Jimin aparenta estar pronto para falar alguma coisa, lembro de que deixei Namjoon no telefone. Apesar de eu já estar querendo fugir dele de qualquer maneira. Faço um sinal para o garoto lá embaixo, indicando que ele deve esperar, e volto para o telefone.

Não é surpresa nenhuma descobrir que Namjoon está me xingando do outro lado da linha. Devido à classificação indicativa, não vou nem mencionar o tipo de palavra que saiu da boca porca dele.

— Ei, seu bosta. — falo, sem rodeios — Vou desligar, te vejo amanhã.

Antes que ele possa responder, coloco o telefone de volta no gancho, encerrando a ligação e corro até a janela. Não tenho ideia do que estou fazendo, no entanto. 

Por que Jimin está aqui a essa hora da noite? Ele não devia estar aqui, assim como eu não devia estar o mostrando que existe uma escada velha ao lado da janela, o convidando a entrar sorrateiramente em meu quarto.

Eu definitivamente fiquei maluco, mas o que eu devia fazer? Deixar o cara ensopado no meio da rua? Quando fui eu que dei um banho nele?

Metade de mim tem certeza absoluta de que isso é uma má ideia, mas a outra metade se sente culpada e curiosa. Não vou mentir, quero muito saber o que trouxe Jimin até aqui.

Mais rápido do que eu gostaria, ele logo chega no parapeito de minha janela, apoiando uma perna no batente com destreza. Certeza que já deve ter pulado muitas janelas por aí. Maldito gangster.

Quando percebe que eu ainda estou parado, bloqueando seu caminho, ele me encara com uma sobrancelha erguida e eu simplesmente sei que ele está puto. Até porque nem mesmo eu sei o que estou fazendo.

— Você não vai me deixar passar? — ele pergunta e uma parte de mim quer rir de sua situação. Jimin está com ambas as mãos no parapeito e uma perna ainda do lado de fora. Deve estar desconfortável, mas não movo um músculo sequer — Jungkook?

O rosto dele está absolutamente próximo demais e nada faz sentido. Seus cabelos loiros estão caidos devido ao banho que eu o dei e tenho que me controlar para não soltar nenhum comentário ou até mesmo tirar aquela mecha que está em cima do olho dele. Mas o que diabos eu estou...

Meus pensamentos se esvaem como poeira no momento que sinto a mão fria de Jimin em meu ombro, me empurrando levemente. Acontece que, obviamente, ele cansou de esperar por uma resposta de meu cérebro lento e saiu do parapeito assim mesmo. No meio disso, ele me empurrou um pouco, mas ainda estávamos perto demais.

— Ei, o que você está fazendo? — a frase sai automaticamente de meus lábios assim que sinto seu toque.

— Você que travou no meio do caminho, então eu entrei.

Eu já disso isso inúmeras vezes, mas ele está perto demais. Muito, muito, muito perto. Ter me afastado só serviu para que Jimin tivesse algum espaço para se mover, porque ele definitivamente ainda está perto demais. Isso não me ajuda em nada a voltar para a realidade. Principalmente porque... Bem, eu posso ser um pouco burro às vezes e posso estar funcionando de forma mais lerda que o normal, mas eu reconheço esse olhar que ele está me lançando agora.

De repente, Jimin balança a cabeça e dá a volta, finalmente se afastando. Respiro fundo e conto até três. Que situação mais ridícula...

Olho na direção de Jimin enquanto ele caminha pelo meu quarto, pingando água no chão de madeira, e espero que ele diga alguma coisa. Não o conheço a tanto tempo assim, mas nunca o vi com essa expressão de raiva tão escancarada, que ele obviamente não está fazendo questão nenhuma de disfarçar.

Depois de avaliar meus posterês e HQs em silêncio, ele finalmente se vira e percebo bem a tempo que ele está prestes a falar alto demais. 

Okay, talvez ele não seja tão folgado assim ao ponto de sair gritando na casa dos outros, mas é de Jimin que estamos falando aqui. Então, por via das dúvidas, saio deslizando com minhas meias em sua direção e tampo sua boca com a minha mão, quase escorregando ao fazer isso. Ele arregala os olhos e gesticula com os braços, obviamente incrédulo com o que estou fazendo.

A verdade é que não sei o que meus pais pensariam caso ouvissem um garoto estranho gritando comigo em meu quarto logo depois de ter pulado a janela e nem quero descobrir.

— Shhhh! O que você pensa que está fazendo? — sussurro o mais baixo que posso, ainda com minha mão tapando sua boca — Já é de noite, você ficou maluco?

Jimin revira os olhos e arranca minha mão de seu rosto. Ele suspira e fico nervoso. Tenho quase certeza de que ele vai gritar, mas ele apenas tira algumas folhas de papel do bolso de seu casaco. Folhas estas que estão molhadas quase que por completo.

— Primeiramente, obrigado pelo banho. Segundo, acho que isso caiu de sua mochila quando você estava no meu carro. — ele explica — Como eram parte das folhas que Taehyung te entregou, achei que seria importante. Foi por isso que eu vim até aqui, okay? Agora você pode, por favor, parar de agir de forma mais estranha do que o normal?

— Você-

Observo enquanto Jimin faz um esforço para desdobrar o papel, agora delicado por causa da água, e sinto uma sensação ruim no estômago. Uma sensação que vai além da raiva, óbvio.

Demora uma questão de segundos para eu entender o que está acontecendo. No meio daquelas folhas está o bilhete. É por isso que deixo a provocação passar.

Não sei se devo rir ou chorar diante da situação.

— Acho que você já entendeu. — ele diz, enquanto assopra o bendito pedaço de papel — Olha só, por sorte ainda dá pra ler. Você é realmente um garoto de sorte, Jungkook.

— Então... isso que você veio fazer aqui? — tento pegar os papéis de suas mãos, mas ele se esquiva — Devolve logo, eu já entendi.

Jimin começa a ler. Ele começa a ler o bilhete em voz alta.

— Não confie tanto no Jimin — ele faz uma pausa e ri — Por favor, tome cuidado.... Que merda é essa?

Fico em silêncio, esperando. Não precisa ser um gênio para saber que boa coisa não vem aí. Tento, mais uma vez, pegar os papéis de suas mãos, mas ele dá meia volta e caminha pelo meu quarto.

— Fala sério, isso é ridiculo, Jungkook. Você não se deixou levar por isso, deixou?

— Eu não passei a tarde inteira com você? Acha mesmo que eu teria ido caso acreditasse nesse bilhete?

— Ah, nem vem. Eu sei que você só foi porque é teimoso e orgulhoso, não aguenta uma provocação e já sai entrando no carro dos outros.

Ele não está errado nesse..

— Se você sabe disso, deveria parar de ser inconveniente. Nem fui eu quem escreveu esse bilhete e nem te tratei diferente depois dele. Você não deveria ir tirar satisfação com Taehyung ao invés? Não me coloque no meio dos problemas de vocês!

Jimin abre a boca para responder, mas parece mudar de ideia e a fecha de novo. Ele sabe que estou certo no final de tudo. Espero calado por uma resposta, mas ao invés disso tudo o que escuto é sua risada alta. Alta demais. 

Enquanto ele ri alto demais, aproveito para acabar com a distância entre nós e tampo sua boca de novo. Tenho certeza de que posso ouvir passos se aproximando no corredor.

— Jungkook? — é a voz da minha mãe, merda — Aconteceu algo?

Como sempre, é exatamente o que eu temia.

Na velocidade da luz, empurro Jimin para debaixo de minha cama, enquanto jogo algumas roupas no chão.

— Não é nada, mãe! Precisa de algo?

Segundos depois o rosto de minha mãe aparece na porta de meu quarto. Ela olha ao redor, avaliando tudo, e seu olhar para nas pequenas poças de água que Jimin deixou no chão. Também não guardei o balde, então é óbvio que ela percebe isso.

— Sabe de uma coisa... — ela diz, com uma expressão clara de decepção — Eu não vou nem perguntar. Namjoon ligou de novo e disse que está vindo pra cá, já que você desligou na cara dele. Ele parecia bravo.

Merda.

Dou meu melhor sorriso, aquele que não engana mais ninguém em minha casa. Não custa tentar, entretanto.

— Tudo bem.

Antes de dar mais uma olhada na direção da janela, ela acena e sai. Espero até que o som de seus passos desapareçam e finalmente suspiro.

— Pode sair.

Espero enquanto Jimin se arrasta para fora, levantando em seguida. Estou avaliando a bagunça que ele fez em meu quarto, então não percebo que ele traz algo consigo.

— Acho que isso daqui é seu.

Olho para o que ele tem em suas mãos. É uma... calcinha rosa, com lacinhos. Não é minha, entretanto, mas de uma garota que veio aqui em casa. Detalhes não importam aqui. O que importa é que sinto meu rosto queimar de vergonha, provavelmente ficando tão rosa quanto a peça que ele segura pela pontinha.

Arranco o objeto de suas mãos e jogo dentro de meu armário, porque não sei o que devo fazer com isso.

— Sem mais comentários. E não, não é meu.

— Sempre soube que você não era santo, mas uau. — Obviamente, ele não perde a chance de provocar — Sinto que hoje foi um dia muito produtivo.

— Cala a boca e vai embora. Finge que eu morri e me esquece.

Da água pro vinho, de repente a expressão de Jimin muda de sarcástica para séria. Ainda não me acostumei com isso.

— Olha, você está certo. O bilhete realmente não é culpa sua. Foi ridículo tirar satisfação de algo que você não fez, então... desculpa.

Não vou mentir, estou mais do que surpreso. Sei que estou fazendo uma careta ridícula, mas não consigo evitar. Mesmo sabendo que eu não fiz nada, me sinto subitamente culpado.

— Você bateu a cabeça? — É o que pergunto, entretanto.

— Estou pedindo desculpas e é isso o que você diz?

— É que... sabe? Não é muito a sua cara.

Pela primeira vez, vejo que sou eu quem está irritando o mauricinho e sinto meu ego inflar.

— Ah, cala a boca.

— Então, já que você resolveu o que tinha pra resolver, acho melhor ir embora. Namjoon deve estar chegando.

— Não vejo problemas nisso.

Respirando fundo, começo a empurrar Jimin na direção da janela. Se ele entrou por aqui, ele vai ter que sair também. No entanto, seus pés parecem grudados no chão. Ele até mesmo cruza os braços.

— Por que você não escreve uma música pra mim também?

— Hein? Por que isso do nada?

Sinto que vou vomitar.

— Acho que é justo.

— Eu não acho.

Ele finalmente para de fazer força e se vira de algum jeito. Jimin apoia uma perna no parapeito da janela e pisca para mim. 

— Não tem problemas, você pode compensar pra mim na operação.

Antes que eu possa responder, ele passa para o lado de fora e começa a descer a escada.

— Esquece isso! — Quase grito da janela, como se fosse a Rapunzel — Promete que vai me deixar em paz!

Lá embaixo, Jimin apoia os pés no chão, mas só consigo ver sua silhueta distinta nas luzes noturnas. Ele dá um tchauzinho com a mão e vai embora sem dizer nada.

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