if i could ride a bike
ainda 20 de março,
na estrada, indo para algum lugar
JUNGKOOK
A primeira coisa que percebo sobre o carro de Jimin é que tudo cheira ao seu perfume. Não é forte, mas é marcante. Suave, um tanto delicado. Não sei o que eu estava esperando no começo, talvez algo como cheiro de café e cigarros, mas a realidade me deixa atordoado por alguns segundos. Sinto um leve desconforto por ter tais pensamentos sem nem mesmo hesitar, mas a sensação não dura muito tempo, logo sendo substituída por uma raiva crescente. Não é raiva apenas de Jimin, entretanto, mas também de mim mesmo. Essa situação está tostando o resto de meus neurônios.
Que tipo de idiota faz justamente o que jurou não fazer, apenas por impulso e birra? Naquele momento, era como se algo no rosto de Jimin não me desse escolha. Eu jamais admitiria em voz alta, mas eu não queria ir embora naquele instante. Entretanto, também não era minha intenção deixá-lo fazer o que quisesse.
Está meio perceptível como falhei miseravelmente nessa última parte.
Atualmente, estou dividido entre surtar em voz alta, até irritar Jimin o suficiente para ele dar meia volta, e deixa-lo dirigir, em silêncio.
Ao que ele percebe minha carranca, escuto sua risadinha baixa. Em seguida, observo enquanto ele coloca uma fita cassete no toca-fitas do carro. Não demora muito para que a voz de Freddie reverbere pelo lugar, as primeiras notas de Don't stop me now dando um toque extra a situação que, honestamente, não sei se chego a apreciar.
— Então... — murmuro, sem nem mesmo perceber que estou, cada vez mais, me encolhendo contra o banco do carro. — Quando você disse que íamos vivenciar a música, você estava falando literalmente?
— Claro que sim. Fico feliz que você tenha topado minha aposta.
— Eu nunca aceitei nada. — Murmuro baixinho, então não tenho certeza se ele chegou a me ouvir. — Para onde estamos indo?
— Você sabe andar de patins, Jungkook?
Pisco, surpreso, enquanto passamos em frente a uma rua cheia de lojinhas um tanto decadentes.
— Patins?
— Patins.
Jimin dá mais uma daquelas suas risadinhas, e tenho vontade de pedir para ele me deixar em casa. É isso, já tive o suficiente disso tudo.
No entanto, ainda me sinto envergonhado por ter entrado em seu carro do nada, quando tudo que eu queria era justamente evitar esse mauricinho rebelde...
— Então, você sabe?
— An... Sei, claro que sei.
Estou olhando para frente de forma nervosa, tentando evitar contato visual com Jimin. Na verdade, não sei andar de patins.
— Você não sabe. — Ele afirma, e nem preciso olhar pra sua cara para deduzir que ele sustenta aquela sua expressão convencida característica — Você sabe andar de bicicleta, pelo menos?
A pergunta faz com que eu vire meu rosto em sua direção, por puro impulso.
Solto um suspiro cansado.
— Okay. Não sei andar de bicicleta nem de patins. Está feliz agora?
Um momento de silêncio se passa. Então, com um semblante tão surpreso que quase me faz rir, ele vira em minha direção, completamente. Parece que falei a coisa mais absurda possível. Seus olhos estão focados em mim e então começo a ficar desesperado.
— Que foi? Olha pra frente! Olhos na estrada! — quase seguro seu rosto, para força-lo a olhar para a pista. — Você quer nos matar?
— Desculpa! Desculpa! Meu deus!
— O que foi?
Uma pausa.
— Como você não sabe andar de bicicleta? Você é como um jovem idoso.
O jeito como ele diz essa frase não me dá escolha a não ser soltar uma risada um tanto engasgada. Principalmente porque, logicamente, o que ele diz não faz o menor sentido. Idosos não sabem andar de bicicleta?
Quando, finalmente, consigo me recompor, Jimin está sorrindo imensamente. Dessa vez, no entanto, permanece concentrado na estrada.
— Então você sabe rir, olha só. — Ele provoca — É bonitinho.
— Cala a boca.
— Não sabe andar de patins, não sabe andar de bicicleta. O que você sabe fazer?
— Jogar? — minha voz já começa a soar irritada demais para os meus próprios ouvidos — Eu sei jogar, e escrever músi...
Paro de falar assim que lembro do que deu início a toda essa confusão.
— Sim, sim! Suas músicas. Como esquecer?
Quase consigo ver o veneno saindo junto de suas palavras. Em um movimento de puro instinto, abraço a mochila em meu colo. Talvez eu devesse queimar o maldito caderno, fingir que nada disso nunca existiu.
— Ah, chegamos!
Somente quando ele fala, é que tomo ciência de onde estamos. É apenas... um parque. Uma praça de cimento, com alguns bancos, cercada por um parque com brinquedos de um lado e árvores, que há muito não são podadas, do outro. Para ser sincero, tenho quase certeza de que fica a uns dois quarteirões de minha casa.
Sem falar nada, o encaro. Como se, de repente, cobras tivessem começado a crescer no lugar de seu cabelo. Jimin não demora nada para perceber meu comportamento, entretanto.
— O que foi? Tem algo de errado?
— Não.
Ele solta uma risada, saindo do carro logo em seguida. Eu o acompanho para fora do automóvel e apenas observo, em silêncio, enquanto ele tira dois pares de patins do banco de trás. Por algum motivo, nem mesmo percebi que eles estavam ali o tempo todo.
— Você realmente, realmente — ele me entrega o par de patins preto — achou que eu fosse fazer algo com você?
— Não... não confio em você, mas não pensei isso. Só não imaginei que você fosse tão literal.
— Quando eu disse que ia te chamar pra sair... O que foi que você pensou?
Novamente, o que Jimin diz não condiz com o olhar em seu rosto. Seus traços poderiam ser comparados ao de um anjo, mas suas palavras passam longe de serem inocentes.
— Não pensei em nada. Só não imaginei um parque e patins. Aliás, eu disse que não sei andar nisso.
— Eu te ensino.
Antes mesmo que eu possa pensar em retrucar, Jimin já estava caminhando até o banco mais próximo. Fico parado, o observando feito um idiota enquanto ele tira seus tênis e começa a calçar os patins. Algumas crianças brincam nos arredores, e duas mulheres, provavelmente as mães, estão sentadas ao longe, conversando sobre algo que eu não consigo ouvir devido à distância.
É apenas uma tarde tranquila, normal, genérica e entediante. Em dias como este, eu estaria em casa lendo alguma revista em quadrinhos ou sendo incomodado por Namjoon. Nunca imaginei, por nenhum segundo, que a pessoa que iria me obrigar a aprender a andar de patins seria Jimin. Também não imaginei que essa fosse a primeira coisa que ele iria sugerir.
A tal Operação não deveria ser mais... arriscada?
Não é como se eu realmente achasse que Jimin era um tipo horrível de pessoa, como Taehyung havia me alertado naquele bilhete. Apenas não confiável, babaca e outras coisas mais. Além de que eu sei como ele pode ser irritante e metido a manipulador... sei também que havia me dedurado, que estava mudando de colégio porque havia arrumado confusão e que andava com um tipo suspeito de gente. Tudo isso depois de um número contado de vezes onde eu havia o visto. Não é como se eu pudesse fazer uma lista tão extensa como essa de motivos para eu confiar nele, ou me deixar arrastar junto a essa aposta ridícula, mas...
— Você não vai calçar os seus patins, Jungkook?
Mas, de uma maneira completamente inesperada, aquele bilhete que Taehyung me entregara também não me passava uma sensação boa. Eu jamais iria admitir, mas Jimin — e toda sua insistência— estava me deixando curioso.
Caminho até onde ele está e sento ao seu lado, calçando o par de patins que ele me entregou. Devo confessar que, a esse ponto, Jimin fez um emaranhado tão grande em minha cabeça que não me importo mais, apenas amarro o cadarço desse negócio. Assim que termino, o mauricinho já está de pé, bem na minha frente.
Ele estende ambas as mãos na minha direção.
— Vamos! — sua voz está ainda mais animada do que o normal. — Vem comigo.
Continuo encarando a palma de suas mãos e os anéis em seus dedos. São dedos pequenos e gordinhos, especialmente o seu mindinho. Senti vontade de rir, mas resolvi não comentar nada. Às vezes, eu ainda prezo pela minha vida.
— O que foi? Por que você tá fazendo careta? — Jimin agarra minhas mãos e me puxa para cima, mesmo que eu não tenha feito nada, e logo estou de pé. — Vamos logo.
A sensação é esquisita. A sensação de ter Jimin segurando minhas mãos enquanto me leva pra lá e pra cá, quero dizer. Tenho quase certeza de que vou cair a qualquer momento, e de que minha cara sustenta algum tipo de expressão medonha, mas não digo nada a princípio.
Consigo ver claramente um sorrisinho de canto de boca no rosto de Jimin, mesmo que seus cabelos escondam grande parte de suas feições enquanto um vento forte quase faz com que eu perca meu equilíbrio nessas coisas esquisitas. Tudo que fazemos no começo é andar de forma espaçada e devagar, mas esse garoto... ele certamente me odeia.
À medida que nos afastamos mais do banco onde estávamos sentados, e começamos a andar pela passarela de cimento que existe ao redor da praça, começo a ficar desesperado. Estou desesperado porque agora realmente estamos andando de patins. Quer dizer, Jimin me puxa, eu faço o melhor que consigo para não cair.
— Jimin, isso não vai dar certo...
Digo isso porque ele está andando de ré, enquanto me puxa em sua frente, e estamos indo cada vez mais rápido. O que quer dizer que, eventualmente, ou ele vai bater em alguma coisa e vamos cair, ou eu vou me desequilibrar completamente e me estabacar no chão. Pelo que eu saiba, Jimin não tem olhos nas costas.
— Relaxa. Eu tenho tudo sob contro...
Antes mesmo que ele possa acabar de falar, suas panturrilhas batem em uma mureta baixa que nenhum de nós viu. O impacto não é forte o suficiente para machucar, mas, ainda assim, o faz perder o equilíbrio, exatamente como eu previa. Ao que ele balança sobre o par de patins, eu acabo perdendo completamente o apoio. Em questão de segundos, de alguma maneira, estou caindo para trás, de bunda no chão, enquanto agarro a jaqueta de Jimin e o levo junto comigo.
Estamos jogados no piso de cimento, em uma posição muito esquisita, e só quero morrer de pura vergonha. Eu avisei que isso aconteceria. Olhando para qualquer lugar que não seja o garoto quase em cima de mim, dou um jeito de me afastar dele.
— Eu avisei — murmuro — Se você não fosse tão...
Minha fala é interrompida pela risada de Jimin. Ele está a uma distância muito curta, de joelhos no chão e rindo sem parar. Começo a sentir uma dor em meus cotovelos, mas estou muito ocupado prestando atenção em como os olhos dele se fecham completamente quando esse tipo de sorriso surge em seu rosto. Não sei se estou encantado ou assustado com sua risada maníaca, entretanto.
— O que foi?
— Isso... Isso foi divertido.
Ele nem mesmo consegue falar direito por conta de sua crise de riso.
— Como, exatamente, isso foi divertido?
Jimin apenas balança a cabeça, começando a se recompor. Fico em silêncio até que ele abra seus olhos. O Park me encara e tem uma espécie de brilho diferente em seu olhar. Não consigo segurar por muito tempo e acabo virando o rosto pra outro lado. Perdi feio.
— Você se machucou? — ele pergunta e está chegando mais perto — Deixa eu ver.
Suas mãos vêm em minha direção, de novo. Quero afastar meus braços dele, mas qual o sentido de fazer isso? Então, de qualquer maneira, deixo que avalie meus cotovelos, enquanto olho fixamente para qualquer coisa que não seja seu rosto e seus cabelos loiros. Além daquele brilho esquisito no olhar que permanece ali, se recusando a ir embora por algum motivo mais esquisito ainda. Motivo este que eu desconheço.
Jimin olha para cada arranhão em meus braços, como se fossem grande coisa, até que finalmente parece se dar por satisfeito. Quando acaba, ele sorri para mim.
— Eu tenho uma caixinha de primeiros socorros no carro. Posso colocar um curativo.
Escuto o que sai de sua boca com atenção, mas estou envergonhado demais para responder. Tudo que faço, então, é soltar meu braço de seu aperto leve e tirar os patins. Ao que meus olhos passam por Jimin, noto que sua calça está rasgada e ele também tem alguns arranhões em seus joelhos.
Somos como duas crianças.
— Você também se machucou.
— Ah — ele faz um gesto de desdém com a mão — Isso não foi nada. Só um arranhão.
— Hum..., mas eu posso colocar algum curativo pra você tam-
Em questão de segundos, ele está bem perto de mim. Seus olhos continuam brilhando, seria assustador caso não fosse... Impressionante?
— Você está bem? Você bateu a cabeça? — Jimin está chegando mais perto a cada palavra que diz — Você tem certeza de que está tudo bem? Você está sendo gentil demais.
— Cala a boca antes que eu me arrependa disso.
O empurro com uma mão antes que seu rosto esteja estranhamente próximo demais. Estou quase certo de que minhas forças estão se esvaindo, porque não tenho mais disposição nem mesmo para ficar bravo com seu comportamento esquisito. Sinto até saudades de quando ele era apenas mais um mauricinho metido que conheci no karaokê.
Fico de pé assim que Jimin também tira seus patins, e caminhamos em silêncio até onde nossos sapatos estão jogados. Espero no banco da praça enquanto ele procura por seu kit de primeiros socorros. É engraçado pensar que o mauricinho tem uma coisa dessas. Parece com algo que minha mãe faria.
Enquanto ele não volta, vejo as duas mulheres, que estavam sentadas conversando, irem atrás de suas crianças e as levarem embora. Uma delas até dá uma olhada raivosa em minha direção. O motivo parece ser óbvio.
Não sei exatamente se sinto vontade de rir ou de me encolher até sumir.
— Encontrei! — Jimin volta, trazendo a caixinha em mãos, alheia a qualquer coisa que aconteça ao seu redor — Você quer de que cor?
O encaro, confuso, até perceber que ele está falando dos curativos.
— Azul.
Jimin senta ao meu lado e limpa meus machucados. Sei que, levando em conta nosso passado atordoante eu deveria estar incomodado com essa situação, mas só consigo pensar em como ele é cuidadoso. Alguns minutos depois, meus cotovelos estão cheios de curativos azuis e tenho certeza absoluta de que ele colocou mais do que o necessário.
Permaneço encarando a bagunça que Jimin fez, até sentir sua mão pressionar minha bochecha. Quando toco o lugar, percebo que ele também deixou um curativo em meu rosto.
— Ei! O que é isso?
— Um curativo.
— Pra quê...
— Fica bonitinho.
Não tenho nem palavras para responder a isso, então também reviro a caixa e coloco um curativo em sua testa. É laranja e fica mais chamativo do que eu imaginava.
— Agora estamos resolvidos.
***********
Depois de cuidarmos de nossos arranhões, acabamos desistindo dos patins. Jimin disse que, algum dia, também me ensinaria a andar de bicicleta. Bem, sonhar não faz mal, então não respondi nada. Até porque, tecnicamente, ele ainda não me ensinou nada além do que não se deve fazer quando se está andando nessas coisas.
Eu não diria que foi produtivo.
Neste momento, estamos indo para algum lugar que ele parece não pretender revelar. Jimin apenas dirige em silêncio. Nenhum de nós removeu os curativos de nossas caras, o que nos assemelha a dois adolescentes ridículas. Por coincidência ou não, é exatamente isso que somos.
Para minha surpresa, as horas parecem passar mais rápido do que eu imaginei. Tento controlar a fome que cresce em minhas entranhas, mas minha barriga faz um barulho assustador. Tenho plena certeza de que Jimin ouviu também, já que está sorrindo. O rosto dele parece que vive congelado nessa constante expressão provocativa, como se ele respirasse e um flerte aleatório deixasse seu corpo junto com o gás carbônico.
— Parece que tem alguma coisa não identificável crescendo aí. — Como eu imaginava, o loirinho não demora nada pra deixar essas palavras escaparem.
— Vai me dizer que você não está com fome também?
Jimin finge pensar.
— Não. Não tanto quanto você. Espero que você goste de coisas doces.
Seu comportamento faz parecer que tem algo mais no ar, e o jeito como ele fala deixa a entender que ele já sabia que gosto de coisas doces.
— Por que isso parece tanto com um encontro? — acabo soltando em voz alta, o que, definitivamente, não era minha intenção.
— Quem disse que não é?
Engasgo com minha própria saliva ao que ele diz isso. Mais uma vez, sou um completo desastre quando se trata de esconder o que eu sinto. Deve estar escrito em letras garrafais bem em minha cara como estou envergonhado com isso.
— Desculpe? — minha voz sai um tanto esganiçada — Você que disse que não seria um encontro. Que só íamos sair como amigos, só hoje. Como amigos.
— Se você quiser, pode ser um encontro.
— Eu nem mesmo topei com a parte onde saímos como amigos, quem dirá com um encontro.
— Mas foi você quem entrou no meu carro sem falar nada.
Ele está certa nesse ponto, mas apenas nesse.
— Eu só fiz isso pra você parar de me perseguir.
Mentira. Eu fiz porque sou um idiota que não pensa.
— Eu nunca disse que ia parar de te perseguir antes da operação acabar.
— Espera aí, você disse só uma vez e, caso eu não gostasse, não precisaria mais sair com você.
Jimin dá uma olhadela em minha direção, sorrindo.
— E você não está gostando?
— Não — respondo, com os braços cruzados — Estou odiando.
Talvez... apenas talvez... isso também seja mentira.
— Certo. Então tudo bem.
Ele diz isso, mas o sorriso de sempre permanece em seu rosto. Até mesmo seus lábios cheios me irritam.
— Mas, assim, hipoteticamente falando — me odeio demais por deixar essas palavras escaparem, mas não consigo controlar —, quanto tempo duraria essa tal operação ridícula com a qual eu com certeza não concordei?
Jimin aumenta o volume do som, que ainda toca Queen. Eu realmente detesto admitir, mas....
— A tal operação ridícula com a qual você com certeza não concordou dura até você admitir.
— Admitir o quê?
— Admitir que Queen são os reis do rock.
Solto uma risada horrível. Jimin não está certo em muitas coisas (em quase nada, na verdade), mas em uma ele acertou em cheio. Eu sou, sim, teimoso, e isso está fora de cogitação.
— Vai sonhando, eu jamais vou admitir isso.
— Então vai se preparando, porque vamos ter vários encontros como esse.
— Espera aí, eu não concordei com a operação. Foi apenas uma pergunta hipotética, okay?
— Okay.
— Isso mesmo.
— Nesse caso, vou levar isso como sua confissão — ele diz enquanto balança a cabeça — Eu sei, eu sei que Queen são os melhores.
— Dá pra parar de ser inconveniente?
— Só se você parar de ser teimoso.
— Quem tá sendo teimoso aqui é você.
— Queen...
Quando as próximas palavras deixam minha boca, eu percebo que posso ser impulsivo na mesma proporção em que sou teimoso e que, talvez, eu deva parar de me deixar levar pela lábia de Jimin.
Ou seja, eu tô muito ferrado.
— Tá bom, cacilda, eu topo essa tal operação terrível. Acho bom você não me decepcionar, ou eu jogo seu corpo no Rio Tâmisa.
— Você viajaria até a Inglaterra por mim? Que romântico.
— Cala a boca, pelo amor de Deus.
**********
ainda 20 de março,
Watermelon Sugar doceria e lanchonete
Definitivamente, esse é o lugar mais colorido que eu já conheci. Tons de laranja, rosa e amarelo preenchem as paredes e várias mesas e sofás de diferentes tamanhos estão dispostos pelo ambiente. As pessoas que frequentam o lugar também não falham em ser autênticas. Atrás do balcão, um homem sorridente, com cabelos castanhos na altura dos ombros, atende os clientes.
Jimin caminha pelo lugar até uma mesa no canto, enquanto cumprimenta algumas pessoas pelo caminho. Eu apenas o segui, de cabeça meio baixa, envergonhado com os curativos em nossa cara e corpo e nossas roupas provavelmente sujas.
Sento-me à mesa, junto de Jimin, enquanto tento identificar a música que toca no ambiente. Tenho certeza de estou fazendo careta quando percebo que, por coincidência ou não, também é Queen. Good Old Fashioned Boy, o que soa até irônico.
O homem sorridente vem em nossa direção, trazendo o cardápio. Desse lugar, ele é, de longe, o que tem um estilo mais chamativo. No entanto, está longe de ser feio. Sua blusa de botões possuí pequenas melancias estampadas e acho o conceito genial. Aqui temos alguém que sabe fazer marketing.
— Como posso ajudar? — ele pergunta, educadamente — Podem ficar à vontade.
Depois de alguns minutos, nos quais Jimin alternava entre conversar com o moço e decidir o que pedir, acabamos optando por uma grande porção de batata frita e hambúrgueres. Nada além do normal.
Fico surpreso por não saber da existência desse lugar até Jimin me mostrar que o mesmo existe. Eu apenas conhecia a Robbers até então, onde eu e Namjoon vamos quase sempre. Todo esse ambiente me passa uma sensação diferente.
Depois de olhar os detalhes das paredes, noto que um quadro repousa bem atrás de Jimin, no qual está pintado uma frase com letra cursiva: "Trate as pessoas com gentileza".
— Gostou? — Jimin aparenta estar ainda mais convencido que o habitual — Eu imaginei que você gostaria.
Dessa vez, infelizmente, ele está certo. Já que acabei concordando com a operação ridícula, admitir ou não já não faz mais diferença. Independentemente do que eu diga, ele vai continuar me perseguindo.
— Gostei.
— Isso sim é um milagre. Você está começando a baixar a guarda, olha só.
Faço um barulho irritado com a boca. Sempre que fico sozinho com Jimin é uma tortura interminável.
— Você não perde a chance de ficar calado, não é?
Ele me encara, sorridente. Aparentemente, a única forma de irritar Jimin é criticar sua altura.
Quando nosso pedido chega, sinto meu estômago vibrar em pura felicidade. Tenho que admitir que é tudo uma delícia. O milkshake de chocolate com creme que pedi também parece ter um sabor diferente, mais doce, mais incrementado, com bastante chocolate. Até tudo isso acabar, tenho que lidar com inúmeras provocações de Jimin, que ficou mais do que feliz ao perceber que estou realmente gostando.
Depois ainda temos direito a uma "hora da sobremesa", na qual Jimin pediu uma torta de limão. Foi então que descobri que ele não gosta de coisas muito doces. Totalmente meu oposto, que pedi uma de torta de morango com chocolate e docinhos para a viagem.
Agora, que tudo finalmente acabou e estou parado na porta de casa observando seu carro sumir ao longe, sinto que algo diferente substituiu todo o desespero dessa manhã. A tarde havia passado como um sopro e a noite está quase chegando. Eu estou cheirando a terra e sinto o gosto dos doces ainda frescos em minha boca.
Talvez, e apenas talvez, tenha sido melhor do que eu podia cogitar. Entretanto, não é o suficiente para me fazer confiar nele ainda. Suficiente para me deixar curioso com relação ao seu comportamento esquisito? É, talvez.
Apenas talvez.
To be continued...
O dia 20 de março ainda não chegou ao seu fim.
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