horror movie night - parte 2

okay, revisar esse capítulo me deu muito trabalho, pq a besta aqui adicionou uma cena inteira e ainda mudou mais coisa do q pretendia

auto controle? desconheço

enfim, se tiver alguém relendo, vcs conseguem perceber as mudanças?

e esse capitulo tem uma playlist e eu já coloquei o link la na pagina fixada no meu perfil


***

1 de abril, 1987

Aproximadamente 6h da manhã, casa da família Jeon.

Os pais de Jungkook cruzam o gramado um tanto cambaleantes. O Senhor Jeon tem certeza de que acabou de ver um vulto pela janela da sala, mas conhece muito bem seu filho mais velho para saber que ele não estaria acordado à essa hora da manhã. Dessa forma, acaba ignorando o que viu e continua caminhando junto de sua esposa até a porta da frente de casa. Em seu raciocínio, aquilo não passou de uma ilusão causada pelo sono, ele sabe que precisa descansar urgentemente.

No topo da escadaria, no entanto, duas figuras se atrapalham com os degraus enquanto correm para tentar alcançar o quarto de Jungkook o mais rápido possível. Parece impossível que o Senhor Jeon não consiga ouvir suas risadas mal contidas. 

***

Algumas horas antes, aproximadamente 23h do dia 31 de março de 1987.

Sala da casa da família Jeon.


JUNGKOOK


— Olha, vou ser sincero.

O jeito que Jimin fala me dá arrepios e acabo me engasgando com a pipoca. Ele continua insistindo nessa ideia de jogo, quando tudo que quero fazer é ver o filme. Esse é muito melhor do que o primeiro.

Com Jimin é sempre assim: Jogos, caças ao tesouro, operações, apostas. Quando vou ter paz? 

— Diz — falo, receoso. — O que é? Já deixei claro que não quero participar de nada.

— O negócio é.. — ele olha bem no fundo dos meus olhos — Estou entediado. O jogo faz parte da operação. Por favor? 

Reviro os olhos com desdém, porque é a única reação que meu corpo cansado consegue elaborar.

— Okay.... Você só está usando a operação como desculpa para fazer o que você quer fazer. Cala a boca e me deixa assistir. 

Jimin coloca ambas as mãos em meus ombros e me sacode de um lado pro outro. Esse moleque tá pedindo para morrer.

— É óbvio que não, Jungkook! Por favor, eu estou sendo cem por cento sincero!

— Não importa. Não quero.

— Escuta. Você tem um UNO, não tem?

Estou ficando cada vez mais convencido de que deixar ele ficar aqui foi uma péssima ideia.

— Tu é chato pra caralho, hein — solto um suspiro derrotado — Sim, eu tenho um UNO... Isso tem a ver com seu "jogo"? O que você tá aprontando?

Jimin sorri e fico surpreso. Parece que faz uma eternidade desde que vi esse sorriso sacana na sua cara e não sei se gosto disso ou se estou aterrorizado.

— Sim, vamos jogar UNO. Apenas isso.

O jeito que ele alarga ainda mais seu sorriso a medida que diz isso faz com que eu levante em um pulo e saia bufando pelas escadas para buscar as malditas cartas em meu quarto. Não sei se apenas fiquei irritado com sua cara, irritado com sua prepotência, irritado com sua existência. Eu apenas não queria mais ter que olhar para esse sorriso maldito.

 "Apenas uma partida de UNO". Ha, como se eu acreditasse nisso.

Quando volto, Jimin está rindo baixinho.

— Qual a graça?

Ele balança a cabeça.

— Você não para de resmungar.

— Eu não estava resmungando.

Jimin continua rindo.

— Estava sim — ele puxa o ar e tenta se recompor — Ficou resmungando sobre mim, mas ainda assim você buscou o UNO rapidinho... bom garoto.

— Bom garoto, um cacete.

Ele volta a rir.

Controlo a minha vontade de jogar o baralho em sua cara com tudo. 

— Vai, diz logo. Qual a aposta da vez?

Jimin finalmente consegue se recompor e me encara com lágrimas nos olhos. 

— Então você já sabe que tem uma aposta.

— Eu seria muito idiota se não soubesse. Você nunca me deixa em paz.

— Tudo isso porque você é teimoso, então se não houver uma aposta ou uma competição, você não topa nada do que eu digo.

Certo.... Parece que pelo menos uma vez na vida, Jimin está realmente certo no que diz.

— Okay, desembucha. Seja lá o que for, eu vou ganhar de você.

Ele pega o baralho de Uno e joga na mesa de centro, se sentando no chão logo em seguida. Não demoro nada para me juntar a ele, sentando do lado oposto ao seu. 

— O negócio é o seguinte: quem perder uma partida vai ter que tirar uma peça de roupa.

Acho que tem um grande ponto de interrogação estampado na minha cara. Desde quando minha casa virou um clube de striptease?

— Como assim? Acho que não entendi.

— Por exemplo, se você perder a primeira partida, vai ter que tirar as meias. Se perder a segunda, vai ter que tirar o casaco e assim por diante. Vamos jogar até alguém acabar pelado....

— Você está falando sério? 

— Vamos começar?

— Você não pode estar falando sério. Como isso pode sequer afetar a nossa operação? Como isso vai te ajudar a provar que Queen é melhor que Elvis? 

— Bem, se eu ganhar, você admite que Queen é melhor.

— Você quer que eu tire minha roupa na sua frente e ainda admita algo que nem verdade é? Nunca.

— Se você ganhar, eu falo a verdade sobre o que você quiser.

A verdade sobre o que eu quiser.... Não apenas sobre a operação, ele quer dizer? 

— Fechado.

Imediatamente, Jimin começa a organizar as cartas com um sorriso no rosto. Não preciso nem dizer que existem vários problemas catastróficos nessa situação. Começando com o fato de eu não ser nada bom no UNO, ou seja, eu só vou ganhar isso caso tenha ajuda divina. Segundo, eu já topei e não tem mais como fazer Jimin desistir dessa ideia.

— O que foi? — ele pergunta com a voz calma, digna de Buda — Você já me viu sem roupa antes.

Por um momento, eu travo. Eu já vi? Demoro alguns segundos para perceber que, sim, eu vi uma vez. Naquele lago. No entanto, ele não estava completamente pelado.... Imediatamente, toda minha cota de autocontrole se esvai, a imagem de um Jimin realmente levando esse jogo adiante brilhando na minha cabeça. Abaixo a cabeça, suando frio e querendo me jogar na frente de um carro, mas ele já terminou de organizar as cartas, feliz da vida.

Eu estava indo tão bem....

Só me resta suspirar.

— Preparado? — ele pergunta.

Estou bem longe de estar preparado para qualquer coisa, mas faço que sim com a cabeça.

Jimin bate palmas uma vez.

— Então vamos começar! Oh, estou tão ansioso, Jungkook. Espero que esteja usando uma cueca bonita.

Nesse momento, percebo que não sei que cueca estou usando.



***


Três partidas já se passaram. Aproximadamente meia hora e três partidas já se passaram.

Eu perdi duas delas.

Estou condenado.

A primeira partida durou só uns dez minutos e perdi de forma tão vergonhosa e rápida que quis morrer. Jimin é pior do que eu imaginava e não tenho nenhuma chance de vencer.

A segunda partida durou um pouco mais e eu consegui ganhar. Não sei como, mas consegui. Tenho minhas suspeitas de que Jimin me deixou ganhar de propósito. Ele sabe que é melhor do que eu e está manipulando tudo.

A prova disso é que a terceira partida foi ainda mais vergonhosa que a primeira.

Agora, estou sem as meias e o casaco, enquanto Jimin tirou apenas as meias. Ele usa menos peças de roupa do que eu, no entanto. Fico feliz por estar usando um casaco hoje, porque se eu estivesse usando um moletom como de costume, já estaria com o torso exposto.

— Que tal fazer uma pausa? — pergunto por puro nervosismo — Você tá com fome?

— Hm, na verdade não — ele nem mesmo olha na minha cara enquanto fala, concentrado em seu jogo — Por quê? Tá nervoso?

Nesse momento, justamente nesse momento, ele resolve finalmente me encarar, um sorriso de canto em seus lábios. Tento ao máximo manter o contato visual e não deixar ainda mais óbvio como estou lutando contra o sangue que ameaça subir para as minhas bochechas, mas Jimin não está colaborando muito.

Óbvio que estou nervoso, estou vivenciando uma das piores derrotas da minha vida. E não é só no UNO que estou perdendo.

— Quem você acha que está nervoso?

— Você — ele solta uma risada e volta a encarar suas cartas — Não se preocupe, eu posso deixar você ganhar.

— Por que você acha que eu quero isso?

— Então você não quer ganhar? — o mauricinho pergunta — Por mim tudo bem, vou com tudo, então.

Ah, fodeu.

Não quero responder com uma afirmação, porque isso acabaria com minhas chances de vez, mas não quero negar, já que isso iria ferir meu orgulho, então abaixo a cabeça e encaro minhas cartas também. Dessa vez até que não está tão ruim, então talvez eu tenha uma chance verdadeira de vencer...

— Esse silêncio é um sim, Jungkook?

Infeliz, filho de uma...

Levanto a cabeça sustentando um sorriso forçado.

— Sim, vem com tudo.

Jimin joga um mais quatro assim que acabo de falar e meu queixo cai. Em silêncio, encaro a carta que brilha acima das outras e quero mais do que nunca o estrangular. 

— Inacreditável — falo enquanto balanço a cabeça — Uma facada doeria bem menos, sabia?

— Não fica assim. Sei que você vai me perdoar algum dia...

Pufft... Incrível, uma das minhas piores atuações e ele não duvidou de mim nem por um segundo.

Jogo outro mais quatro na pilha, e Jimin fica surpreso por apenas alguns segundos antes de dar uma gargalhada alta. Não é bem a reação que eu estava esperando...

Nesse momento, o impossível acontece. Jimin joga outra carta igual na pilha, um sorriso feroz em seu rosto. 

Mesmo sabendo da triste realidade, ainda procuro por mais outra carta que eu possa usar, mas simplesmente estou sem opções. Jimin me venceu e agora vou ter que tirar.... 

Quatro com mais quatro com mais quatro.... Doze? Doze cartas.

Não existe mais esperança. 

Com a risada de Jimin ecoando em meus ouvidos, sinto como se estivesse no próprio inferno enquanto tiro mais doze cartas da pilha.



***


Quero morrer.

Depois de sofrer tamanha humilhação, resolvi assumir a estratégia "vendedor de porta em porta". Vou apenas tagarelar e torcer para que isso faça com que Jimin perca sua concentração. Nem todo mundo tem o privilégio de ser inteligente feito o diabo.

Essa é a sétima partida e não está nenhum pouco balanceado! Eu mal superei a humilhação de ter quase vinte cartas em mãos e a situação conseguiu piorar ainda mais.

O que pode ser pior do que ter vinte cartas em mãos? Isso mesmo, ter que ficar pelado na frente desse mauricinho irritante.

Já reviramos os armários, quando Jimin realmente sentiu fome, e agora a mesinha de centro é uma bagunça de pacotes de biscoito, latinhas de refrigerante e salgadinho. O tempo parou de ser levado a consideração e agora já perdi total noção de quantos minutos já se passaram. Tudo que sei é que perdi a quarta partida, ganhei a quinta por um milagre, perdi a sexta e agora estou tentando vencer a sétima, mas sem muitas esperanças.

O negócio é que já estou quase pelado. Tive que tirar a blusa quando perdi a quarta partida e a calça quando perdi a sexta. Jimin está sem camisa e sua tatuagem começa a me distrair.

Estou com frio e isso é altamente vergonhoso. Tudo é completamente vergonhoso.

Jimin não para de olhar para meu peito nu, o que me deixa com vontade de o estrangular, mas não posso reclamar porque também estou olhando para o seu. Dei um jeito de cobrir minha cueca com uma almofada, mesmo que a mesa não o deixe ver nada. O momento onde tive que tirar a calça é uma cena da qual não quero lembrar nunca, muito menos mencionar.

O filme que passava na TV já acabou a um tempo, então já deve ser bem mais do que meia noite. Espero que eu não seja o único sonolento.

A nossa partida está quase acabando e não posso me dar ao luxo de permitir ainda mais distrações. Hora de aplicar minha técnica de persuasão. Jogos justos são privilégios de quem nasceu com talento.

— Jimin.

— Hm.

O mauricinho está concentrado em suas cartas. Ele está com cinco e eu com quatro, ainda existe uma faísca de esperança.

— Sempre quis te perguntar isso.... Por que você falta tanto à escola?

— Segredo.

— Segredo?

— É.

Solto um suspiro e ele finalmente olha para mim. Quando Jimin está concentrado, para minha surpresa, ele fala muito pouco, mas acho que consegui chamar sua atenção.

— Por que a curiosidade? Ficou com saudades de mim?

Abandonando todo meu orgulho, dou um sorriso à altura dos que Jimin está sempre distribuindo por aí.

— Sim. Eu senti sua falta.

Dessa vez, tenho o privilégio de ver Jimin recuar um pouco, com uma expressão de surpresa que quase me faz sentir culpado. 

— O que é isso? O que você quer?

— Nada. Só estou dizendo que senti saudades.

— Eu já prometi que não ia faltar tanto, não prometi?

É a vez de Jimin jogar a carta, mas ele parece distraído agora. Certo, a operação está funcionando. Falta só mais um empurrão.

— Não posso sentir saudades nem ficar preocupado com você? — Pergunto, mesmo sabendo que isso soa forçado demais — Aliás, você não vai jogar?

Quando Jimin coloca sua carta na mesa, sinto um sorriso se alargar em meu rosto. Era exatamente disso o que eu precisava. Em algum momento, ele parou de planejar e jogou uma carta aleatória que fazia par com a última carta vermelha jogada. Por sorte, é justamente o que eu precisava para ganhar.

Com um sorriso que quase não cabe em meu rosto, ponho em prática minha estratégia final enquanto saboreio a evolução das expressões que Jimin sustenta. Primeiro surpresa, depois ele franze as sobrancelhas e, por último, ele tem seu momento de epifania.

— Foi tudo enganação! — o loirinho metido grita — Tudo mentira!

— Mas é claro, você acha mesmo que eu iria falar essas coisas sem motivo?

Pela primeira vez, sinto o gostinho de conseguir virar o jogo.

— Seu...

— Vamo lá — provoco — Tira a calça, Jimin.

Mesmo que Jimin ainda pareça estar indignado comigo, ele levanta de um pulo e abre o ziper da calça. De repente, diante dessa visão, começo a me sentir tão nervoso quanto estaria caso fosse eu quem tivesse que tirar a cueca. Ele abaixa a calça e olho pro outro lado instantaneamente, apesar de tudo.

Isso significa que a próxima partida é a última. Eu ainda tenho uma chance de ganhar.

Ou era isso que eu pensava antes de ver a expressão de Jimin, me dizendo que ele estava armado até os dentes com seu sentimento de vingança.


***

Então, eu perdi.

Perdi feio na última partida.

Vou ter que ficar pelado.

Jimin vai ver meu saco e não estou preparado para isso.

Não consigo olhar para sua cara sorridente sem sentir vontade de lhe dar um soco. O Park parece mais do que confortável apenas de cueca e, agora que perdi a última partida, ele mal consegue conter sua felicidade, todo radiante, jogado no chão de minha sala, esperando que eu tire a única peça de roupa que me resta.

— Vamos lá, Jungkook. Trato é trato.

— Você é um demônio.

— Anda.

Não consigo...

Coloco a mão na barra da cueca, mas travo.

Realmente, limites. Desisto da ideia e tiro a mão da peça.

— Okay! — grito, no fim de tudo — Foi um ótimo entretenimento, agora vamos dormir, né? Tá tarde.

— Amanhã é domingo, não tem aula. Não vejo problemas.

— Mas lembra que meus pais vão chegar logo cedo? E você tem que sair antes deles chegarem.

— Isso não é desculpa. Fizemos uma aposta, agora tira a cueca.

Nem sob tortura.

— Você já viu até demais. Eu não quero, já foi o suficiente.

O calor em minhas bochechas deixa mais do que óbvio que estou vermelho feito um pimentão, mas me mantenho firme. Vou negar até a morte, mesmo que eu tenha topado isso. Espero por uma resposta engraçadinha de Jimin, mas ele apenas alcança minha camisa que está no chão e a joga para mim. Sem reação, a capturo no ar e visto em silêncio.

— Tudo bem, foi divertido —Jimin diz, apenas — Mas você perdeu.

— Não vou dizer que Queen é melhor do que Elvis, porque não é.

Ainda desconfortável, procuro por minhas calças e as visto rapidamente enquanto escuto o som mais do que familiar da risada de Jimin.

— Certo, tudo no seu tempo — ele desdenha —Um dia você vai admitir, eu sei que vai.

— Alguém já te disse que você é muito convencido?

— Todos os dias. 

Reviro os olhos e observo pelo canto do olho enquanto Jimin também veste suas roupas. Ele começa a recolher as coisas que estão espalhadas pela sala logo em seguida, e o ajudo em silêncio. 

É uma situação no minímo esquisita. Em questão de poucos minutos, tudo está limpo novamente e não sei mais o que devo dizer depois do que acabou de acontecer.

— Está tarde... — é tudo o que acabo murmurando.

— Humrum... Você já vai dormir?

Balanço a cabeça em concordância.

— No... seu quarto? — ele pergunta.

—Aonde mais seria?

— Eu não sei....

Apenas nesse momento, percebo o que ele está querendo insinuar.

— Ah, você vai dormir aqui na sala. Não temos mais quarto de hóspedes, porque agora é do meu irmão.

Tudo bem que ele não está em casa, mas as chances de Jimin não perceber quando meus pais chegarem é grande. Além de ser o último quarto do corredor.

— Vai deixar a visita dormir sozinha na sala? E se tiver algum fantasma?

—Você não se preocupou com isso quando meteu a mão suja de sangue no vidro da minha janela.

Inclusive, devo ressaltar que acabamos tendo que limpar essa sujeira no meio de uma de nossas partidas de UNO, mais especificamente entre a quarta e a quinta, quando eu fiquei extremamente indignado por estar com mais de 20 cartas em mãos e virei o rosto de repente, me deparando com aquela mancha. Demorei uns bons minutos para lembrar de onde ela viera. Não foi nada fácil me livrar dela, mas coloquei Jimin pra fazer a maior parte do trabalho, já que foi culpa dele de qualquer forma. Depois disso, fechamos as cortinas e voltamos a programação normal. 

Espero que ninguém tenha nos visto esfregando detergente numa mancha de sangue, quando já era quase meia noite.

— São duas coisas completamente diferentes!!!

— Não são, não. 

Não tem nenhuma chance de eu dormir no mesmo quarto que Jimin. Na mesma cama, ainda mais. Zero chances. Totalmente nula.

— Vou pegar um lençol e um travesseiro para você.

Sem esperar por uma resposta de Jimin, dou meia volta, começando a caminhar em direção às escadas. No entanto, ele segura meu pulso antes que eu possa dar mais um passo sequer. 

O encaro um pouco surpreso, mas ele parece mais envergonhado do que eu.

— O que foi? — pergunto.

— Precisamos conversar. Você não pode dormir comigo aqui? Eu posso ficar no tapete, não tem problema.

Jimin está desviando seu olhar do meu, sua cara detonada e um tom de voz de dar pena. 

Eu o odeio.

Quando percebe que ainda está segurando meu pulso, apesar de seu aperto ser fraco o suficiente para ser considerado insignificante, Jimin me solta de uma vez. 

— Tudo bem — respondo — Espera um pouco aí.

Corro escadas acima, tropeço no último degrau, mas coleto os dois travesseiros que estão em minha cama e alguns lençois no ármario. Quando chego no andar de baixo, Jimin está sentado no sofá, esperando pacientemente. Seu olhar fixo na TV, apesar de ele parecer estar perdido em pensamentos. 

Jogo um travesseiro e um lençol em seu colo, e ele volta para a realidade, os agarrando assustado. Dou uma risadinha enquanto sento ao seu lado, já me enrolando para me proteger do friozinho da madrugada que começa a surgir.

— Então, o que você queria conversar comigo?

Ele coloca o lençol nos ombros, mas não me encara.

— Ah.... Eu queria perguntar se você leu o meu último bilhete. 

Finalmente. O maldito bilhete. 

— Sim, eu li — Várias vezes, inclusive — Mas não entendi bulhunfas do que você quis dizer.

De repente, Jimin mete o travesseiro em mim. Pisco surpreso.

— O que foi isso? — pergunto.

— Por ser tão lerdo assim, é o mínimo que você merece. 

— Lerdo?

— Sim, lerdo.

Por alguns segundos, nenhum de nós diz nada. A verdade que não quero aceitar é que não sou lerdo, eu entendi muito bem o que ele quis dizer. Só não consigo... aceitar.

Jimin solta um suspiro pesado.

— Eu gosto de estar com você, isso não ficou óbvio ainda? — ele pergunta, e puxo um pouco mais do lençol, cobrindo meu rosto — No começo, era apenas uma brincadeira, mas eu realmente gosto de sair com você. 

— Hm. Isso eu entendi...

— Então não tem muito mais o que explicar.

Na verdade, tem sim. Muita coisa. No entanto, posso sentir meu rosto queimando de vergonha e não sei mais como insistir. 

— Então a operação é uma brincadeira também?

— Você não percebeu?

Arrisco um olhar em sua direção e levo um susto. É como se ele estivesse me devorando com o olhar, algo ainda escondido sob algumas camadas de mentiras, apesar de ser bem visível através de suas íris brilhantes.

Nesse momento, no entanto, nada disso importa.

— O que eu não percebi?

— Que é só uma desculpa para sair com você. Eu não ligo se você realmente acha que o Elvis é melhor, eu só queria sair com você. No começo, de fato, estava apenas te provocando sem motivo, mas agora virou algo especial.

Mentiras.

Mentiras bonitas e elaboradas, com algumas verdades no meio. Sou lerdo, mas não o suficiente para não perceber.

Sem saber o que dizer, ou como reagir, me encosto no travesseiro, quase deitando no canto do sofá. É uma medida de segurança, para impedir que eu fique perto demais dele para fazer alguma bobagem.

— Essa é a sua forma de dizer que gosta de mim?

Logo depois de deixar essas palavras saírem de minha boca, me arrependo. O que estou dizendo? Meus olhos estão pesados de sono a essa altura e já estou falando o que não devo.

Jimin, no entanto, desvia o olhar e fica em silêncio. Sua falta de palavras é tão demorada e profunda que meus olhos caem mais e mais e se fecham.



De volta à 1 de abril, 1987

Aproximadamente 6h da manhã, casa da família Jeon.


A primeira coisa que vejo quando abro os olhos é o desespero quase que palpável de Jimin. Ele está me sacudindo de um lado pro outro e meto a mão na sua cara sem querer, o empurrando para longe.

— Ai, cacete — ele resmunga — Bom dia para você também.

Murmuro algo que acho ser compreensível, mas demoro alguns instantes para entender o que está acontecendo. Jimin usa toda a sua força para me empurrar para fora do sofá, enquanto puxa os lençois junto, e subitamente sou um emaranhado de tecidos. 

Ainda grogue, seguro o travesseiro que ele me entrega. Nesse momento, eu lembro. 

Jimin ainda está em minha casa. 

Já é de manhã. 

Quando olho para a janela, a qual está com as cortinas abertas — provavelmente Jimin as abriu quando acordou — vejo o carro de meus pais estacionando.

A única coisa que me impede de surtar é o sono.

— O que a gente faz cacete? — Jimin pergunta, desesperado.

Ele está segurando os lençois em uma mão e os sapatos na outra, e posso ver que ele está decidindo se quer chorar ou rir.

Não temos porta dos fundos, e ele tampouco pode sair pela porta da frente agora. 

De repente, uma risada deixa minha boca. Não sei o que estou fazendo, mas sei que estou puxando Jimin escadas acima. Em algum momento, ele começa a rir junto de mim e tenho certeza de que não somos nada discretos.

Tropeçamos no último degrau, mas conseguimos entrar em meu quarto antes que eu possa ouvir o barulho da porta da frente sendo destrancada. Por via das dúvidas, passo a chave na porta do quarto. 

Por um momento, nenhum de nós diz nada. Estamos ocupados demais tentando voltar a respirar propriamente, enquanto controlamos nossas risadas. 

— O que eu faço, Jungkook? — é a primeira coisa que Jimin diz quando consegue se recompor.

— Você acha que eu sei? Pula a janela e corre.

Só quando Jimin joga o lençol e o travesseiro na minha cama e passa a perna no parapeito da janela é que percebo que talvez seja um pouco antecipado demais.

— Espera aí! 

Tarde demais. Tento desembaraçar o lençol que o Park acabou enrolando em mim quando me puxou do sofá, mas não consigo, então corro para o parapeito assim mesmo e olho para a rua deserta da manhã lá embaixo. 

Deserta exceto por uma pessoa, óbvio. 

Meu irmão encara Jimin, que já aterrissou na calçada, como se fosse uma espécie de alienígena. Quando ele levanta o olhar para a minha janela, me escondo. Digno de uma mocinha previsível. Demora apenas dois segundos para que eu volte e veja Jimin correndo enquanto grita que tudo não passa de uma brincadeira de primeiro de abril. 

Sinto que estou deixando algo importante passar.

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