VIII. Um Dia Quase Normal
*Sem correcção. Perdão.
Ruby tinha tido uma noite de sono melhor do que podia imaginar. Tinha pensado muito no que acontecera na Sala Escura, na adrenalina que cobriu todo seu medo no momento em que Dark se levantou até ela, e nos últimos dois dias sabia que mesmo com a situação duvidosa não iria desistir daquele contracto. E não era apenas por dinheiro, algo lhe dizia com certeza que havia muito mais por trás de tudo aquilo, a começar pelo comportamento de Tom e depois pela forma como Mr. Dark falava com ela. Queria descobrir e estava decidida como nunca antes.
Abriu os olhos apenas para confirmar com um sorriso que não estava mais na cama da casa de seu melhor amigo Malcom. Tinha voltado para a sua mansão, estava no quarto amplo e na cama muito macia e grande. Nem se lembrava da última vez que teve sua vida sob controlo, sua própria casa e alguns dias sem comprar nada. Parecia algo quase impossível, poder descansar sem se preocupar com as dívidas e os credores. Uma paz quase impagável, o que só reforçava a ideia de Mr. Dark ser alguém com interesses a mais que sexo.
Girou a cabeça para procurar o celular na cabeceira, era sempre a primeira coisa que fazia mesmo antes de abrir os olhos por completo. Apalpou e sentiu o formato do seu livro, tinha tido a coragem para começar a ler e enfrentar seus demónios do passado. Procurou mais um pouco e estranhou ao sentir a textura de um envelope, algo que lhe fez acordar de imediato.
Ali estava um envelope timbrado que não estava na noite anterior. Sentiu o corpo gelar, mas logo arrefeceu quando o abriu e encontrou dinheiro e um cartão:
Tema para o próximo conto:
Uma Ninfomaníaca em busca de prazer numa sala de cinema a meia-noite.
* É obrigatória a caracterização do personagem.
* Roupa íntima rendada e um sobretudo por cima.
Atenciosamente,
Dark.
Os olhos de Ruby aumentaram ao ver o que estava escrito, seu coração palpitou e seus lábios ficaram secos. Ao mesmo tempo em que pensava como aquele envelope tinha ido parar ali na sua cabeceira sem que se desse conta. O facto de saber que tinham acesso a tudo, a deixava em pânico e ao mesmo tempo vinha aquela maldita sensação de segurança. Como confiar em quem entra no seu quarto pela calada?
E encarnar uma ninfomaníaca não era um pouco contraditório sendo que prazer por sexo era o que menos sentia? Mordeu o lábio inferior com força e contou o dinheiro que lhe era dado para poder preparar a sua personagem, suas mãos chegaram a tremer ao pensar em gastar em outras coisas. Precisava de comprar qualquer coisa mesmo que não soubesse o quê.
Saltou da cama com toda disposição do mundo e foi até ao banheiro todo de mármore com peças douradas e tudo de luxo. Tomou um banho demorado e se enrolou num roupão, descendo as escadas devagar a pensar no que faria naquela manhã.
─ Bom dia.
Ruby gritou ao encontrar Tom sentado na grande cozinha americana com balcões de madeira e granito, a ler um jornal e com uma xícara de café fumegante a sua frente. Tinha aquele olhar escuro e perigoso, as mãos enluvadas abriam as folhas e balançava o pé ao de leve.
─ Você me assustou! ─ Exclamou com a mão no peito.
─ Se fosse diferente não teria interesse. ─ Ele fechou o jornal e se levantou, obrigando-a a olhar para cima. ─ A senhorita dorme de boca aberta.
─ Vocês são loucos. Não tem o direito de invadir minha privacidade e... ─ Calou-se quando o viu levar o dedo indicador para perto dos lábios finos. ─ Ah! Não me mande calar, eu o proíbo de entrar aqui sem bater.
─ Não sigo suas ordens. Se tiver dinheiro para me pagar, até poderíamos negociar. ─ Usava aquele timbre enregelado e irónico que ela tanto detestava. ─ Devo acompanhá-la nas compras, dizem por aí que não é muito confiável quando tem dinheiro nas mãos.
Ruby ficou furiosa e quase atirou a xícara de café fumegante na cara dele. Iria ter uma conversa séria com Mr. Dark para que parassem de se intrometer daquele jeito.
─ Não adianta. ─ Tom tirou uma maçã do bonito cesto e trincou. ─ Ele a comprou.
─ Para além de estar em todo lado também virou um adivinho, Tom? ─ A escritora ironizou, mas os dois foram surpreendidos com a porta da mansão que se abriu de rompante.
─ Ruby! Ruby! ─ Era Malcom, tinha ficado com uma chave extra que a amiga lhe confiara. ─ Veja só quem apareceu na minha porta.
Tom estreitou os olhos e recuou quase em silêncio, por sua vez ela saiu da cozinha em toda sua curiosidade até ao gigante hall de entrada com tectos altos e candelabros pendurados.
─ Naya? ─ Ela mal conseguia acreditar ao ver a jovem de dezoito anos que entrou toda sorridente para lhe dar um abraço apertado.
─ Tia! ─ Nayara era alta, até mais do que Ruby. Tinha uma pele negra clara, o cabelo cacheado até a altura do queixo e um corpo que não era magro, mas era bonito com seios salientes e um sorriso no rosto muito encantador.
─ O que faz aqui? ─ Ruby perguntou, um pouco admirada. Fazia anos que sua família a tinha abandonado, alguns até a ridicularizaram na imprensa para ganhar dinheiro.
─ Vim passar umas férias. Meu Deus, que casa maravilhosa. Ainda bem que já não está com o Malcom, não íamos caber todos lá. ─ Naya rodopiou no lugar e começou a apreciar os quadros de renome e os objectos decorativos.
─ Férias. ─ Malcom repetiu com sarcasmo, pois puxou as quatro malas que a sobrinha trouxera para dentro da casa que ainda não tinha empregados, afinal a dona ainda não tinha como os pagar.
─ Eu queria ter vindo muito antes, mas era menor de idade e precisava de autorização. ─ Naya continuava a falar com toda a naturalidade, como se tivesse se despedido da tia há poucos dias e não há muitos anos, quando ainda era uma adolescente. ─ Eu tive saudades tuas.
Ruby chegou a rir e encolheu os ombros.
─ Eu também. ─ Teve que concordar, mas sempre olhava para a cozinha para ver se Tom ainda estava lá. Como explicar para uma jovem tão nova tudo o que estava a fazer para poder reaver as suas coisas? ─ Bem, se acomode. De quanto tempo são as suas férias.
─ Algum tempo. ─ Naya foi bem rasa na resposta e disfarçou um sorriso que intrigou os dois que trocaram olhares de esguelha. ─ Bem, vou subir para escolher o meu quarto. Depois podemos ir passear?
─ Claro. ─ Ruby pensou em ligar para a irmã mais velha para questionar sobre Nayara, mas Ângela era tão antiquada em suas crenças que tinham se deixado de falar quando ela ainda tinha a idade da sobrinha. ─ Vamos, eu ajudo.
Os três carregaram as malas pesadas para cima, Naya estava bem relaxada e até escolheu um quarto com a vista para a bonita piscina que ficava no belo jardim.
─ Por que veio aqui? Alguém morreu e não quer me contar? ─ Ruby não resistiu a perguntar, depois que estava vestida para sair. Usava um vestido longo com duas rachas laterais, sapatos bem altos e o cabelo num penteado que libertava seus cachos na parte de cima.
─ Bate na boca e morde a língua, Ruby! ─ Malcom girou os olhos e entrou no seu carro. ─ Eu preciso ir trabalhar. Nos vemos mais tarde, cherry?
─ Vamos sair para beber alguma coisa. Eu pago! ─ A escritora deu umas palmadas na bolsa Chanel apenas para mostrar que tinha dinheiro e piscou o olho para o amigo que não retribuiu, apenas fez um gesto negativo com a cabeça ainda a receber os beijos imaginários que lhe eram enviados por ela.
Ruby soltou um suspiro quando começou a dirigir, pelo menos se tinha livrado de Tom ou sabia que iria manter uma certa distância agora que estava com Nayara. Precisava de ir as compras à vontade.
─ Os seus pais sabem que estás aqui? ─ Perguntou mais uma vez, estava desconfiada e não queria nenhum problema para si.
─ Sabem, claro.
─ Então por que não me ligaram?
─ Porque não queriam que eu viesse te ver, mas não podiam impedir também. ─ Naya mesmo sentada se inclinou para dar um beijo no rosto da tia. ─ Li seus livros, adoro você. Era meu sonho estar ao seu lado novamente.
Ruby derreteu como manteiga e estacionou no parque subterrâneo do maior centro comercial da cidade. Subiram as escadas rolantes e só de passar pelas vitrinas e ver as novas tendências, suas mãos suaram frio. Podia levar coisas e negociar para pagar depois, afinal teria dinheiro não era o certo?
─ Não. Não. ─ Se criticou por ter aqueles pensamentos, mas era mais difícil do que parecia. Então com a sobrinha comprou uma lingerie bem sexy para sábado e depois foram em busca de um casaco cheio de classe e de estilo.
─ Posso levar uns batons? ─ Naya estava empolgada também com as compras.
─ Leve. ─ Ruby ainda estava confusa quando entraram na vigésima loja, não gastara nem metade do dinheiro e não faria nenhum mal comprar só umas coisinhas, no entanto podia se lembrar do psicólogo que lhe pedira para organizar suas coisas e tirar o que não precisava. ─ Ai. Eu preciso me curar...
─ Tia Olívia?
─ Ruby.
─ Acho que tem um homem nos seguindo. ─ Nayara sussurrou com a voz baixa e apertou a mão dela para fora da loja. Apressou os passos.
─ Um homem você diz... ─ Ruby engoliu em seco, sendo quase arrastada pela jovem que era alta e esperta. ─ E como é esse homem?
─ Parece bandido. Cara fechada e usa luvas. ─ Disse apenas para confirmar as suspeitas da tia, mas antes que esta pudesse controverter o que fosse, Naya a puxou de rompante para um pequeno corredor de serviço. Ficou na frente de Ruby, tirou a sua bolsa do ombro e a segurou com duas mãos.
Quando Tom passou quase em passos agitados, foi recebido com a bolsa pesada bem no meio do rosto. Não cambaleou ou se mexeu, apenas os olhos escuros fixaram a jovem que o tinha atacado.
─ Ops. ─ Naya estremeceu.
Ruby inventou uma risada qualquer bem fora de mão e passou para frente dela.
─ É o meu segurança. ─ Mentiu e viu Tom arquear o sobrolho. ─ O Tom.
─ Tom? Me senti o Jerry agora. ─ As bochechas dela estavam encarnadas. ─ Que medo, tia Olívia, deveria contratar outro tipo de segurança.
Ele estava furioso mesmo com o seu estado de calma aparente. Quase derreteu a escritora só com o olhar, mas se segurou para não dizer nada na frente da "pirralha" como passou mentalmente a chamar.
─ Gastou tudo? ─ Perguntou e ignorou a curiosidade da sobrinha de Ruby.
─ Não. Pensei que... Talvez pudesse pagar uma empregada com o dinheiro que sobrou. ─ Nem acreditou que aquilo saiu da sua boca e até viu as feições dele suavizarem ao de leve.
─ Ótimo. ─ Concordou e se voltou para Naya. ─ A próxima vez que for acertar alguém use o joelho.
─ Conselho guardado, Tom. ─ Ela ia puxar a bochecha dele, mas a mão enluvada foi muito mais rápida a impedi-la. Naya abriu os olhos castanhos e olhou para a tia.
─ Bem, acho melhor continuarmos. ─ Ruby sorriu em amarelo, precisava fazer as unhas.
Hans passou pelas portas do restaurante e rumou até ao bar. Seu cabelo loiro estava bem arranjado e de calças jeans e uma camisa de mangas curtas, ganhava um ar ainda mais sensual sem o jaleco branco. Seu corpo era bem trabalhado sem exageros que garantia uma massa muscular extraordinária. Os olhos enigmáticos vestiam do azul profundo, vasculharam até encontrar uma mesa onde Ruby estava com o amigo e a sobrinha.
─ Boa noite. Está tudo bem? ─ Perguntou assim que se aproximou. Ela tinha telefonado para que fosse ao seu encontro de imediato.
─ Consegui sobreviver um dia com dinheiro na bolsa e só gastei o que era necessário, acredita? ─ Ruby desceu do banco alto, as rachas laterais exibiam suas pernas grossas e sorriu para Hans. ─ A Naya e o Malcom.
Se cumprimentaram.
─ Me chamou aqui por isso? ─ Hans até tinha ficado preocupado, mas lidava com tantos tipos de clientes que não se espantava com mais nada.
─ E podia ser melhor? Temos que comemorar. ─ A escritora puxou uma pequena tábua com copos pequenos cheios de bebidas coloridas.
─ Não... ─ O psicólogo negou, ainda constrangido.
─ Estou fazendo o que me disse e sem contar que quer meu amigo não? ─ Lhe estendeu a tábua numa clara chantagem. ─ Está na minha conta.
Hans riu e meneou a cabeça, aquela mulher baixinha sabia aproveitar cada momento da vida com intensidade e um sorriso no rosto.
─ Só um. A você. ─ Girou o pequeno copo de uma vez na boca e fez uma careta.
─ A Ruby! ─ Os outros completaram o brinde e também beberam soltando reclamações pelo líquido forte que queimava suas gargantas.
─ Eu adoro esse lugar! ─ Naya saltou no lugar de braços abertos e Malcom pediu para o servente trazer mais bebida. ─ Homens lindos e cheios de charme. Não quero mais voltar para casa.
─ Fico feliz que esteja dando um passo de cada vez, isso como amigo. Como seu psicólogo digo que é o princípio de uma jornada difícil. ─ Hans parecia inquieto enquanto olhava para Ruby. ─ Eu realmente preciso de ir. Em doze dias nos vemos.
─ Não precisa ser tão sério. ─ Ela o puxou pelo braço até a pista que tocava uma música qualquer. ─ Sempre pode se divertir.
Hans estava retesado quando sentiu os braços suaves se enrolarem em torno do seu pescoço, a medida em que Ruby começava a ditar o ritmo da música um pouco mexida. Ele não sabia identificar, não estava muito a par dos novos lançamentos que saíam todos os dias pela internet.
Ela tinha um sorriso verdadeiro, de quem sabe que a sua doença é realmente grave e que conseguiu superar apenas um dia que podia transformar o resto de sua vida. O perfume era provocante, assim como as mãos masculinas que pousaram um pouco acima da cintura fina. Hans engoliu em seco, parecia preocupado.
─ Algum problema? ─ Ruby questionou. Os olhos dele eram ainda mais intrigantes quando os via de perto, era realmente um homem muito bonito.
─ Eu... Eu preciso ir. Não é de bom-tom que seja visto tão próximo de uma paciente minha. ─ Garantiu, mas a voz estava branda e os olhos não se libertavam de perto dela.
─ Aqui no bar somos apenas amigos. E já reparei que nunca pronuncia meu nome... ─ Ela se balançava devagar ao som da música, embora Hans continuasse parado sem sair do lugar.
─ Eu... Eu sou um homem casado. ─ O psicólogo acabou por levantar a mão e mostrar uma aliança dourada que a escritora nunca tinha dado conta. Se afastou dele no mesmo instante.
─ Ah... ─ Ficou envergonhada. ─ Oh!
Hans estava com o maxilar retesado e o coração batia com força em seu peito por tê-la tão perto.
─ Espere! ─ Pediu quando viu Ruby sair dali a correr.
Ela entrou no banheiro feminino, seu coração batia agitado. Por que sempre metia os pés pelas mãos? Estava tão envergonhada que nem sabia se conseguiria voltar ao consultório de Hans depois daquele tiro no escuro. Só queria ter um dia normal, estar com os amigos, dançar um pouco e quem sabe até se aproximar um pouco mais do psicólogo.
Mas era idiota! Riu de si mesma enquanto lava o rosto e tentava recuperar a respiração. Se assustou quando as luzes se apagaram e ficou uns segundos estática antes de pensar em sair dali.
─ *Bleiben Sie! ─ Apenas ouviu a porta se trancar e um Toc que arrepiou toda sua alma.
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*Bleiben Sie! - Fique!
Bom dia Dilaceradas. Eu prometo que as coisas vão começar a aquecer, pode parecer que tudo está meio lento agora, mas é preciso de conteúdo de narrativa para que fique o mais verossímil possível.
Tenham paciência! Aposto que vão gostar do que vem por aí.
:)
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