VI. Simbiose "Parte 1"
─ Não vai falar comigo? ─ Malcom estava indignado quando chegou do trabalho e percebeu que a amiga tinha arrumado as suas coisas e agora se preparava com todo um afinco deveras interessante para o jovem rapaz.
Ruby tinha lavado os cabelos e os cachos estavam bastante vigorosos caindo por baixo dos seus ombros. Usava um vestido branco que marcava a renda da sua roupa íntima, seus lábios pintados de vermelho vibrante e seus sapatos altos da mesma cor subiam em tiras finas que se fechavam no tornozelo delicado. O perfume era marcante sem ser forte demais, deixava um aroma bastante convidativo quase a beirar ao íntimo.
─ Pelo calcanhar fraquinho de Aquiles, eu sei que estás chateada comigo. Mas toda nossa amizade tem que ser colocada numa balança. Eu só queria te poupar, você já tinha tantos problemas, Ruby. Sempre fui seu amigo acima de qualquer coisa. ─ A língua presa se intensificava por conta do nervosismo. Passou a mão pelos cabelos bem arrumados para o alto. Naquele dia usava uma gravata borboleta que ficava ridícula na maioria dos homens, mas o conjunto de camisa social às ricas e as calças com suspensórios, davam a Malcom um estilo completamente diferenciado.
─ Então podias ter me magoado com a verdade antes daquela Fiorentina qualquer coisa ousar me desclassificar por inteiro. ─ Bufou e se levantou em todo seu charme, procurou o bonito caderno que tinha encontrado no meio de suas tralhas e onde tinha realmente escrito algo que vinha de si. Das suas ânsias profundas como mulher. Usara uma caneta e deixara sua letra redonda ganhar vida, mesmo com um borrão aqui e ali, sabia que as páginas perfumadas iriam acrescentar algo a mais naquela apresentação. ─ Amanhã estou me mudando. Obrigada por me aturar aqui por um ano inteiro, mesmo que eu não tenha me dado conta.
─ Você me ajudou muito mais. Eu era um menino perdido em festas e sem pretensão futura, minha Hobbit favorita. ─ Malcom girou os olhos quando viu Ruby o encarar com fúria por ser comparada as criaturas do filme do Senhor dos Anéis. ─ Eu ainda sou muito novo, mas tenho um negócio, um apartamento e uma vida graças a você. Sou eu quem agradece e prometo nunca mais esconder nada.
─ Cruz no coração?
Ele cruzou os dedos, os beijou e depois levou ao peito.
─ Está perdoado. ─ Reprimiu um sorriso só para não parecer fácil demais e olhou para o relógio pequeno, mas que era uma réplica do original que um dia tinha tido. ─ Tenho que ir.
─ Não vai me dizer para onde vai? Eu sei que aquele seu encontro sinistro é só aos sábados, então por que tanta produção? ─ Estava curioso como nunca e a perseguiu pelo quarto a fora, mas parou bem antes de se aproximar da porta só pela ideia de dar de cara com aquele homem assustador.
─ Sigilo profissional. ─ Ruby lhe piscou o olho e viu a careta que ele fez.
─ Desde quando?
─ É sempre preciso um começo. ─ Ela abriu a porta e saiu em seus passos que por muito rápidos que fossem, eram curtos e graciosos. A saia do vestido balançava quando se mexia e viu o olhar de cobiça do vizinho quando estava dentro do elevador. Qualquer um podia sentir quando uma mulher se preparava para um encontro particular.
Quase bateu de frente com Tom que ia a entrar no elevador ao mesmo tempo que ela saía. Ele usava aquele casaco preto e comprido, mãos enluvadas e rosto fechado como se sempre estivesse preparado para fazer algo secreto.
─ Podia ter me esperado.
─ Boa noite, Tom. Relaxe. ─ Estava empolgada, podia sentir um frio no estômago, mas pela primeira vez não sentia tanto medo. Depois de tanto tempo, podia se sentir inesperadamente segura mesmo que fossem estranhos.
Ele murmurou alguma coisa e ignorou o porteiro que estava habituado a vê-los quase sempre juntos e que tinha acenado com vigor quando os viu passar, mas a escritora sempre simpática retribuiu e seguiu até ao carro cor de vinho, mas se estacou ao lembrar da tentativa de assalto que ocorrera ali mesmo naquele lugar, como se ele tivesse estacionado ali de propósito apenas para a recordar do infortúnio recente.
Tom abriu a porta, nem um pouco preocupado com o que a podia abalar e aguardou inquieto para que ela entrasse logo. Ruby se demorou, mas depois se acomodou no banco de trás, deixou que ele fechasse a cabine e se recostou com calma. Estava sim um pouco nervosa, mas se o Mr. Dark não gostasse do que tinha escrito, então estaria claro que nada daquilo daria certo.
─ Tom?
Ouviu ele respirar pesadamente.
─ Sim, senhorita Angel?
─ Qual é o seu sobrenome? Tom quê?
Ele deixou uma gargalhada crua e divinal.
─ Cruise.
─ Ah! Idiota!
Permaneceram em silêncio o restante da viagem, a música tocava baixo e Ruby não conseguia enxergar nada, mas quanto mais contava o tempo passar, mais apreensiva ficava. Podia sentir as mãos frias e os pés que não paravam inquietos. Quando sentiu o carro começar a abrandar, o coração se descontrolou e toda sua confiança inicial se esvaiu como pó pelo ar. Começou a respirar pesadamente e ficou um pouco aflita.
─ Espero que tenha tido uma boa viagem. ─ Tom lhe disse quando abriu a porta, sempre com os olhos indecifráveis e uma expressão que não deixava claro se estava a ser irónico ou cortês.
─ Você é um segurança? Motorista? Cão de guarda? Advogado?
─ Depende para o que me pagam. Siga pela porta, quando terminar estarei aqui esperando. ─ Foi frívolo como sempre e usou das mesmas palavras como um disco riscado. Revirou os olhos quando ela tirou a língua de fora em resposta.
Ruby engoliu em seco e começou a caminhar a tentar segurar as pernas, quase em vão, pois tremores cobriam seu corpo pequeno. Empurrou a porta blindada e entrou de uma só vez antes de mudar de ideias, o coração saltou quando esta se fechou automaticamente atrás de si. Parecia estar a ter um Déjà Vu ou se imaginou como aquelas loiras dos filmes de terror que sempre vão na direcção do assassino psicopata.
Abriu os olhos rasgados.
Desta vez, uma fileira de velas pequenas e aromáticas lhe indicava o caminho para uma Long Chaise branca de veludo situada perto de umas cortinas transparentes que estavam penduradas em alguma parte do tecto escuro. Ao lado, numa mesinha redonda com as pernas onduladas, repousava uma garrafa de vinho ao lado de uma taça cheia e redonda.
─ Gute Nacht. Fique à vontade!
Ruby deixou escapar um grito dos seus lábios ao ouvir a voz de Dark. Tinha sido tão surpreendida como a decoração nova do lugar, tentou se acalmar e colocou uma mão no peito acelerado enquanto caminhava até lá. Sabia que estava a ser observada, só não podia prever de que ângulo.
─ Tem que parar de me dar sustos. ─ Tentou disfarçar o nervosismo e usou um tom divertido que não surtiu muito efeito. Estava a perder o jeito na sua capacidade de representar.
Passou pelas cortinas e podia sentir o aroma de baunilha que se espalhava pela sala, se aproximou da bela Long Chaise e tentou controlar a sua respiração.
─ De que lado está, Mr. Dark? ─ Perguntou girando devagar a procura de alguma direcção. Tudo o resto era escuridão, mas pelo menos hoje não ouvia a batida do próprio coração em colunas de som. Estava tudo bastante silencioso, não fosse o leve crepitar das chamas das velas.
─ Quero que se deite de lado e leia para mim assim que se sentir preparada. ─ O sotaque era tão forte que parecia querer não só arrastar os R, assim como a alma dela que se sacudiu como borboletas primaveris.
─ Está próximo ou distante? ─ Ela era insistente, foi uma pena não ter visto como os olhos dele brilharam.
─ Isso depende do seu ponto de vista. ─ Respondeu de forma evasiva, carregando ainda mais no seu tom alemão.
─ Não acha que está numa condição vantajosa? ─ Ruby acabou por primeiro se sentar, deixou a bolsa junto aos pés da mobília e retirou o caderno bonito colocando-o junto do seu colo.
─ Parece que quem está tendo mais vantagens aqui não sou eu. ─ Dark retorquiu e ela ouviu o primeiro Toc da bengala. Não soube dizer, mas tinha tido aquele gesto como um sinal de impaciência.
─ Está ansioso?
─ E deveria estar? Warum?
Ruby não entendeu a questão.
─ Eu perguntei por quê?
─ Não sei. ─ Deu de ombros, ainda com os olhos inquietos a tentar captar de onde a voz poderia provir. Engoliu em seco.
─ Sirva-se.
A mão tremia quando segurou na taça em cima da mesinha ao lado, mas precisava relaxar e não conseguiu distinguir a proveniência daquele vinho. Era doce e saboroso de um jeito que nunca imaginou existir, sentiu os lábios ficarem molhados e um sorriso escapar de seus lábios.
─ É muito bom. ─ Teve que elogiar, mas não obteve resposta alguma. Pousou a taça vazia na mesinha, seu corpo a obedeceu e se deitou de lado, mas depois se lembrou dos sapatos e os quis descalçar.
─ Nein! Os mantenha.
Ela voltou a se colocar de lado, com as costas viradas para o encosto macio e o cotovelo a suportar a mão que apoiava a cabeça. Suas pernas grossas brilhavam junto da leve iluminação das velas e nem o aroma delas era tão eficiente como o perfume que Ruby tinha usado e que deslizava pelo ar apenas para o desestabilizar.
Dark acompanhou com atenção a mão que segurou o caderno, pequena e de unhas curtas pintadas de vermelho sangue da mesma cor do batom e dos sapatos. Lentamente virou a primeira página e deixou um suspiro aflito escapar dos lábios carnudos.
─ [...] Simbiose. ─ Levantou os olhos de um jeito tão preguiçoso que o título do seu conto pareceu bastante profundo em todos seus significados, depois os baixou para seguir com a leitura. ─ Num sentido figurado, a Simbiose é uma ligação ou relação íntima entre duas pessoas; uma intimidade. Bem, eu diria que é ainda mais que isso, quando existe a combinação perfeita entre dois seres, muito mais do que amor ou um sentimento fidedigno, e sim quando existe uma atracção poderosa, muito conhecida como química.
«Devo ter reprovado então desmedidamente, pois das vezes que pensei em encontrar o fogo em mãos atraentes, breve meu interior se teria esfriado. Eu sentia alguns beijos mais que os outros, alguns abraços e carícias. Muitas vezes me empolguei em sensações, cheguei a cogitar que finalmente meu corpo iria fluir, mas tão rápido como o sopro da chama de uma vela, tudo se apagava.
Não havia nada. Nada que despertasse a verdadeira Simbiose em mim.»
─ Poético. ─ A voz dele soou plena. Por um momento Ruby pestanejou ao não sentir o sotaque habitual naquela palavra, levantou os olhos castanhos e se inquietou porque sentiu uma estranha familiaridade.
─ Vou beber mais um pouco. ─ Decidiu e se ergueu lentamente para buscar mais do vinho raro. Sentiu como o vestido subiu e suas pernas ficaram mais à mostra do que deviam, algo que deveria ter feito com que ficasse constrangida. Nunca tinha sido uma mulher tão à vontade, mesmo que demonstrasse o contrário.
Serviu o líquido e bebericou devagar, ainda com o caderno em suas mãos, se preparando para o que teria de ler a seguir.
─ Está bebendo também? ─ Ousou perguntar, porque era curiosa como uma criança que é proibida de tocar em algo e é exactamente lá onde coloca suas mãos.
Silêncio.
─ Você tem cabelos claros ou escuros? É alemão?
Toc. Toc. Toc. A mão dele apertava o topo da bengala da nobreza com força, batendo-a contra o chão, num gesto típico que muito queria dizer.
─ Me responda apenas isso. Quero imaginar você. ─ Insistiu.
─ Não há necessidade. Podia não gostar.
Os lábios dela se entreabriram ao ouvir aquela afirmação, ficou com dúvida e se deteve por alguns instantes enquanto o doce sabor do vinho se perdia na sua boca. Bebeu mais um pouco.
─ Seus fios de cabelo são lisos ou crespos? Dourados ou pretos?
Dark percebeu que ela não ia desistir.
─ Lisos e muito escuros. ─ Acabou por ceder, o sotaque em alemão se intensificara ainda mais.
─ Lisos como seda e escuros como a noite. ─ A alma de escritora nela não podia deixar de ressaltar. Voltou a deitar-se de lado e um sorriso discreto escapou de seus lábios. ─ Queria muito ver você.
─ Não, não ia querer.
─ Por que diz isso?
─ Apenas leia, Ruby.
Acenou com a cabeça em positivo, abriu mais uma página e mordeu o lábio inferior lentamente. Aquela parte dizia muito de si própria, era como se abrir mais do que deveria. Piscou lentamente e soltou o ar dos pulmões.
─ [...] Agora, imagine-se primeiro numa roda de amigas. Onde todas falam com vivacidade sobre suas experiências perfeitas, descrevem a forma como seus corpos estremecem após um êxtase, contam relatos de como é sentir um membro duro dentro delas. Como gemem, como choram e pedem por mais e mais.
«Enquanto você, completamente alheia de todos aqueles prazeres e sentidos, só disfarça e mente que também adora. Repete histórias contadas por outras amigas, em outras rodas, como se fossem suas. Apenas porque seu corpo não responde.
Silêncio.
«Mas você quer sentir, quer ser beijada de um jeito que integre todo o tipo de sensações. Quer sentir tremores como nos romances, quer que o corpo se acenda de paixão, quer sentir sua alma vibrar e saciar por inteiro. Transpirar e molhar os lençóis.
O problema é que isso nunca aconteceu, a não ser em lembranças tão distantes que cria um medo constante, como se abrir aquela parte da sua memória fosse fazer com que a perdesse. Será que me compreende, caro ouvinte?
Todos os meus anseios são frutos de um imaginário. Nunca meu corpo presenciou Desejos realizados, mas tenho certeza que lá dentro existe algo que precisa se descobrir para sentir. Com ardor, com intensidade e é aqui que começo a contar.»
─ E você gostaria realmente? ─ Dark a interrompeu, apenas para a lembrar da sua forte presença. Não era para a pele dela ter se arrepiado assim com tanta facilidade ao ouvi-o, mas se sentia completamente embriagada, não pelo vinho, mas pelo clima intenso em que estava inserida.
─ De quê?
─ De sentir tal como descreve no conto.
Ela ficou um pouco de lábios semiabertos, sem saber bem como enquadrar aquelas letras para fora e traze-las para a vida real. O coração palpitou.
─ Eu... ─ Engoliu em seco, seus olhos estavam inquietos. ─ Não sei se sou capaz de sentir alguma vez.
Toc. Bateu com a bengala no chão, mas desta vez apenas foi ao de leve. Como uma indignação.
─ E se eu lhe disser que posso fazer com que sinta? ─ Aquele sotaque excitante com a voz profunda não ajudava a escritora a não se arrepiar. Parecia ter um comando contra o corpo dela.
Ruby engoliu em seco e arqueou as sobrancelhas.
─ Como assim? ─ Ficou curiosa. ─ No contracto vem que jamais iremos nos tocar ou manter relações sexuais. Sequer posso vê-lo.
─ Apenas responda se gostava de sentir como no seu conto. De encontrar essa perfeita "Simbiose". ─ Dark viu quando os olhos dela se tornaram ainda mais inquietos. ─ Existem muitas formas de fazer isso. Não a tocarei.
─ Que outras formas? ─ A curiosidade e o Desejo se misturavam de um jeito único.
─ Você já se tocou, Ruby?
Ela se assustou quando ouviu o som de uma taça a pousar contra a mesa, virou o pescoço rápido apenas para vê-la cheia de vinho novamente. Como um fantasma, parecia estar em todo lugar, perto e distante ao mesmo tempo. Os lábios pintados de vermelho estavam abertos e a respiração acelerada.
─ Antworte mir. ─ Ele pediu e em seguida traduziu. ─ Responda-me.
─ Tentei certa vez. ─ A voz dela estava quase muda.
─ E o que sentiu?
─ Nada. Foi estranho. ─ Deu de ombros. ─ Tive uma crise de espirros.
Ouviu aquela maldita risada assustadora que fazia seus pelos da nuca se eriçarem por completo. Chegava a ser cadenciada, gutural e sensual de um jeito estranho e delicioso.
─ [...] A primeira vez que senti a presença dele foi uma atracção única. Meu corpo reconheceu o dele muito antes de sonhar que aquele homem existia. Tinha um ar misterioso, um sorriso que não chegava aos olhos e uma confiança que fazia qualquer um ter inveja.
«Talvez tenha sido a química perfeita necessária, porque a meio de tantos outros a minha vontade se encaixou na dele. Na primeira noite quase sem nomes, completos desconhecidos e descobri pela primeira vez sobre o que era o sexo oral. Sem vergonha alguma, sem muitas palavras, apenas levantou a minha saia e se colocou no meio das minhas pernas.
Eu não sabia sequer o que podia estar a acontecer, meu coração batia com força e minha boca estava manchada de meu próprio batom. Ali, no escuro, com aquele completo estranho hipnotizante, eu não era mais minha.
E sim dele.
Ainda agora consigo sentir o hálito quente perto da minha intimidade. Caro ouvinte, era como se ali tão perto ele pudesse ainda parado, sugar a minha alma por inteiro. A expectativa, a curiosidade e os sopros de ar, fazia com que apertasse as minhas pernas contra a cabeça dele, pedindo mesmo sem saber, com aquele gesto impaciente.»
Dark se inquietou no lugar. Ninguém o via, mas podiam senti-lo em toda sua presença. Seus olhos acompanhavam os lábios vermelhos de Ruby, a forma como se mexiam lentamente na leitura que o desconcertava. Podia imaginá-la naquela posição, sentada com as pernas abertas e um homem lá no meio. Apertou o cabo da sua bengala com força.
Toc.
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Bom dia. Kkkkkk
Gente o capítulo tava ficando enorme. Tive que cortar, mas ele continua ta? Andreza e Suelle estavam chorando, aqui está o Mr. Dark.
Espero que estejam a gostar. Mandem corações aqui. S2
Não se esqueçam de votar, comentar e chamar as amigas para ler. Compartilhem aí.
Mil beijos de amor.
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