[66] Longe de Casa - Parte 3
Após uma semana longa, exaustiva e quase insuportável a bordo do navio mercante, Lian, Jungwon e Jay finalmente desembarcaram no Porto de Xangai. O Alfa mais velho cuidou para não ser reconhecido pelos oficiais, porém, a Marinha estava mais preocupada em inspecionar os passageiros com menos recursos financeiros.
Os nobres sequer foram parados para uma vistoria, o que foi ótimo para os três que estavam entrando escondidos em domínio chinês. O centro do povoado se preparava para um novo dia, mas a guarda da cidade nunca dormia, e duplas de oficiais circulavam pelas ruas, mantendo a ordem.
— Onde fica sua casa mesmo? — Jay olhou confuso para os lados. — Eu não faço ideia de onde estamos.
— Ainda não. — Jungwon decidiu. — Precisamos de um lugar seguro pra ficar, longe de qualquer um que possa reconhecer o Lian.
— Os subúrbios. — O mais velho afirmou. — Não há nenhuma patrulha por lá. A Marinha só vai quando é dia de cobrar os impostos.
— Tem certeza de que eles não vão te reconhecer?
Antes de responder o Ômega, Lian puxou os dois para se esconder de uma dupla de oficiais que estavam passando pela localidade. Eles entraram em uma travessa e saíram na rua ao lado.
— Eu espero que não — finalmente respondeu.
Mas o que aconteceu não foi exatamente o que Lian planejou. Ele foi reconhecido no primeiro lugar em que apareceu, mas isso não foi de todo ruim, visto que o aldeão ficou feliz por vê-lo depois de muito tempo.
— Você é aquele rapaz bondoso da Marinha, não é? — O Aldeão sorriu. — Quase não o reconheci por causa das roupas. Onde está seu uniforme?
— Eu não sirvo mais à Marinha. Sou um desertor.
— Oh…
— Por favor, não diga nada a ninguém — o Ômega pediu. — Finja que não nos viu. Iremos embora…
— Não, não — o ancião interrompeu. — Não precisam se preocupar. Se estão fugindo da Marinha, podem se esconder em minha casa.
— Não queremos causar problemas.
— Deixe-me retribuir o que você fez por mim. — O velho segurou na mão dele. — Minha casa é humilde, mas lá você encontrará amigos.
Lian olhou para os outros dois, que o acompanhavam. O Ômega assentiu para ele, aprovando a proposta do aldeão. Enquanto o mais novo, nem precisava perguntar, Jay apreciava a segurança em tudo e claro que concordaria com o que Jungwon aceitasse.
Os três foram levados pelo ancião, onde foram recebidos pela Ômega do mesmo e também seus filhos. Todos motivados a prestar apoio para qualquer um que fosse inimigo da Marinha. Aqueles que viviam no lado mais necessitado da cidade não apreciavam a presença dos oficiais.
Foram alojados no quarto dos filhos, uma vez que aquela casa possuía apenas dois. A gentileza foi aceita com dificuldade, pois nenhum dos piratas queria tirar o conforto daquelas pessoas.
— Essa a é hora que você diz qual é o plano — Jay mirou o Ômega.
— O plano é observar. — Jungwon respondeu, e virou-se para o mais velho: — Onde ela poderia estar?
— Em casa é o mais provável. Mesmo que futuramente seja condenada à morte, ela ainda é sobrinha do Imperador e viúva de um Almirante. Não seria jogada em um calabouço com pessoas comuns.
— Leve-nos até lá. — O Ômega decidiu. — Você consegue fazer isso sem que a Marinha nos veja?
O Alfa ponderou em silêncio, mentalizando as ruas que contornam sua antiga casa, a programação das rondas dos oficiais, quando e por onde passavam, casas e estabelecimentos. Para que tivessem sucesso naquela missão, era preciso prever os movimentos do inimigo, tendo a noção de espaço como um bom timoneiro.
— Posso fazer isso.
— Ótimo. — Jungwon encaixou o cinto com as armas e deu dois tapinhas no coldre. — Que saudade eu tava disso aqui.
— É bom te ver assim — Jay sorriu para ele.
— E é muito bom estar de volta — Jungwon respondeu. — Estão prontos?
Os dois Alfas olharam para ele e assentiram. Assim que deixaram o quarto, encontraram o anfitrião mexendo dentro de um balde uma mistura bastante duvidosa.
— Isso é…? — O Ômega apontou para o recipiente.
— A nossa refeição — o que preparava sorriu para ele. — Estão com fome?
Jungwon olhou para os outros dois e sorriu nervoso. Depois, entregou o saco com o restante das moedas para o aldeão.
— Por favor, compre comida. Estou faminto.
— Mas isso aqui é muito!
— É porque eu como bastante…
— Não está vendo? — Lian brincou. — Ele precisa comer muito para crescer mais.
Jay mordeu os lábios e virou o rosto disfarçando, para não rir, enquanto o outro continuou encarando o Ômega cinicamente, divertindo-se com o olhar furioso do mesmo.
— Se acha muito engraçado não, é?
— Desculpa, você fica muito fofo quando tá bravo. Eu não resisto.
— É? Então permita que eu deixe tudo mais engraçado; meus pais estão na costa chinesa.
— Tá falando sério? — O sorriso do Alfa mais novo foi diminuindo.
— Como sabe? — Lian franziu o cenho.
— Nosso amigo me contou… — o Ômega disfarçou tocando a têmpora, indicando que o Kraken comunicou-se por telepatia.
— Então acabou? — Jay olhou de um para o outro, esperando uma resposta.
— Não vou sair daqui sem a minha mãe.
Enquanto os dois discutiam algumas possibilidades, Jungwon parou observando um ponto qualquer, refletindo em silêncio conforme avaliava as circunstâncias de cada cenário que poderia vir a acontecer, com a presença do Black Swan no mar territorial da China.
O pior de todos seria um ataque dos navios de guerra. Embora a enorme criatura marinha viesse a ajudar, o grande número de galeões levaria o Black Swan a ser gravemente avariado, visto que, ao que tudo indica, era o único navio pirata ancorado pela região.
— O que você acha? — Seu raciocínio foi interrompido por Lian.
— Certamente o Black Swan já deve ter sido detectado pela Marinha. — Jungwon respondeu. — Voltar pro navio sem a sua mãe não é uma opção, mas agora precisamos de muito mais cuidado.
— Nesse caso então eu acredito que a Marinha vai direcionar sua atenção pro navio pirata, não pra quem tá na cidade. — Lian refletiu. — Talvez seja até melhor.
— A primeira vista sim — o Ômega concordou, explicando algo que o preocupou logo em seguida: — mas o Almirante é esperto. Pense, ele vai se perguntar; por que o Black Swan estaria ancorado, sozinho, na costa chinesa?
— Olhar pra cara dele que não é — Jay complementou.
— A essa altura ele sabe da sua traição e que se juntou a nós. Então, evidentemente, se o Black Swan está aqui, você também tá — Jungwon prosseguiu. — Se o Almirante ligar os pontos, o que não é muito difícil, vai entender que você está aqui procurando a sua mãe.
— Então você acredita que ele vai aumentar a guarda? — Lian perguntou.
— O que você acha? — o Ômega devolveu o questionamento. — Ele faria algo assim?
— Bom, não que ele queira causar algum dano a minha mãe, ele precisa seguir ordens como todo oficial…
— Não precisa fazer isso — Jungwon interrompeu o que seria a explicação sobre as ações do Almirante. — Você gosta muito dele e eu realmente entendo, mas precisamos ser lógicos aqui.
Ainda que Jungwon tivesse as mesmas características de um Ômega, que possuem o lado emocional em maior evidência, algumas de suas ações levam muita gente a vê-lo como uma pessoa “fria”, e que deve mostrar mais seus sentimentos.
Acontece que Jungwon também possui um traço racional forte. Com pensamentos objetivos, ele tende a priorizar escolhas essenciais para cada momento. Naquela ocasião, o resgate bem sucedido de Yue era mais importante do que a reputação do Almirante.
Jungwon era estratégico e implacável como o Capitão Jeon. Quando tal personalidade parte de um Alfa, sempre é mais aceitável, e até mesmo admirado. Mas um Ômega agindo assim, sempre acarreta em muito mais críticas e cobranças.
Mas havia alguém que nunca o cobrou por mais demonstrações de afeto ou qualquer coisa que o valha. Jay cresceu com Jungwon, ele o entendia, sentia a verdadeira essência daquele Ômega. Jay sabia que o menor não precisava pular em seus braços para demonstrar seu sentimento por ele. Jay o sentia, e ninguém poderia dizer o contrário.
Lian compartilhava do mesmo entendimento. Ainda que fosse um pouco duro deixar os sentimentos de lado, para falar sobre uma pessoa que se gosta.
— Deixa eu refazer a pergunta… — Jay interveio. — Você acha que, para garantir a segurança da sua mãe, ele aumentaria a guarda sobre ela.
— É bastante provável… não, eu tenho certeza que sim.
— Então a gente precisa observar, sem chamar atenção. — Jungwon decidiu, virando-se para Lian: — Talvez demore alguns dias, eu quero certeza em nosso resgate. Sem qualquer margem para erro.
— Se isso significa que minha mãe ficará bem e vocês não serão expostos, estou de acordo.
Jungwon sorriu para ele, tendo a mesma reação do Alfa mais novo assim que olhou para o mesmo. Após deixarem a residência do aldeão, eles foram guiados por Lian pelas ruas da cidade, sem ter a presença anunciada, onde permaneceram em local seguro e furtivo observando toda movimentação da Marinha.
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Depois de semanas firmando um acordo justo e satisfatório, para que os reinos mais poderosos da costa asiática possam lucrar igualmente, cartas com o selo real de cada nação estavam sendo criadas para oferecer o perdão aos piratas.
Um representante estava em reunião com o Imperador, para discutir mais alguns interesses japoneses. O Almirante também estava presente, representando a Marinha, mas também aguardando para ficar a sós com o Imperador e discutir a situação de Yue.
A Beta ainda não foi condenada apenas por intervenção de Wo Lee. Os oficiais eram em sua maioria muito fiéis ao seu líder, desse modo, se o Imperador pretendesse continuar obtendo o apoio da Marinha, deveria cooperar com o Almirante e suas exigências.
— Senhor, precisa vir comigo imediatamente — um marujo entrou no gabinete, chamando pelo Almirante Wo.
— O que houve?
— O Black Swan foi visto na costa há alguns minutos. Estão ancorados. O que devemos fazer?
— Resolva isto, Almirante — o Imperador moveu a mão com pouca paciência. — Depois conversamos sobre aquele assunto.
O líder da Marinha deixou a sala. O oficial que o chamou, seguiu com ele até uma janela onde o Almirante pode ver através de uma luneta, o navio de velas negras ancorado a uma distância razoável. Mas ainda era possível enxergar a movimentação pelo convés do Black Swan.
— Deixem os galeões a postos, mas não ataquem. — Lee decidiu. — Não há razão em atacar um navio isolado, se ele não está sendo uma ameaça.
— Sim, senhor.
— Chame a oficial Jiang em meu gabinete.
O marujo assentiu e fez como o líder ordenou. Em alguns minutos a Alfa estava reunida com o Almirante, recebendo novas demandas.
— O Lian está aqui — Lee foi direto.
— No Black Swan? Sei que eles estão na costa.
— Não. Ele já deve estar aqui, em algum lugar. Esperando uma oportunidade para salvar Yue.
— Quer que eu o ajude?
— Não, você já se envolveu demais nessa história. Vá até a casa de Yue e fique lá, se ver o Lian não interfira, mas também não ajude.
— Nenhum oficial tem permissão para entrar na casa.
— Estou concedendo a você essa autorização. Apenas certifique-se de que Yue não seja coagida, caso o plano dele tenha alguma adversidade.
— Em outras palavras, quer que eu a proteja.
— Sim.
— Pode contar comigo, senhor. Farei isso agora mesmo.
— Obrigado. — O Alfa sorriu para ela, observando a mesma deixar o gabinete logo em seguida.
Após Lian abandonar a Marinha, foi-se junto a possibilidade dele um dia crescer dentro da organização militar. Com isso, os olhos do Almirante voltaram-se para Jiang, que sempre foi muito responsável e leal. Um grande nome para se tornar a próxima Tenente da Marinha chinesa.
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Ao anoitecer, as luzes do pavimento superior do Black Swan não foram acesas, por ordens do Capitão Jeon. Sem lua no céu, o navio inteiramente negro estava camuflado sob o manto da escuridão. A movimentação dos piratas pelo convés estava oculta das lentes de qualquer luneta dos oficiais.
Se durante o dia, a Marinha estava controlando cada passo da tripulação do Black Swan, durante a noite eles perderam tal vantagem. Os piratas estavam acostumados a agir durante qualquer hora do dia, a noite principalmente. A falta de iluminação nunca foi um problema para eles.
O Kraken também estava perto do navio pirata, com parte de seu corpo fora da água, olhando diretamente para o Capitão Jimin, que o encarava de volta do alto do parapeito.
— Eles estão bem, não é? — O Ômega quebrou o silêncio. — Levante um tentáculo para sim e dois para não.
Apesar de poder ouvi-lo, a criatura abissal não falava e estava limitado a se comunicar mentalmente apenas com seu “mestre”, que seria Jungwon. Mas ele poderia atender o pedido do Capitão e responder através de gestos, mas não o fez.
— Eu acho que ele não gosta muito de você, papai — Eunji estava fazendo companhia, sentada no parapeito.
— Olha só — Jimin respirou fundo, voltando a falar com a criatura —, se eu proibi o meu filho de manter contato com você, foi porque estava preocupado com ele. Jungwon era uma criança e você é… algo muito grande e forte. Você sequer gostava dele, o que queria que eu fizesse?! Ah, filhinho, pode ir brincar com o Kraken sim, não tem perigo algum, ele é só uma lula gigante que segundo as lendas devorou dezenas de embarcações e milhares de pessoas. Claro, eu serei um pai muito irresponsável e vou deixar você brincar com ele sim, porque além de irresponsável eu sou muito legal. Só não vá se molhar, hein.
Eunji tentou disfarçar mas começou a rir com o jeito que seu pai estava falando, com as mãos apoiadas na cintura e um tom de voz cheio de sarcasmo.
— Eu admito, ao contrário do que eu imaginei você não o machucou. Quando percebi que você não faria mal a ele, até permiti que se comunicasse com você. Mas agora eu preciso da sua ajuda… — O Kraken permaneceu imóvel, apenas observando. Jimin suspirou mais uma vez, olhou para a filha e depois voltou a mirar o Kraken, quando prosseguiu: — Quando ele nos deixou, você também sentiu, não foi? Aquela dor…
As memórias voltaram como uma enxurrada na mente da criatura. No momento em que Fritz perfurou o coração do Ômega com sua espada, o Kraken sentiu desde o primeiro momento, o susto, o medo e a calmaria após Jungwon dar seu último suspiro.
Foi como se uma luz no centro de seu enorme corpo tivesse se apagado, e o Kraken tivesse voltado novamente para a escuridão mais profunda do oceano.
— Não quero passar por isso outra vez. Preciso saber se os meninos estão bem. Por favor…
Jimin parou de falar quando viu o Kraken erguendo um de seus longos braços. Um tentáculo significa sim, Jungwon estava bem. O Capitão fechou os olhos e respirou profundamente aliviado. Quando abriu, olhou para o Kraken e sorriu.
— Obrigado.
O Kraken puxou o braço para debaixo da água quando Jungkook se aproximou, submergindo logo em seguida, ocultando seu corpo inteiramente das vistas do Capitão Jimin e da pequena Alfa.
— Yoongi e Baekhyun podem invadir o território deles sem serem notados — Jungkook afirmou. — Eles são assassinos furtivos…
— Não há necessidade. Nosso filho e os outros estão bem. O Kraken me assegurou.
— Não acha que eles precisam de ajuda?
— Talvez. Mas eles decidiram fazer isso sozinhos, não vou interferir a não ser que seja muito necessário.
— Você tem razão.
Embora o instinto protetor dos pais quisesse gritar mais alto, era preciso deixar o filho voar sozinho.
— Ai! — Jackson resmungou, chamando a atenção daqueles que estavam pelo convés. — Você me atacou!
O braço dele estava com um corte, o sangue manchou certa fração da manga da camisa.
— Você disse pra eu não me conter — Sarah se defendeu, dando de ombros. — Talvez você esteja ficando velho e cansado…
— Essa menina tá ficando muito selvagem, Jisung! — Jackson acusou. — Quase me matou.
— Eu disse a você pra usar armas de madeira, mas você é teimoso. — o Ômega suspirou indiferente.
— O treino acabou por aqui — o Alfa decidiu, encarando a filha. — Vou pra enfermaria antes que você me fatie, como o lombo de um javali.
A garota ficou parada observando o pai descer as escadas da escotilha. Depois, limpou a espada antes de embainhar novamente e foi para junto do pai Ômega.
Jackson encontrou a enfermaria vazia. Sabendo que obviamente os médicos ainda estavam a bordo, ocupou uma cadeira para esperar até que um deles aparecesse. Na mesa ao lado havia uma garrafa com o chá dos Alfas e uma caneca vazia.
— Coloca as sementes naquele pilão e vai macerando bem até soltar a seiva — Seokjin instruiu seu jovem aprendiz, quando ambos chegaram na enfermaria.
— Tá bom. — Taesung fez como indicado, separando uma certa quantidade por vez.
O médico viu que havia um paciente esperando para ser atendido. Ele guardou uma caixa que trouxe consigo e finalmente deu atenção para o Alfa:
— Pois não?
— Dê um jeito nisso. — Jackson mostrou o braço machucado.
Seokjin rasgou a parte da manga da camisa que cobria o ferimento, avaliou por algum tempo e quando satisfeito, chamou o Alfa mais novo:
— Vem aqui, Taesung. Você vai cuidar disso.
O Alfa deixou o pilão com as sementes e prontamente obedeceu o chamado do médico. Jackson franziu o cenho acompanhando a cena, querendo acreditar que havia entendido errado.
— Observe o braço dele — o Beta instruiu. — Qual é o tipo?
— Pérfuro inciso… — Taesung inclinou o rosto perto da lesão e estudou. — potencialmente contaminada.
— Perfeito. E agora?
— Assepsia?
Seokjin assentiu confirmando e, posteriormente, indicando as prateleiras:
— Não esqueça da analgesia.
Jackson respirou fundo, já perdendo a pouca paciência que tinha. Geralmente, sempre que chega a enfermaria, tanto Sungjae quanto o próprio Seokjin costumam realizar seus atendimentos de forma rápida e eficaz.
Agora, em sua opinião, estava realizando um verdadeiro teatro colocando o garoto para narrar cada procedimento. Jackson acompanhou com os olhos, o Alfa retornando enquanto tentava equilibrar alguns frascos entre as mãos.
— Em uma escala de zero a dez, onde zero significa ausência de dor e dez uma dor inimaginável, como você descreve sua dor nesse momento?
— Que palhaçada — Jackson revirou os olhos para Seokjin, ignorando a pergunta do mais novo. — Faça logo seu trabalho.
— Queira, por gentileza, responder a pergunta do meu aprendiz — o Beta orientou.
Jackson encarou o médico por alguns segundos, depois voltou sua atenção para o Alfa quando finalmente cedeu a resposta, visivelmente ranzinza:
— Zero!
— Qual eu uso?
— Este aqui — o médico orientou.
— Certo. — Taesung apanhou uma gaze e a umedeceu com soro.
No momento em que tentou limpar o local da ferida foi interrompido quando a mão do lúpus agarrou seu pulso com força.
— Isso aqui já é demais!
— Você não precisa de sutura, portanto, ele vai apenas limpar sua ferida e fazer um curativo sob a minha supervisão. Solte-o.
— Use um rato se quiser treiná-lo, não serei eu a cobaia. Vim para ser tratado por um médico, não por um adolescente.
— Ele será o futuro médico da tripulação. A vida dos seus filhos vai depender do quão experiente ele vai ser — Seokjin cruzou os braços. — Tem certeza que não quer colaborar com o aprendizado dele?
Jackson encarou o mais novo nos olhos, cujo formato era semelhante aos de Sungjae, enquanto a cor era idêntica a do irmão mais velho, onde a genética herdaram de Scott. Ele soltou o braço do Alfa e assistiu o mesmo umedecer a gaze com soro novamente, para logo em seguida dar continuidade ao procedimento.
Assim que terminou de fazer o curativo, Taesung deu um passo para trás, para que Seokjin avaliasse seu desempenho. O médico sorriu muito orgulhoso, elogiando a prática de seu aprendiz:
— Não via um curativo tão bem feito assim desde que ensinei o seu pai.
Os olhos do Alfa mais novo brilharam, e ele sorriu satisfeito consigo mesmo.
Antes de deixar a enfermaria, Jackson saciou sua curiosidade quando viu Taesung encher a caneca com o chá contido na garrafa que encontrou ao chegar no recinto, e ingerir o conteúdo logo em seguida.
Era o terceiro Alfa mais jovem da tripulação que, aos 14 anos, estava experimentando pela primeira vez o período do rut. Jackson lembrou-se de quando o garoto tinha a mesma idade que sua filha, sentindo como o tempo passava ligeiro e que muito em breve era Sarah que estaria tomando aquele chá.
O gêmeo dela, por outro lado, Jackson evitou pensar a respeito, do contrário, poderia iniciar agora mesmo uma matança e exterminar todos os Alfas da tripulação antes que o pequeno Hyun chegasse à idade de ter seu primeiro heat, o que aconteceria dentro de 4 anos.
🏴☠️
Naquela noite, o aldeão e sua família se alimentaram como nunca antes. As moedas de ouro que Jungwon entregou para o anfitrião, iriam garantir fartura naquela casa por um bom tempo.
— Muito obrigado — o velho agradeceu pela vigésima vez, ou talvez até mais. Jungwon perdeu as contas… — Eu não sei como agradecer tamanha generosidade. Tem certeza que não vai fazer falta?
— Não se preocupe, tem muito mais de onde veio isso — o Ômega sorriu para ele. — Há um verdadeiro lago cheio de riquezas, que pertence aos meus pais.
— Desculpe a inconveniência mas, o que eles fazem?
— Comércio de alto risco. — Jungwon sorriu enigmático.
— Oh…
— Bom, o jantar estava delicioso — Lian elogiou a dona da casa, e virou-se para seus companheiros: —, mas precisamos discutir o motivo de estarmos aqui…
Os três se levantaram e deixaram a cozinha, para se reunirem na privacidade do quarto em que foram alojados.
Durante o dia, eles observaram o vai e vem dos oficiais que rondavam a casa da família Zhang.
— Eles são extremamente pontuais em suas trocas de turno. — Jay avaliou. — Que irritante. Assim não há qualquer abertura.
— Podemos criar uma — Jungwon ponderou, olhando pela janela. — Do mesmo jeito que saímos daquela casa, podemos entrar sem sermos vistos.
— Se está se referindo aos tambores que vocês dois fugiram, pode esquecer. Eles revistam qualquer coisa que entre ou saia de lá desde o incidente.
— Eu não vou caber dentro naqueles tambores — o Alfa mais novo largou o corpo na cama. — Talvez o Jungwon sim, mas ele não vai entrar sozinho.
Lian mirou o Ômega na janela, esperando uma reação violenta pela fala de Jay, referindo-se a sua estatura, mas ele estava tão concentrado em seus pensamentos que sequer prestou atenção.
— Os telhados não são tão vigiados assim — o Ômega comentou. — Usaremos isso ao novo favor.
— E quando faremos? — Lian se aproximou da janela.
— No mínimo, ficaremos mais dois dias de vigília — o Ômega ficou de frente para ele. — Quero saber até mesmo quando e como eles respiram. Cada passo deles, eu quero que esteja decorado em nossas mentes. Seremos como sombras.
— Estou com você no que decidir — Jay afirmou e Lian assentiu no mesmo instante, concordando com ele. — O Kraken deu alguma notícia?
— Ah! Quase me esqueci — Jungwon fechou a janela. — Ele disse que meu pai está preocupado, mas que não vão se envolver. Estão ancorados, e a Marinha aparentemente quieta.
— Estranho…
— Não exatamente — Lian respondeu. — Se eles pretendem oferecer o perdão como foi planejado, vão manter as aparências pacifistas por enquanto.
— Que coisa! — Jay virou de frente para o colchão, com os braços esticados no centro dele. — O camarote do galeão era mais confortável do que isso aqui.
Jungwon jogou o corpo sobre o dele, deitado na mesma posição. O Alfa sorriu, com o repentino peso do Ômega em suas costas.
— Parece bastante confortável… — Jungwon avaliou cinicamente.
— Deixa eu ver — antes que os dois mais novos pudessem protestar, Lian fez o mesmo, deitando-se em cima de Jungwon. — Nossa, que macio.
— Agora eu não consigo respirar! — Jay reclamou, sendo pressionado pelos dois corpos contra o colchão.
— Ele tem razão. — o Ômega riu com certa dificuldade, o peso do Alfa estava inteiramente sobre eles. — Você é tão pesado!
— Vamos tentar de outro jeito…
Lian agarrou o Ômega pela cintura e trocou de posição com ele, agora, estava com as costas contra as do Alfa mais novo e com Jungwon em seu colo, deitado se frente para si.
— Eu ainda estou sentindo todo o peso! — Jay protestou mais uma vez.
— Pare de reclamar, você é um jovem muito forte. — Lian provocou, adicionando dois tapinhas no quadril do Alfa.
Jungwon riu, assim como o mais velho. Ambos arregalaram os olhos quando Jay levantou-se erguendo os dois de uma só vez, derrubando-os ao lado do colchão e logo em seguida deitando em cima de Lian que, por outro lado, manteve os antebraços apoiados contra a cama para que o peso de ambos não caísse completamente sobre o Ômega.
— Hmmm… — Jay sorriu com um tom cheio de provocação. — Como ele é cavalheiro.
— Ah, seu… — Lian passou a cutucar o mais novo, mantendo o peso de ambos com um braço.
Jay obviamente não ficou quieto, devolvendo os beliscões e empurrões. Os dois pararam o confronto quando ouviram Jungwon rindo alto. Ele estava se divertindo enquanto assistia aquela rixa de brincadeira.
— Do que está rindo? — O mais novo perguntou.
— De vocês — o Ômega foi sincero. — Por que não revezam? Primeiro um fica embaixo e depois o outro. Mas não parem, sério — ele riu um pouco mais, antes de continuar: — está muito bom.
— Tá muito engraçado, é? — Lian estreitou os olhos. Era ele quem mais estava sentindo naquela situação.
— Você não faz ideia do quanto — Jungwon suspirou, apoiando as mãos atrás da cabeça. — E eu tenho a visão privilegiada da coisa toda.
Lian olhou para trás, encontrando o Alfa mais novo lhe encarando em retorno, ambos chegando ao mesmo ponto de vista. Com efeito, era quase possível escutar os pensamentos um do outro: “como esse Ômega é ousado, você tá vendo isso?”
O sorriso que exibiram entre si foi como uma resposta para a pergunta em seus pensamentos. Lian deixou o apoio do braço ceder e seu corpo, com o do Alfa logo acima, prensou o do Ômega contra a cama. Jungwon parou de rir no mesmo instante.
— Não tô conseguindo respirar!
— Não parece tão engraçado agora? — Lian o beijou na bochecha. — Retire o que disse.
— Estou falando sério!
— Eu também.
— Não farei isso!
— Hmm — Lian suspirou tranquilamente. — Então parece que há um dilema aqui.
Jungwon segurou nos ombros dele e tentou fazer como Jay, empurrando para removê-los de cima. Mas não conseguiu.
— Que adorável. — O mais velho sorriu.
— Estou certo de que deixei a lâmina das minhas adagas muito bem afiadas hoje cedo…
O sorriso dele sumiu, os dois Alfas trocaram olhares antes de se levantarem da cama em um único pulo, deixando o Ômega completamente livre.
— Você tem ótimos argumentos. — Liam reconheceu.
— Me fizeram suar — Jungwon sentou na cama, levantando-se logo em seguida. — Agora vou ter que tomar banho de novo.
O Ômega seguiu para o lavabo e Jay o acompanhou com o olhar. Quando voltou sua atenção para o outro Alfa, o mesmo já estava ocupando um espaço no cantinho da cama com a parede. O mais novo fez o mesmo, deitando-se de lado no meio do colchão. Ficaram os dois um de frente para o outro.
— Montou em mim com gosto, não foi? — Lian sorriu, ao ver o rosto do mais novo ficar vermelho, com a pergunta de duplo sentido. — Você é o único Alfa que eu vejo ficar envergonhado tão facilmente.
— Isso é ruim? — O outro negou movendo a cabeça devagar. O sono estava dando os primeiros sinais de quem levaria primeiro naquela noite. — Nós vamos conseguir salvar a sua mãe.
— Eu sei. — Lian sorriu para ele mais uma vez, recebendo o mesmo de volta.
Ficaram encarando-se em silêncio, até que o mais velho piscou os olhos vagarosamente, depois outra vez e mais uma, até que não os abriu mais.
Jay continuou olhando para ele, e só percebeu o retorno do Ômega porque sentiu seu aroma doce e um peso movendo sobre o colchão logo atrás dele.
— Ele está dormindo de verdade?
— Uhum — o Alfa murmurou, sorrindo ao sentir o Ômega abraçando-o por trás. — Jun?
— Hm?
— Isso precisa dar certo.
— O resgate?
— Sim. — Ele virou o rosto para encará-lo. — O Lian já perdeu muita coisa.
— Vamos conseguir. — O Ômega confirmou e ambos olharam para o Alfa dormindo, ao mesmo tempo. — Por ele.
Jay assentiu, suspirando fundo e fechando os olhos com um sorriso refletindo a certeza de que Lian e sua mãe ficariam livres, uma do cárcere privado e o outro da culpa que tentava esconder.
Continua…
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