Capítulo Quinze
Dias depois, era a minha vez de estar no lugar do passageiro. Eu e Max precisávamos de comprar as decorações para a próxima festa temática e, como sempre, preferíamos ser nós a fazê-lo, em armazéns com todas as escolhas possíveis. Na verdade, era mais relaxante do que eu pensava inicialmente que seria. Com Max a conduzir, poderia descansar durante a viagem de carro e, mesmo durante o dia, a sua companhia nunca seria desgastante. Era o meu melhor-amigo e, apesar de ter demasiada energia ocasionalmente, era das poucas pessoas que eu conseguia tolerar durante horas seguidas.
Ambos preferíamos ir aos armazéns fora da cidade, por já termos confiança com os vendedores e por já sabermos que os preços eram os mais acessíveis. Nos primeiros meses de Dove, tínhamos cometido o erro de ir a lojas mais conhecidas e acabávamos a ficar sempre desiludidos com o resultado. Só quando encontrámos aqueles armazéns é que começámos a organizar cada vez mais festas temáticas, principalmente porque começaram a dar lucro em vez de despesa. Para não falar que Max parecia um menino de cinco anos sempre que se encontrava entre os corredores repletos de decorações.
Tinha a cabeça relaxada contra as costas do banco, praticamente a adormecer, quando Max começou a mudar incessantemente de estação de rádio. Sem abrir os olhos, a minha mão agarrou imediatamente a dele – algo que o assustou mas a que, simultaneamente, ele já estava demasiado habituado para perder controlo do carro – e coloquei-a no volante. Max bufou e revirou os olhos, fingindo não olhar para mim enquanto eu baixava o volume do rádio e abria o seu porta-luvas, em busca da sua pen, cujos ficheiros ele atualizava mensalmente.
- Não sei se me apetece ouvir as músicas daí. – Max reclamou, numa voz arrastada, mas eu limitei-me a ignorá-lo. – Daxon, não me ignores!
- Max. – disse apenas, na voz mais severa que consegui. Ele sorriu-me, colocando a língua de fora.
Coloquei a pen e avancei algumas músicas, até parar numa que sabia que ambos íamos gostar. Max soltou um hm de dúvida mas, segundos depois, já estava a acompanhar o cantor. Não resisti ao riso que ameaçou soltar-se e acabei a encostar a nuca nas costas do banco do passageiro de novo. Olhei para a paisagem por onde passávamos: os prédios tinham sido substituídos por bairros de moradias, divididos por alguns terrenos onde se via, ao longe, pessoas a trabalharem. Por vezes esquecia-me que a nossa cidade também continha partes mais isoladas que o centro, onde eu e a Ava vivíamos. A cidade era enorme, na verdade - era difícil ter noção de algo daquela dimensão.
Ao pensar em Ava, senti os meus dentes a pressionar contra o meu lábio. A primeira coisa que fizéramos naquele domingo, depois de Nate ter aparecido no Dove, foi arrumar coisas suficientes para tanto Ava como Mia saírem do apartamento. No entanto, foi combinado que eu e Ava passaríamos lá algumas noites, no intuito de distrair Dan caso ele estivesse a observar os movimentos dela, pois eu sabia que era apenas uma questão de tempo até ele eventualmente encontrar a minha casa. Ainda assim, mesmo tomando todas essas medidas de segurança, Ava vivia a sua vida normalmente.
Não queria sufocá-la, por isso recusava-me a dar-lhe ordens e eu sabia que ela tinha notado. Sempre que ela olhava para mim, quando eu perdia o foco por estar a pensar em Dan e em Nate, sorria-me e beijava a minha testa suavemente, agradecendo-me. Ela não precisava de me agradecer, claro, mas sabia bem ter alguém que apreciava a minha tendência protetora. Proibi-me de estar sempre a mandar-lhe mensagem a perguntar se ela estava bem e de lhe dizer para ela não andar sozinha. Não queria subestimar Dan, mas também sabia que o bêbado não tinha inteligência o suficiente para ser efetivamente um perseguidor. O pior era Nate, o homem atrás da cortina, que certamente estava a encher a cabeça do bêbado com todas as mentiras suficientes para o enfurecer.
- Hoje é o dia de relaxamento, Dax. Não vale a pena estares a pensar naquele idiota. – voltei-me para Max, expirando.
- Não estava...
- Estavas com a tua cara de preocupado. Não me enganas, amor. – revirei os olhos, mas também ri um pouco. Era verdade, afinal; nunca conseguiria enganá-lo, nem ele a mim. – A Ava está com a irmã, ela está bem.
- Eu sei, mas...
- A rapariga partiu o nariz ao Nate, e a Ava também se sabe defender. Não tens que te preocupar tanto com ela. – continuou, numa voz séria.
- Eu sei disso, Max.
- Para não falar de que ela trabalha num laboratório. Aquilo está rodeado de seguranças, tanto que me faz pensar nas coisas secretas que eles hão de esconder lá... - e, com aquele comentário, Max distraiu-se completamente do assunto principal. – Será que existe um clone da Ava algures naquele laboratório?
- Sim, Max. Chama-se Mia.
- Não era disso que eu estava a falar e tu sabias, seu idiota. – ri um pouco, abanando a cabeça.
Eventualmente, chegámos à zona dos armazéns. Max abanou-se no banco do condutor, mostrando-me quão feliz ele realmente estava por estar a voltar a fazer compras. Tínhamos várias hipóteses para a próxima noite temática, mas tudo dependeria dos preços e da disponibilidade das decorações. Por termos tido mais lucro no último mês do que o costume, iríamos aproveitar para preparar já as próximas três noites temáticas, tanto quanto conseguíssemos. Todo o dinheiro era útil e, apesar de as nossas finanças não estarem apertadas, preparar o futuro nunca custava. Só queríamos ter a certeza de que, caso uma semana fosse mais parada que outra, teríamos sempre a noite temática para equilibrar as finanças e trazer mais pessoas ao Dove.
- Isto é um paraíso! – Max gritou, assim que entrou no armazém. Ouvi um riso grave e rouco e olhei para a esquerda, vendo Joseph, o dono do dito armazém. Ele aproximou-se de nós com o peito ainda a tremer do riso. Como sempre, só Max conseguia soltar aquele tipo de gargalhada das pessoas.
- Rapazes! Como estão?
- Joe. – apertei a sua mão, dando um passo para trás para dar espaço a Max de o abraçar com força. – Como podes ver, o Max está entusiasmado.
- Exatamente igual a quando ele era miúdo, no Natal. Nem parece que tem trinta anos. – Joe abanou a cabeça, rindo e mostrando orgulhosamente as rugas que se tinham formado nos cantos dos seus olhos.
Joseph era um amigo de longa data do pai de Max. Inicialmente, nenhum de nós tinha querido pedir ajuda às nossas famílias para a abertura de Dove – e com nós, era claramente só eu que tinha esses problemas – mas eventualmente teve que ser. Joseph quase nos bateu quando descobriu que andávamos as fazer as nossas compras em lojas cuja premissa era apenas a sua marca ser conhecida. Garantiu que nos faria sempre um desconto se nos tornássemos clientes habituais e, depois de termos comprovado que os seus produtos eram realmente melhores, o acordo foi feito sem mais demoras. Com a sua ajuda, fomos descobrindo outros fornecedores melhores para o nosso negócio do que aqueles que tínhamos escolhido inicialmente. Não me custava admitir que, sem Joseph, Dove nunca teria vingado tão bem na Rua Verde.
- Ok! Temos bastantes ideias desta vez, meu lindo Joe. – Joseph olhou para mim, com olhos castanhos completamente divertidos com o meu amigo.
- Vamos lá, então. Sou todo vosso por enquanto.
- E é assim que gostamos de ti. – e, com um braço em cima dos ombros do homem mais velho, Max puxou-o até ao seu corredor preferido.
Peguei num dos carrinho de compras que Joseph disponibilizava na entrada do seu estabelecimento e, enquanto Max se ocupava a fazer Joe imaginar todas as nossas ideias para o bar, preocupei-me com as restantes coisas. Lâmpadas que precisavam de ser renovadas, tinta para retocar alguns cantos, mais luzes néon para a zona VIP. Tudo o que podia ser feito por mim, Max, ou um dos empregados, eu preferia que assim fosse em vez de contratar pessoas de fora para o fazerem. Não só seria mais caro, como significaria que tinha que abrir o meu estabelecimento a mais pessoas em quem eu não confiava totalmente. Preferia pagar os materiais e as horas extra a contratar equipas profissionais que pediam mais dinheiro do que deviam. Aprendi a ser poupado – e um pouco forreta, na verdade – com o meu pai e o meu avô, que tinham incutido em mim a ideia de que o dinheiro era passageiro e fictício.
Precisávamos de saber fazer as coisas em vez de depender da capacidade de pagar a alguém que as fizesse por nós.
- Dax! Algemas?
- Para que porra é que precisamos de algemas, Maxwell? O que é que estás a fazer? – ouvi o riso alto de Joe do outro lado do corredor alto e levei a minha mão à testa, abanando a cabeça.
- Para a festa com o tema Prisão, seu grande burro!
- Mas não vamos prender ninguém! – um silêncio instalou-se, fazendo-me pausar. – Ou vamos?
Max não me respondeu mais, sendo que só consegui ouvir o som das rodas do seu carro de compras a rodar e, ao longe, os murmúrios dos dois homens. Revirei os olhos mas não me preocupei, sabendo que tudo se resolveria na caixa, porque era o meu cartão que pagava as decorações. Nada era comprado sem a minha autorização, e Max sabia-o, mas eu também sabia que ele teria ótimos argumentos para tudo o que fosse desnecessário e ridículo. De qualquer forma, preocupei-me com as coisas que tinha para fazer. Precisava, também, de comprar mais copos e algumas garrafas de vidro para o bar, assim como algumas coisas para redecorar a parede daquela zona de Dove.
Continuámos com as nossas tarefas separadas até que os encontrei no corredor dos balões. Joe estava a agarrar os braços de Max, impedindo-o de se colocar em bicos dos seus pés para chegar a algo numa das prateleiras mais altas. Como que a demonstrar quão idiota o mais novo conseguia ser, Joe deu três passos para trás e puxou o escadote que estava montado em todos os corredores, exatamente para prevenir acidentes como o que Max estava destinado a enfrentar. Revirei os olhos e abanei a cabeça, gostando da constante energia e bom-humor que o meu melhor-amigo me proporcionava. Para que serviria um melhor-amigo se não para nos animar quando não o conseguíamos fazer a nós próprios?
Duas e duras horas depois, estávamos a colocar tudo na bagageira enorme da carrinha de Max. Era por aquilo que íamos sempre no seu carro; o meu, apesar de grande o suficiente, não tinha espaço para todas as compras que fazíamos quando íamos ao armazém de Joseph. Peguei no meu telemóvel e, quando verifiquei que não tinha nenhuma mensagem de Ava ou de Mia, respirei fundo. Ava, apesar de todas as suas inseguranças, continuava a ser demasiado orgulhosa quando estava nos seus dias mais relaxados e, por assim ser, tendia a não me querer preocupar.
- Temos tudo o que precisamos? – Max perguntou, antes de fechar a bagageira do seu carro.
- Isso e um grande buraco nas nossas finanças. – ele riu, abanando a cabeça e fechando a bagageira.
- Não te preocupes, lindo. – colocou uma mão no meu ombro e encarou-me. – Já não somos os miúdos que éramos há uns anos. O Dove tem mais sucesso que nunca, não podemos agarrar-nos ao passado para sempre.
- Sinto que já não estás a falar do bar, Max. – ele sorriu abertamente, completamente inocente, e encolheu os ombros, caminhando até à porta do condutor.
Fiz o mesmo até à porta do passageiro e, antes de realmente entrar no quarto, olhei à volta e inspirei o ar puro uma última vez. O ar da cidade era completamente diferente daquele.
- Quais são os planos para o resto do dia? – perguntei a Max, ligando o rádio enquanto o fazia. Apesar de termos ido fazer compras relacionadas com o bar, era o seu dia de folga.
- Bem, meu amor, acredites ou não...tenho um encontro. – levantei as sobrancelhas, ganhando um sorriso incrédulo ao mesmo tempo – A sério!
- Quem?
Com um sorriso divertido, Max contou-me de como conheceu uma rapariga no Dove. Era uma rapariga de pele azeitona, provavelmente com descendência arábica, e que, nas palavras dele, tinha pernas infinitas. Ainda assim, apesar de ele estar a focar-se nas caraterísticas físicas da rapariga, eu pude ver que não tinha sido isso a atraí-lo. Max era uma pessoa que precisava de constante estímulo ou de, pelo menos, alguma coisa com que ele pudesse gozar constantemente – como era o meu caso. Se ele estava interessado na rapariga ao ponto de estar feliz por ir jantar com ela, a minha aposta era que ela era, pelo menos, divertida e com uma panóplia de histórias engraçadas para contar.
- Só não te podes esquecer de uma coisa muito, muito importante, Maxwell. – ele olhou para mim, ainda com olhos a brilhar de divertimento. – A minha mãe tem que aprovar.
- A tua e a minha, amor. – riu alto, aumentando o volume do rádio.
eu adoro a amizade destes dois. na verdade tem imensa piada, na minha cabeça, imaginar dois rapazes de trinta anos todos musculados e enormes e agirem como estes dois agem. e adoro o Max a tratar o Dax por amor, eles são tão lindos <3
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