07

— Ele só está com medo, Vegas.

Macau tentou tranquilizar o irmão que rodava o quarto de hotel em zigue-zague a mais de meia hora.

— Por que você não chama ele pra sair, só vocês dois? — sugere.

— Também 'tô com medo Macau. E se, sei lá... o que levou o papai a me ligar? Nós já tínhamos combinado que eu só precisaria retornar no próximo mês, até lá meu trabalho seria a distância. Era o tempo que eu precisava pra preparar o Pete, agora... ele pode pensar que quero largá-lo e não tenho essa pretensão. Me apeguei tanto ao Venice também, e se ele ficar com raiva de mim ou... se eu demorar a voltar e ele não me reconhecer? Tudo pode acontecer. Só não queria magoar o Pete de novo. Quando ele chorou, tive vontade de me socar Macau. Por que tinha que cruzar o caminho dele, logo agora?

Vegas estava tão afoito que mal havia percebido que tagarelava sem parar, jorrando seus medos e frustrações ao vento. Macau coçou a cabeça, seu rosto se encontrava todo amassado devido à noite mal dormida. Lógico que o Theerapanyakul mais novo entendia razoavelmente o desespero do irmão, mas não se oporia em jogar algum objeto em sua cabeça se tivesse forças o suficiente e isso fizesse o mais velho raciocinar direito. Não era nem oito horas da manhã direito e ele havia entrado no quarto do hotel, que estavam ficando hospedados, feito um furacão, acordando Macau como se o mundo tivesse desabando. Bom, talvez para ele sim.

Se Macau conhecia bem seu pai, algo estava sendo planejado e seu irmão poderia se surpreender com esse retorno para casa. Algumas suspeitas borbulharam em sua mente e ele anotou mentalmente a ligação que faria para a mãe. Não queria ser pego de surpresa. Seu irmão parecia uma criança prestes a ser repreendida pelos pais por colocar fogo na escola, o que era engraçado, já que seus progenitores nunca foram do tipo que fica cobrando os filhos por tudo; por outro lado, Vegas tinha essa mania de querer agradá-los e muitas vezes fazia sacrifícios que não eram necessários. Como a escolha infundada feita há anos atrás quando decidiu deixar Pete.

— Acabou? — Vegas o fuzilou com o olhar. — Tá bom, digamos só que... você deveria ter um pouco mais de fé no nosso pai, Vegas. Se ele te pediu pra antecipar a viagem, deve ser algo realmente importante e se está com tanto receio de magoar o Pete, converse com ele, saiam pra jantar ou dançar, só vocês dois. Sei que você jamais magoaria ele de propósito.

— Sabe?

— Claro!

— Por que você me tortura Macau?

O mais novo dar de ombros. — Porque é legal. Só estou assumindo meu papel de irmão mais novo.

— É, nossos pais disseram que ia ser fácil.

Vegas disse, se jogando sobre a cama e encarando o irmão que o fitava negando com a cabeça.

— Eles não fizeram o cálculo certo.

— Não mesmo. — ambos riram. A verdade era que eles se amavam e se entendiam, mas também viviam seus momentos de não compreensão e birras. Mas, no fim, eles sempre se apoiavam.

Macau passou o restante da manhã tentando tranquilizar o irmão. Sem êxito. Vegas até embarcava em algumas observações malucas do irmão, mas no seu íntimo, sentia certo desconforto com toda aquela situação.

Ele amava Pete. Esse sentimento era incontestável. Mas, se sentia preso no meio de uma encruzilhada e precisava de tempo para organizar tudo e conseguir seguir na direção do Saegthan sem se sentir um fracasso para sua família.

Era quase cinco da tarde quando seu telefone tocou e o nome de Pete piscou no visor. Um sorriso logo atingiu seus lábios. Mesmo apreensivo com o futuro, não conseguia negar o quanto cada pequena abertura que Pete dava, lhe fazia feliz.

— Alô!

Vegas atendeu com a voz animada, mas logo sentiu seu coração se contrair quando ouvi um fungado do outro lado da linha.

— Pete... O que aconteceu?

O Saegthan deu um longo suspiro antes de falar: — Vegas, você pode vir até o hospital?

Uma dor lancinante atingiu o coração de Vegas. Logo imaginando que algo muito ruim poderia ter acontecido com Pete ou Venice. Ele tentou perguntar mais uma vez o que estava acontecendo, mas o Saegthan não conseguia dizer mais do que as palavras anteriores.

— Chego aí em dez... não, em cinco minutos.

A ligação de encerrou e Vegas saiu às pressas, explicando rapidamente ao irmão que Pete o chamara. Omitiu que era ao hospital, no entanto. Ele nem conseguia imaginar quando foi a última vez que sentiu tanto medo em sua vida. Vários cenários ruins atingiram sua mente enquanto ele cortava os carros na avenida principal que dava acesso ao hospital e seu coração pareceu se tornar ainda menor quando leu a mensagem enviada pelo Saegthan com apenas uma curta frase: "Me encontre na emergência."

Vegas estacionou o carro atravessado e saiu correndo na direção do interior do hospital, sentindo suas pernas travarem assim que viu Pete sentado em um dos bancos com o corpo curvado para frente, os olhos fechados, cabeça baixa e a roupa completamente banhada de sangue.

O Theerapanyakul sentiu o próprio sangue congelar em suas veias. Seja lá o que tanto ele imaginou no caminho até ali, nada o preparou para aquela visão do mais velho. O Saegthan parecia destruído e nem de longe tentava desfaçar seu sofrimento. Vegas deu um passo hesitante em sua direção, quando esse erguer a cabeça e se achou preso em seu olhar. Um olhar angustiado, que fez Vegas recordar os dias que o Saegthan se encontrava deprimido por lembrar do irmão morto. Ele nunca sentiu essa dor, mas conseguia imaginar todo o medo pavoroso dentro dele.

Pete se ergueu em um salto e correu na direção de Vegas, se jogando em seus braços como se ali fosse sua âncora, e talvez fosse. Vegas o abraçou apertado, sentindo o corpo do mais velho tremer descontroladamente, assim como as lágrimas que banhavam sua camisa como um jato quente. Embora ele não fizesse ideia do que estava acontecendo, sentiu o pânico tomar sua mente.

— O que houve, meu amor? Cadê o Venice? Aconteceu alguma coisa com ele?

— Desculpa ter te ligado. — o Saegthan mal conseguia formar a frase. Vegas só entendeu o que ele falou porque estava próximo, sua voz saiu tão baixa e tão quebrada que o Theerapanyakul sentiu novamente uma contração em seu coração.

— Não se desculpe por isso, só... por favor me diz o que aconteceu?

— Chloe...

Pete fungou, então enterrou sua cabeça no peito de Vegas e perdeu o restante de controle que ainda o segurava. Ele chorou copiosamente por vários minutos, até que se sentiu anestesiado e apenas se permitiu se acalmar. Vegas permaneceu calado, apenas o abraçando e acariciando seus fios. Tentou fazer com que Pete se sentasse, mas esse negou veementemente e apenas permaneceu grudado no mais novo. Quando se sentiu calmo o suficiente, contou o que houve a Vegas.

— Minha irmã fugiu da clínica de reabilitação. Doutor Jake me ligou, mas... ela foi até nosso apartamento e... Vegas, não cheguei a tempo... ela tava descontrolada, acho que ela usou alguma droga no caminho, e queria levar o Venice com ela, disse que eu tinha roubado o filho dela e quando a Mika foi tentar impedir que ela se aproximasse do Nice, Chloe ameaçou ela com uma faca. Ela esfaqueou a Mika, Vegas. Eu não consegui impedir... eu... não cheguei a tempo.

Pete ficou em silêncio, lamentando mentalmente o ocorrido, sentindo seu corpo tremer, mas sem dar realmente importância. Sua preocupação excedia qualquer cuidado a si. Vegas ficou atônito, sem saber o que perguntar ou mesmo fazer. Ele apertou o corpo do Saegthan contra o seu, um gesto protetor e reconfortante.

— E o Venice? O que aconteceu, Pete?

— Ele está bem, a psicóloga ficou com ele. Ela pediu pra que eu tentasse me recompor antes de pegar ele. — Pete disse, um sorriso sem graça preenchendo seus lábios. Ele se sentia um inútil naquele momento. Frágil demais.

— E a sua irmã? O que houve com ela?

— O doutor Jake conseguiu contê-la. Liguei pra ele assim que recebi a chamada da Mika e chegamos quase ao mesmo tempo, no prédio. O síndico chamou a polícia e ela foi levada pra delegacia. Não sei o que acontecerá agora e nem me sinto preparado pra todas as implicações disso. Só... só queria o Venice não tivesse presenciado essa cena.

Pete sentiu uma pequena leveza ao contar, mesmo que resumidamente, o ocorrido para Vegas.

— O Venice ficou desesperado. Não parou de chorar um só minuto. Só via meu filho desesperado assim, quando tinha pesadelos. Tenho tanto medo que eles voltem a assombrar ele, Vegas.

— Calma, meu amor, não vamos pensar nisso agora. O Venice é forte como você, ele superará isso e você também.

Eles permaneceram em silêncio por um bom tempo, até Jess cruzar as portas que davam acesso à ala cirúrgica e seguir até os dois. Pete se desvencilhou parcialmente dos braços de Vegas e encarou a amiga com um ar de expectativa. Era possível notar uma sombra dolorosa sobre seus olhos, mas ela parecia tentar agir o mais neutra possível.

— Qual o estado dela, Jess? — Pete perguntou angustiado.

Ele não chegou a mencionar muito sobre Mikaela, mas Vegas deduziu que era por ela que o Saegthan se encontrava tão aflito.

— Felizmente não perfurou nenhum órgão vital, mas ela perdeu muito sangue e teve que tomar duas bolsas. Correu tudo bem na cirurgia.

Vegas sentiu o corpo de Pete relaxar contra o seu, logo em seguida, ele se desvencilhou completamente e puxou a amiga para seus braços.

— Me desculpa, Jess. — ele pediu e Vegas entendeu que sua dor não era apenas medo de algum ruim acontecer com Mikaela, mas também o de sua amiga o odiar por colocar a prima naquela situação. — E obrigado.

— Você não tem culpa de nada bobão. — Jess o conforta, se permitindo chorar, com um misto de alívio, pela prima ter saído com vida, e o medo acumulado anteriormente. — Ela vai ficar bem, é isso que importa. — ela se afasta do Saegthan e fita seu estado deplorável. Seu rosto inchado e sua roupa suja de sangue, davam a ele um ar triplamente mais desesperado do que de fato ele estava. — Agora se recomponha e vá ficar com seu filho, ele precisará do seu apoio mais do que nunca. Quando a Mika puder receber visitas te aviso. — ela dar um meio sorriso para Pete que assente, então encara Vegas a alguns poucos passos de distância. — Cuida dele.

Vegas apenas concordou em um aceno. Ela se retira da presença dos dois e Vegas guia o mais velho até o banheiro mais próximo. Ele deixa o Saegthan sozinho por alguns minutos, enquanto se dirige até seu carro e pega uma muda de roupa que sempre deixava no veículo caso ocorresse algum imprevisto. Quando retorna ao banheiro, o oncologista se encontrava chorando outra vez, logo se recompondo e se sentindo minimamente pronto para encarar o que vinha pela frente. Ele vestiu a roupa que Vegas lhe entregou, um conjunto moletom preto, e se permitiu sorrir minimamente ao notar como elas ficavam folgadas em si. Ele sentiu falta disso, sempre usava as roupas de Vegas quando dormia na sua casa quando namoravam, o que era quase que diariamente. A lembrança distante, lhe trouxe certo alívio.

Vegas segurou firme na mão do Saegthan, enquanto caminhavam pelos corredores do hospital. Os colegas de trabalho do oncologista o encaravam com um misto de pesar e carinho. Vegas notou que muitos o admiravam e sentiam orgulho dele e isso o fez feliz. Seu Pete conquistava as pessoas fosse onde fosse. Ambos seguiram pelos corredores da ala pediátrica, até parar frente a uma sala de recreação. O mais novo bate duas vezes na porta, quando percebe Pete imóvel, apenas encarando o letreiro. Sente o Saegthan tencionar o corpo contra sua palma, que se encontrava apoiando em suas costas, ao abrir a porta. Ele empurra o mais velho levemente, fazendo seus primeiros passos, duros e pesados, irem em direção ao interior daquele ambiente.

Venice se encontra encolhido no canto, evitando qualquer contato que a médica, uma mulher de aparência jovem, de cabelos ruivos e amarrados em um coque, tentava fazer. Ela parecia tentar de tudo, mas o pequeno era irredutível. Tudo mudou quando ele ouviu a voz de Pete, logo em seguida a de Vegas. Algo em seu semblante pareceu se iluminar e antes que os mais velhos pudessem falar novamente, ele se levantou do seu canto e correu até Vegas, se agarrando em suas pernas como no primeiro dia.

Ele o havia escolhido. Vegas pensou. Como ele, um cara que sempre sonhou em constituir uma família grande e feliz, poderia partir sabendo que aquele pequeno ser depositava toda confiança nele? Nem Pete e nem Venice mereciam mais sofrimento. Era isso, sua decisão estava consolidada: ou ele levaria Pete e Venice com ele, ou não iria a lugar algum.

Venice se agarrou ao pescoço de Vegas quando esse o ergueu do chão. O Theerapanyakul sentiu que o pequeno também tremia o corpinho miúdo e automaticamente acariciou suas costas, sussurrando palavras de incentivo, embora o significado dessas não conseguissem ser explicadas facilmente para uma criança. Sentiu o corpo do garoto relaxar gradualmente em seus braços e logo constatou que ele havia adormecido.

— A carga emocional que Venice sofreu foi muito grande, então é provável que ele volte a se retrair por alguns dias. — a médica continuou uma conversa profissional com Pete e abriu um sorriso na direção de Vegas quando notou o pequeno finalmente dormindo. — Quanto mais ele se sentir seguro, mas rápido a recuperação. Pete, sugiro que você tire uma folga, passe o máximo de tempo com ele, faça ele sentir que está envolto num casulo de afeto. Se possível, leve ele pra ficar em algum lugar diferente. Ele precisa entender que ficará seguro com você.

— Vou fazer o meu melhor por ele.

— Sei que sim, meu bem... ele tem sorte de ter alguém como você na vida dele. Não desanime Pete, talvez ele leve um pouco mais de tempo pra se recuperar, mas ele é forte e vai se sair bem... você também.

— Nem sei como te agradecer.

A médica sorrir de maneira doce para o Saegthan, logo em seguida para Venice nos braços de Vegas.

— Só prometa que vai cuidar dele e... de você. — a médica caminha até uma mesa no lado oposto de onde Venice se encontrava ao chegarem, e pega um cartãozinho para entregar a Pete. — Dr.ª Hedley, é uma excelente terapeuta, ela costuma trabalhar no meio familiar, aconselho que você marque uma visita ao consultório dela.

— Obrigado doutora.

Pete agradece e a médica o abraça ternamente. Vegas permaneceu em silêncio o tempo todo, mas ficou feliz de Pete ser cercado por pessoas tão preocupadas consigo.

No caminho até a recepção, Pete foi parado por um homem de meia-idade, com ar preocupado, que logo se identificou como Marcus, diretor-geral do hospital. O homem exalava afeto protetivo, como um pai. E nem mesmo esperou Pete pedir uma folga, ele simplesmente o dispensou, pedindo para que ele fosse para casa e que depois, com calma, os dois conversariam. Ele informou que deixaria uma doutora cobrindo os horários de Pete até segunda ordem e que não precisava temer uma despensa, mas sim, necessitava descansar.

Já no carro de Vegas, Pete suspirou um pouco mais aliviado. Jess havia cruzado com eles nos corredores e explicou que Mikaela havia tomado uma sequência de remédios que fariam ela dormir por algumas horas, mas Pete poderia ir vê-la pela manhã, no dia seguinte. Venice ainda dormia, agora no colo do Saegthan.

— Você veio junto na ambulância?

Pete concordou em um aceno. — Aonde estamos indo? — perguntou quando notou Vegas pegando a estrada na direção contrária ao seu trajeto habitual.

— Pro hotel. — Vegas bateu os dedos no volante, tentando reprimir as várias perguntas variadas para saber se Pete estava bem, mesmo que fosse nítido que não. — Não vou deixar você voltar pro seu apartamento, pelo menos não por enquanto.

O silêncio se apoderou do veículo por alguns minutos, até Pete se afundar um pouco mais no banco do passageiro e o encarar com um misto de sentimentos nos olhos, gratidão era um deles.

— Obrigado.

Vegas levou sua mão para segurar a do Saegthan e, sem desviar o olhar da pista, a levou até seus lábios, deixando um breve selar, como uma promessa de dias melhores e uma afirmação de que ele estava ali. Por eles.

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Olha quem apareceu antes do previsto!!!

Vejo vocês em breve, meus amores!!!

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