2.Estranheza
Algumas horas após Anúbis deixar o palácio:
Por Dália,
Não sei ao certo quando ele nutriu esse interesse, mas Anúbis foi o primeiro a reconhecer e afirmar que eu não sou uma simples deusa, por mais que meus poderes estejam debilitados ainda sou capaz de cumprir com minhas funções.
Suspirando, sai do salão, os chacais desapareceram junto a ele e uma carruagem me aguardava, obviamente que precisei ordenar que arrumassem o local, agora estou a caminho do palácio do segundo príncipe, a carruagem me levou até ele rapidamente e a gárgula de sempre me recebeu.
-- O que deseja princesa? -- Curvou-se moderadamente e devo admitir que gosto desse título, Beelzebub havia me mandado uma carta então, somente levantei o papel lhe mostrando onde queria chegar.
-- Ah sim. Siga-me por-favor, o mestre está na sala do maquinário. -- Ao ouvi-la me arrependi de estar tão bem vestida, é capaz desse tecido branco ficar todo sujo...
A gárgula que me guiou saiu, deixando a meu encargo bater na porta, eu entrei me espantando: Beelzebub estava ocupado com uma grande máquina enquanto Tesla tinha as mangas da roupa erguida e seus fios estavam bagunçados, o lápis na mão e um murmúrio de que não estava encontrando a resposta.
-- Devo voltar depois? -- Anunciei minha presença:
-- Senhorita Dália? -- Assenti -- Não-não... Fique. -- Chega a ser engraçado como ele se sente tão em casa.
-- Precisam de ajuda? -- Beelzebub não me respondeu, mas me olhou de forma estranha, o que esse deus tem?
-- Ah, sim, toda ajuda é bem-vinda. Entende de cálculo Senhorita? -- Neguei.
-- Mas posso pedir um café, que tal? E há quanto tempo estão aí sem descansar?
Tesla me olhou com as mãos na cintura encarando Beelzebub.
-- Umas duas ou três horas.
Balancei minha cabeça negativamente sorrindo.
-- Vou preparar pessoalmente, posso ajudá-lo a expandir sua capacidade mental se assim desejar. -- Os olhos de Tesla brilharam. -- Volto logo.
Por Beelzebub,
Eu não consigo dizer nada, encarar Dália me gera uma profunda confusão e um toque de raiva e frustração.
-- Deveria parar de ignorar uma dama, na verdade, nunca vi uma mulher como ela antes.
Respirei pesado.
-- Se refere a pele, cabelo ou roupas? -- Tesla é de outro lugar, então é normal que uma deusa completamente livre lhe pareça estranha.
-- Me refiro a tudo, principalmente como ela se porta, acho incrível mulheres a frente de seu tempo. Se bem que aqui não há isso, então a minha devida estranheza talvez lhe pareça comum...
Concordei.
-- Agora, caro amigo, pare de ignorar aquela dama que veio até aqui lhe ver, em meu país isso seria uma falta de cortesia e tanto. -- Lhe encarei e ele Gargalhou: -- Não acho que a senhorita Dália veio até aqui para me ver.
Desviei meu olhar, há muito o que devemos conversar e enquanto isso não ocorre não consigo vê-la diretamente, não enquanto cenas daquela noite perpetuam em minha mente com tanta clareza que chegam a me dar desgosto.
-- Ora Beelzebub cientista são destemidos e audaciosos, então pare de covardia e vá atrás dela. Fale para aquela linda senhorita que me retirei antes da hora, ainda preciso ver a minha bela dama. -- Ele desapareceu e eu simplesmente respirei fundo, ainda em vida Tesla nunca teve uma família e a bela dama ao qual se refere é uma de suas grandes invenções que está na ala norte do meu castelo, já que replicamos sua sala do Ragnarok aqui, inclusive todos os outros inventores vivem adentrando aquele lugar, parece uma convenção de cientistas infinitas e agora me pergunto onde eu estava com a cabeça por permitir isso.
Por Dália,
Eu fiz um café mediano intercalando com gotas do meu poder apenas para que ele pudesse expandir ainda mais sua capacidade, provavelmente duraria apenas algumas horas, o suficiente para completar seja lá o que estão fazendo, no momento prefiro os usar desse jeito do que pôr as mãos em seu corpo ou qualquer outro devido à parte debilitada do meu poder.
Uma dama vestida de preto e com o rosto coberto por um véu da mesma cor se aproximou.
-- Senhorita permita-me. -- Estendeu a mão para que eu lhe entregasse a bandeja.
-- Não precisa, já está pronto.
-- A senhora não precisa ter esse trabalho, sou Acácia, a governanta do castelo.
-- Então é você a responsável pelo cuidado e manutenção das gárgulas? -- Ela assentiu, suas vestes pareciam de freira, mas sua aura era claramente pesada e cruel, me lembrando a de Satã e na hora meus pensamentos ecoaram que ela deve ser uma de suas servas.
-- Você é devota dele não é? -- Olhei em seu rosto coberto. -- Não adianta mentir pra mim, abre a boca e fala ou rebobino até que me conte o que eu quero saber.
Ela respirou pesado, abaixando a cabeça e tirando o véu de seu rosto, sua pele possuía uma cicatriz que ia de um lado a outro do rosto um pouco funda, mas não lhe tirava a beleza, seu rosto entristecido e seus olhos aparentavam sem vida.
-- Sou uma espécie de escrava, sou amarrada a ele até que me liberte e isso jamais acontecerá. -- Desviou o olhar constrangido. -- Se em vida, ele era cruel ao ponto de torturar-me todas às vezes que sentia vontade, agora que está morto, meu corpo finalmente poderá descansar, mas jamais serei capaz de sumir desse lugar.
-- E o lorde Beelzebub não sabe dessas consequências, imagino. -- Ela afirmou e respirei fundo, quantos problemas o primeiro governante deve ter causado? Quantas coisas ele deve ter feito e Beelzebub sequer tem conhecimento enquanto usava seu corpo? Com tais pensamentos deixei um sorriso amigável.
-- Acácia, agora que seu senhor morreu, não deseja continuar com as funções que tem aqui? Creio que Beelzebub jamais lhe trataria mal.
O corpo dela tremeu.
-- Por mais que apresente a face serena, sempre o verei como meu carrasco.
-- Compreendo, nesse caso trabalhará para mim, ainda preciso de uma dama de companhia. -- Seus olhos se iluminaram por um segundo e depois me afastei. -- Conversarei com ele para ver como podemos livrá-la dessa maldição, agora vou levar esse café até os cavaleiros, se puder mandar que limpem a bagunça que fiz, da próxima vez serei mais organizada, sim?
Ela assentiu sorrindo para mim pela primeira vez.
-- A senhora é completamente diferente da primeira governante não há um pingo de crueldade em seu ser. -- Me aproximei ainda com a bandeja em mãos.
-- Todos somos capazes de ser cruéis e eu simplesmente escolhi renegar essa parte dentro de mim, não há necessidade nisso. -- Pisquei antes de sair e seguir até o maquinário ao abrir a porta percebi um silêncio e o lorde estava concentrado em sua leitura habitual.
-- Trouxe um café reforçado, cadê o Tesla? -- Coloquei a bandeja a sua frente.
-- Ele foi embora, segundo o próprio, precisava ver sua bela dama. -- Deixei um sorriso escapar e Beelzebub me olhou, ouso dizer que é a primeira vez desde que entrei nesse castelo. -- Não pense de maneira romântica, a bela dama de Tesla é uma super máquina a frente de seu tempo e apenas isso.
Servi duas xícaras café e fui até ele colocando-a frente e apoiei meu corpo na mesa ficando ao seu lado.
-- Bom... -- Sorvi o líquido quente. -- Se ele sente-se apaixonado pelo que faz, não vejo mal algum nisso. -- Repousei a xícara na mesa e o olhei degustar meu café com calma. -- Está bom?
Ele assentiu.
-- E o que temos para hoje? -- Me aproximei mais e com isso seu pulso esbarrou em minha coxa nua, automaticamente ele se afastou como se eu fosse algum tipo de repelente. -- Algum problema?
-- Nenhum. -- Os olhos dele vagaram pelas minhas pernas descobertas antes de desviar e notei um rubor em suas bochechas o que me fez sorrir discretamente, eu não fiz de propósito, mas gosto da reação que lhe causo, esperei que ele colocasse a xícara vazia sobre a mesa e respirasse, era possível ver a fumaça deixar seus lábios lentamente, deixei um leve afago em seu belo rosto e ele segurou em minha mão com receio.
-- Não faça isso.
-- Por quê?
Antes que ele pudesse me responder, a porta foi aberta e por ela a imperatriz passou.
-- Desculpa os interromper, mas Hades acabou com a minha paciência. -- Sorriu antes de se aproximar. -- O rei do submundo resolveu dar uma festa antes de sair de férias e já que ficaremos seis meses fora, vocês serão nossos representantes, meus parabéns pela promoção temporária! -- Ela bateu as mãos demonstrando felicidade antes de nos abraçar. -- Já mandei prepararem um quarto em nosso castelo, já que seria absurdamente cansativo lidar com todos os detalhes do inferno estando em três palácios, o escritório de Hades ficará à disposição de ambos e qualquer coisa é só nos chamar que...
-- Espera aí Sn, explica isso com calma.
Ela sorriu.
-- Não há o que explicar minha querida irmã, Beelzebub lhe instruirá e infelizmente estamos reformando os quatorze quartos daquele lugar, então só tem um disponível para os dois. -- A cara deslavada dela enquanto conta essa mentira é impressionante e o pior é olhar para Beelzebub e ver que ele acreditou. Sn sua descarada!
-- Antes que me esqueça, conto com vocês para gerir essa reforma também e a festa será no seu castelo Dália se não tiver problema algum é claro.
Balancei minha cabeça negativamente, minha irmã só pode estar brincando se acha que vou aceitar isso tão facilmente.
-- Espero que não tenha problema algum para você Beel. -- Ela sorriu angelicalmente para ele, droga! SN já o comprou pelo afeto!
-- Claro que não, minha rainha, não vejo problema algum, vai querer ajuda para o planejamento?
Ela agarrou o braço dele.
-- Vou, sim, inclusive quero que instrua Dália pessoalmente, podem passar bastante tempo juntos. -- Sn Afagou o próprio ventre antes de se despedir. -- Espero que consigam dar conta do recado.
Inflei minhas bochechas antes de desviar o olhar.
-- Quando será a festa?
-- Amanhã então se apresse irmã. -- Piscou antes de me abraçar e sussurrar para que só eu escutasse: --"Um empurrãozinho não mata, depois você me agradece."
SN saiu nos deixando confusos, Beelzebub me olhava de maneira estranha, o clima entre nós está tão confuso que eu mesmo não entendo.
-- Bom, vamos trabalhar. -- Ele afagou a própria nuca e foi então que me lembrei da governanta.
-- Espere, precisamos conversar a respeito da sua governanta.
Ele me encarou confuso.
-- Desde quando eu tenho isso? -- Ali cruzei meus braços. Não é possível que esse príncipe tenha sido tão manipulado!
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