18.O ciúme é uma certeza
Aurora me olhava com um meio sorriso, enquanto Apolo naturalmente parecia um predador.
— Imperatriz temporária, que bom vê-la — ecoou a voz de Aurora.
— Pode me chamar de princesa ou regente. Não há necessidade de um título que não me pertence — fui direta, olhando para Apolo. — Imagino que veio falar a respeito da nossa dívida.
— Dessa vez não, querida. Preciso conversar com o segundo no comando, mas quero te ver no meu palácio amanhã, se possível, para saudarmos essa questão. — Respirei tranquilamente. Não posso deixar que esse deus me desestabilize, e espero que Beelzebub não caia nessa armadilha.
— E você, Aurora?
— Apenas estou acompanhando o deus Apolo e, claro, também devo trazer a senhorita Delphine. — Não faço ideia de quem seja essa, e, no momento, não faz a menor diferença.
— Creio que o segundo príncipe os atenderá muito bem. — Afastei-me, indo até a cozinha, e me deparei com as gárgulas.
— Princesa, estamos finalizando a sobremesa. Deseja algo? — Passei a mão direita na minha nuca e depois olhei para elas, sorrindo.
— Nada. Quando estiver pronta, me avise. Estarei no banho. — Elas assentiram, e nem pensei muito antes de partir. Estou louca para relaxar um pouco.
Já no banheiro, prendi meus cabelos em um coque e afundei até os ombros na banheira quente e cheia de bolhas. Alguns pensamentos me ocorreram durante aqueles momentos na água. Como, por exemplo, o fato de que não consigo ser responsável pela minha própria felicidade, apenas pela dos outros. E sei que faz parte do meu dom e da minha sentença, além dessa maldita fraqueza, da qual Sn não pode saber.
Se minha irmã, por um minuto sequer, pensar a respeito, sei que tentará intervir nos meus planos. Mas não há o que se fazer a respeito, não é mesmo?
Fechei meus olhos, apoiando meus braços no beiral da banheira. Cada escolha é uma renúncia, e cada renúncia, uma sentença. Afinal, eu sou a deusa do Destino.
Fechei meus olhos mais uma vez, e tudo o que veio à minha mente foi a primeira vez que o príncipe sorriu para mim, assim como seus lábios e a forma como fui tão bem aceita nesse lugar que passei a chamar de lar.
— Princesa... — Batidas longínquas chamaram minha atenção aos poucos.
— Princesa... — Mais batidas, e dessa vez, balancei um pouco a cabeça.
— Diga. — Saí da banheira, secando meu corpo.
— O jantar está servido.
— Perfeito, deixe que eu mesma avise ao príncipe. Pode se retirar. — Ela apenas concordou antes de me deixar só. Tratei de me arrumar rapidamente, colocando um vestido branco, como os que costumo usar após cuidar da minha pele e pentear meus cabelos. E assim, segui pelo local, indo em direção ao escritório, passando pelos corredores lentamente, imaginando que provavelmente ficaremos sem descanso por mais algumas noites.
Abri as portas do escritório calmamente, afinal, ele pode estar em reunião.
— Espero não estar interrompendo a reunião, mas o jantar está pronto e... — Olhei para frente, incrédula. — Mas o quê?
À minha frente, o príncipe da gula tinha em seu colo uma mulher desconhecida, e nem percebi que já havia adentrado o escritório.
Por Beelzebub,
— Mas o que...? — A expressão de Dália estava retraída enquanto seu olhar se fixava na deusa em meu colo, um terrível mal-entendido.
— Não é o que você está pensando.
— Não é? — Ela parecia cada vez mais instável, sustentando um semblante irônico.
— Delphine precisava de ajuda — afirmei.
— Que tipo de ajuda é essa, Beelzebub? E desde quando você se oferece? — Esse é o ciúme de uma deusa? Dália parece que vai me matar a qualquer momento, sendo que a única que me interessa é ela.
— Consegue se ouvir?
— Alto e claro. E você ainda não respondeu à minha pergunta, senhor das moscas. — Sua voz ficou densa enquanto me encarava, mas uma risada nos interrompeu.
— Acho melhor deixar para outra hora, príncipe. Pelo visto, sua namorada não consegue se comportar.
Dália encarou a deusa com tanto ódio que não tive tempo de processar. Apenas vi seu dedo girando em posição anti-horária e ela se aproximando tão rapidamente que parecia que estávamos presos no tempo. Com um gesto simples, empurrou Delphine contra o estômago da deusa de maneira tão sutil que não pareceu nada. No entanto, ao acelerar o tempo, Delphine foi parar na parede, abrindo um buraco no local.
— Se estou na qualidade de representante do inferno, você deve se reportar a mim com os títulos adequados e não esquecer o seu lugar. Agora — Dália me olhou séria —, vou para o Egito. Anúbis pediu uma reunião a respeito das próximas dádivas para o seu povo. A ata está na sua mesa há dezesseis dias.
Revirei meus olhos. Eu realmente esqueci desse pedido.
— Não acho correto você sair assim.
— Segundo príncipe, temos trabalho a fazer. Termine o que você tem com esse ser e me deixe fazer a minha parte. Depois, irei para os domínios de Apolo e só deve me ver daqui a dois dias. — Sem esperar pela minha resposta, ela sumiu.
— Que mulher ciumenta você arrumou, hein, querido? E para completar, você é péssimo nesse lance de relacionamento. Quem é que diz: "Não é o que está pensando" ou "Ela precisava de ajuda", para uma namorada claramente com raiva? Só faltou o "Eu posso explicar!" para atestar a sua culpa. — A voz veio de Asmodeus, que estava recostado na porta do escritório.
— Peste, o que faz aqui?
— Olha, eu vou me sentir ofendido assim, e vou fazer de Leviatã meu irmão favorito. Seu grosso! Só vim trazer o presente que Dália me pediu, mas agora acho que você não a verá tão cedo... — Asmod desviou o olhar para a deusa que se levantava um pouco atordoada. — Olha, Beel, seu bom gosto foi para o caralho, né? Que mulherzinha mais... insossa.
— Asmod, saia daqui agora! — Ele revirou os olhos antes de me obedecer.
— Sua mulher é muito intransigente. — A mediadora dos titãs comentou.
— Referir-se a uma deusa maior, que atualmente está à frente do submundo, e a uma princesa como uma mulher humana é um pouco arrogante da sua parte. — Ela me encarou sorrindo, seus fios pretos caindo por seu rosto, desaguando sobre os ombros e se movendo como serpentes. Ela se levantou, arrumando as alças do vestido antes de sorrir. Seu rosto parecia muito com o de Lilith, exceto pelas marcas, uma vez que não as possuía, e os cabelos dela eram escuros, enquanto os de Lili eram prateados como as estrelas.
— Lilith ficaria feliz em saber que você seguiu em frente, principalmente pela escolha de uma deusa que claramente não esconde as emoções.
— Delphine, eu não te vejo desde a Gigantomaquia. Então, o que quer aqui?
— Não seja tão azedo. Eu vim avisar que os titãs que sobraram estão desviando forças para os portões da prisão, ou seja, estão pensando em fugir mais uma vez.
— Será que são tão irracionais ou esqueceram o que aconteceu da última vez que Hades se encarregou pessoalmente deles?
Ela sorriu ao se aproximar e tocar meus ombros.
— Ao que parece, sem Satã, alguns pararam de temer você. — E assim sumiu. No fim das contas, ela veio aqui apenas para provocar, e agora preciso falar com Dália antes que essa deusa cometa alguma loucura. Respirei pesadamente, nunca imaginei que passaria por isso, e só consegui enviar uma das gárgulas atrás dela.
Por Dália,
Meus passos estão cada vez mais pesados, e sinto meu corpo doer. Meu pai tem sido tão cruel comigo que chega a ser tenebroso o que a falta do meu poder me faz. Ao passar pelos corredores, os servos de Anúbis abaixavam a cabeça. A última porta se abriu para mim, e encarei o deus dos mortos sentado em seu trono, enquanto seus colegas de trabalho sugeriam ideias.
— Me desculpem pelo atraso. — Contive meu ímpeto de fazer uma reverência, pois, como regente atual do submundo, não devo me curvar a ninguém.
— Sei que está ocupada, mas preciso que faça algo por mim, minha rainha. — Anúbis veio até mim, segurando minha mão esquerda e beijando meus dedos.
— O que você quer? — Fui direta, e ele sorriu.
— Eu preciso que firme um tratado entre Odin e este que vos fala. — Cruzei meus braços, encarando o semblante cínico de Anúbis. Em pensar que terei que lidar com dois deuses cafajestes em um só dia. As mãos dele foram parar em minha cintura enquanto ele me olhava.
— Você está aprontando alguma coisa, Anúbis.
— Eu juro que é só coisa boa, querida. — E assim beijou minha testa antes de entrelaçar nossos dedos. — E então, o que me diz?
Respirei fundo antes de olhar em seus olhos.
— Sua sorte é que tenho muito a tratar fora do submundo. — Ele simplesmente mordeu o lábio inferior antes de me olhar lascivamente.
— Nunca te vi tão nervosinha. — Aproximou-se do meu ouvido. — E nunca estive entre suas pernas assim também. Fora que você está incrivelmente bela nesse vestido.
— Não fiz questão alguma de responder, e assim seguimos para Asgard. O rei me recebeu tranquilamente, e após uma conversa pouco amistosa, ele e Anúbis fizeram as pazes, das quais eu nem sabia que precisavam ser feitas. Depois disso, o deus dos mortos conseguiu prender minha atenção só para ele. Bebemos e comemos em meio a outros deuses egípcios, e, por fim, eu acabei ficando cansada demais para seguir até os domínios do deus do sol, repousando sobre os lençóis de algodão da cama que conheço muito bem...
Acordei sentindo um aperto em minha cintura, levantei e me espreguicei antes de seguir em frente. Anúbis estava ao meu lado, dormindo a uma distância considerável. Então, quem foi que me apertou? A resposta veio na forma de um olhar carmesim brilhante, antes de desaparecer. Apenas ajeitei meus cabelos, calcei as sandálias e parti para os domínios solares.
...
Apolo estava repousando em uma enorme cama rodeado de ninfas, todas vestidas, e mentalmente agradeci por isso.
— Finalmente a deusa do destino chegou. Pensei que não viria tão cedo. — Ele sorriu ao levantar-se, metade do corpo nu e fios perfeitamente alinhados. — Minhas queridas, continuem aqui. Tenho uma conversa séria para tratar com esta bela deusa.
Revirei os olhos.
— Só vim cumprir com minha parte. Vamos ao que interessa.
Ele olhou ao redor e tocou em meus braços; simplesmente me afastei, dando um tapa em sua mão.
— Não permiti que me tocasse, deus do sol. — Ele ficou surpreso com a minha atitude, mas sorriu como se nada tivesse acontecido.
— Posso fazê-la querer, deusa... — Pisquei sem olhar para ele, parece que nenhum deus sabe lidar com a rejeição, principalmente um deus claramente narcisista e egocêntrico como Apolo.
— Dispenso, guarde todo o seu vigor para elas. — Inclinei a cabeça para a direita, indicando as ninfas, enquanto ele sorriu. — Agora, por favor, estenda as mãos.
Ele respirou fundo, olhando para as ninfas antes de fazer o que eu pedi. Toquei em seus braços enquanto ele sorria, e mostrei a ele o que tanto queria saber. Ao me afastar lentamente, senti meu corpo vacilar um pouco em meio a uma tontura, mas permaneci de pé como se nada tivesse acontecido.
— Espera, deusa, deixe-me fazer o mesmo. — Ele sorriu de canto, como se prever o futuro fosse um desafio, embora esse não fosse o seu dom. Mesmo assim, concordei. Apolo se aproximou e alinhou meus cabelos, prendendo-os em um rabo antes de olhar nos meus olhos. Seu dedo indicador agora possuía um dedal de ouro na ponta, fina como uma agulha, e ele alisou meu braço, ferindo superficialmente em uma leve abrasão. Ele me olhou de maneira fulminante, e pude ver um brilho em seu olhar ao mesmo tempo em que o efeito surpresa. Sem esperar mais, me preparei para tocá-lo, quero entender o que ele tanto vê, mesmo que duvide de suas habilidades.
— Não, espere sua vez, querida.
Ele segurou meu pulso e, instantes depois, retirou aquela garra da minha pele.
— Que interessante... — Ele se aproximou mais, puxando meu braço, e esfregou o polegar na minha pele.
— Imagino que tenha visto algo, ou seu dom não me serve. — Fui direta, e ele sorriu, colocando uma mecha do meu cabelo atrás da orelha direita e aproximando-se dela:
— A única coisa que vejo é o caos e o desespero dentro de você, e depois disso, não há mais vida. Você vai morrer, querida. — Seu sussurro não mudou minha expressão; não é como se eu estivesse surpresa com o curto relato. No fundo, já esperava por isso.
— Então, agora que acabou, não lhe devo mais nada, deus Apolo. — Afirmei, arrumando meus cabelos e me afastando.
— Estamos completamente quites, mas... Se quiser ficar, é bem-vinda. Você parece tão cansada. — A luxúria parecia percorrer a ponta de sua língua enquanto conversávamos.
— Você é tão absurdamente ordinário quando se trata de prazer, e eu dispenso o convite. — E assim segui para fora do reino solar, sentindo que estou realmente muito cansada. No entanto, mantive-me de pé, e quanto mais me aproximo do castelo, mais distante ele parece. Até que parei um pouco, fechando meus olhos.
"Te avisei para não usar seu poder à toa. Se continuar assim, será consumida por ele. Antes de quitar sua dívida com os celestiais."
A voz veio de um tempo que parece sentir-se culpado por me enfraquecer. Por esse pensamento bobo, abri meus olhos. Seres etéreos não possuem sentimentos ou qualquer amabilidade com o próximo, apenas governam o universo com o que chamam de sabedoria.
"Seja sábia Dália, seu tempo está acabando."
Despertei de vez sentindo meu corpo levitar olhei para cima apenas ver seus cabelos escuros e os broches em seu colarinho.
— Beel...
— Não fale, Dália, apenas descanse. — Me aninhei em seu peito enquanto ele andava até o quarto ao qual estamos. Meu corpo foi posto na cama. — Descanse, depois conversamos.
O príncipe se afastou, e seu semblante estava sério, além de entristecido. Eu me sentei na cama rapidamente.
— Espera, eu estou melhor. — Me recostei na cabeceira.
— Você é tão teimosa. Custa me ouvir pelo menos uma vez? — Olhei para ele, que passou a mão pelos cabelos.
— Eu não sei o que está acontecendo, mas essa é a terceira vez em que você usa o seu poder e fica fraca. — Desviei meu olhar.
— Não se preocupe, é só um desinforme.
— Você não é uma máquina, Dália, para ter esse tipo de problema. E sei muito bem que você não vai me contar o motivo. — Apertei o tecido suavemente em minhas mãos. Eu queria ter mais tempo para desfrutar desses momentos, aprender mais e simplesmente entender o que ele sente por mim. Me levantei e caminhei em sua direção, abraçando-o. Ele respirou pesado antes de retribuir, e tudo o que fiz foi sorrir para ele antes de ficar na ponta dos pés e selar nossos lábios.
— Eu sou o destino e suas sentenças, então não se preocupe. Quando digo que tenho tudo sob controle, estou falando sério. — A mão direita dele acariciou meu rosto antes de beijar o canto dos meus lábios.
— Descanse, e quando você estiver inteira, conversaremos sobre sua "crise de ciúmes" no escritório. — Arqueei minha sobrancelha.
— Aquilo não foi uma crise, não chegou nem perto disso. — Afirmei.
— E imagino que dormir na cama de Anúbis também foi uma casualidade.
Esse deus está cada vez mais intrigante. Subi meus braços por seu abdômen até parar em seu pescoço, o enlaçando.
— Eu não lembro de ter comentado onde passei a noite, príncipe... Quer dizer que você está me espionando? — O rosto dele ficou vermelho, e mordi a parte interna da minha bochecha. — Que coisa mais feia, querido príncipe. Eu deveria te punir por isso. — Dei um sorriso de canto e, em seguida, senti um aperto em minha cintura e meu corpo ser virado de costas. Assim, fiquei colada ao seu corpo, seu braço me imobilizando. Ele riu baixo e rente à minha orelha.
— Não está se aguentando em pé e quer me provocar? Sabe, princesa, eu ainda tenho alguns afazeres, mas depois... — Ele mordeu o lóbulo da minha orelha. — Quem vai te punir sou eu.
E assim, senti o lado direito da minha bunda queimar devido a um tapa, antes de o príncipe se afastar e sair do quarto. Passei a mão pelos meus cabelos, sentindo meu coração acelerado internamente, desejando que ele volte para cumprir o que afirmou.
Não esperem por um Beelzinho fã de BDSM nessa fic, afinal ele ainda é um amorzinho. Só veremos essa pseudo-versão "dele" em Anjo caído minha próxima fic do casal que inclusive já publiquei a intro. <3
Agora assim todos os personagens da fanfic foram apresentados :)
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