Capítulo 1 - deuses

— ELE ESTÁ VINDO! — Gritara alguém da porta.

— SEGURE-O ENQUANTO PUDER! — Ordenei.

Abri o portal para o mundo, segurei a criança com mais cuidado, sentindo o peso de minha responsabilidade em minhas mãos, eu quebrei as leis, então o Destino parecia estar me punindo. Pisei em solo firme e cuidei de encontrar um lugar seguro para deixar a criança.

— Você será a nossa salvação. — Sussurrei para o bebê.

Deixei a criança para trás e segui em frente, afastando-me dali para que não houvesse chance de ele chegar perto da criança. Eu senti quando minha criação foi incendiada, meu povo morreu, senti sua dor, seu sofrimento e a destruição de tudo que eu amava.

Queria por um fim nisso, queria destruir a existência dele, mas no fundo eu sabia que não seria forte o bastante para fazer isso. O fogo queimava ao meu redor, a criação que era nosso bem mais precioso, lamentava implorando a nós por suas vidas, no entanto nada poderíamos fazer para ajuda-los.

Segui em meio ao caos que ele causara, tentando ajudar os que via em meu caminho, talvez o ódio o trouxesse a mim. Continuei andando até estar em um lugar completamente vazio, um lugar onde poderíamos travar nossa batalha sem machucar as pessoas ao nosso redor.

Observei o céu estrelado, estava uma noite belíssima e eu sabia que seria a última vez que eu veria uma noite como aquela.

— Você morrerá aqui... — Diziam as vozes sibilantes que estavam por perto, as criaturas negras.

— Eu não me importo com a morte. — Respondi num sussurro.

— Você salvou a criança... — Deduziu uma delas, criaturas astutas, esbocei um sorriso.

— A profecia poderá se cumprir. — Disse outra, virei-me para encará-las, sua beleza era assustadora, tão belas quanto cruéis.

— Que profecia? — Inquiri.

— Como isto poderia ser do seu interesse? — Alguma entre as muitas que eu via falou.

— Sua morte se aproxima...

— Sabemos que você consegue sentir isto...

O sorriso retornou ao meu rosto, meu coração martelava em meu peito e eu temia as palavras que quase me sufocavam, porém quando pensava que a partir dali eu já não teria mais uma vida, elas não foram tão difíceis de ser expostas.

— Se não partirem agora, o meu destino será tão terrível e doloroso quanto o seu. — Alertei.

As criaturas me encaravam, elas sabiam que eu lhes dizia a verdade, então desapareceram completamente de meu campo de visão. Engoli em seco e retirei o manto com capuz que ainda me encobria as feições. Minha pele escura, contrastava com os cabelos completamente brancos, meu corpo era como a noite, negro e meus cabelos como uma lua leitosa.

Encarei o nada e questionei aos meus pais, como seria após minha morte, se minha criação morreria junto comigo, suspirei quando senti a temperatura ao meu redor esquentar.

Virei-me para encará-lo, lá estava ele, exatamente como eu me recordava, os cabelos negros e os olhos vermelhos, sua pele clara agora completamente vermelha pelo calor de suas chamas, ele sorria, um genuíno e louco sorriso de alguém que estava conseguindo exatamente o que queria.

— Olá, irmã, quanto tempo se passou desde que nos vimos pela última vez? Trezentos? Quinhentos anos? — Questionou-me.

— Ignis... É uma pena ver o que você se tornou.

— O que eu me tornei? — Ele riu. — Quando, irmã, vocês quiseram ver o que eu criei? Quando deram-me a chance de mostrar-lhe que minha criação não era o pesadelo que vocês julgavam ser? Não irmã, eu não sou o monstro aqui.

— Olhe ao seu redor Ignis, você está matando pessoas inocentes... Diz que nunca apreciamos sua criação, mas quando você demonstrou qualquer respeito pela nossa?

— Eles escolheram a sua criação, deixaram Kori e eu sem qualquer reconhecimento, não somos dignos deles? Seres inferiores e insignificantes, nossas criações são muito superiores as suas e ainda assim, vocês são recompensadas. Não tente julgar o meu modo de lidar com minha fúria irmã, veja sua criação, veja a sua insignificância, seu povo clamava por misericórdia, imploravam por sua ajuda e você fugia.

— Você não viu Kori vir até aqui assassinar inocentes.

— Porque ele é um fraco! Sempre foi fraco e vocês sempre souberam disso, mas ninguém jamais quis dizer isso a ele!

— Kori sempre foi o mais sensato entre nós, sua criação era igual a ele, se ninguém soube valorizar a criação dele, os deuses são todos tolos! — Urrei.

Ignis gargalhou, como se todas as minhas palavras fossem dignas de uma piada completa. Engoli o ódio que fervia em meu corpo, ele ainda era meu irmão.

— Por favor! Ignis, vamos ser razoáveis, apenas vamos conversar e tentar resolver tudo pacificamente.

— Você teme a mim irmã! Já não adianta implorar por sua vida, morra como a criatura insignificante que sempre foi!

Ignis atacou-me, seu fogo queimando tudo ao meu redor, protegi-me de seu ataque e logo estava lançando meu poder contra o meu irmão. Senti a tristeza que aquilo causava a minha alma, meus pais jamais me perdoariam por uma batalha como esta, independente de lutar pela minha vida.

Lancei meu ataque lançando Ignis pelos ares, meu irmão se levantou rindo e abalou o chão sob meus pés, lava quente fervia ali enquanto eu saltei para longe. Nosso poder se chocou, eu queria um jeito de deixa-lo inconsciente para que eu pudesse aprisiona-lo, precisava apenas sustentar o meu poder para conseguir isto.

Nossa batalha destruía o lugar em que estávamos, eu tinha as estrelas, tinha a noite e todo poder sombrio que ela carregava, ele tinha o fogo, talvez eu não fosse forte o bastante no fim das contas.

Meu irmão lançou-me pelos ares, suas chamas acertando meu braço esquerdo, quase incapacitando-o, os deuses se curavam rapidamente, mas não quando se tratava do poder de outro deus sendo desferido contra nós. Meu corpo estava enfraquecendo, seja qual fosse o truque que Ignis colocara em suas chamas, estava consumindo o meu poder.

— O que foi Karol? Está ruim para se proteger?

— Ignis, pense um pouco, não quero machucá-lo!

— Me machucar? Não sou eu que estou levando a pior aqui irmãzinha. — Meu irmão riu.

Lancei meu ataque com cada ínfima gota de magia que ainda me restava, vi a onda de poder negro envolver o corpo do deus do fogo, por uma fração de segundo, permiti-me ter esperanças de que conseguiria vencê-lo.

No entanto, Ignis retornara do meio de meu caos de magia negra, ele lançara suas chamas contra mim e tudo em que pude pensar enquanto sentia a morte sussurrando em meus ouvidos, foi no fato de que aquela criança precisava de tempo para crescer.

As chamas encontraram meu corpo e senti-as queimando, devorando-me em corpo e essência, não havia poder divino capaz de impedir que o poder de Ignis me matasse. Então avistei a forma escura e encapuzada que abraçou-me, pondo fim a minha agonia de um corpo que sequer deveria sentir dor.

Karol estava morta, minha irmã mais poderosa perecera em minhas chamas, não haveria retorno para mim a partir dali. Aquele fora o último instante de retorno e eu segui em frente, portanto, tornei-me o deus mais poderoso do mundo.

Olhei ao redor, havia uma cratera imensa, no lugar onde minha irmã morrera, não havia o menor sinal de vida ali. Esbocei um sorriso, não haveria mais deuses no mundo além de mim.

Minha barriga doeu e caí de joelhos, estava ofegando e apoiei as mãos no chão para impedir-me de cair ao chão. Questionando-me a razão pela qual estava passando por esta situação, eu usei o pouco poder que me restava para abrir um portal para Bartolg.

Caí sobre o piso de pedras quentes do castelo e minha cortesã se aproximou correndo, eu sentia minha chama se apagando, a fêmea soube disso assim que tocou em meu rosto, ela chamou os guardas para que me levassem ao santuário.

Eu sentia o poder daquele lugar mesmo à distância, sabia que precisaria voltar logo para lá, assim conseguiria hibernar até que meu poder fosse preenchido e milha chama voltasse a queimar.

— Durma mestre. — Sussurrou a fêmea na linguagem dos dragões.

Observei o santuário, as chamas acesas e no centro dele a chama negra estava quase extinta, não precisei questionar, ou dar ordens, apenas deixei-me ser deitado no altar e fechei os olhos.

Meu coração reduziu seus batimentos ao mínimo possível, meu corpo estava relaxando, eu consegui cumprir uma parte dos meus planos, logo estaria descansando devidamente.

Meus sonhos eram normais, minha infância com os meus irmãos, Karol e Deborah estavam lá, assim como Kori, os três divertindo-se com as possibilidades de seu poder. E eu afastado deles, jamais lhes mostrei do que era capaz, sempre vivi guardando o meu poder para o dia da criação.

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