Decidi ficar com Bellamy. Podia demorar, mas quando ele acordasse, ficaria confuso, e eu queria estar com ele. Maggie a algumas horas tinha trazido um sanduíche e suco para mim, e eu pensei que depois de comer, ficaria com sono, mas eu estava ligada demais, minha mente não desligava um segundo.

— Ei — Harlan disse quando entrou no trailer e me viu — Não sabia que ainda estava aqui.

— Oi. Desculpe montar acampamento na sua enfermaria.

— Não tem problema. É bom você estar aqui quando ele acordar. Ele chamou seu nome muitas vezes.

Olhando assim para Bellamy machucado, me lembrei de Jax. Ele sofreu assim também. Eu queria que ele estivesse bem.

Pelo que Maggie me disse, ele estava bem depois do primeiro ataque. Jax era um cara durão. Ele não sofreu tanto para morrer nessa guerra. Eu não queria pensar que eu ia perder pessoas importantes, pessoas que eu amava. Eu não estava preparada para isso. Nunca estaria.

Harlan se encostou em uma das camas que tinha ali e cruzou os braços.

— Obrigado por fazer isso por ele. Sei que você sabe que ele é um dos Salvadores.

— É só o meu trabalho. Eu tento manter esse meu lado imparcial. Nem todas as pessoas fazem o que fazem por que querem.

— Você é bom. Como seu irmão — eu disse. Carson era meio ranzinza, e eu não sabia se ele era assim desde sempre ou era a convivência com Negan que o deixou assim. Talvez a segunda opção — Ele também é um ótimo médico. Salvou minha vida quando eu levei um tiro.

Esse era um momento que eu procurava não lembrar, mas que de vez em quando vinha na minha cabeça.

— É. Ele é sim — Harlan diz num tom nostálgico — Talvez quando tudo isso acabar, ele volte.

Um burburinho do lado de fora tomou nossa atenção, e um arrepio correu pelo meu corpo. Segurei a arma quando Harlan foi olhar pela pequena janela. Será que era Negan? Será que eles derrotaram Alexandria e vieram para cá? Não pode ser, não...

— É Rick. São todos eles — Harlan diz e eu corro para olhar também, enquanto guardo a arma atrás do jeans. Vi Rosita, Tara e várias outras pessoas que eu não conhecia e deviam ser de Hilltop e outras comunidades.

Saímos do trailer e o vento frio fez eu me encolher. Todos estavam se abraçando, tinha muitas pessoas, muitas mesmo. Era uma multidão que tomava grande parte do lado de dentro de Hilltop.

Vi Daryl perto de um dos trailers. Quando cheguei perto dele, ele me olhou surpreso, e eu o abracei, sem dizer nada. Depois de alguns segundos, ele passou o braço pela minha cintura, retribuindo.

— O que aconteceu com Rick? — perguntei, o soltando quando vi que Rick estava sendo amparado por Michonne, e sua camisa cheia de sangue. Eles não me viram no meio da multidão. Harlan foi até ele, e eles seguiram direto para o trailer onde Bellamy estava.

— Levou uma flechada.

— Você está bem? — perguntei, tirando seu cabelo que cobria o corte na sua bochecha. Ele concorda com um aceno de cabeça típico de Daryl.

— É você? Como está aqui? — ele perguntou. Daryl não era o tipo que demonstrava sentimento, e desde nossa última conversa em Alexandria, as coisas ficaram um pouco pesadas.

— Dwight me ajudou — disse e ele balançou a cabeça em reconhecimento.

— Onde está Jax? — perguntei e Daryl olhou para o lado. Jax estava falando com um homem de dreads, e quando olhou para mim, parou, como se eu fosse um fantasma.

Ele deixou o homem e veio andando lentamente em minha direção, como se não acreditasse no que estava vendo. Eu não me contive e corri para abraça-lo. Era estranho abraçar ele depois de tudo isso, mas era bom. Eu sentia saudades de Jax, sentia saudades de todos.

— Emma. Meu Deus... Eu estava tão preocupado — ele soltou um pouco os braços para me olhar.

Eu coloquei minhas mãos em seus ombros e olhei em seus grandes olhos azuis. Ele deu um leve sorriso, segurou meu rosto com um olhar triste e afetuoso.

— Eu estava tão preocupado... Deus, eu senti tanto sua falta — ele me abraçou de novo e beijou minha cabeça.

— Eu também. Está tudo bem agora, Dwight me ajudou — disse, me afastando para olha-lo — Por que estão todos aqui? — perguntei e vi sua expressão endurecer.

— Alexandria foi destruída. Os muros caíram, caminhantes entraram em nós tivemos que sair. É melhor ficarmos todos juntos, assim somos mais fortes.

Alexandria caiu. Céus, eu achei que isso não aconteceria.

— Ainda não acredito que você está aqui — Jax suspirou. Encarei seus olhos azuis, que se enrugaram quando ele sorriu.

— Eu vim com um amigo. Ele está machucado... Harlan cuidou dele.

Maggie apareceu com Glenn Jesus ao seu lado. Eles me deram um rápido abraço.

— Emma, você pode me ajudar a arrumar um lugar para todas as pessoas passarem a noite? — Maggie perguntou. Glenn a abraçou, pousando a mão na sua barriga, que estava dando sinal de começar aparecer.

Eu não sabia onde iríamos colocar tantas pessoas, a casa era grande, mas não tão grande, e mesmo com os trailers, ficaria apertado. Concordei e Maggie saiu com Paul e Glenn, e quando ia os seguir, Jax segurou meu braço.

— Quando terminar, quero conversar com você.

Eu sabia que essa conversa ia acontecer. Decidi encarar tudo, eu não tinha porque ter vergonha de nada.

Ajudei Maggie a instalar alguns colchões nas salas e outros cômodos. Ficaria apertado, mas era o único jeito. Indiquei os quartos as pessoas, quando vi Jax andando no corredor na minha direção.

— Você fica nesse — apontei para a porta que estávamos na frente, que era a última desse corredor — Você e Daryl.

— Podemos conversar agora? — ele pergunta, empurrando os cabelos loiros e molhados para trás.

Concordo e ele abre a porta, me deixando entrar primeiro. Sento na cama enquanto ele a fecha.

— Quero falar sobre o que aconteceu naquele dia que nos pararam na estrada — Jax diz, sentando ao meu lado. Eu via o semblante da culpa que ele ainda carregava.

Por um tempo, eu senti raiva do que ele fez, mas isso passou. Eu entendia porque ele fez e acreditei quando disse que ele tinha um plano que não funcionou. As coisas deram erradas, e ele não teve culpa. Não havia nada para perdoar.

— Jax, não. Você não precisa me explicar nada. Tudo aquilo ficou para trás.

— Não — ele passou a mão na boca — Eu quero que você me escute. Quero te contar o que aconteceu a partir do momento que você entrou naquele trailer.

Eu não queria ouvir. Ele falaria de Negan, tudo que ele fez e eu não queria saber, não queria algo a mais para me magoar, mas eu precisava ouvir. Acenei para ele ir em frente e me arrumei na cama, de frente para ele.

— Eu fiquei dois dias com eles, até que Rick mandou Sasha e Abraham nos procurar — Jax começou, e seu rosto se distorceu, me fazendo questionar se era uma boa ideia ir em frente com essa conversa — Eles pegaram os dois também, e os fizeram chamar Rick no rádio para ele ir até nós.

— Eles nos colocaram em fila, de joelhos, até que Negan apareceu. Ele fez todo um discurso, ameaçando nos matar e machucar você caso nós não trabalhássemos para ele, até que Abraham foi pra cima, e aquele cara que nos parou na estrada atirou na cabeça dele.

Simon. Aquele desgraçado. Eu esperava que ele morresse da pior maneira possível.

— Eu acho que foi melhor assim do que da outra forma que ele provavelmente morreria — Jax divagou. Lucille.

— Negan achou que não era o suficiente, ele pensou que o Rick estava o enfrentando ainda, então ele amarrou um cinto no braço do Carl e o deitou no chão, e disse para o Rick cortar a mão dele. O Rick se desesperou tanto ao ponto de ceder, ele foi tão humilhado que ele cedeu.

Meu Deus. A cada coisa que saia da boca de Jax me fazia questionar se tudo o que tive com Negan não passava de um sonho ou alucinação criada pela minha cabeça. Não era possível Negan ser tão frio e doente assim, e comigo ser totalmente diferente.

— Eu... sinto muito — segurei sua mão e Jax a cobriu com a dele.

— Ele transformou Sasha em caminhante e entregou a nós. Achamos que ela ainda era a Sasha, mas quando tirei o saco que cobria sua cabeça, ela quase me mordeu.

Eu achei que Negan havia a matado, realmente a matado, mas claro que não seria tão fácil assim.

— Não concordo e nunca vou entender você ter estado com ele, mas quero que veja o que ele fez com nós — Jax olhava para nossas mãos enquanto falava — Então, independente do que acontecer, fomos nós que começamos, e vamos ser nós que vamos terminar.

De qualquer maneira, eu ia sentir dor, independente do lado que ganhasse. Pessoas iam morrer, muitas delas.

— Eu sobre o que aconteceu aquele dia — Jax continuou — Eu não espero que me perdoe. Eu fiz o que achei que tinha que fazer para mantê-la segura. Só quero que saiba o que desde que você se foi, eu não deixei de pensar em você. Tudo o que eu fiz até agora foi para te trazer de volta.

Fechei os olhos e deixei as lágrimas descerem. Quando os abri, Jax me olhava tenso. Eu não era alguém que chorava, Jax até brincava dizendo que eu era de pedra. Mas agora eu não era mais dura, e eu odiava me sentir assim fraca.

— Eu sei... Estou aqui agora — sequei meu rosto com a manga da camisa.

— O ele fez quando soube? — Jax perguntou, passando os dedos sobre o o machucado da minha testa — Foi ele quem...

— Não. Ele não me bateu. Ele não me machucou... assim — eu respirei fundo. As feridas dentro de mim doíam mais do que qualquer machucado físico.

— O que você quer dizer? Ele forçou você...

—- Não! — minha voz saiu elevada, demais para uma conversa pacífica e eu me levantei — Ele nunca faria isso.

— Você ainda o defende? — Jax perguntou, exasperado — Eu sei que ele trancou você. Dwight disse.

— É, ele fez isso. Mas não quero falar disso — eu comecei a me afastar, e o ouvi me seguir.

— Você sabe por que eu tenho feito tudo isso? Sabe o que você é para mim? — a dor em sua voz era gritante, e eu parei onde estava — Tem alguma ideia do que diabos eu vivo todos os dias?

Ele ficou em silêncio e eu me virei para olhar para ele. Eu podia ver as lágrimas rolando lentamente pelo seu rosto, nublando o azul bonito de seus olhos. Ele adiantou-se e enxugou-as para longe.

— Eu vivo em um inferno constante. Tem sido assim desde o dia em que você partiu. Então, quando soube que estava com ele, foi como acordar de um pesadelo todos os dias.

— Me desculpe — pedi. Nada que eu dissesse faria diminuir a dor dele. Ele disse que me amava, mas eu não podia retribuir, nem antes nem agora.

— Eu achei que você estava com ele para nos ajudar, mas...

— Eu o amo — eu o interrompi. Queria deixar tudo claro, Jax merecia isso, tinha o direito de saber por mim. Seu rosto desgostoso era o suficiente para eu parar de falar, mas eu continuei — Mas mesmo o amando, eu não fechei os olhos para as coisas que ele faz. Por isso que eu ajudei vocês. Não fale comigo como se eu tivesse ignorado vocês enquanto estive lá. Cada segundo que eu estive com ele eu tentei fazê-lo mudar. Mas eu não consegui.

Jax olhou para o chão, tentando assimilar o que eu disse. A lista de pessoas que eu magoava só crescia.

— Não espero que você entenda. Não posso pedir isso — sentei na cama e apoiei a cabeça entre as mãos.

— Emma — senti sua mão nas minhas costas. Levantei meu olhar para encontrar o dele.

— Eu estou bem — menti — Eu só preciso dormir. Eu não durmo a dias — passo minhas mãos geladas no rosto, espantando qualquer resquício de choro.

— Tudo bem — Jax esfregou meus braços. Eu precisava disso, de alguém dizendo que tudo ia ficar bem, mesmo eu sabendo que não ia — Vamos deitar.

— Daryl vai dividir o quarto com você — disse me levantando.

— Ele quer ficar nos muros. Fique aqui — ele pede.

Bellamy não acordaria hoje, e eu precisava dormir, nem que fosse alguns minutos. Deitei, suspirando ao afundar a cabeça no travesseiro. Puxei o cobertor e Jax fez o mesmo. A noite estava fria, eram as primeiras semanas do inverno.

— Vem cá — Jax me puxou para perto, e eu encostei minha cabeça no seu ombro.

Fechei os olhos, enquanto seus dedos deslizam pelo meu cabelo. Eu devia me sentir em casa com Jax, mas eu não consigo. A única pessoa que me faz sentir assim é aquela que eu preciso me afastar.

Um capítulo inteiro Emma+Jax, o que acharam?

Beijosss