Capítulo 25
Hoje.
Hoje era o dia que Jesus disse que buscaria a planta que eu fiz. Eu havia passado os últimos dias prestando mais atenção no movimento daqui, observando as pessoas, vendo como tudo funciona. Não que antes eu não observasse, mas agora era por uma causa maior. Eu não podia contar com Jasper — ele não falava comigo desde que descobriu. Mal sabe ele que não precisa mais se preocupar, já que fui lindamente descartada.
Eu tentava não pensar nisso, afinal não me ajudaria em nada. Eu nunca quis ter um relacionamento serio com ninguém, eu conheci vários caras na faculdade, mas era só isso: sexo. E eu levava muito bem, sem me importar. O que eu não entendia era por que dessa vez meus miolos estavam fritando. Eu tinha um dedo podre para escolher homens, já me conformei.
Eu estava com os nervos eletrocutados, principalmente porque eu já estava aqui do lado de fora esperando para ir a Alexandria.
Eu estava em frente a cerca onde havia alguns caminhantes, enquanto as pessoas ao redor arrumavam tudo para logo partir. Eu tinha acordado cedo, conversado com Dwight e visto Jasper sair com alguns homens para fora.
— Perdeu alguma coisa aqui, boneca? — ouvi aquela voz que eu conhecia como o dorso da mão. O arrepio gelado na minha espinha subiu automaticamente, junto com as lembranças. Engoli tudo antes de virar para ele.
Negan estava com Lucille no ombro, com aquele sorriso que queria dizer: hoje vou ferrar com a sua vida.
— Hoje é o dia de ir a Alexandria — minha resposta soa quase como uma pergunta.
— Ah, que merda — ele deu um tapa na própria testa — Eu esqueci de avisar. Você não vai mais a Alexandria.
Eu mantive a mesma expressão. Eu esperava que ele fosse fazer algo assim, e depois de tudo, até que não foi a pior das coisas que ele poderia fazer.
— Tudo bem — eu concordo, assentindo brevemente com a cabeça.
— Sério? Nada a dizer? — ele ri, passando a língua no lábio, me fazendo acompanhar o movimento mesmo que involuntariamente.
Eu odiava isso, mesmo depois de tudo eu ainda me sentir atraída. Isso deve ser um desequilíbrio químico no meu cérebro causado pelo sexo incrível. Sexo incrível. Sério, Emma? Afasto o pensamento e foco nele que ainda está me olhando, parecendo intrigado.
— Nada que possa importar — respondi calmamente.
Ele me olhou com confusão estampada no rosto, e isso me fez rir por dentro. Eu sempre o questionava, sempre tinha algo para rebater. Mas desde a nossa última conversa, eu decidi que iria abaixar a bola. E isso o deixou frustrado.
Se eu achava que o motivo de ele nunca ter me machucado era porque ele tinha alguma consideração por mim, isso foi bem explicado na última vez que nos falamos. Não havia mais nada. Nunca houve.
Eu não queria me machucar, não queria que Jasper se machucasse. Eu não conhecia ele como pensei, então não sabia o que esperar. Eu apenas ia acatar o que era dito e tentar viver o melhor possível aqui.
Talvez vendo que eu o obedecia como os outros, ele me deixaria em paz. Eu estava tão exausta de viver assim. Era isso que eu queria. Paz. Ele me fez de idiota, mentiu para mim. Ou talvez eu tenha me feito de idiota acreditando nele. Ou ainda estou sendo.
Mas de alguma forma isso ia acabar. Eu havia feito o que Jesus pediu para mim, eles logo teriam uma noção do lugar e de quantas pessoas havia aqui. Eu sei que levaria um tempo até eles se organizarem e formularem um plano sem Negan descobrir, ainda mais quando eles não tinham nem armas. Mas ia acontecer.
Um longo silêncio caiu sobre nós, tornando nosso contato visual quase insuportável combinado à tensão pesada no ar.
— É disso que eu gosto. Colaboração — ele dá duas batidas com o taco no chão.
— Senhor, estamos prontos para partir — um homem de cabelos castanhos amarrados em um rabo de cavalo diz. Negan continua olhando para mim, e parecia que todo meu autocontrole era sugado por aqueles olhos castanhos.
— Vamos chutar a bunda de alguns filhos da puta — ele fala antes de sair assoviando com Lucille no ombro.
* * *
Já era fim do almoço quando Bellamy sentou comigo. Lauren já tinha ido, e Jasper só me olhava de longe. Nos dois éramos teimosos, mas eu sabia que uma hora ou outra alguém ia ceder.
— Soube o que aconteceu aquele dia — ele aponta para meu rosto — Até que não está tão ruim.
Comparado aos outros dias, até que não estava péssimo. Estava meio verde, meio roxo, mas o hematoma havia clareado bem.
— Obrigada pela mentira — eu rio.
— Quando falaram que você brigou com Arat, eu pensei que veria você numa cadeira de rodas. Mas disseram que você derrubou ela — a surpresa na sua voz é tanta que eu não consigo não rir.
— Foi só sorte.
— Não em uma briga. Nunca se vence uma briga por sorte.
— Talvez eu tenha talentos escondidos, vai saber.
— Então você é uma boa lutadora. O que mais você esconde que eu não sei? — ele cruza os braços sobre a mesa, se inclinado um pouco para frente.
Muita coisa.
— Então, você sumiu esses dias todos — eu comento, querendo mudar de assunto.
— Estive fora, tentando encontrar algumas peças para arrumar as placas solares com defeito.
— Ainda? — eu pergunto e ele ri, e eu quero enfiar minha cara no chão — Não que eu esteja dizendo que você está demorando pra fazer o seu trabalho.
— É difícil, mas hoje à noite antes do sol cair vou de novo. Achei um lugar. Fica um pouco longe, mas vai valer a pena se eu encontrar o que eu preciso.
— Jasper vai com você?
— Não. Eu gosto de fazer as coisas sozinho. Sou meio solitário — ele dá os ombros.
A verdade era que Bellamy não parecia como os homens daqui. Ele era legal demais e não um babaca-escroto-machista. Ele me lembrava como Jasper era antes de vir para cá. Agora Jasper me lembrava Negan.
— Aconteceu alguma coisa? — ele pergunta e eu percebo que eu estava divagando. Eu nego com um movimento de cabeça.
— Eu entendo você. As vezes ficar sozinho é melhor mesmo.
Um homem assovia e faz sinal para Bellamy.
— Espero te ver antes de ir — ele pisca pra mim antes de sair.
* * *
Os caminhões entraram pelos portões logo após o meio dia, o que me fez ficar aflita porque o normal eram voltar no meio da tarde. Como eu ia encontrar com Jesus durante o dia? Isso era arriscado demais. Mais arriscado do que já era.
Eu estava na horta, ajudando, realmente ajudando, já que não ganharia pontos porque hoje eu iria a Alexandria. Mas eu não conseguia ficar parada, não com minha cabeça a mil como estava. Vejo Dwight pular do caminhão.
— Oi, D. Deu tudo certo? — pergunto quando chego perto dele, guardando as luvas de jardinagem no bolso de trás do jeans. Eu não esperava que ele falasse se alguém morreu, mas eu estava torcendo para que não.
— Sempre da tudo certo — ele ri e eu respiro aliviada. Dwight não sabia fingir sentimentos, e se tivesse acontecido algo, daria para ver. Vejo Negan caminhando na nossa direção, olhando para Dwight e depois para mim.
— Tirem todas essas merdas do caminhão. Quero um inventário do que veio hoje — ele manda. Dwight assente e sai na mesma hora. Eu fico vendo Dwight andando para longe, porque qualquer coisa é melhor do que encarar Negan.
Barulhos de tiros ecoaram e eu vi um homem cair perto de mim antes de ser empurrada para o chão, com Negan em cima de mim.
— Você está bem? — ele sussurrou para mim — Acertou você?
Eu neguei. Seus olhos ficaram brilhantes enquanto ele corria o olhar ao redor, procurando de onde veio. Eu podia sentir seu coração batendo contra mim. Ouve mais alguns disparos antes de Negan se levantar me puxando pra cima com ele. Ele correu os olhos pelo meu corpo com preocupação antes de voltar a sua postura rígida e séria.
Foi quando vi Carl, deitado no chão com Dwight apontando uma metralhadora para ele. Se meu sangue ferveu com a adrenalina de alguns segundos atrás, agora ele havia congelado nas veias. Negan foi até eles, assoviando.
— Porra, você é adorável — disse rindo, enquanto Carl olhava com um olhar feroz para ele — Mas não vou mentir, você me assustou pra caralho.
— Dwight, solta ele — Dwight saiu de cima de Carl depois de tirar a faca que ele tinha no cinto — Isso é jeito de tratar o nosso novo convidado?
Como a situação estava controlada, todos se dispersaram e ficaram poucas pessoas ali, vendo a cena — provavelmente porque já sabiam como ia terminar. Eu estava estaqueada no lugar, imaginando as formas que Negan escolheria para matar Carl já que ele metralhou dois de seus homens.
— Vem garoto, eu vou te mostrar o lugar — Negan estende a mão para Carl levantar do chão, mas ele continua do mesmo jeito, o olhando com ódio.
— Sabe, você tem o mesmo maldito olhar de raiva do seu pai, só que pela metade, porque sabe, você não tem um olho.
Carl desvia o olhar. Eu tento com todas as minhas forças acreditar que Negan não vai machuca-lo, mas é meio improvável depois do que ele fez. O que esse garoto tem na cabeça?
— Você não vai mesmo pegar a minha mão? Porque você tem sorte de ainda ter uma — Negan vocifera e isso parece trazer Carl para a realidade e ele pega sua mão, levantando do chão.
— Mudança de planos, vamos queimar os mortos e descarregar o caminhão depois — Negan avisa e as poucas pessoas restantes pegam os corpos e levam embora.
Eu caminho para perto deles, meio hesitante sobre o que fazer. Acho que a ficha ainda não caiu que Carl entrou no Santuário e metralhou os homens de Negan. Será que Jesus sabia disso? Será que era uma distração? Não, Rick não usaria Carl para isso.
— O que vai fazer comigo? — Carl pergunta, o encarando. Quando ele percebe que eu estou perto, ele foca sua atenção em mim.
— Primeiro, não estrague a imagem que eu tenho de você. Você é foda pra caralho, não tem medo de nada, não tem medo de mim. Parece até alguém que eu conheço — Negan pisca para mim — Que eu conheço muito bem.
— Não machuca ele, por favor — eu disse as últimas palavras baixo, e isso pareceu diverti-lo. Carl me encarava com uma expressão séria, como se não entendesse a conversa.
— Em segundo lugar, para caso queira saber, nós vamos ter uma conversa, de homem para homem, não é, Carl? — Negan passa o braço pelos ombros de Carl — Meninas não estão convidadas.
Eu fico olhando enquanto eles sobem as escadas, entrando no Santuário. Mesmo estando calor, minhas mãos estavam geladas e suadas. Além da preocupação sobre o que ele faria com Carl, eu não conseguia esquecer em como ele se jogou em cima de mim quando começaram os tiros, em como ele olhou preocupado para mim quando levantou.
Merda, isso está queimando o resto de sanidade que eu tenho. Eu prefiro pensar que ele tropeçou e caiu em cima de mim.
* * *
— Você tem que parar com isso. Não basta dizer: oi Emma, eu estou aqui?
Eu pergunto depois de Jesus me puxar para o mesmo galpão em que conversamos da última vez. Eu estava andando em redor do Santuário esperando encontra-lo.
— Não tenho muitas opções — ele se defende, um sorriso fraco no rosto.
— Você sabia que Carl viria?
— Não. Quando vi ele já estava no caminhão. O que vão fazer com ele? — ele pergunta, preocupado. Carl era realmente um adolescente inconsequente.
— Não sei. Negan pode fazer qualquer coisa. Eu não quero nem pensar.
Eu não queria pensar que ele machucaria Carl porque mesmo que ele tenha matado pessoas ele ainda era uma criança.
— Eu vi o tiroteio. Vi quando Negan se jogou em cima de você. Se você tá fazendo qualquer coisa que não quer só para conseguir informações, quero que saiba que não precisa.
— Do que você está falando?
— Ele não é o tipo de cara que defende as pessoas, Emma. Mas ele defendeu você.
As outras pessoas que estavam ao redor com certeza não perceberam, porque estavam mais ocupadas em salvar o próprio traseiro. Mas isso só confirmou o que eu pensei. Negan tinha me defendido.
— Eu não sei onde você quer chegar com isso — eu tiro as folhas do cano da minha bota, o melhor lugar onde eu achei para esconde-las — Aqui está o que eu fiz. A planta e uma média de quantos homens têm aqui. Ainda vou dar um jeito de descobrir sobre a localização dos outros postos.
Ele pega os papeis e enfia no bolso de dentro do casaco.
— Porque não foi a Alexandria hoje?
— Não consegui ir. Talvez eu vá na próxima semana - menti. Ele assentiu.
— Como esta Maggie? E o bebê? — pergunto. É claro que eu me preocupava com todos, mas Maggie tinha se tornado uma amiga no tempo que estive lá.
— Bem. Maggie decidiu ficar em Hilltop até ganhar o bebê.
Não consigo não sorrir. Era melhor ela ficar longe dessa loucura toda. Provavelmente Glenn voltaria para Alexandria para ajudar Rick com tudo. Céus, eu só queria que todos ficassem bem.
— Qual seu nome de verdade? Cada vez que te chamo de Jesus sinto que estou perto de conhece-lo de verdade.
— Paul. Pode me chamar de Paul se preferir.
— Ok, Paul. Você deve ir agora — eu digo. Por mais que eu quisesse ficar e conversar, isso era arriscado, era praticamente insano estarmos aqui, fazendo isso debaixo do nariz de Negan.
— Até semana que vem — ele some da minha vista no segundo seguinte.
* * *
Carl desceu sem o curativo no olho, apenas o cabelo cobrindo. Ele não estava machucado, mas parecia ter chorado. Carl sempre tinha a mesma expressão de raiva no rosto, então era difícil saber exatamente o que ele estava sentindo.
Eu não sabia o que tinha acontecido lá, mas ele estando inteiro e sem nenhum membro faltando já me deixava aliviada. Negan não parecia a ponto de matar, então me arrisquei a chegar perto.
— Você está bem? — eu pergunto, tocando no braço dele. Só nessa hora sinto que estou tremendo. Ele concorda com a cabeça, sem falar.
— Não se preocupe. Eu não fui duro com ele, embora como você sabe, eu seja bastante duro — eu revirei os olhos, desviando o olhar. Embora Carl seja uma criança, acho que ele conseguiu entender a frase. Negan riu, apertando os ombros de Carl.
— Ok, hora de ir. Vou entregar o serial killer aqui sã e salvo para o papai Rick.
* * *
Já era noite quando vi Dwight. Eu estava saindo do meu quarto, a maioria das pessoas também já estavam nos seus quartos. Se Dwight estava aqui, queria dizer que Negan também havia chegado.
— Antes que você pergunte, sim, todos vivos — ele fala rolando os olhos de brincadeira.
— Obrigada. Por isso que você não é um filho da puta como os outros — dou um soquinho no braço dele. Mesmo brincando, minha cabeça não parava de trabalhar, pensando em como eu conseguiria mais informações, e o mais importante, como faria sem ninguém desconfiar.
— O que vai fazer agora? — ele pergunta, e eu levanto minha garrafa de água vazia.
— Indo na cozinha pegar água.
— Bom, boa noite, então — ele se despede, caminhando para seu quarto.
— Sabia que ia te ver antes de sair — ouço a voz de Bellamy atrás de mim. A cozinha estava silenciosa, e eu dei um pulo de susto — Desculpa, não queria assustar você.
— Você fala como se estivesse se despedindo para sempre — eu faço uma careta. Ele se encosta na pia, cruzando os braços.
— Talvez. Nunca se sabe se vamos voltar ou não — ele responde dando um suspiro teatral, me fazendo rir.
— Para com isso. Esses músculos não servem só para encantar as meninas — eu disparo e quando ele abre a boca para falar, eu emendo outra pergunta — Você está indo agora?
Ele confirma, arrumando os cabelos molhados.
— Posso ir com você? — pergunto e vejo Bellamy arregalar os olhos. Ele não esperava por isso, nem eu para falar a verdade. Mas um tempo fora dessas paredes cinzas soava muito bem.
— Claro — ele concorda rapidamente, se desencostando da pia e se endireitando — Mas isso não vai contar como pontos, e vamos ficar fora por uns dois dias.
A cota de coisas ruins que podiam acontecer já aconteceram, então uns dias fora fariam bem para minha cabeça que parecia ter sido colocada em um liquidificador em potência máxima. E qualquer coisa que me afastasse das frases sarcásticas de Negan parecia um oásis.
— Não tem problema. Isso parece bom. Não vou incomodar você, garoto solitário? — eu perguntei com uma sobrancelha levantada. Ele disse que não gostava de sair em grupo, mas duas pessoas não são um grupo. E eu não pediria isso se eu não precisasse realmente esvaziar a mente matando alguns caminhantes.
— De jeito nenhum — ele responde num tom totalmente satisfeito — Consegue arrumar suas coisas rápido? Estamos saindo em dez minutos.
— Vou só pegar minha mochila — digo saindo da cozinha.
Jogo o que preciso dentro da mochila e passo no quarto de Lauren avisando. Mesmo que Jasper estivesse bravo comigo, se eu desaparecesse sem avisar ele enlouqueceria.
Quando saio, vejo Bellamy parado perto de um carro conversando com um cara, que era um dos que eu derrotei no pôquer no dia da briga com Arat. Antes de eu chegar ele sobe em um dos postos de vigia.
— Pronta? — Bellamy pergunta, quando eu paro ao lado da porta do passageiro.
— Sempre estou — ele balança a cabeça, olhando para o chão e rindo.
Quando saímos pelos portões, parece que mil quilos foram retirados dos meus ombros. Tchau problemas. Pelo menos por dois dias. Sair desses portões era arriscado, assim como respirar era arriscado hoje em dia. Tirando isso, nada de ruim poderia acontecer — não mais ruim do que já aconteceu.
O que vai acontecer durante e depois dessa saidinha da Emma com o Bellamy?
Espero que tenham gostado, beijos!!!
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