Cap 87. O que os olhos veem e o coração sente

Apesar de ter me envolvido com Taylor, a minha prioridade não era ele ou a nossa relação, a qual já havia deixado claro que, de maneira sólida, não existia. Sabia que ele ficara chateado com a minha decisão, eu mesma não estava satisfeita com a situação mal desenrolada, mas ficar sem compromisso era o que dava para fazer.

O certo era eu não ter me rendido, não enquanto ainda houvesse o mínimo de chance de voltar para Nathan, porém, como humana, era passível de errar. Não pretendia, portanto, ficar me culpando por ter beijado a boca e chupado o pau do meu ex, quando por muitos dias ele tentara de todas as formas ficar por perto e me fazer ceder. Havia o beijado e chupado, sim, e tinha sido bom. Se o nosso rolo não evoluísse para nada além nos próximos dias ou depois, paciência.

Existia a chance de que no final das contas eu e Taylor ficássemos juntos, porém, naquele momento, a chance era bem maior para Nathan.

Era nisso em que eu pensava dentro do táxi a caminho da Wishes, na manhã de segunda-feira.

*****

Fui diretamente para a recepção quando o taxista me deixou no final da ladeira perto do prédio principal da clínica, gelada e respirando fundo, pois, mesmo decidida a encontrar Nathan, eu não sabia bem o que lhe falar. Não havia discurso pronto ou suposições sobre o quão forte ou fraco meu coração bateria em sua presença. Teria mesmo que pagar para ver.

— Bom dia — cumprimentei o rapaz atrás do balcão da recepção, retirando os óculos escuros. — Eu vim falar com o Dr. Smith. Nathan. — Frisei o nome, para ele não pensar que me referia a Simon.

— O Dr. Nathan Smith não está atendendo no momento. A senhorita tinha alguma consulta agendada? Nós avisamos a todos os pacientes...

— Não — interrompi-o. — Na verdade, eu vim para falar com ele... na visita — sussurrei, tentando ser discreta, mas deixando claro que sabia da situação na qual um dos donos da clínica se encontrava. — Vi no site os horários de visitação. Talvez eu tenha chegado um pouco cedo.

— Seu nome?

— Isabelle Lopes Ferreira.

O recepcionista solicitou o meu documento de identificação e me pediu para aguardar na área de espera ou na varanda logo em frente, explicando-me que a visita começaria a partir das 10. No entanto, como já havia duas pessoas agendadas previamente — o limite de visitas por paciente por dia —, ele precisaria checar se autorizariam a liberação de mais uma.

— Quem precisa liberar? Nathan é o dono. Não torna tudo mais fácil?

— São as normas, senhorita. Se abrirmos um precedente para um paciente...

— Hum. Entendi. — Bufei, de acordo com o argumento. Nathan, como um dos responsáveis pela clínica, precisava dar o exemplo. — Vou aguardar ali.

Enquanto esperava a resposta, impaciente, sentada em um dos sofás em frente a recepção, tentando me concentrar em um folheto explicativo sobre transtornos psiquiátricos, vi quando a senhora Nancy chegou ao recinto acompanhada da deusa loira de meus pesadelos. Nada mais nada menos que Gigi Robins em carne, osso e cabelo de cuia. Recoloquei os óculos escuros, como se eles pudessem me dar algum poder de camuflagem, e fui imediatamente para a varanda. Ficaria escondida até que elas passassem pela recepção e fossem para qualquer outro lugar, dando-me a chance de sair dali — e da clínica — de fininho.

Ficou muito claro que eu sobrava na Wishes e que a ideia de fazer uma visita surpresa fora tremendamente idiota. Se Gigi e Nancy estavam tão próximas a ponto de chegarem juntinhas para a visita, só poderia significar uma coisa: Nathan e a estilista prodígio pretendiam se acertar e Nancy fazia muito gosto. Obviamente. Depois de nossa separação a senhora Smith deve ter dado graças a Deus que seu filho ficara livre para alguém melhor. Poderia apostar que sim. Provavelmente tinta até feito um jantar comemorativo. Merda, merda. Até que ponto sua bondade comigo não fora mero teatro?

Ah, Deus, quanta humilhação!

Depois de cumprimentarem os funcionários com sorrisos e adeusinhos, simpáticas, as duas passaram da recepção para as escadas que levavam ao andar superior. Aproveitei o campo livre para sair da toca e pegar o meu documento no balcão.

— Obrigada pela ajuda, mas preciso ir. Não precisa dizer ao Dr. Smith que estive aqui. Eu... eu... volto outro dia.

Claro que eu não voltaria. Encontrava-me pronta para fazer o caminho de volta para West Hollywood, torcendo para que um caminhão se chocasse de frente com o meu táxi e acabasse de vez com a minha agonia.

Tentei pensar que a presença das peruas na clínica era apenas uma visita de mãe e amiga, tentei pensar que, talvez, Nathan nem ficasse tão feliz com a visita de Gigi. Porém pensei, também, que provavelmente as duas vinham o visitando desde o início da internação e que ele esperava ansioso por aqueles dias. Todas as segundas, quartas e sextas, dias de visita, deviam ser especiais para ele, com a presença ilustríssima de sua ex-noiva famosa.

O que foi que ele me pedira na mensagem de áudio? Para esperar a internação acabar, pois no final entraria em contato. Em nenhum momento falou para eu visitá-lo durante o tratamento. Bem feito, Isabelle, bem feito por ser afoita, burra, e não esperar o tempo das coisas.

Cheguei ao condomínio chorando, enfiei-me no quarto e lá fiquei o resto do dia, ouvindo a mensagem de Nathan várias vezes, chamando-o de cachorro e outros nomes não tão bonitos a cada "eu te amo" pronunciado. Por que ele criara expectativa em mim mandando aquela mensagem? Por que, meu Deus? Isso não era certo, não fazia o menor sentido.

Foi um golpe terrível o choque de realidade na Wishes. A ideia era visitar o meu ex, conversar sobre nós dois e, também, falar sobre a possibilidade de me consultar com a Dr. Miwa. No entanto, saíra de lá sem uma coisa nem outra e com um inferno criado na cabeça.

*****

A carência bateu forte depois de me sentir rejeitada por Nathan, mas nem por isso corri para os braços de Taylor.

Naquele mesmo dia ele foi me procurar, na parte da tarde, mas eu sequer abri a porta. Não estava a fim de olhar para a sua cara e muito menos de conversar. Taylor me perguntaria o porquê das lágrimas. E eu falaria o quê? Já estava cansada de inventar desculpas para o meu constante desânimo e não queria que ele olhasse para os meus braços e visse ainda mais marcas.

E... dará tudo certo, porque... porque eu te amo e... eu sei que... eu quero que as coisas se ajeitem. E você também quer. É só uma fase ruim e vai passar. Em breve, quando eu voltar para casa, entrarei em contato novamente. Espere por mim... Eu te amo.

À noite ouvi pela milionésima vez o áudio de Nathan e, já mais calma, pude raciocinar melhor. Bem, talvez ele tivesse sido sincero ao dizer que queria que as coisas se ajeitassem, talvez existisse realmente um propósito para me pedir que o esperasse. Talvez ele me amasse de verdade. Talvez a visita de Gigi tivesse sido a primeira, talvez a única e por iniciativa dela, talvez ela e Nancy tivessem se esbarrado na entrada, sem querer... Talvez muitas coisas.

Tentaria fazer o jogo do contente, para que conseguisse sobreviver ao resto dos dias, até a próxima segunda, quando Nathan provavelmente deixaria a clínica e, conforme o prometido, entraria em contato. Teríamos muito que conversar, e não estava a fim de parecer uma louca desconfiada e insegura, mesmo que de fato eu me encaixasse nas duas definições.

*****

No dia seguinte, Taylor me chamou para ir com ele até a obra, e como não queria ser indelicada de negar o mesmo convite mais uma vez e me pareceu ser um passeio despretensioso, vesti um jeans, camiseta, tênis, e fui caminhado com ele para lá.

— Não quis insistir ontem, pois percebi que não estava em condições de falar, mas... o que foi que aconteceu? — Taylor, cedo demais, iniciou o processo de me dissecar.

— Não é que eu não estivesse em condições de falar, é que, algumas vezes, não sinto vontade de me abrir mesmo.

— No domingo você disse que tinhas coisas para resolver na segunda, e disse, também, que procuraria um psicólogo...

— Se vai matar sua curiosidade; não resolvi nada. — Nem o deixei terminar de falar. — Arrumar soluções não é comigo. Euzinha aqui só arranjo mais problemas. E a culpa disso, muitas vezes, é da minha impulsividade.

Taylor soltou um suspiro pesado, e levou um tempo até que ele falasse mais alguma coisa:

— Eu ainda acho que deveríamos viajar e ficar um tempo longe desse mundo real aqui. Também estou precisando.

— Se eu viajasse agora, estaria novamente agindo por impulso e cometendo mais um erro. E... você não me parece precisar de um tempo para espairecer.

— Também tenho os meus problemas, Belle. — Suspirou mais uma vez. — Não é somente a obra, não são apenas os compromissos profissionais, como DJ e com a banda. — Desabafou, cheio de mistério.

— Estou aqui, caso queira se abrir. Não é porque estou cheia de contratempos que não conseguirei escutar os seus. Somos amigos antes de tudo e você pode confiar em mim.

— Eu sei que sim. Mas se as minhas questões podem vir a trazer mais problemas para você, prefiro não as compartilhar. Não é o caso de falta de confiança, mas de cuidado.

Entendia o lance do cuidado, pois um dos motivos que não contara a Taylor que eu fora atrás de Nathan na manhã anterior fazia parte do meu cuidado com ele. Desde a minha volta para sua vida, ele sempre soube de meus sentimentos por Nathan, mas não precisava tripudiar de seus sentimentos por mim. Achei que já havia tripudiado o bastante ao enchê-lo de esperanças com a nossa pegação no final de semana.

— Viaje comigo, Belle. — Taylor tocou de leve a minha mão, tentando segurá-la enquanto andávamos lado a lado. — Será bom para nós dois.

— Taylor... Acho que... o que você pretende com essa viagem vai um pouco além do que consigo lhe dar nesse momento. — Cruzei os braços logo abaixo do peito. O gesto falava por si, mas, achei bom começar a esclarecer, para não restar dúvidas: — Eu disse a você para a gente deixar rolar, para vermos a nossa relação de forma mais abrangente e...

Ele me interrompeu:

— Não entendi o que quis dizer com "abrangente".

— Entendeu, sim. Você até falou que aceitava o fato de eu não querer compromisso. Já se esqueceu?

Não é que ele tivesse esquecido, provavelmente não aceitara a minha posição.

— Certo, admito. Falei que aceitava o fato de você não querer compromisso, mas não deixei de falar, também, que criara expectativas. — Ele freou os passos e segurou o meu braço, impedindo-me de continuar caminhando. — Belle, não tenho como negar que espero mais.

— Não tem mais, Taylor. — Interrompi suas ilusões olhando profundamente em seus olhos. — Não seria honesto com você, e nem comigo, se eu mergulhasse fundo em nós dois agora. É por isso que estou sendo tão enfática em dizer que não viajaremos juntos. Não dá para fazer essas coisas de casal em lua-de-mel, não dá para esperar por mais quando tem um monte de coisas acontecendo.

— Então seja mais clara, por favor: é somente sexo o que está rolando entre a gente? É apenas isso o que quer de mim? — De braços cruzados, puxei o ar, pensando no que dizer. Não era apenas sexo, mas não sabia definir o que era. Dei sorte de ele continuar falando, assim ganhei tempo: — Eu tenho expectativas românticas, Belle, não vou mentir. Levar você para jantar, fazer carinho, dormir abraçadinhos, dizer coisas bonitas e, claro, sexo também. Tudo isso cabe na palavra abrangente, mas a sua definição de abrangente deve ser diferente da minha.

— Não exatamente — repliquei, tensa. — Amizade colorida se encaixa bem em abrangente e nela cabe tudo isso aí que você citou.

Taylor demonstrou sua decepção ao bufar e não falar mais nada, voltando a caminhar. Então resolvi me explicar melhor, apressando o passo para acompanhá-lo:

— Fiz questão de colocar as expectativas lá embaixo, porque estou tentando evitar que alguém nessa história saia machucado. Ou eu, ou você...

— Ou o seu ex, né? Pode me dizer. O fato de não querer compromisso comigo tem a ver com ele, não tem? — Taylor parou de andar novamente, posicionando-se na minha frente de braços cruzados. Meu estômago pesou, enquanto a adrenalina, quente, percorria as minhas veias. — Você disse que, talvez, vocês reatassem, eu lembro... Como está isso aí? Vocês têm se falado ou se visto?

— Eu ainda gosto dele, Taylor. — Foi duro repetir essa informação, mas necessário. — Falei isso para você no meu primeiro dia em sua casa. Não voltei a tocar no assunto, porque... não havia necessidade. Mas...

Okay, chega. — Ele correu uma das mãos pelo cabelo, bufando. — Não quero ouvir.

— Foi você quem perguntou sobre ele. — Dei ombros.

— Já me arrependi. Ouvir você falar desse cara e do que você sente por ele me deixa... mal. Ou melhor; puto. — Mordi os lábios enquanto meu estômago se revirava, pagando o preço por ser honesta. — Levei bem essa situação no começo, mas confesso que foi porque não acreditei que você realmente pensava em voltar para ele. Vejo que me enganei.

— Tenho uma coisa mal resolvida aqui com você e outra ali com ele. Como acha que eu fico no meio disso? Acha que estou confortável? Também me sinto mal! — exaltei-me. — Não me joguei nos seus braços à toa, Taylor. Só que depois de ter permitido nos envolvermos um pouco mais, cheguei à conclusão de que é melhor ir devagar, de que de repente é... é até melhor dar um tempo.

— Um tempo até você ver se vai dar certo com ele, para, caso não dê, você voltar pra mim? Tem um nome pra isso!

Só de ele falar aquela verdade em voz alta, completamente irritado, senti-me mal. Não fazia de propósito, não estava a fim de magoar ninguém.

— Você e Nathan me magoaram de maneiras distintas, Taylor, mas me magoaram tanto que eu nem deveria estar em um dilema entre um e outro. — Meus olhos encheram-se d'água, e, com a voz embargada, continuei: — Se fosse para fazer o certo, escolheria nenhum dos dois. E quer saber? Chega, viu? Esse papo está demais para a minha cabeça!

Batendo os pés eu me virei, pronta para deixá-lo, certa de que me refugiar no apartamento, para chorar sozinha, era a melhor opção.

— Isabelle! Aonde você vai?

— Para casa! — Gritei, sem olhar para trás, chamando atenção de quem passava na rua.

— Belle... — Taylor me alcançou e segurou firme a minha mão. — Por favor...

— Não vai ser legal a gente passar um tempo juntos nesse clima. — Com a mão livre enxuguei as lágrimas. — Ontem você disse que me entendia; que sabia que eu tinha outras prioridades e que tudo bem viver a nossa relação sem compromisso. Hoje já veio com cobrança.

— Não é cobrança, Belle, é só que... — Olhando nos meus olhos tristes, com a mesma tristeza espelhada, ele não disse mais nada.

— Amizade colorida não serve para você, já entendi. — Livrei minha mão da dele e enterrei as duas nos bolsos de trás do meu jeans. — Você nem leva em conta que, antes, nem isso eu estava disposta a oferecer.

— É difícil aceitar que fiquei com o prêmio de consolação enquanto meu rival, em algum momento, ganhará o troféu de primeiro lugar. É difícil ficar com você com a possibilidade de você estar pensando em outro.

As lágrimas voltaram a correr soltas, junto com a minha revolta, e não consegui controlar a ira enquanto espumava na cara dele:

— Se faz você se sentir melhor, não estava pensando em ninguém além de você quando chupei o seu pau! Das duas vezes! — Taylor arregalou os olhos, olhando em volta, como se para se certificar de que ninguém ouvira aquilo. Baixei o tom, mas a raiva continuou presente. — Não é como se eu visse em você a figura do Nathan. Não acredito que você cogitou um troço desse! A única imagem masculina que interferiu alguma coisa na nossa intimidade foi a do filho da puta do Jayden, e só!

Taylor calou-se, e vi seu pomo de Adão subir e descer.

— Olhe — continuei —, isso aqui não vai acabar bem. Vou voltar pra casa e você resolve suas coisas na obra, seja lá o que forem essas coisas. Depois, sei lá, amanhã ou outro dia, quando a gente conseguir, a gente se fala. É realmente difícil pra você aceitar essa situação, e eu entendo. O erro foi meu por ter cedido aos seus encantos. Desculpe.

— Isabelle...

— Você pressionou e eu cedi, porque sinto algo e não sou de ferro, mas chega. Quer saber; melhor a gente nem insistir na amizade colorida. Já senti que não está bom pra você e, de certa forma, também não está bom pra mim.

Acenei, secamente, e continuei meu caminho de volta para o condomínio, pensando no quanto eu fora estúpida por me envolver com Taylor. Não precisava tê-lo feito sofrer, nem ter aberto uma brecha para eu sofrer ainda mais. Nathan me pedira 15 dias, nem era tanto assim, e na primeira semana eu sucumbira ao diabo loiro.

.......


Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top