Cap 30. A verdade sobre Max
Se eu soubesse que show de glam metal era tão animado, eu teria ido a outros há mais tempo. Especialmente se pudesse sempre estar acompanhada de um homem gentil abraçadinho a mim, dando fungadinhas no meu pescoço, como Nathan havia feito diversas vezes durante uma hora e meia que ficamos ali em pé.
— Vamos comprar água antes de irmos embora? — sugeriu ele após o final do bis, caminhando de mãos dadas comigo para o salão do bar.
— Minha energia está lá embaixo, acho que preciso de um Flying Skull. — Bocejei só para implicar, e Nathan me olhou torto, sorrindo em seguida, assim que percebeu que eu estava zoando com a sua cara.
— No que depender de mim, na minha presença, você não bebe mais essa porcaria.
— Ha, ha. Até parece. — Retribui as fungadas que havia recebido no pescoço com um beijo doce estalado na sua bochecha, o que o deixou bem surpreso. — Só por isso vou pegar um aditivo agora mesmo. Vou ficar ligadona até amanhã — brinquei.
Paramos lado a lado, perto do balcão do bar, disputando um espaço entre todas aquelas pessoas sedentas, e foi então que, mais uma vez tivemos — eu, pelo menos, tive — o desprazer de esbarrar em Max, que abriu o maior sorriso ao nos ver.
— Achei vocês! E aí? Curtiram o show? — Continuava alterado, apenas parecia bem menos inconveniente. — Trouxe água lá do espaço VIP. — Ele estendeu dois copos de acrílico, um para mim e outro para Nathan.
— Obrigado — agradeceu-lhe Nathan, dando um gole. — Acho que íamos morrer nessa fila.
— Mas e então... Vamos esticar a noite? Vou fazer uma festinha lá em casa com um pessoal que conheci hoje. — Ele olhou para mim. — Baby, sei que você não tem boas lembranças lá de casa, mas vai ser tudo na paz desta vez... Tudo na maior paz...
Eu conhecia aquele Max paz e amor, conhecia bem porque eu também já tinha ficado daquele jeito. Por isso desconfiei de que ele estava cheio de MDMA mais uma vez. Sua sociabilidade repentina não era à toa, não mesmo; era muito ecstasy ingerido.
— Obrigado por nos chamar, Max, mas a Penelope está cheia de sono. Vou deixá-la em casa e descansar um pouco. Amanhã cedo preciso dar suporte ao meu pai com alguns pacientes. — Nathan apertou minha mão duas vezes, e eu entendi seu recado.
— Só uma hora, para me prestigiar, jogar uma sinuquinha... — Estreitei os olhos, enojada com a analogia. — O novo casal não vai me dar essa honra?
— Fica pra próxima — encerrou Nathan, dando um aperto no ombro de Max e nos livrando de vez do convite. — Boa noite, companheiro. Cuide-se, beba bastante água também. Você já bebeu cerveja demais por hoje.
Agradeci em silêncio por Nathan nos livrar da companhia de Max no final do evento e mais ainda por se esquivar do convite para irmos à casa dele.
*****
— Essas festas do Max sempre acabam mal... — disse Nathan, enquanto andávamos para o carro, e engoli em seco. — Não pretendo ir a mais nenhuma delas. Na verdade, eu até gostaria de me distanciar um pouco dele, de maneira geral. Mas insisto na nossa amizade pelo que já vivemos juntos, pelo nosso passado. — Ele fez uma pausa, pensativo. — Enquanto eu fiz e faço de tudo para me manter bem, ele continua nessa...
— Nessa o quê? — atrevi-me a perguntar.
— É uma longa história — respirou fundo —, mas se pretendemos nos relacionar, mesmo que isso acabe somente em uma bela amizade, precisamos ser honestos um com o outro. Então eu vou lhe contar.
Nathan acabou de beber a água, empilhou o seu copo no meu copo vazio e foi até a lixeira mais próxima descartá-los, depois voltou, abriu o carro, e nos acomodamos. Com o estacionamento lotado, vimo-nos em uma grande fila para sair do Ambassador. Ele começou sua explicação ali mesmo.
— Conheci o Max quando éramos muito novos. Eu tinha apenas dezesseis anos. Sabe aquela fase que os garotos são rebeldes, revoltam-se com qualquer coisa, querem aparecer, tirar vantagem com as meninas...?
Confirmei com a cabeça. A típica onipotência da juventude.
— Nós éramos assim — continuou. — Enchíamos a cara todas as noites. Se não podíamos beber na rua, bebíamos em casa. Nossos pais sempre tinham as melhores bebidas ao alcance de nossas mãos. E isso virou uma coisa comum, um hábito. Fora do normal.
Arregalei os olhos. Acostumada a ver Nathan bebendo água, não imaginava que ele tivesse consumido álcool nem na vida anterior.
— O que estou querendo dizer, Penelope, é que para nos divertir precisávamos estar bêbados. E queríamos diversão a toda hora, então acabamos afogados no alcoolismo muito cedo, gerando agressividade, comportamentos de risco, péssimo rendimento na escola...
Chocada. Chocada. Olhando para Nathan assim tão certinho, quem diria que ele tinha sido um adolescente rebelde, agressivo e certamente insuportável? Eu nunca.
— Então você e Max sempre foram amigos? Desde a adolescência?
— Sim, mas não nos conhecemos da maneira convencional. Do jeito que contei, parece que vivíamos juntos, mas não saíamos juntos, não. Não frequentávamos a mesma turma. Nossas histórias são apenas iguais. Iguais à de muitos jovens de hoje em dia. — Ele se ajeitou no banco e virou o corpo para mim, com um braço apoiado no volante. — Na verdade, eu conheci o Max na clínica do meu avô, que hoje é do meu pai. Uma clínica de reabilitação que fica em Malibu. Foi lá que fiquei o tempo necessário para me livrar da vontade, da necessidade de beber todos os dias. Eu e Max, por termos quase a mesma idade, acabamos nos aproximando, fazendo atividades juntos, e assim levamos a amizade para fora dali. Por muitos anos, ele se manteve sóbrio, mas recentemente teve uma recaída. Bem, como você pode ver.
O que eu poderia dizer depois de tudo aquilo, com Nathan se abrindo daquele modo escancarado para mim? Eu não esperava. E, como não consegui encontrar palavras, ele continuou:
— Apesar de ele ser um cara difícil, sinto-me mal todas as vezes que penso em me afastar. Tem uma sensação de responsabilidade envolvida. Como se eu precisasse conviver com o Max, para fazê-lo voltar ao eixo. O preocupante é que não estou conseguindo. O que eu vejo é um Max que não quer mais saber dele mesmo. Um Max que, apesar de ter quase 30 anos, voltou a agir como o menino desorientado de 14 que precisou de ajuda.
— Nossa! Isso é muito triste. — Aquilo bateu fundo em mim. Max não era só um babaca. Era doente. Hmm. Mas era também um babaca.
— Sim, é muito triste. Ele não suportou um acontecimento na sua vida pessoal, e isso contribuiu para que voltasse a beber desse modo. Precisava ter continuado com um acompanhamento psiquiátrico, minimamente precisava de consultas com um psicólogo, mas não fez nenhum dos dois. Vou ver se converso com ele de novo e tento convencê-lo a buscar um tratamento.
— Ah, sim, talvez você consiga fazer isso. — Mirana, depois do meu surto, não obteve sucesso em me persuadir.
— Falta a Max algo que, apesar dos pesares, nunca faltou a mim: uma base familiar. Desde cedo, sempre foi tudo muito confuso para ele. Filho de pais separados, ele nunca teve muito apoio. No tempo que passou na clínica, recebeu muito poucas visitas. Era notável o descaso. O pai, um multimilionário da indústria alimentícia, morava em outro estado, nunca deu as caras durante o tratamento. E a mãe, uma modelo de sucesso no final dos anos 1960, estava mais preocupada com ela mesma, em tentar se integrar em Hollywood, do que com o próprio filho.
— Deixe-me entender: eles moravam em outro estado e quando os pais se separaram a mãe veio para Los Angeles com o Max? Trouxe o filho para longe do pai, foi isso?
— Exatamente. Ela veio para tentar ser atriz aqui.
— E como é o relacionamento de pai e filho hoje em dia?
— Relacionam-se dentro do necessário, mas não são melhores amigos. O pai continua na Pensilvânia cuidando da base dos negócios. Casou de novo uns anos depois, teve outros filhos... Só que Max, por ser o mais velho, ficou com a responsabilidade de gerenciar os negócios na Califórnia. Uma responsabilidade muito grande para ele. — Eu não conseguia imaginar Max administrando nem uma banquinha de camelô, quanto mais a sucursal de uma grande empresa. — Ele até estava indo bem, mas depois do que aconteceu com a mãe há dois anos, destrambelhou de vez. Apesar de não ser equilibrada, a mãe era o seu porto seguro.
— O que ela teve? — Senti que ele não queria me dizer, que já tinha falado até demais, mas a minha curiosidade foi maior.
— Max encontrou a mãe morta em sua mansão, depois de dias sem notícias. Foi visitá-la, e lá estava ela; caída no chão, cheia de frascos de remédios controlados vazios do lado.
Nossa, que merda. E lá estava eu, sem palavras de novo. Mas, desta vez, esforcei-me para dizer algo, porque Nathan parecia abalado ao relembrar toda a história.
— É importante que, mesmo sendo desgastante, você não saia de perto do Max agora.
— Sim. Não posso sair de vez do lado dele. Posso não ir às festinhas, mas não vou abandoná-lo. Max confia em mim, sou seu amigo. Ele já perdeu muitas coisas na vida, eu não vou ser mais uma delas.
Eu acariciei o rosto de Nathan, alisando a sua barba com o indicador.
— Foi por tudo que você viveu quando jovem que decidiu ser psiquiatra?
— Com certeza foi definitivo, ainda mais vindo de uma família inteira de psiquiatras.
— Sua mãe é psiquiatra também?
Ele riu, puxou a minha mão e beijou a palma de maneira carinhosa.
— Não, não. Minha mãe cuida apenas da administração da casa. É uma mulher muito bacana, você vai se amarrar nela.
A questão era se ela ia se amarrar em mim, a substituta da bonequinha de porcelana Gigi Robins. Imagina o que ela, provavelmente uma madame rica de Beverly Hills, diria se soubesse que a nova escolhida do seu filho era uma stripper e, ainda por cima, latina. Suei frio só de pensar.
— Sabe, Penelope, não é fácil se manter sóbrio. É uma luta diária. Mas vale tanto a pena, tanto... Max está se acabando... — Seu tom foi bastante preocupado.
— Eu vi uma amiga se acabar, novinha. Envolveu-se com drogas pesadas e foi ladeira abaixo. Até chegou a ser internada, mas acabou fugindo da clínica e morreu num acidente de carro durante a fuga. Na verdade, ela chegou a ser socorrida com vida, mas morreu no hospital.
— Sinto muito pela sua amiga.
— Foi muito dolorido. Só quem convive de perto com um dependente químico sabe como isso desestabiliza os amigos, a família e todos em volta. Num passado mais recente, convivi também com uma pessoa que, por problemas pessoais, acabou no vício do álcool. — Eu me referia ao irmão mais velho de Taylor. — Ele ficou internado na Azure Ville por um tempo. Conhece?
— Ah, sim, uma clínica muito exclusiva em Hollywood Hills que atende às celebridades e milionários. Acho que nem tem muitos quartos, tamanha a privacidade. A Wishes, a clínica da minha família, também atende um público seleto, mas tem outro estilo de tratamento.
— Wishes... — pensei alto. — Já ouvi falar dessa clínica. Acho que em alguma revista. Não foi lá onde o Charlie Sheen ficou internado?
— Isso. — Ele tocou de leve o meu braço, uma vez para cada um dos nomes que citou em seguida: — Charlie Sheen, Robert Downey Jr., Ben Affleck, Wynona Ryder... A Wishes é muito conhecida por isso. Os paparazzis não dão descanso nem nesses momentos.
— Principalmente nesses momentos — enfatizei. Eu sabia muito bem o que era fugir deles.
Depois de uns dez minutos parados na fila para sair do estacionamento, conseguimos chegar à rua. Nathan ligou o rádio, colocando o mesmo CD que ouvimos na ida para o Ambassador, e fiquei pensando não ser justo que, depois de ele ter se aberto, eu não contasse algumas coisas sobre mim. Especialmente sobre o envolvimento acidental com o seu amigo, segredo que estava me sufocando.
— Ainda sobre Max... — Tomei coragem para começar, aproveitando que o nome dele estava em pauta.
— O que tem o Max? — Ele olhou para mim, agora um pouco mais relaxado.
— Você o puxou para uma conversa ali perto da mesa de sinuca...
— Ah, foi. Tive que fazer isso. Não podia deixá-lo perto de você falando um monte de besteiras. Ele bebe e fica bem intragável.
— Fica... — concordei. — Mas o que vocês conversaram? Parecia sério. — Coloquei uma mexa de cabelo atrás da orelha.
— Ele está, ou estava, interessado em você. Ele me disse com bastante convicção. Mas como eu poderia adivinhar?
— Ele disse disso? — Lola já tinha me avisado, o próprio Max tinha dito isso na minha frente lá no Ambassador, eu só não tinha levado a sério. — O que mais ele disse?
— Ah, Penelope, nem vale a pena comentar. Chega num ponto que ele cria coisas na cabeça. Tem uma hora que já não dá mais para saber o que é verdade e o que é mentira... É um fanfarrão.
— Nathan...
— Oi? — Ele deu uma olhadinha rápida para mim no banco do carona e depois voltou à atenção para o trânsito.
— É que aconteceu uma coisa, uma coisa muito constrangedora no The Heat. — Eu desci a mão do pescoço até o peito, massageando a região, angustiada. — E foi até por isso que eu saí de lá.
Nathan, parado no sinal, agora olhava fixo para mim. A expressão ainda era neutra, mas seu olhar atento tornou minha explicação um pouco mais difícil.
— Teve uma noite que a Lola, Lollie Pop, Queen Lollie, você sabe quem é... Ela colocou alguma droga na minha bebida, e acabei ficando bem mais eufórica do que o normal, com os sentidos muito mais aflorados, desejos estranhos... Hmm... — Respirei devagar antes de continuar. — E então ela me chamou para uma festa em um dos quartos VIP e...
— E você acabou se envolvendo com ela e com Max ao mesmo tempo — ele completou a história, sem se alterar. — Então o que Max falou é verdade.
— Desculpe. — Baixei a cabeça. — É verdade, sim, mas eu não teria feito nada daquilo se não fosse pelo efeito da droga.
— Eu sei que não. — Ele voltou a olhar para frente e dirigir como se tivesse apenas ouvido que fui até a esquina comprar balas. Simples assim.
— Sabe? — Ai, que bom ouvir aquilo.
— Penelope, eu entendo muito sobre o comportamento humano. Estudei anos para poder entender. Fora o meu instinto natural. Você já tinha tido um problema com Max, jamais em condições normais se envolveria sexualmente com ele.
— Achei que você fosse me querer longe quando ficasse sabendo.
— Longe? — Ele olhou para mim de relance, sorrindo. — Só se eu fosse louco. Sei que não foi o caso, você estava alterada; mas mesmo se, conscientemente, você tivesse feito uma dança privada para ele, seria apenas o cumprimento do seu trabalho. Quem seria eu para achar ruim? Ainda mais que nenhum dos dois sabia do meu interesse por você.
Eu sorri e olhei pela janela, aliviada por ele ser tão desprendido. Fiquei tanto tempo me martirizando por causa dessa situação, preocupada com o que ele pensaria de mim, para no fim, que bom, ele nem se importar.
Nathan tocou a minha coxa de leve, como tinha feito na ida para o Ambassador, e olhei para ele mordendo o lábio inferior, sentindo que desta vez o toque tinha sido bem menos despretensioso.
— Não importa o que você, Lola e Max fizeram. O mais preocupante disso tudo foi o fato de você ter tomado uma substância ilícita sem saber. Que perigo. Fora isso, com tanta coisa boa de nós dois para lembrar, por que eu escolheria focar no ruim? — Senti seus dedos pressionarem a minha pele.
Pensei em nós dois juntos, no nosso contato quente na noite do Valentine's, e um calor percorreu o meu corpo. Perguntei-me se era nisso que Nathan também estava pensando. Porque dos nossos momentos bons, aquele tinha sido o melhor.
Cantarolei mentalmente o refrão de Is this love, do Whitesnake, acompanhando a música do carro, pensando no quão maravilhoso era estar ali com Nathan. Com parte de nossos problemas esclarecidos e o fantasma de Max mais do que exorcizado, desejei que aquela noite jamais acabasse.
— O que acha de irmos jantar? — Minha vontade foi atendida com a sugestão de Nathan. — Podemos parar para comer algo gostoso e tomar um suco.
— É uma ótima ideia. — Apertei a mão dele, ainda sobre a minha coxa. — O que tem aberto esta hora?
Nathan olhou para o relógio no painel do carro.
— Já passa de meia-noite, não muita coisa. — Ele parou para pensar. — O Mastro's, meu restaurante favorito, fechará em meia hora. Quero levar você lá, mas hoje, que pena, não vou conseguir.
— Melhor. Assim não estarei suada e poderei me vestir de maneira adequada. — O Mastro's era um restaurante chiquíssimo, eu não me sentiria confortável de minissaia jeans e regata.
— Você está linda, poderíamos ir assim mesmo. Mas, pela hora, tudo que posso oferecer é um lanche gordurento em um drive-thru de sua preferência, ou um sanduíche leve preparado por mim lá em casa. Você escolhe. — Ele deu a sua piscadela fofa, e eu me derreti, com as amigas borboletas revolucionando o meu estômago.
— Eu topo o sanduíche preparado por você. — Pisquei de volta. — Prefiro algo leve esta noite.
.......
[ Nota ]
Música citada:
"Is this love" (WHITESNAKE, 1987)
.......
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