Capítulo 9 Visita Repentina

Eu estava estirada no sofá, com Zezinho empoleirado no encosto, repetindo alguma fofoca que tinha escutado da rua, quando ouço baterem na porta. Meu coração gelou. Só podia ser cobrança, por que quem mais viria me visitar a essa hora? Natália já tinha passado aqui de manhã, trazendo bolo, e Dulceneia, graças a Deus, estava ocupada demais com as fofocas do centro.

Levantei devagar, meio desconfiada, e fui atender. Quando abro a porta, dou de cara com nada mais, nada menos, que Rodrigo. O dono da academia. O homem que fazia meus joelhos tremerem desde os tempos de escola, com aquele cabelo despenteado de propósito e o sorriso que parece esculpido por um escultor italiano.

— Oi, Rafaela! Tudo bem? — ele começou, com aquele jeito tranquilo que ele tem.

Eu congelei. O que ele estava fazendo aqui na minha porta? Será que estava me convidando para um jantar romântico? Não, né? Claro que não. Ele veio aqui, óbvio, pra me cobrar da matrícula na academia. Eu nem sequer apareci mais lá depois da tragédia da semana passada.

— O-o-oi, Rodrigo! Tudo ótimo! Você... precisa de alguma coisa? — tentei soar casual, mas senti que minha voz saiu trêmula.

— Na verdade, eu vim saber por que você não apareceu mais na academia. Fiquei preocupado. Está tudo bem com você? — ele perguntou, com aquela expressão genuína de preocupação que só complicava mais a minha situação.

Senti o chão abrir. Como eu ia explicar que simplesmente não levo jeito pra academia? Eu não podia ser sincera que a minha motivação de me matricular na academia era pra ficar mais próxima dele. Maldita paixão não correspondida, me colocava em situações que eu não pensava direito e agia por impulso.

— Ah... então... — comecei, já sentindo meu rosto ficar quente. — Sabe como é, né? A vida tá uma correria...

Rodrigo me olhou com uma sobrancelha levantada, como quem não estava comprando essa desculpa esfarrapada.

— Correria? Rafaela, eu te vi na praça ontem, tomando sorvete com a Natália, e parecia bem relaxada.

Droga! Ele tinha me visto! Claro que ele tinha! Porque quando a gente quer desaparecer do mapa, o universo sempre faz questão de colocar a pessoa certa no lugar errado. Soltei uma risada nervosa, tentando parecer menos culpada.

— Ah, sim... A praça! Sabe como é, um momentinho de descontração... Faz parte, né? Pra... equilibrar as energias.

Ele deu uma risada curta, como quem percebeu que eu estava enrolando.

— Rafaela, se você não quer continuar, é só me dizer. Não precisa inventar desculpas.

Pronto, foi o suficiente para desmoronar o castelo de areia que eu estava tentando construir. Senti minhas mãos suando e sabia que não tinha mais como sair daquela conversa sem me afundar mais. Respirei fundo e decidi que era hora da verdade.

— Tá bom, tá bom! — levantei as mãos, derrotada. — Eu admito, Rodrigo, eu não tenho o menor jeito pra academia! Eu sou um desastre completo!

Ele piscou, surpreso.

— Como assim?

— Como assim? COMO ASSIM? — comecei a enumerar. — Eu quase fui arremessada pela esteira, o leg press me prendeu como se tivesse vida própria, e, na última aula, o personal me pediu pra fazer um agachamento e eu caí no chão! No CHÃO, Rodrigo! Como uma jaca madura!

Ele tentou segurar o riso, porém, eu vi o canto da boca dele tremer.

— Não tá acreditando? — continuei, embalada pelo desabafo. — Pergunta pro Zé do Mercado! Ele viu tudo. Deve ter contado para a cidade inteira! Foi uma vergonha nacional. Eu simplesmente não levo jeito pra essas coisas! Academia não é pra mim. Eu sou do tipo que prefere ficar sentada no sofá, comendo bolo e assistindo novela!

Rodrigo cruzou os braços, finalmente rindo abertamente.

— Não precisa exagerar, Rafaela. Ninguém nasce sabendo.

— Não, Rodrigo, você não tá entendendo. Não é questão de "nascer sabendo". É questão de "nunca vou saber". Eu sou uma catástrofe ambulante! E não tem personal que resolva isso.

Ele balançou a cabeça, ainda rindo, mas com um olhar de quem estava tentando me convencer do contrário.

— Sabe, você só precisa de prática. Eu mesmo posso te ajudar. Posso te acompanhar nas aulas. Se você cair de novo, eu te levanto.

— Você diz isso porque nunca me viu tentando fazer uma aula de spinning. Parecia uma barata tonta tentando pedalar!

Ele riu mais alto dessa vez, e, confesso, mesmo morrendo de vergonha, o som da risada dele me fez sentir um calor diferente por dentro. Parecia até que ele estava gostando de me ouvir contar essas tragédias.

— Olha, se você não quer mais ir, tudo bem. Mas, se quiser tentar de novo, sem pressão, eu estarei lá pra te ajudar.

Fiquei ali, encarando o homem que eu secretamente admirava desde sempre, me oferecendo ajuda como se fosse a coisa mais natural do mundo. E eu, como uma pata, não conseguia pensar em outra coisa além da cena ridícula de mim mesma caída no chão da academia.

— Eu agradeço, de verdade. Mas, honestamente, eu acho que sou um caso perdido. Talvez eu só precise aceitar que minha vocação é ficar longe de qualquer equipamento que envolva pesos.

Rodrigo deu de ombros.

— A decisão é sua. Só achei que seria legal você continuar. Quem sabe um dia, né?

Ele me deu um sorriso que, se eu não estivesse tão envolvida no meu próprio drama, poderia ter me derretido inteira. Mas, claro, eu mantive a postura, mesmo com o coração batendo mais rápido do que deveria.

— Quem sabe... — respondi, sem muito entusiasmo.

Ele me deu um aceno antes de ir embora, e eu fiquei na porta, assistindo enquanto ele se afastava. Quando fechei a porta, suspirei. Por que ele era tão bonito? E tinha que fazer meu coração bater forte? Talvez nunca superasse aquela paixãozinha por ele.

— Rafaela, minha filha, você é uma negação! — falei para mim mesma, enquanto Zezinho, do nada, decidiu imitar o som da minha queda na academia: um "plof" escandaloso.

— Zezinho! Cala a boca! — gritei, jogando uma almofada no papagaio.

E lá estava eu, com mais uma história embaraçosa na minha longa lista de fiascos. Eu era uma comédia dramática diária.

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