Uma tarde com Gustavo
Dorama do vídeo acima : De volta a 1989 / Back to 1989.
Marcamos de nos encontrar no shopping mais próximo de nossas casas, Gustavo já estava me esperando, sentado em um lugar, com dois Milk – shakes sob a mesa.
Ele sorriu assim que me viu chegando. Aquele sorriso malandro que eu já estava começando a odiar. Como pode um moleque de 14 anos ser tão atrevido?
— Minha princesa chegou — disse ele, sorridente demais.
— "Sua"? Não seja louco! Vejo que já pediu um Milk-shake... — disse e me sentei de frente a ele.
— Dois. Um para mim e um para você.
— E se eu não quisesse um Milk-shake?
— Quem não quer um Milk-shake? Não seja do contra, eu sei que você gosta, pedi de chocolate, todos amam chocolate, não?
Suspirei. — Obrigada.
— Quer comer algo?
— No momento não.
— O que você tem para falar comigo?
— Desde quando gosta de mim? Por que gosta de mim?
Ele sorriu, como era confiante... — É sobre isso, princesa? Bom, eu sempre gostei de você, mesmo sem nunca termos nos falado muito, eu tinha vergonha de chegar em você, mas agora não tenho mais, o tempo passou e eu mudei, eu cresci.
A forma como ele falou "o tempo passou, eu cresci", seria uma pista de que ele era um viajante do tempo?
— Quanto tempo passou?
— Hora, que pergunta é essa? Foi um ano, você sabe.
— Não, Gustavo. Eu não sei.
— Não entendo...
— Estou cansada de fazer joguinhos, ficarei louca se eu não souber sobre isso. Eu vou contar a verdade e eu quero que você também seja sincero comigo. E sou uma viajante do tempo, sou de 2024, tenho 27 anos, mas acabei voltando para o meu passado, no tempo em que eu estava com 14 anos. Por isso estou aqui hoje, eu voltei no tempo, 2011 já passou para mim, mas estou revivendo ele novamente, só que... As coisas que tem acontecido comigo aqui desde a minha volta, estão todas diferentes de como foi na minha primeira vez tendo 14 anos. E eu estou achando que você tem algo a ver com isso, você também é um viajante do tempo, Gustavo?
— Você... Também voltou ao passado? — Ele perguntou, surpreso, seus olhos estavam esbugalhados ao ouvir tudo o que eu falara. Eu sabia! Ele também era um viajante...
— Então, você também veio de 2024?
— Sim... Eu voltei para 2011, pelo visto, da mesma forma que você voltou... Eu não sabia que você tinha voltado no tempo como eu — ele disse, espantado.
— Pois é... Voltei. Como aconteceu com você? — Quis saber, ainda atônita com a informação.
— Bom... — Ele começou a coçar sua mão repetidas vezes, antes de contar. — Eu tenho um computador sem o cartão de memória, quando o desligava por completo, o ano do computador sempre voltava para 2011, e eu tinha que arrumar, mas dessa vez, deve ter acabado a energia durante a madrugada e creio que eu viajei no tempo enquanto dormia... Pois amanheci, liguei o computador, e notei que não trocava, dizia que estávamos em 2011, foi quando percebi que estava tudo diferente, eu estava na minha antiga casa em Juiz de Fora, meu corpo mudou, a casa estava exatamente como eu me lembrava daquela época, meus pais também estavam ali, foi quando percebi que realmente estávamos em 2011.
— O quê? Exatamente como aconteceu comigo... Meu computador também voltou para 2011, quando você voltou? Qual foi o seu primeiro dia aqui?
— Foi no dia em que conversamos no MSN pela primeira vez, ontem no caso... Quando resolvi puxar assunto com você. Eu estava olhando os meus contatos quando te achei, eu me lembrei de você...
Bati a mão na mesa de leve. — Domingo também foi o meu primeiro dia! Voltamos no tempo no mesmo dia... Mas por quê? Por que nós dois? Quer dizer, por que você? Qual a sua história? E por que você me envolveu nisso tudo de "gostar de mim", sendo que você nunca gostou?
Gustavo sorriu, um sorriso misterioso dessa vez, não consegui identificar o motivo daquele sorriso naquele momento crucial.
— E quem disse que é mentira? Eu realmente gosto de você.
— Para de ficar brincando com coisa séria! Não tem como você gostar de mim, sendo que voltou no passado! Faz anos que não nos vemos, eu nem me lembrava de você, Gustavo — falei, irritada com seus joguinhos.
Ele colocou a mão por cima da minha e sorriu timidamente. — Não estou mentindo. Eu gostava de você, Alícia, na minha primeira vez sendo adolescente, eu morria de amores por você. Quando eu ia me confessar, meus pais me tiraram do colégio e da cidade, fui morar em BH e nunca mais voltei para Juíz de fora, até esse momento, a minha volta ao passado me fez voltar para esta cidade.
— Não brinca... — falei, um pouco incrédula.
— Não estou brincando. Eu era apaixonado por você quando eu tinha 14 anos, mas não tinha coragem de me confessar, e sua melhor amiga, havia se confessado para mim na época, e você sabia, por conta disso, eu nunca me atrevi a tentar nada com você. Eu sabia que você não daria bola para mim com sua melhor amiga gostando de mim, depois passou um tempinho e tive que me mudar de cidade, e assim, nunca mais te vi, pessoalmente.
— Minha nossa... nunca desconfiei de nada.
— Claro, você era super tímida, e nem olhava para mim. Bem que eu notei que dessa vez você estava um pouco diferente da Alícia que você costumava ser... Antes você era muito tímida, recentemente, está mais solta, mais atrevida, então é por isso, você também é uma adolescente com a mentalidade de uma adulta... Assim como eu — falou convencido, e sorriu. Só naquele momento percebi que sua mão ainda estava sob a minha. Afastei minha mão da dele, que sorriu ladino com o meu gesto.
— Para de flertar o tempo todo! Nem parece um adulto, estou começando a achar que você continua tendo a mentalidade de um garoto de 14 anos, ou será que a viagem no tempo te afetou? — Estava revoltada com a forma como ele levava tudo na brincadeira e nos flertes.
— Desculpa. Vou falar sério agora...
— Assim espero.
— O que mais quer saber sobre mim?
— Por que você também voltou no tempo? Qual foi o motivo que te fez voltar para 2011? E por que você voltou com o físico diferente de quando você tinha 14 anos?
Ele riu, novamente. Gustavo parecia não levar nada a sério. — Eu saí da escola no meio do ano, lembra? Quando fui para BH, entrei na academia, e meu físico melhorou, e estamos em Julho de 2011, enquanto em 2024, estávamos em maio. Em Julho eu já estava com o físico melhorado no ano de 2011, por isso, não voltei da forma como você se lembrava de mim.
Só naquele momento percebi que em 2024 estávamos em Maio, e em 2011 já havíamos voltado para o mês de Julho...
— Espera, mas por que você voltou para Juiz de Fora, se na sua primeira vez sendo jovem, você estava em BH? — Eram tantas informações, que eu estava ficando maluca.
— Bom... acho que isso se deve ao motivo de eu ter voltado para 2011... Minha vida em BH era lamentável. Nunca me adaptei a BH, cresci em Juiz de Fora, e sentia saudades daqui. Eu tinha um emprego, trabalhava com administração, mas era algo que eu fazia por obrigação, apenas para ter como me sustentar, era terrível, todos os dias eu era constantemente humilhado no emprego pelo meu chefe, eu estava no meu limite, passei a beber, e me afundei cada vez mais, não queria mais viver aquilo, todos os dias, trabalhando com algo que eu odiava, sendo humilhado, e me afundando na bebida... Eu fui largado por minha namorada, ela disse que eu era lamentável e que não me amava mais, sentia saudades da minha adolescência, foram tempos melhores para mim... Eu era feliz, mesmo estando em uma cidade da qual não gostava muito, tive uma adolescência feliz e tranquila. Especialmente na época em que eu vivia em Juiz de Fora, eu sempre imaginei como teria sido a minha vida se eu tivesse permanecido em Juiz de Fora, o que teria acontecido comigo se eu nunca tivesse ido para BH? Se eu tivesse conseguido me declarar para você? Pode achar que é besteira minha, mas eu nunca te esqueci, Alícia. Sempre pensei em você, nós dois teríamos tido alguma chance juntos se eu tivesse continuado aqui? Você foi o meu primeiro amor platônico, eu nunca te esqueci... — ele confessou, os olhos marejados demonstravam que estava sendo sincero, e eu me senti estranha ao ouvir tudo aquilo. Nunca passou por minha mente que eu tivesse sido o primeiro amor platônico de alguém. Eu sempre fui uma garota tímida e não tinha muita autoestima, nunca sonhei que eu pudesse ser a paixão de algum garoto.
— Bom, eu sinto muito por você... Então, quer dizer que você voltou no passado para mudar seu futuro infeliz, assim como eu.
— Me conte a sua história.
— 27 anos, dependente dos pais financeiramente e emocionalmente. Fiz faculdade, pós, cursos... Mas não conseguia emprego na área em que me formei. Comecei a sentir a pressão da minha família e da sociedade em relação a isso, e claro, de mim mesma. Comecei a desenvolver quadros de ansiedade, e fiquei com traumas em relação a isso, foi horrível. Também sentia saudades da minha adolescência, era tudo mais fácil, mais feliz. E aqui estou.
Gustavo colocou sua mão sob a minha. — Eu sinto muito por você, Alícia... A vida adulta é uma droga, não é?
— Um pouco... — respondi, tentando controlar as minhas lágrimas, não queria chorar na frente dele.
— Pode chorar, não é vergonha — ele me incentivou, me olhando com carinho.
— Não! Não vou chorar agora, já estou em 2011, não é? Agora posso ser feliz, posso mudar tudo e curtir a minha juventude novamente. Sugiro que você faça o mesmo.
— É isso o que estou tentando fazer.
— Afinal, você é um grande mentiroso! Disse que havia terminado de assistir The OC há pouco tempo, e eu acreditando que um garoto de 14 anos assistiu The OC...
— Não foi uma grande mentira. Eu realmente assisti, mas foi em 2023, eu menti, porque não sabia que você também tinha voltado no passado.
— Entendo. Bom, é isso, cada um segue seu caminho a partir daqui — disse, e me levantei, já havia saboreado o meu pedido durante a conversa.
Mas fui impedida pela mão de Gustavo, que segurou com firmeza meu pulso.
— Onde pensa que vai? Somos da mesma sala, Alícia! Não da para cada um seguir o seu caminho, nós dois voltamos no tempo no mesmo dia, não percebe? Estamos destinados a algo, e mesmo que não estivéssemos... Eu não tenho a intenção de te deixar ir embora dessa vez.
— O quê? Está maluco? Não estamos em um livro de romance, Gustavo! Não somos o casal principal, eu não gosto de você, e não voltamos para 2011 para ficarmos juntos, esquece que um dia gostou de mim — disse grosseiramente, ele me soltou, parecia decepcionado com minha atitude.
— Você mudou muito... Não fazia ideia de que aquela Alícia de 14 anos pudesse ser tão cruel um dia... Como pode ser tão insensível depois de tudo o que eu te contei? Depois de saber que eu era apaixonado por você... Não é apenas a sua vida que precisa de um final feliz, essa chance também foi dada a mim! Se continuar assim, seu futuro mudará para pior — ele disse, estava nitidamente ofendido.
As palavras dele conseguiram me abalar, senti o impacto de sua fala, não tinha notado o quanto tinha parecido "cruel", é que eu nunca tive um relacionamento amoroso na minha vida, nem uma amizade masculina, o primeiro contato físico e verbal que tive na vida por muito tempo com um garoto era o Gustavo, agora, em 2011.
Eu já havia gostado sim de vários rapazes durante meu crescimento, mas nunca interagi com eles, nunca souberam sobre meus sentimentos, então, eu não sabia lidar com os sentimentos alheios, talvez, eu não soubesse nem lidar com os meus próprios sentimentos.
Ele percebeu os meus olhos marejados, sem que eu percebesse algumas lágrimas escapuliram por meu rosto. Gustavo tocou no meu rosto com carinho, parecia preocupado.
— Você está bem? Eu te magoei? Desculpa, sou um tolo... Prometo não te irritar mais.
Explodi em mais lágrimas, sem entender, ele me abraçou com ternura, não me soltou enquanto eu não me acalmasse.
Quando as lágrimas cessaram, o soltei lentamente, ele segurou minhas mãos, e olhou nos meus olhos, esperando por uma explicação.
— Desculpa — pedi.
— Por qual motivo?
Suspirei, era difícil para mim, falar sobre meus sentimentos com alguém que eu não conhecia direito. Haviam se passado tantos anos, eu mal lembrava que ele havia estudado comigo.
— Por ter sido insensível com relação aos seus sentimentos por mim, por ter te tratado rudemente, por ter sido cruel — confessei, minha voz embargou, estava começando a chorar novamente, que droga! Por que eu estava tão sentimental?
Ele riu e apertou minhas bochechas de leve. — Que fofa! Acho que a Alícia de 14 anos ainda mora em você.
— Para... Não aja como se não tivesse te magoado.
— Está tudo bem, Alícia. Todos nós já fomos insensíveis com outra pessoa, uma vez na vida. O que importa é que você reconheceu e se arrependeu. Não precisa continuar se sentindo mal, estou feliz em saber que você ainda tem um coração puro — disse, e bagunçou meu cabelo.
— O que vamos fazer? — Perguntei.
— Como assim?
— Estamos em 2011, voltamos com nossos corpos de 14 anos, voltamos ao passado... Por que nós dois voltamos no mesmo dia? Não acha estranho? Às vezes sinto que estou louca... Como estar em 2011 pode ser real?
Ele sorriu timidamente. — Não sei Alícia... Não faço ideia do motivo de nós dois termos voltado juntos, ou como isso aconteceu. Também custei a acreditar que isso é real. Mas essa é a nossa nova realidade, precisamos nos acostumar a ela, e fazermos o que queríamos quando desejamos voltar no tempo... Vamos viver bem, aproveitar nossa adolescência sem arrependimentos, para que nosso futuro se torne melhor. Vamos fingir que somos adolescentes e fazer parte de 2011 novamente.
— E nós dois... Podemos nos tornar amigos — sugeri sem jeito.
Ele riu. — Sim, já que você não gosta de mim romanticamente, podemos ser amigos — ele falou descaradamente.
Revirei os olhos. — Sem flertes, por favor — pedi.
Ele fez uma careta engraçada. — Ah... Mas eu adoro flertar com você!
— Gustavo...
— Alícia... — ele me imitou até mesmo no tom de voz, bati de leve no braço dele, que sorriu, e eu sorri também. Não consegui evitar, ele era uma figura.
Depois, ele me levou até em casa, conversamos um pouco sobre nossas vidas no futuro, ele me contou que sempre gostou de desenhar, mas que não desenhava tão bem quanto gostaria e que sempre quis fazer um curso de desenho, mas quando se tornou maior de idade já não tinha mais tempo para isso, teve que estudar coisas que davam dinheiro.
Agora que voltou no passado, estava disposto a fazer um curso de desenho para aperfeiçoar seu talento, segundo ele, faria tudo o que sempre quis e não pôde da primeira vez sendo adolescente.
Eu o entendia bem, o mesmo acontecia comigo, também havia várias coisas que eu gostaria de fazer, mas que não fiz na época e no futuro, ficava arrependida.
Era a nossa chance, a oportunidade perfeita para sermos e fazermos tudo o que sempre sonhamos. Não podíamos desperdiçar.
— Então, é isso, Alícia. Até amanhã — ele se despediu de mim, me olhava com carinho.
— Obrigada pela ótima tarde que passei ao seu lado, obrigada por ter me feito perceber que eu estava sendo uma pessoa horrível...
Ele sorriu e bagunçou meu cabelo novamente. — Já disse que está tudo bem, lindinha, adorei a conversa que tivemos, espero que nos tornemos bons amigos.
Sorri e assenti com a cabeça. — Sim. Até amanhã — falei.
Ele sorriu novamente e acenou um "tchau", acenei de volta e entrei em casa.
Naquela tarde percebi que Gustavo era um rapaz legal, um homem legal... Enfim, os dois. Que ele também sofreu ao crescer e perceber que nada estava do jeito que sonhou um dia. Ele estava certo, eu não sou a única que busca um final feliz, uma vida feliz. Com toda certeza, existem muitas pessoas espalhadas pelo mundo que sentem o mesmo que nós dois, várias em situações piores do que a nossa. Não sei se elas voltaram no passado um dia ou se voltarão em algum momento... A única coisa que sei neste momento, é que estou em 2011, e assim como Gustavo disse, precisamos fazer parte novamente deste ano, sermos adolescentes e vivermos da forma como queríamos. Nossa vida atual era no ano de 2011, apesar de estarmos no passado, 2011 era o nosso novo presente.
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