Capítulo 2

Dois meses atrás...

Rubi. Novo Mundo.

— Esse lugar é sinistro. — Gael comentou assim que entraram na chamada floresta Seca. — Nunca vi árvores assim.

Estavam cercados por árvores de caule muito pálido, cumprido e magro; e suas folhagens eram grandes, grossas e muito vermelhas. Era como se fossem uma rosa vermelha em grande escala.

— Nós chamamos essa árvore de Pétalas de vinho. E ela só existe aqui no reino Rubi. — Raíssa deu um pequeno salto até alcançar um galho mais baixo e arrancou duas folhagens vermelhas; que eram o dobro da mão dela, quase do tamanho do rosto; e as enrolou em um canudinho. — Ela é o nosso alimento.

Gael que a olhava surpreso, piscou.

— Alimento? Pensei que o único alimento dos vampiros eram sangue.

Raíssa sorriu para ele, os olhos vermelhos cintilantes.

— E é. Meu criador e antigo rei, era um feiticeiro e vampiro. E passou anos da sua existência para desenvolver uma alternativa de alimento para nós.

— Uma alternativa que não envolvessem sangue?

Raíssa brincou com o canudinho de folhas vermelhas nos dedos e depois deu uma mordida nele.

— Bem, há sangue nas árvores. No mesmo jeito que nos outros mundos, a vegetação precisa de água, aqui, precisa de sangue. — Deu de ombros. — Essas árvores é uma alternativa para não saímos por aí matando as pessoas.

— E não é a natureza de vocês matar?

Ela revirou os olhos.

— Francamente caçador, você é a última pessoa que pensei que faria esse tipo de comentário. Não é exclusivamente dos vampiros natureza de matar. Já vi muita gente da sua espécie fazer isso. Além disso — deu a última mordida na folha — nós precisamos viver em harmonia com os outros reinos. E meu antigo criador sempre soube que isso não seria possível se o nosso povo tivesse uma sede de sangue descontrolável. E isso não é muito diferente de vocês, humanos. Me responda, Gael, quando fica com fome, você não enlouquece?

Ele franziu a testa.

— Sim, mas não matamos ninguém.

Raíssa revirou os olhos novamente e riu.

— Ora, claro que vocês matam para comer. Animais principalmente. Viu só? Não somos muito diferentes.

Sabendo que ela tinha razão, resolveu permanecer em silencio. Até outra questão aparecer.

— E o meu sangue? Por que fala que só pode se alimentar do meu?

O olhar de Raíssa se perdeu nos dele por longos minutos antes de responder.

— Olha, esse negócio de outra metade do coração é bem mais intensa para os vampiros. Quando acontece, a gente se torna preso com essa pessoa, a ligação é tão profunda, que se eu provar de outro sangue para me alimentar, meu corpo vai rejeitar e adoecer.

Gael a olhou curioso.

— É por isso que me disse que sou sua fraqueza?

— É um dos motivos.

— E se você provar do meu sangue?

Um sorriso cresceu nos lábios dela e passou a língua por eles. O corpo de Gael estremeceu, não de medo. Mas da visão da língua, da boca, de qual seria a sensação de tocá-los.

— Se eu provasse do seu sangue, caçador, eu nunca mais precisaria me alimentar com folhas de árvores. Uma gota do seu sangue me alimentaria por meses. E isso, claro, antes do juramento eterno. Depois dele, nunca mais precisaria de sangue algum.

— Juramento eterno?

— É o casamento dos vampiros. É muito além de uma cerimônia e um "sim". É um ritual, onde você me permite beber do seu sangue e promete lealdade, amor e todas as coisas importantes por toda a eternidade.

***********************

Dias atuais...

Gael piscou, surpreso.

— Agora?

Raíssa riu e agitou a mão no ar, descartando a ideia.

— Seria muito bem vindo se pudesse me alimentar com um pouco agora, mas não é uma necessidade. Se eu puder tomar um gole por mês, será o bastante para me manter viva.

Ele franziu o cenho, pensativo.

— E será o bastante para te manter forte? Não entendo muito sobre esse assunto, mas... sei que também sou sua fraqueza, e que a fome nos enfraquece. — Remexeu desconfortável na cadeira antes de continuar. — Você é a rainha de fogo, domadora de dragões, eu não quero enfraquecê-la.

Achando graça do aparente desconforto dele, Raíssa elevou a sobrancelha perfeita.

— Sim, me alimentar com uma frequência mais recorrente com seu sangue me fortaleceria muito mais.

— Em qual frequência? Duas vezes por semana?

— Uma vez por semana seria o bastante, mais que isso poderia enfraquecê-lo. Mas, Gael, não precisa fazer isso. Não quero transformá-la em um pedaço de alimento.

Ele se encostou no espaldar da cadeira, os olhos cinzentos intensos e decididos.

— Você mesmo disse que não precisa de muito, não é? E uma vez por semana não iria me prejudicar. E nos dois sabemos que eu sou muito mais que uma fonte de sangue.

Ele era a outra metade do seu coração, o homem destinado a ser seu. O homem que estava predestinado a amá-la, que a tinha salvado, que ao lado dela, tinha lutado e libertado o Novo Mundo. Os olhos vermelhos dela se encontraram com os dele, sabia que era um bom acordo. Mesmo assim, se encontrou preocupada com a saúde dele.

Durante muitos anos a única preocupação dela era com o seu povo, com a própria sobrevivência e agora com Gael, sentia um instinto protetor crescer dentro dela. Um que dizia que as próprias necessidades, a própria fome não poderia ser a prioridade, não quando o bem estar dele estava em jogo. Ela quase riu. Nem ao menos o amava — pelo menos ainda não — mesmo assim, desde que provara seu sangue pela primeira vez, sentia algo dentro de si que se movia, que se conectava nele.

Que estava sempre ciente da presença do caçador.

— Olha, Gael, não precisa de sacrificar tanto. Eu vou ficar bem e.... — se interrompeu quando o viu se levantar e se colocar diante dela, a prendendo ainda mais contra a mesa. O calor do corpo dele, o coração pulsante contra ela.

Gael inclinou a cabeça para mais perto, as mãos apoiadas na mesa branca nas laterais do corpo dela. O olhar cinzento queimaram nos dela.

— Eu te fiz um juramento lembra? — A voz rouca, baixa ecoou como uma batida muda dentro do coração silencioso de Raíssa. — "Por tudo o que sou, por tudo que serei, aqui e agora, eu lhe faço um juramento. Juro que a partir desse instante ficarei ao seu lado. Lhe entregarei meu sangue, minha alma e a minha lealdade". Lembra?

Ela engoliu em seco, sentindo-se subitamente nervosa, como se fosse novamente humana. Como há anos não sentia.

— Eu lembro sim, mas...

— Eu fiz uma escolha e dei minha palavra. E eu sempre cumpro com a minha palavra. Agora.... — colou a bochecha na dela, expondo o pescoço — aceite, Raíssa. Aceito o que estou te oferecendo.

Raíssa fechou os olhos. O cheiro do sangue dele, doce, viciante era o mais delicioso que tinha provado em toda sua longa eternidade. Deixou que a ponta do nariz roçasse na pele quente, sentindo a pulsação do coração, ouvindo a respiração quente contra o rosto. Sim, ela aceitaria tudo dele. Em um movimento rápido, uma de suas mãos o puxou para mais perto e outra o segurou na nuca.

Delineou com a ponta da língua gelada a veia quente que pulsava no pescoço e o sentiu estremecer em seus braços. Não era medo. Ela sabia reconhecer o motivo da pele dele se arrepiar, do coração palpitar e da respiração entrecortada. Era atração. Atração que nenhum dos dois poderia negar. Um desejo que se intensificava toda a vez que provava o sangue dele.

Abriu a boca, deixou que os dentes roçarem na pele dele sem de fato perfurá-la em um aviso mudo de logo aconteceria. Depois, sentiu quando as presas perfuraram a pele, atingindo as veias e o sangue inundou sua boca. Todo o corpo dela se eletrizou, em um gesto tão intenso quanto um beijo ou uma consumação sexual. Ele era doce e quente. E por mais apetitoso que fosse, sabia que não poderia beber muito. Por isso, retirou as presas e passou a língua gelada nos dois buraquinhos na pele, fechando-os sem deixar marcas. Como se nunca houvesse sido perfurados. Sem conseguir resistir, ela beijou o pescoço dele antes de afastá-lo.

Os olhos cinzentos se encontraram com os dela, tão intensos, tão quentes que ela não conseguiu encontrar a própria voz.

— Raíssa...

Nesse momento, duas batidas na porta é ouvida e uma vampira de longos cabelos ruivos e intensos olhos escuros entrou e parou ao vê-los agarrados um no outro. Gael se afastou da Raíssa, deixando o corpo cair novamente na cadeira; zonzo pelas emoções que o golpeavam; mas não pode deixar de notar o modo de como a intrusa o encarou. Como se o desaprovasse.

— Do que precisa, Mavis? — Raíssa quebrou o silêncio e passou a língua nos lábios, se certificando que não houvesse nenhum pingo do sangue de Gael neles.

— Só vim avisá-la, majestade, que o conselho já está reunido na sala do trono.

A rainha de fogo assentiu.

— Avise-os que já estou indo.

Com um último aceno, Mavis se retirou.

— Acho que sua secretária não gosta de mim. — Gael comentou com um sorriso que indicava que não dava a mínima. Raíssa riu.

— Não se preocupe, Gael. É normal ela não gostar de você.

— Só porque eu sou um caçador?

— Não. É porque você é a outra metade do meu coração, a pessoa com quem estou predestinada a amar pela eternidade. Mavis é minha ex-namorada. — Explicou e riu com a cara abismada dele.

Até que ele limpou a garganta e se ajeitou na cadeira.

— Bem, não sabia que você... bem...

Raíssa gargalhou com a falta de jeito dele.

— Gael, sou uma vampira com mais de cem anos. Vai por mim, se tivesse a mesma idade que eu, também iria se aventurar no diferente. A eternidade é longa demais para ficar preso dentro de uma caixa, caçador. 

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