{Um dia antes da maldição ser rompida}
EXTRA II: Um dia antes da maldição ser rompida
— Mãe, preciso de sua ajuda — disse após ter obtido a permissão de entrar em seu quarto, ela estava penteando seus longos cabelos em um raio de cavalo quando parou para me olhar.
— O que houve, meu amor? Venha cá, sua voz está estranha — soltando a escova, deu duas batidas sobre a cama me chamando para sentar, e o fiz sem hesitar.
— Cadê o papai? — escorei a cabeça em seu ombro assim que começou a afagar meus cabelos, era algo comum que ela fazia quando notava algo de errado.
— Não deve estar muito longe, acabou de sair do quarto. Precisa falar com ele também? — afirmei com a cabeça, me arrependendo logo em seguida — CASSIUS VOLTA PRA CÁ.
— Mãe! — dei um salto por instinto quase cobrindo os ouvidos pelo grito, era algo que eu poderia dizer que minha mãe possuía um talento único que não é qualquer um que consegue, sua voz quando queria, fazia até mesmo as paredes tremerem.
— Aí, desculpa, esqueci que você estava muito perto — ela riu me fazendo soltar um suspiro, que foi interrompido com meu pai surgindo como um flash de luz pela porta — Amor, você demorou.
Isso era demorado?
— Estava no térreo — ele sorriu assim que nos olhou — O que é tão urgente de minhas preciosidades que não poderia esperar alguns minutos? — fechando a porta atrás de si, meu pai me puxou para um abraço se lançando na cama, enquanto no caminho agarrava minha mãe junto.
Ela riu com a atitude repentina e não pude evitar de sorrir. De fato, eu devo agradecer por ter pais tão incríveis, ainda mais depois de ver o quão disfuncional pode ser a família real.
— Sabe a minha dupla personalidade? — ambos afirmaram — Não sou eu.
— Isso é óbvio, meu amor. Por isso que se chama dupla — minha mãe ergueu as sobrancelhas me olhando confusa.
— Não, não, estou falando no sentido literal. Eu fui amaldiçoado no dia da caça e estou trocando de corpo com outra pessoa, por isso nossas atitudes são diferentes — ah, de alguma forma eu acabei soando como o Tony agora — Calma, não é nada preocupante, certo? Já está quase resolvido.
Meus pais me olharam em silêncio por alguns longos segundos e depois se encararam, voltando a me olhar de novo, fizeram isso mais duas vezes até eu erguer as sobrancelhas.
— Ah, então era isso — meu pai assentiu com a cabeça.
— Espera, você acha que isso faz sentido!? — ela o olhou abismada.
— O que faz mais sentido, nosso filho ter sido amaldiçoado ou ter sofrido um choque por conta dos gritos do meu sogro? — minha mãe pareceu ponderar de maneira profunda, até concordar — Viu só?
Não demorou muito para eu conseguir explicar de forma detalhada para eles o que de fato, tinha acontecido, e como de costume em nenhum momento eles me interromperam ou esboçaram nenhuma reação, apenas me ouviram com paciência até acabar.
Havia pensado por um bom tempo se deveria ou não contar a minha família sobre, afinal, querendo ou não isso não é um segredo só meu, mas depois cheguei a conclusão que seria uma boa decisão a se fazer por um motivo muito simples: os membros reais não são confiáveis, nada irá garantir que não vão tentar fazer algo com o Zayn.
— Está me dizendo então, que você e o quarto príncipe estão trocando de corpo porque os dois jovens acharam de bom tom mandar um ao outro se matar em nome da deusa da luz? — bem, falando disso em voz alta, parece um pouco mais absurdo do que deveria... Acenei com a cabeça confirmando, recebendo uma sequência de tapas nela em seguida — Minha. Nossa. Eu. Criei. Um. Filho. Burro!?
— Calma, calma — meu pai rodou pela cama a puxando para um lado, enquanto eu deslizava em fuga para o oposto — Ele não foi burro, só foi...
Com a expressão que fez, era melhor não ter tentado defender.
— Não foi a melhor das atitudes, eu admito... mas há um problema maior.
— O que pode ser maior do que ser amaldiçoado? Ser morto? — ela me olhou com os olhos afiados por cima de meu pai, como se dissesse: Pense bem no que vai dizer.
— De fato.
— Você vai ser morto!? — os dois se sentaram de forma abrupta na cama.
— Eu? Não.
Um suspiro de alívio escapou deles, mas meu pai pareceu pensar sobre o que eu disse e me olhou espantado — O príncipe que vai morrer?
— Não se depender de mim — dei de ombros.
Como se tivesse visto uma assombração, minha mãe se escondeu atrás do meu pai, me olhando por cima de seu ombro — Cassius, o Theo tá estranho, concerta ele.
— Alguém dessa casa tem concerto...? Aí! — levando um soco, meu pai que veio se esconder atrás de mim — Theo, me protege.
— Ela é sua esposa, por que eu que tenho que te proteger? — mas assim que ela nos encarou eu peguei a mão do meu pai me unindo a ele — Sou inocente.
— Você disse que tinha algo pior, o que é? Decidirei depois de sua resposta o que faço com vocês dois — ela cruzou os braços, tomando uma pose de juíza prestes a julgar um condenado.
— Eu amo ele... — murmurei desviando o olhar da expressão assustada que meu pai havia feito.
— O que disse? Não consegui ouvir.
— Do príncipe Zayn, estou apaixonado por ele — minha mãe deixou seus braços descruzarem enquanto abria a boca em um perfeito círculo.
Admitir isso em voz parecia um pouco doce demais para o que estava acostumado, em algum momento eu tinha começado a gostar dele sem sequer notar. Ele, que se empenhava tanto naquele topete, que não se importava em deixar suas coisas um próprio caos, que apesar de tentar nunca conseguia esconder o que estava sentindo, e por algum motivo, só era sincero com suas palavras quando tirado do sério.
Desde o início sabia que havia algo de errado com ele, então porque nem me esforcei em não me deixar cair na lábia daquela raposa?
Quando o vi chorando após sua irmã passar correndo por aquele corredor, algo dentro de mim pareceu se revirar, ele não havia notado, seu olhar estava tão cansado e ainda assim, sequer havia notado que as lágrimas rolavam pelo seu rosto.
Não deveria ter dito aquelas coisas para ele assim que nos conhecemos, eu estava profundamente errado. Farei o que for preciso para a partir de agora, ele não ter mais aquele olhar no rosto.
— Você... minha nossa — minha mãe cobriu a boca.
Uma reação plausível.
Soltando minhas mãos, meu pai segurou meu rosto, olhando no fundo dos meus olhos me fazendo estremecer, sua percepção sobre as pessoas era algo que se sempre me deixou desconcertado e curioso, quase um dom.
— Você gosta mesmo daquele garoto — ele disse por fim, com uma seriedade incomum na voz — O que vai fazer? Ele não é apenas um príncipe, é filho de uma concubina abandonada que até mesmo o rei se opôs abertamente. Isso não é um sentimento que pode ser tratado de forma leviana, está realmente disposto a assumir esse risco?
— Eu já assumi esse risco, no momento em que decidi ficar ao seu lado.
Depois de mais um período de silêncio, minha mãe se levantou em um suspiro desamassando seu vestido e estendeu sua mão — Então vamos.
— Para onde? — inclinei a cabeça em confusão.
— Oras, para onde mais? Assumir seu noivo — quase engasguei com minha própria saliva, e foi preciso meu pai dar algumas batidas em minhas costas para voltar a mim.
— Mãe, eu não-
— Mãe nada, bora. Sabe que se não fizer isso, seu avô só irá se manifestar para permitir qualquer ajuda para meu genro no pós vida — ambos sorriram para mim, fazendo uma sensação de aconchego percorrer meu corpo. Espero que eu consiga ajudar o Zayn, e que se sinta acolhido aqui.
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— Vocês demoraram para o jantar, já estava ficando preocupada — tia Ana se levantou da cadeira para nos cumprimentar, ignorando tio Filípe e tio Willian que por algum motivo, estavam se enforcando, e meu avô que puxava os cabelos de tio Xavier.
Hoje era o dia perfeita, justo porque o jovem conde Norlan e o duque Scott iriam jantar no palácio em uma tentativa desesperada da rainha de abafar o que estava acontecendo.
— Tenho algo sério a dizer — com essas palavras, o caos parou de forma instantânea, todos focando em mim.
— Céus, o Theo matou um nobre — Katarina colocou as mãos sobre a boca, falando em um tom normal.
— Nem brinque com isso — Karina lhe deu uma cotovelada.
— Por que a primeira coisa que vocês pensam é que matei uma pessoa? — indaguei ofendido, mas o que recebi em resposta foram olhares como se a resposta fosse óbvia — Esqueçam — pressionei as têmporas, deixando um suspiro sair — O que eu tenho a dizer é que...
Pela primeira vez senti dificuldade em colocar as coisas em palavras, como deveria falar isso para minha família sem soar tão absurdo quanto é?
— Ah, bem... fui amaldiçoado — decidi iniciar pelo começo.
— Meu neto foi o que!? — meu avô se levantou de vez da cadeira.
— Nem ferrando que isso era verdade — Anthony parecia tentar conter a risada.
— Só falta nos dizer que realmente era outra pessoa em seu corpo — Benjamin suspirou.
Eu conseguia ver de relance, minha mãe se apoiando em meu pai, lutando para não soltar uma gargalhada com a reação de todos, os olhos quase saltando para fora em surpresa.
— Você está certo, o "Ted" era de fato, outra pessoa. A maldição consistia em uma troca de corpos — foi a primeira vez que vi o queixo de meu primo cair — Ah, essa pessoa era o quarto príncipe, inclusive.
— Q-quarto príncipe!? — de surpresa, o olhar do meu avô mudou para pânico.
— Em pensar que um príncipe é mais agradável que você... — Benjamin cruzou os braços, afirmando com a cabeça.
— Por isso que conseguia manusear com tanta perfeição as coisas com a mão esquerda... Ah! E teve a vez que o encontrei deitado no chão, a primeira coisa que passou em minha mente era que você nunca iria fazer aquilo com seus pijamas, em pensar que eu estava certa — tia Ana se sentou, parecendo tentar assimilar todos os comportamentos que havia presenciado.
— Também há mais uma coisa.
— Ainda tem mais!? — meu avô estava de fato, desesperado.
— Estou cortejando o quarto príncipe.
A partir disso, as reações foram as mais diversas possíveis, meu avô caiu sentado sobre a cadeira com a mente em branco, o garfo de tio Xavier caiu de sua mão, tio Filípe cuspiu seu vinho no rosto de tio Willian, que parecia ter parado de respirar e tia Ana arregalou seus olhos de pé, deixando sua boca formar um círculo.
Benjamin tirou seus óculos, cobrindo o próprio rosto, enquanto Karina tentava fazer Katarina não cair da própria cadeira, e Anthony, bem...
— Parabéns, Theo! Você oficialmente enlouqueceu, agora sim é digno de ser um Morisete — e me lançou um joinha.
Não aguentando as reações, minha mãe se deixou explodir em uma risada quase histérica, deixando a missão de segurar o riso agora para o meu pai.
Com um longo suspiro, como se estivesse puxando a coragem para dentro do meu corpo, coloquei um dos meus braços atrás das minhas costas, deixando a mão livre sobre o meu coração.
— Eu, Theodor, herdeiro do marquesado de Morisete, sacrifico meu nome e minhas posses em prol da confiança que coloco sobre Zayn Von Yigrem.
Dessa vez até mesmo Anthony, deixou sua taça cair.
— Theodor, o que você...? — meu avô tentou falar algo, mas pareceu desistir no meio do caminho, suspirando com certo pesar — Por que gosta desse garoto?
— Por que o senhor gostava da vovó? — ele abriu a boca para questionar, mas no fim, apenas acenou com a cabeça.
Com o salão tomado pelo silêncio, ele andou até onde havia deixado sua espada e a pegou, tirando-a da bainha enquanto vinha em minha direção.
— Eu, Roger, décimo segundo marquês do território Morisete, reconheço seu juramento e deixo em sua responsabilidade os atos de seu companheiro, como prova de sua confiança por ele — enquanto falava, apontava a espada sobre meus ombros, cabeça, e por fim meu peito, demorando alguns segundos antes de entregá-la nas mãos do meu pai e respirar fundo, se jogando em um abraço quase me deixando sem fôlego — MEU NETO CRESCEU — e de repente, se debruçou em lágrimas.
— Oh, céus. Estava a ponto de ter um infarto — tio Xavier pois a mão no peito, derretendo na cadeira.
— Quem diria que esse animal ia ser o primeiro a entrar um relacionamento de todos nós — Benjamin bufou, voltando a cortar sua comida.
— Ah, agora estou curiosa para conhecê-lo pessoalmente, parece ser um jovem tão agradável — tia Ana dizia, enquanto tentava secar a parte da roupa de tio Willian.
Não pude evitar de sorrir ao ver essa cena, poderia deixar para explicar os detalhes mais tarde, o mais importante nesse momento, era que minha família estava ao meu lado.
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